Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3368/21.1T8OAZ.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: COVID-19
SUSPENSÃO DE PRAZOS
CRÉDITOS LABORAIS
PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RP202307123368/21.1T8OAZ.P2
Data do Acordão: 07/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4. ª SECÇÃO SOCIAL
Área Temática: .
Sumário: I - Nenhuma razão lógica existe que justificasse decorrer dos artigos 6.º da Lie n.º 16/2020, de 29 de Maio e do correspondente do art.º 5.º, da Lei 13-B/2021, de 5 de Abril, o propósito do legislador proceder a uma alteração dos prazos de prescrição e caducidade, introduzindo-lhes um acréscimo de tempo, ou seja, visando que passassem a ter uma duração diferente da estabelecida na lei, para lhes ser acrescido o período de tempo correspondente ao da suspensão.
II - O propósito do legislador não foi alterar os prazos de prescrição [ou caducidade], mas sim salvaguardar os interesses de titulares de direitos sujeitos a prescrição, que por efeito da situação extraordinária vivida durante a pandemia que justificaram adopção de medidas extraordinárias, para além do mais, restringindo a liberdade de circulação e obstando à prática de actos judiciais, ficaram impedidos, por causa não imputável aos próprios, de exercer os seus direitos por via judicial.
III - O objectivo do legislador foi tão só o de inutilizar para o decurso do prazo de prescrição [e de caducidade] o período em que ocorria aquele impedimento, para o efeito determinando a suspensão desses prazos. Por conseguinte, cessada a suspensão, o prazo retoma o seu decurso, mas “alargado[s] pelo período correspondente à vigência da suspensão”, de modo a assegurar o efeito pretendido com esta medida extraordinária.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO nº 3368/21.1T8OAZ.P2
SECÇÃO SOCIAL



ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I. RELATÓRIO

I.1 No Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo do Trabalho de Oliveira de Azeméis, AA intentou contra A..., Lda, a presente acção emergente de contrato de trabalho, com processo comum, pedindo a condenação da Ré no seguinte:
- a “pagar ao Autor a quantia de 6.716,69 € (seis mil, setecentos e dezasseis euros e sessenta e nove cêntimos), conforme descriminada supra, acrescida de juros de mora desde a data da citação até efectivo e integral pagamento”.
Alegou, no essencial, que foi admitido ao serviço da Ré, com contrato de trabalho verbal e por tempo indeterminado, no dia 1/05/2018, para desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de “empregado de mesa”, auferindo mensalmente o salário de 580,00€, acrescido de igual montante a título de subsídio de férias e de subsídio de natal.
Em 31 de Outubro de 2019 Autor e Ré acordaram na revogação do contrato de trabalho na sequência da ativação do procedimento de despedimento por extinção do posto de trabalho pela Ré, tendo-lhe sido proposto o pagamento de uma compensação no valor de 2.582,22 € - correspondente ao valor ilíquido de 3.140,62 €, deduzidos os descontos legais -referente a todos os créditos vencidos, o qual aceitou sem, no entanto, verificar a sua conformidade.
Veio, no entanto, a perceber que o valor pago não abarca os direitos derivados da execução do contrato e da sua cessação por despedimento.
Prestou o seu trabalho cumprindo um horário de mais de 40 horas semanais, e um horário que consistia em iniciar a jornada às 20:00 horas e que se prolongava nos dias de semana até às 3:30-4:00 horas e nas sextas e sábados, até às 6, 7 ou 8 horas da manhã, até ao encerramento do estabelecimento, que é de diversão noturna, resultando que prestava mais de 40 horas semanais e mais de metade ocorriam após as 24 horas do dia.
Ao setor de atividade em causa é aplicável o Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a APHORT e a FESAHT, publicado no BTE n.º 23 de 22-06-2018, nos termos do qual o salário mínimo devido para a sua categoria profissional do Autor era de 600,00 €. Tendo a Ré pago um salário de s 580,00 € durante o ano de 2018, é devida a diferença no valor de 20,00 € por cada mês em 2018 e respetivos subsídios de férias e de Natal.
Nos termos do mesmo CCT aplicável, o trabalho prestado após as 24 horas é considerado trabalho noturno, sendo remunerado com o acréscimo de 50%, sendo que, caso o horário normal de trabalho ocorra maioritariamente em horário noturno todo o trabalho será remunerado com o referido acréscimo de 50% [Cláusula 31.º, n.º ]. Tendo cumprido mais do que aquele tempo de trabalho em horário noturno, é-lhe devido subsídio de trabalho noturno, correspondente a todas as remunerações auferidas ao longo de 18 meses, de Maio de 2018 até Outubro de 2019, resultando num crédito de 5.400,00 € (150,00 x 18).
A Ré nunca pagou subsídio de alimentação, sendo que nos termos do CCT é direito do Autor auferir a quantia mensal de 107,00 €, sendo-lhe devida a quantia de 1.926,00 € (107,00 x 18).
É-lhe devida também a compensação pela extinção do posto de trabalho, que deve corresponder, pelo menos, a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou fração de antiguidade, do que resulta um valor indemnizatório de 240,00 €.
São ainda devidos valores referentes a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, bem como a 7 dias de férias não gozadas, referentes ao trabalho prestado no ano de 2019, até outubro, bem como subsídio de férias devido no ano de 2018.
Assim, a Ré deve ao autor, em virtude do despedimento por extinção do posto de trabalho efetuado, a quantia de total de 9.856,9. Aquando da assinatura do acordo de revogação do contrato, a Ré pagou-lhe 3.140,62€ restando em divida o remanescente que ascende a 6.716,69€. A esta quantia, que pela presente Acção peticiona, acrescem os juros compensatórios à taxa legal devidos desde a citação e até integral e efectivo pagamento.
Foi realizada audiência de partes, mas sem que se tenha logrado alcançar o acordo.
A Ré apresentou contestação. Defendendo-se por excepção, arguiu a prescrição dos créditos reclamados, invocando o disposto no art.º 337.º n.º1, do CPT.
Alega, também no essencial, que o contrato de trabalho cessou no dia 31 de outubro de 2019, por mútuo acordo, nos termos do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 220/2206, de 03 de Novembro, pelo que todos os direitos e créditos laborais resultantes do contrato, sua violação ou cessação, a existirem extinguiram-se por prescrição no dia 1 de Novembro de 2020.
O Autor solicitou no Instituto de Solidariedade e Segurança Social, a 8 de agosto de 2021, o benefício de Apoio Judiciário, e no dia 4 de Novembro de 2021, propôs a presente ação, vindo a ré a ser citada no dia 26 de novembro de 2021.
Conclui, defendendo que os créditos peticionados estão extintos, por prescrição, às 24 horas do dia 1 de novembro de 2020, ainda que se aplique a suspensão dos prazos de prescrição e caducidade contemplada pela Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março.
Caso assim não se entenda, impugna os créditos pedidos por se encontrarem pagos na data da assinatura do acordo de revogação do contrato de trabalho, nos termos do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro.
Pede que a acção seja julgada improcedente, com a sua absolvição do pedido.

I.2 O Tribunal a quo fixou o valor da causa em € 6.716,69, proferiu despacho saneador e, de imediato, passou a conhecer do mérito da causa, proferindo a decisão, concluída com o dispositivo seguinte:
-« [..]
5. Pelo exposto, julgo procedente a exceção de prescrição e, em consequência, absolvo a ré do pedido.
6. Custas pelo autor.
7. Registe e notifique.
Fica sem efeito o julgamento agendado.
[..]».

I.3 Inconformado com esta decisão, o autor interpôs recurso de apelação, o qual foi admitido e julgado por esta Relação, em acórdão de 13 de Julho de 2022, tendo sido decidido “julgar o recurso procedente declarando a nulidade da decisão recorrida por violação do princípio do contraditório [art.º 3.º 3, do CPC e 61.º n.º2, do CPT], devendo a 1.ª instância dar prévio cumprimento àquele princípio, para que o autor possa pronunciar-se quanto à excepção de prescrição dos créditos arguida pela Ré”.

I.4 Os autos baixaram à 1.ª instância e, em cumprimento do determinado, o autor foi notificado para se pronunciar.
Veio o autor defender não ter ocorrido a prescrição dos créditos laborais no momento em que foi proposta a ação, alegando, no essencial, que as normas dos artigos 6.º, da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, e 5.º, da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, estabelecem que os prazos são alargados pelo período de tempo em que tiver vigorado a sua suspensão.
Por seu turno, a Ré defendeu ter ocorrido a prescrição, por não existir uma dupla contagem do prazo de suspensão.

I.5 Observado o direito ao contraditório, o Tribunal a quo passou a proferir nova decisão, concluída com o dispositivo seguinte:
10. Pelo exposto, julgo procedente a exceção de prescrição e, em consequência, absolvo a ré do pedido.
11. Custas pelo autor.
12. Registe e notifique».

I.6 Discordando da sentença, o autor interpôs recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram finalizadas com as conclusões seguintes:
I – Introdução
1 - No âmbito de processo supra referenciado, foi proferido o Douto Despacho Saneador Sentença do qual agora se recorre, pelo qual foi entendido pelo Digno Tribunal ad quo julgar procedente a exceção de prescrição invocada pela Ré, dando total provimento à contestação e decidindo absolver a mesma Ré do pedido.
2 - Entendeu assim o Digno Tribunal ad quo dar provimento à alegada e pedida declaração de prescrição, entendendo o Autor, com o devido e muito respeito por opinião contrária, que de forma incorreta, tendo em atenção a legislação aplicável, nomeadamente a Lei 1-A/2020, Lei 4-A/2020, Decreto-Lei n.º 10- A/2020, Lei 16/2020, Lei 4-B/2021 e Lei 13-B/2021.
II – Da Prescrição
3 - Consuma o Digno Tribunal ad quo, no Douto Despacho Saneador proferido, embora ferida de nulidade como se vem de conhecer, a decisão da causa, dando provimento à prescrição invocada pela Ré e decidindo pela absolvição do pedido.
4 - Com o devido respeito por opinião diversa, entende o Autor que a solução legal adotada preconiza um regime diferente daquele que é aplicado no Douto Despacho recorrido, além de os períodos de suspensão definidos e resultantes das leis aplicáveis serem superiores aos considerados no mesmo Douto Despacho.
5 - O início de contagem do prazo de prescrição é necessariamente o dia 1 de Novembro de 2019, dia seguinte à data de cessação do contrato de trabalho, sendo o prazo de prescrição de um ano.
6 - Estando em curso o referido prazo de prescrição, por força das disposições conjugadas do art. 7.º da Lei 1-A/2020, de 19 de março, art. 5.º e 6.º da Lei 4- A/2020 de 6 de abril e art. 37.º do Decreto-Lei 10-A/2020, de 13 de março, o mesmo veio a ser suspenso no dia 09 de março de 2020.
7 - Por força das disposições conjugadas do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, do artigo 5.º e 6.º da Lei 4-A/2020 e do artigo 37.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, o início da suspensão dos prazos de prescrição previsto no artigo 7.º da Lei 1- A/2020 iniciou no dia 09 de março de 2020.
8 - Nos termos do disposto no art. 7.º da Lei 1-A/2020, de 19 de março de 2020, na redação vigente naquela data, no seu n.º 3, a situação excecional que justificou a emanação da referida Lei, é causa de suspensão dos prazos de prescrição, acrescentando o n.º 4 do mesmo artigo que o regime do n.º 3 prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo em que vigorar a situação excecional.
9 - Resulta do regime legal definido aquando da determinação da suspensão da contagem dos prazos de prescrição que, os prazos ficaram suspensos naquele momento, parando o seu curso, retomando a sua contagem a partir do momento da cessação da situação excecional que justificou a sua suspensão.
10 - A suspensão da contagem dos prazos manteve-se desde 09 de março de 2020, só tendo cessado no dia 03 de junho de 2020, 5 dias após a publicação da Lei 16/2020, de 29 de maio, a qual veio cessar a suspensão dos prazos operada pela referida Lei 1-A/2020, de 19 de março, através da revogação do artigo 7.º desta Lei, na sua redação inicial, do que resultou uma suspensão na contagem do prazo de prescrição durante 86 dias.
11 - Aquando da suspensão da contagem do prazo em 09 de março de 2020, haviam decorrido 130 dias no prazo de prescrição, pelo que, retomando-se a contagem, como determinado no número 4 do artigo 7.º da Lei 1-A/2020, devendo contar-se o período decorrido desde o momento inicial até a data de termo, acrescendo um período correspondente ao tempo em que vigorou a situação excecional, do que resultaria o termo da contagem em 25 de janeiro de 2021.
12 - A Lei 16/2020, de 29 de maio, no seu artigo 6.º, além de revogar a suspensão dos prazos operada pela Lei 1-A/2020, de 19 de março, determina ainda o incremento dos mesmos prazos, estipulando que os mesmos são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão.
13 - Embora a Lei 16/2020 venha revogar o Artigo 7.º da Lei 1-A/2020, fá-lo com efeitos a partir daquele momento, não determinando qualquer efeito retroativo, do que resulta que, por efeito do referido artigo 7.º da Lei 1-A/2020 e não obstante a sua revogação com a entrada em vigor da Lei 16/2020, o prazo ficou suspenso, não se considerando o tempo da suspensão na contagem do prazo original.
14 - Ou seja, ao período que resulta da aplicação do regime definido na Lei 1- A/2020, de 19 de março, que terminaria a 25 de janeiro de 2021, deve acrescer, por força da disposição do art. 6.º da Lei 16/2020, de 29 de maio um período de 86 dias, correspondente ao tempo em que vigorou a sua suspensão.
15 - Resulta da conjugação dos regimes da Lei 1-A/2020 e da Lei 16/2020 que, o prazo de prescrição, em 03 de junho de 2020, ocorreria, previsivelmente em 21 de abril de 2021, ou seja, o prazo original, acrescido da suspensão de 86 dias determinada pelo n.º 4 do art. 7.º da Lei 1-A/2020, acrescendo ainda o alargamento de 86 dias determinado pelo art. 6.º da Lei 16/2020.
16 - Estando ainda em curso o referido prazo de prescrição, veio a ser instituída nova suspensão e alargamento dos prazos de prescrição.
17 - A Lei n.º 4-B/2021, de 01 de fevereiro, veio introduzir alterações na Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março, nomeadamente o aditamento do artigo 6.º-B, resultando do mesmo, nomeadamente do seu n.º 3, a suspensão da contagem dos prazos de prescrição até sua revogação, bem como determinando, no seu n.º 4, que aos prazos de prescrição em curso acresceria o período de tempo em que durar a suspensão.
18 - A Lei 4-B/2021 entrou em vigor no dia 02 de fevereiro, sendo que, determinou o seu artigo 4.º que a produção de efeitos da suspensão da contagem dos prazos de prescrição (art. 6.º-B) iniciou no dia 22 de janeiro, dia a partir do qual os prazos de prescrição ficaram suspensos.
19 - Por força da Lei 4-B/2021, o prazo de prescrição do direito do Autor, que ocorreria no dia 21 de abril de 2021, ficou suspenso a partir do dia 22 de janeiro, inclusive, do que resulta que restava ainda o período de 90 dias para a preclusão do prazo de prescrição.
20 - A suspensão dos prazos operada pela Lei 4-B/2021, veio a ser revogada através da Lei 13-B/2021, de 05 de abril, a qual, no artigo 5.º procede à revogação do art. 6.º-B da Lei 4-B/2021, determinando a continuação da contagem do prazo de prescrição, nos termos previstos na norma que determinou a sua suspensão, a partir do dia 6 de abril de 2021, data de entrada em vigor da mesma Lei.
21 - Assim, e por aplicação e efeito da norma do artigo 6.º-B da Lei 4-B/2021, o prazo de prescrição, atenta a data de cessação dos efeitos da referida Lei devido a revogação operada no dia 5 de abril de 2021, retomou a sua contagem, acrescendo ao mesmo o tempo em que vigorou a suspensão, ou seja, 74 dias, portanto, contando-se o prazo como se o referido período não tivesse decorrido.
22 - Considerando que na data de início da suspensão operada pela Lei 4-B/2021 restavam 90 dias para que ocorresse a prescrição do direito do Autor, é este o período a contar para apuramento da data que resulta da aplicação do referido art. 6.º-B da Lei 4-B/2021, iniciando-se a sua contagem a partir do momento da cessação da vigência do mesmo artigo.
23 - Retomando a contagem do remanescente do prazo no dia 6 de abril de 2021, o qual era de 90 dias, a prescrição ocorreria no dia 04 de julho de 2021, último dia do prazo.
24 - A lei 13-B/2021, no seu artigo 5.º, determina que, os prazos cuja suspensão cesse por aplicação da referida Lei são alargados pelo período correspondente à vigência da suspensão, ou seja, após contagem do prazo nos termos do disposto no artigo 6.º-B, n.º 3 e 4 da Lei 4-B/2021, determina o alargamento do prazo pelo mesmo período de tempo que durou a suspensão, o que no caso deste segundo período de suspensão, durou 74 dias.
25 - Resulta do exposto que, o prazo de prescrição em causa nos autos, que terminaria no dia 04 de julho de 2021, foi alargado por 74 dias, apenas ocorrendo a sua preclusão no dia 16 de setembro de 2021.
26 - Assim, a suspensão do prazo de suspensão, operada pela Lei n.º 1-A/2020 e pela Lei 4-B/2021, tem o respectivo regime definido em dois números, tendo ali sido regulado que a contagem do prazo ficaria suspensa, bem como que aos prazos suspensos acresceria o período correspondente à sua suspensão, ou seja, o período de suspensão não contaria para efeitos de prescrição.
27 - A revogação das referidas normas, pelas Leis 16/2020 e 13-B/2021, não invalida nem elimina os efeitos produzidos pelas mesmas durante a sua vigência.
28 - As normas dos artigos 6.º da Lei n.º 16/2020 e do art. 5.º da Lei 13-B/2021, que vieram revogar as normas que determinaram a suspensão, não fizeram apenas essa revogação, vieram também introduzir inovações na contagem desses mesmos prazos.
29 - Decorre do teor das normas constantes dos artigos 6.º da Lei n.º 16/2020 e do art. 5.º da Lei 13-B/2021, que revogaram a suspensão dos prazos de prescrição que, os prazos de prescrição passavam a contar-se normalmente, e conforme já determinado nas normas que os suspenderam, como se o período de suspensão não tivesse ocorrido, estipulando ainda um aumento ou alargamento na duração dos mesmos prazos com a duração correspondente ao tempo em que os mesmos estiveram suspensos.
30 - Considerando que a revogação de uma norma não invalida nem elimina os efeitos que a mesma produziu durante a sua vigência e que a Lei que suspendeu os prazos já determinou que o período de suspensão não contava para efeitos de prescrição, a revogação das referidas normas já determinou a retoma da contagem dos prazos suspensos como se o período de suspensão não tivesse ocorrido.
31 - A previsão, na norma revogatória, de um alargamento do prazo de prescrição terá necessariamente de ser entendido como um alargamento além do decurso do prazo de prescrição com a integração do período de suspensão, momento ao qual é determinado que acresça novo alargamento com duração semelhante ao período de suspensão.
32 - Estando definido, no que toca a efeitos das leis, que o seu efeito é apenas para o futuro, sendo salvaguardados os efeitos produzidos por leis anteriores que sejam revogadas ou derrogadas, como estatuído no artigo 12.º do Código Civil, é mister concluir que os efeitos das Leis 1-A/2020, com a redacção inicial, bem como da Lei 4-B/2021, quando determinam a suspensão dos prazos de prescrição e a contagem do prazo original como se aquele período de suspensão não existisse, se mantém, mesmo após a respectiva revogação.
33 - Entender de outra forma, desconsiderando por conseguinte os efeitos produzidos pelas normas dos artigos 7.º n.º 3 e 4 da Lei 1-A/2020 e do artigo 6.ºB, n.º 3 e 4 da Lei 4-B/2021, consubstancia uma violação do princípio da proteção da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático enunciado no artigo 2.º, da Constituição da Republica Portuguesa, por aplicação retroativa das normas dos artigos 6.º da Lei n.º 16/2020 e do art. 5.º da Lei 13-B/2021, de forma injustificada e sem base legal em qualquer norma destas referidas Leis.
32 - Relativamente à data considerada no Douto Despacho Saneador recorrido como a data de entrada da ação, é mister realçar que a data a considerar como de entrada da ação não pode deixar de ser a de 8 de agosto de 2021 e não de 26 de novembro de 2021, para efeitos de contagem da prescrição.
35 - Resulta dos autos e da factualidade considerada no Douto Despacho Saneador sentença que, o Autor requereu a concessão de apoio judiciário com nomeação de patrono no dia 08 de agosto de 2021.
36 - Nos termos do disposto no art. 33.º da Lei 34/2004, de 29 de julho (Lei do Apoio Judiciário), o requerimento de apoio judiciário com nomeação de patrono determina que a ação seja proposta pelo patrono nomeado no prazo de 30 dias a contar da nomeação, salvaguardando a possibilidade de prorrogação do referido prazo, considerando-se a ação proposta no dia em que o requerimento para concessão do apoio judiciário e nomeação de patrono foi apresentado na segurança Social.
37 - Na sequência de nomeação oficiosa, foi elaborada e interposta a pretendida ação, que originou os presentes autos, a qual deu entrada no dia 04 de novembro de 2021, dentro do prazo de 30 dias, acrescido de dilação requerida e concedida com a mesma duração, portanto, dentro do prazo previsto no artigo 33.º da Lei 34/2004, retroagindo os efeitos da sua propositura à data de 08 de agosto de 2021.
38 - Terminando o prazo de prescrição apenas no dia 16 de setembro de 2021, como já explanado supra e tendo a propositura da ação ocorrido no dia 08 de agosto de 2021, acrescendo o prazo de 5 dias para a produção do efeito interruptivo da mesma, nos termos do disposto no artigo 323.º n.º 1 e 2 do Código Civil, ou seja, no dia 13 de agosto de 2021, foi nesta data e antes do dia 16 de setembro de 2021, interrompida a prescrição.
39 - Ao ter decidido da forma descrita e constante do Douto Despacho Saneador, foram violadas as normas do artigo 7.º da Lei 1-A/2020, de 19 de março, art. 5.º e 6.º da Lei 4-A/2020, de 6 de abril, art. 37.º do Decreto-Lei 10-A/2020, de 13 de março, artigo 6.º da Lei 16/2020, de 29 de maio, art. 6.º-B da Lei n.º 4-B/2021, de 01 de fevereiro, art. 5.º da Lei 13-B/2021, de 05 de abril, artigo 12.º do Código Civil, artigo 2.º da constituição da Republica Portuguesa, artigo 33.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho e artigo 323, n.º 1 e 2 do Código Civil.
Nos termos expostos e com o Douto suprimento desse Venerando Tribunal, deve ser julgada não provada e improcedente a exceção invocada de prescrição e julgado tempestivo o exercício do direito pelo autor, determinando-se a revogação do despacho sentença proferido e que prossigam os termos da ação

I.7 A recorrida Ré não apresentou contra-alegações.

I.8 O Ministério Público junto desta Relação teve visto nos autos, para os efeitos do art.º 87.º3 do CPT, tendo emitido parecer no sentido da improcedência do recurso, no essencial, na consideração do seguinte:
-«[..]
Ressalvado o respeito devido por melhor opinião em contrário, nenhum reparo ou censura há que ser feito ao douto despacho saneador sentença recorrido, que, deverá ser confirmado, atento o rigor dos fundamentos que nele foram consignados e que determinaram a improcedência da acção.
Bem se concluiu que ocorreu a prescrição dos créditos salariais, pelo decurso do prazo a que se alude no arto. 337.º, n.º 1, do Código do Trabalho, no momento da sua instauração, com a devida aplicação do regime decorrente das Leis de emergência que foram publicadas por ocasião da situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e pela doença Covid-19. As sucessivas suspensões de prazos que foram impostas por tais Leis, “in casu”, foram adequadamente computadas.
Improcedem as conclusões formuladas.
O despacho saneador sentença recorrido merece ser mantido na ordem jurídica.
[..]».

I.9 Foram colhidos os vistos legais e determinou-se a inscrição do processo em tabela para ser submetido a julgamento.

I.10 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 640.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho], as questões colocadas para apreciação pelo recorrente consistem em saber se o tribunal a quo errou na aplicação do direito aos factos, ao ter julgado procedente a excepção de prescrição dos créditos.

II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO
Com relevo para a apreciação da questão, o Tribunal a quo teve em conta a factualidade seguinte:
- O contrato de trabalho celebrado entre autora e ré cessou por revogação em 31 de outubro de 2019;
- Em 8 de agosto de 2021 o autor requereu a concessão de apoio judiciário nas modalidades de dispensa de pagamento de taxas e custas e nomeação de patrono, tendo-lhe sido nomeado patrono em 16 de setembro de 2021;
- A ação deu entrada em 26 de novembro de 2021;
- A ré foi citada em 26 de novembro de 2021.

II.2 MOTIVAÇÃO DE DIREITO
O Tribunal a quo julgou procedente a excepção arguida pela Ré de prescrição dos créditos reclamados pelo autor, com base na fundamentação seguinte:
-[..]
9. Nos termos do artigo 337.º, n.º 1, do Código do Trabalho, «o crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho».
O prazo de prescrição esteve suspenso durante certos períodos do ano de 2020 e 2021 – Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, Lei 4-B/2021, de 1 de fevereiro e Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, mais concretamente entre 9 de março de 2020 e 3 de junho de 2020 e entre 22 de janeiro de 2021 e 6 de abril de 2021.
Assim, o prazo normal de prescrição ocorria em 31 de outubro de 2020, mas é necessário acrescer 87 dias após a primeira suspensão e, como este prazo não termina até 22 de janeiro de 2021, então temos que aplicar o disposto nos artigos 6.º, da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, e 5.º, da Lei n.º 13.o-B/2021, de 5 de abril.
Estas normas estabelecem o seguinte: «Sem prejuízo do disposto no artigo 5.º, os prazos de prescrição e caducidade que deixem de estar suspensos por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão» e «sem prejuízo do disposto no artigo anterior, os prazos de prescrição e caducidade cuja suspensão cesse por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período correspondente à vigência da suspensão».
A questão que se coloca que divide as partes é precisamente a de saber se o prazo de prescrição considera-se suspenso nos períodos indicados e, para além disso, se deve acrescentar um período igual ao da suspensão ou se os períodos de suspensão se contam uma única vez. Em nosso modesto entendimento, temos que ter em conta a razão de ser das normas em causa, a razão que lhes estava subjacente e apurar qual o seu sentido. Todas as normas jurídicas visam responder a um problema e, no caso concreto, o problema reconduziu-se à limitação e perturbação no exercício de direitos [neste caso pelos trabalhadores] durante um período de agravamento da situação pandémica que desaconselhava vivamente contactos interpessoais, que exigissem a presença física. Logo, considerou-se que, como estavam desaconselhados os contactos interpessoais, qualquer pessoa estava limitada no exercício dos seus direitos, porque tinha limitações no contacto com advogados que os pudessem aconselhar adequadamente nesse exercício. Logo, o legislador considerou adequado suspender o prazo de prescrição de direitos para que a situação pandémica não prejudicasse, de qualquer forma, o exercício de direitos. Se, nos períodos considerados pelo legislador, existiam fortes limitações de contactos interpessoais, então esses períodos não devem ser contabilizados para efeitos de contagem de prazos de prescrição e caducidade. Mas o legislador não visou, em momento nenhum, alterar o regime dos direitos substantivos para além da paragem dos prazos de prescrição e caducidade. Logo, consideramos que a interpretação das normas em causa não é a de que os prazos estão suspensos nos períodos indicados e, para além disso, são acrescidos de período idêntico ao da suspensão, o que significaria que o prazo de suspensão seria contado duas vezes, pela suspensão em si e pelo acréscimo resultante do alargamento do prazo, porque esse entendimento não está de acordo com a razão de ser justificadora da suspensão. Em nosso modesto entendimento, o sentido das normas em causa é o de estabelecer o modo como os prazos são contados após a suspensão. Por isso, temos em conta o prazo inicial e, este prazo, é alargado por período idêntico ao da suspensão. No caso concreto, isso significa que o prazo inicial terminava em 31 de outubro de 2020, logo é necessário acrescentar 87 dias resultantes da primeira suspensão, o que levaria o prazo de prescrição para depois do segundo prazo de prescrição, o que significa que a prescrição ocorre no mês de abril de 2021.
Logo, no momento da entrada da ação, a prescrição já tinha ocorrido há vários meses, o que sucedeu ainda antes do requerimento para a concessão de apoio judiciário.
Por isso, deve proceder a exceção de prescrição.
[..]».
Como bem sintetizou o Tribunal a quo, a questão que se lhe colocava para apreciação e dividia as partes era “precisamente a de saber se o prazo de prescrição considera-se suspenso nos períodos indicados e, para além disso, se deve acrescentar um período igual ao da suspensão ou se os períodos de suspensão se contam uma única vez”.
A recorrente vem reiterar a posição que defendeu na acção, a qual assenta, no essencial, no seguinte:
[conclusão 12] A Lei 16/2020, de 29 de maio, no seu artigo 6.º, além de revogar a suspensão dos prazos operada pela Lei 1-A/2020, de 19 de março, determina ainda o incremento dos mesmos prazos, estipulando que os mesmos são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão.
[conclusão 14] Ou seja, ao período que resulta da aplicação do regime definido na Lei 1- A/2020, de 19 de março, que terminaria a 25 de janeiro de 2021, deve acrescer, por força da disposição do art. 6.o da Lei 16/2020, de 29 de maio um período de 86 dias, correspondente ao tempo em que vigorou a sua suspensão.
[conclusão 20] A suspensão dos prazos operada pela Lei 4-B/2021, veio a ser revogada através da Lei 13-B/2021, de 05 de abril, a qual, no artigo 5.º procede à revogação do art. 6.º-B da Lei 4-B/2021,
[conclusão 24] A lei 13-B/2021, no seu artigo 5.º, determina que, os prazos cuja suspensão cesse por aplicação da referida Lei são alargados pelo período correspondente à vigência da suspensão, ou seja, após contagem do prazo nos termos do disposto no artigo 6.º-B, n.º 3 e 4 da Lei 4-B/2021, determina o alargamento do prazo pelo mesmo período de tempo que durou a suspensão, o que no caso deste segundo período de suspensão, durou 74 dias.
Em suma, como o recorrente alega na conclusão 29, no seu entender “Decorre do teor das normas constantes dos artigos 6.º da Lei n.º 16/2020 e do art. 5.º da Lei 13-B/2021, que revogaram a suspensão dos prazos de prescrição que, os prazos de prescrição passavam a contar-se normalmente, e conforme já determinado nas normas que os suspenderam, como se o período de suspensão não tivesse ocorrido, estipulando ainda um aumento ou alargamento na duração dos mesmos prazos com a duração correspondente ao tempo em que os mesmos estiveram suspensos”.

II.2.1 Passando à apreciação, começaremos por dizer que esta precisa questão foi apreciada no Proc.º 5592/21.8T8MTS.P1, em recurso decidido por acórdão de 20 de Março de 2023 [disponível em www.dgsi.pt], relatado pelo aqui relator e com intervenção deste mesmo colectivo.
Estava aí em causa a interpretação e aplicação do art.º 5.º, da Lei 13-B/2021, de 5 de Abril, com a epígrafe “Prazos de prescrição e caducidade”, que veio estabelecer o seguinte: “Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, os prazos de prescrição e caducidade cuja suspensão cesse por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período correspondente à vigência da suspensão”.
Mas como refere o Tribunal a quo e o próprio recorrente invoca, aquela norma não fez mais do que replicar o art.º 6.º, Lei n.º 16/2020, de 29 de Maio, que com a mesma epígrafe “Prazos de prescrição e caducidade”, já dispunha “Sem prejuízo do disposto no artigo 5.º, os prazos de prescrição e caducidade que deixem de estar suspensos por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão”.
Este colectivo não vê razões para alterar o entendimento aí afirmado, acrescendo notar, como bem se percebe, que por identidade de razões o mesmo é aplicável a ambas aquelas normas.
Por conseguinte, seguindo-se inteiramente a posição aí defendida, passamos a transcrever a fundamentação aí constante, na parte que para a apreciação releva, dela constando o seguinte:
-«[..]
Na perspectiva do recorrente, a interpretação desta norma pressupõe usar o período durante o qual durou a suspensão – 73 dias – por duas vezes e de modos distintos: uma para descontar ao decurso do prazo de prescrição o período durante o qual perdurou a suspensão; outra, para acrescentar ao prazo de prescrição, que no caso é de um ano, o tempo equivalente àquela suspensão, ou seja, outros 73 dias. Dito de outro modo, de acordo com esta interpretação, o prazo de um ano passaria a ser de 365 dias, acrescidos de 73 dias, e ainda se alargaria o mesmo noutros 73 dias, de modo a descontar esse tempo em que este suspenso. [..].
Com o devido respeito, este entendimento não pode ser acolhido. O propósito do legislador não foi alterar os prazos de prescrição [ou caducidade], mas sim salvaguardar os interesses de titulares de direitos sujeitos a prescrição, que por efeito da situação extraordinária vivida durante a pandemia que justificaram adopção de medidas extraordinárias, para além do mais, restringindo a liberdade de circulação e obstando à prática de actos judiciais, ficaram impedidos, por causa não imputável aos próprios, de exercer os seus direitos por via judicial.
Tenha-se presente, que conforme decorre do art.º 323/1, do CC, “A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente”.
O objectivo do legislador foi tão só o de inutilizar para o decurso do prazo de prescrição [e de caducidade] o período em que ocorria aquele impedimento, para o efeito determinando a suspensão desses prazos. Por conseguinte, cessada a suspensão, o prazo retoma o seu decurso, mas “alargados pelo período correspondente à vigência da suspensão”, de modo a assegurar o efeito pretendido com esta medida extraordinária.
Nenhuma razão lógica existe que justificasse decorrer do art.º 5.º, da Lei 13-B/2021, de 5 de Abril, o propósito do legislador proceder a uma alteração dos prazos de prescrição e caducidade, introduzindo-lhes um acréscimo de tempo, ou seja, visando que passassem a ter uma duração diferente da estabelecida na lei, para lhes ser acrescido o período de tempo correspondente ao da suspensão, o que no caso levaria a que o prazo de um ano previsto no art.º 337.º/1 CT 09, fosse aumentado para 1 ano e 73 dias.
Nesse sentido pronunciou-se o acórdão do TRL de 24-03-2021 [proc.º 2072/20.2T8CSC.L1-4, Desembargador Leopoldo Soares, disponível em www.dgsi.pt] invocado pela recorrida, que embora reportando-se à Lei n.º 1-A/2020 , de 19 de Março, começou por afirmar, como consta do respectivo sumário, que “A suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade contemplada nos nºs 3 e 4 do artigo 7º da Lei n.º 1-A/2020 , de 2020-03-19, que ocorreu entre 9 de Março de 2020 e 3 de Junho do mesmo ano , aplica-se ao prazo prescricional contemplado no nº 1 do artigo 337º do Código de Trabalho/2009”, por isso aqui com inteira aplicação, lendo-se na fundamentação o que segue:
Efectivamente , do supra citado regime ( do preceituado nos nºs 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020) , resultava que os prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos não urgentes estavam suspensos.
Porém, com a revogação dessa norma, pela Lei n.º 16/2020, os prazos de prescrição e de caducidade deixaram de estar suspensos, sendo que foram alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão (artigo 6.º da Lei n.º 16/2020).
Assim, cessada a suspensão, os prazos de prescrição e caducidade passaram a dever ser calculados como se a suspensão não tivesse tido lugar, acrescentando-se, pois, uma dilação ao prazo final correspondente ao período de suspensão ocorrido entre 9 de Março de 2020 e 3 de Junho de 2020.
Tanto basta para que, no caso concreto, se deva considerar que à data em que a Ré foi citada nos presentes autos ( 3- A ré foi citada em 11 de Agosto de 2020 ) o prazo prescricional de um ano que terminaria em 9 de Agosto de 2020 , sendo acrescido de uma dilação de 88 dias, não se mostrasse , obviamente , esgotado”.
No mesmo sentido pode ver-se ainda o Acórdão de 09-11-22, também da Relação de Lisboa, [Proc.º 19707/21.2T8LSB.L1-4, Desembargadora Celina Nóbrega, disponível em www,www,dgsi], afirmando-se na fundamentação o seguinte:
O “alargamento” a que alude o artigo 5.º da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de Abril reporta-se ao período de suspensão correspondente, ou seja, aos prazos que hajam sido suspensos por força da Lei n.º 4-B/2021, de 01.02. e que corresponde ao período de 22.01.2021 a 05.4.2021, num total de 74 dias.
Na verdade, o artigo 5.º da Lei n.º13-B/2021, de 5 de Abril (“Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, os prazos de prescrição e caducidade cuja suspensão cesse por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período correspondente à vigência da suspensão) deve ser interpretado no sentido de que os prazos de prescrição e caducidade cuja suspensão cesse por força daquela Lei são alargados pelo período correspondente à respectiva suspensão. No caso, uma vez que a suspensão do prazo de prescrição previsto no artigo 337.º n.º 1 do CT apenas se verificou de 22 de Janeiro a 5 de Abril, de 2021, obviamente que a Recorrente apenas podia beneficiar de 74 dias por serem os correspondentes ao período da sua suspensão».
Concluindo, improcede o recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
[..]».
Em suma, pelas razões acima expressas não reconhecemos que assista fundamento ao recorrente para defender que “Decorre do teor das normas constantes dos artigos 6.º da Lei n.º 16/2020 e do art. 5.º da Lei 13-B/2021, que revogaram a suspensão dos prazos de prescrição que, os prazos de prescrição passavam a contar-se normalmente, e conforme já determinado nas normas que os suspenderam, como se o período de suspensão não tivesse ocorrido, estipulando ainda um aumento ou alargamento na duração dos mesmos prazos com a duração correspondente ao tempo em que os mesmos estiveram suspensos”.
Repetindo o ali afirmado, nenhuma razão lógica existe que justificasse decorrer dos artigos 6.º da Lie n.º 16/2020, de 29 de Maio e do correspondente do art.º 5.º, da Lei 13-B/2021, de 5 de Abril, o propósito do legislador proceder a uma alteração dos prazos de prescrição e caducidade, introduzindo-lhes um acréscimo de tempo, ou seja, visando que passassem a ter uma duração diferente da estabelecida na lei, para lhes ser acrescido o período de tempo correspondente ao da suspensão.
Por conseguinte, improcede o recurso, confirmando a decisão recorrida.

III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida.

Custas a cargo do recorrente, atento o decaimento (art.º 527.ºCPC)


Porto, 12 de Julho de 2023
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
Rita Romeira