Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1370/21.2T8PNF.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOÃO RAMOS LOPES
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
PERDAS SALARIAIS E DANO BIOLÓGICO FUTURO
VALORES DE INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RP202209131370/21.2T8PNF.P1
Data do Acordão: 09/13/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 2. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - No cálculo das indemnizações por danos patrimoniais (perdas salariais e/ou dano biológico futuro) deve ser atendida a remuneração líquida do lesado.
II - Para indemnizar, pelo dano patrimonial futuro, lesado que, com 55 anos à data da consolidação das lesões e que auferia, à data do evento lesivo, vencimento mensal de 2.470,00€, ficou afectado por défice funcional de 13 pontos, compatível com o exercício da actividade profissional, tem-se por equilibrado, ajustado, adequado e conforme aos (aproximado ou ao menos não substancialmente afastado dos) padrões jurisprudenciais (ponderando casos com pontos de contacto e semelhanças com a situação dos autos) o montante de 50.000,00€.
III - Apresenta-se como equilibrado, justo, ponderado e conforme aos padrões jurisprudenciais atendíveis o valor indemnizatório de cinquenta mil euros (50.000,00€) para compensar o dano não patrimonial do lesado que foi sujeito a clausura hospitalar superior a trinta dias logo após o evento lesivo (sofrendo posteriormente internamentos mais curtos), que teve longo período de recuperação até à consolidação das lesões (vinte e um meses), que padeceu quantum doloris de 6/7, que ficou afectado de dano estético de 4/7, tendo as sequelas padecidas uma repercussão nas actividades desportivas e de lazer de 3/7, e ficando a padecer de défice funcional de 13 pontos.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação nº 1370/21.2T8PNF.P1
Relator: João Ramos Lopes
Adjuntos: Rui Moreira
João Diogo Rodrigues


Acordam no Tribunal da Relação do Porto
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RELATÓRIO
Ré/apelante: A..., Companhia de Seguros, SA
Autor/apelado: AA
Juízo central cível de Penafiel (lugar de provimento de Juiz 4) – Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este.
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Realizada a audiência de julgamento na acção interposta por AA contra a ré A..., Companhia de Seguros, SA, destinada ao exercício do direito a indemnização com fundamento na responsabilidade civil emergente de acidente de viação, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a ré a pagar ao autor:
a) a título de danos patrimoniais a quantia global de 25.796,83€ (vinte e cinco mil setecentos e noventa e seis euros e oitenta e três cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa de 4% ao ano, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento,
b) a título de dano pela perda da capacidade de ganho e pelos esforços acrescidos, a quantia global de 100.000,00€ (cem mil euros), acrescida de juros de mora à taxa de 4% ao ano, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento,
c) a título de danos não patrimoniais, a quantia global de 50.000,00€ (cinquenta mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da presente sentença, até efectivo e integral pagamento,
d) no que se vier a liquidar em execução de sentença, relativamente a tratamentos, medicação e cirurgias, devido a agravamento ou novo processo infecioso por força do acidente dos autos.
Não se conformando com os montantes indemnizatórios arbitrados, que considera excessivos, e com a condenação ilíquida proferida, que considera não se justificar em função da matéria provada, apela a ré, terminando as suas alegações formulando as seguintes conclusões:
I. A recorrente desde logo assumiu a responsabilidade pela produção do sinistro em causa nos presentes autos não podendo, no entanto, concordar com os valores indemnizatórios arbitrados pela sentença recorrida, por manifestamente excessivos e injustificados face à realidade dos factos e à prova produzida.
II. Para fixação das indemnizações a título de danos patrimoniais o tribunal a quo ficcionou como sendo o valor mensal auferido pelo Autor a quantia de €2.645,83, em claro desrespeito pela prova constante dos autos.
III. Tendo em conta os elementos disponíveis, que são as declarações de IRS do Autor dos anos de 2017 e 2018 (neste último referente a 9 meses do ano), e atenta a disparidade entre ambas, deveria o tribunal recorrido ter apurado a média mensal dos rendimentos auferidos pelo Autor no período a que se referem as declarações em causa, apurando-se assim como vencimento médio bruto o montante de €2.055,00 x 12 meses (€11.413,42 + €31.750,00/21 meses).
IV. Por outro lado, mal esteve também o tribunal recorrido ao considerar, para efeitos de cálculo das indemnizações a arbitrar, o vencimento bruto do Autor, sendo entendimento dominante nos tribunais superiores que se deverá ter em consideração o rendimento líquido auferido, pois é este o que corresponde ao ganho efectivo dos lesados. A não ser assim ocorrerá necessariamente um enriquecimento injustificado do lesado.
V. No caso específico do Autor, e atenta a realidade familiar do mesmo espelhada nas declarações de IRS juntas aos autos - solteiro, divorciado ou separado judicialmente e sem dependentes a cargo – a carga fiscal a aplicar ao mesmo em sede de IRS será de, pelo menos 40%, pelo que o rendimento líquido daquele seria – tendo em conta o supra defendido quanto ao rendimento bruto – de €1.250,00. Sendo, no entanto, que o mesmo raciocínio será de aplicar caso se venha a considerar qualquer outro – ou até mesmo o considerado pelo tribunal recorrido, o que se admite como era hipótese que não se consente – como sendo o vencimento bruto do recorrido.
VI. Do exposto, e considerando-se como supra, torna-se evidente que, a título de perdas salariais, e tendo a recorrente já tendo liquidado ao Autor a quantia de €29.765,60, conforme consta dos factos provados, nada mais deve ao mesmo, encontrando-se este integralmente ressarcido das perdas reais e efectivas de rendimento que sofreu durante os períodos de incapacidade temporária, o que tudo se requer seja reconhecido, com a consequente absolvição da ré nesta parte do pedido.
VII. Dos mesmos erros padecem o raciocínio e os cálculos efectuados pelo tribunal recorrido quanto à indemnização por danos patrimoniais arbitrada pela incapacidade ou défice funcional permanente de 13 pontos, cujo montante se revela totalmente desproporcionado e, até mesmo, violador dos princípios da equidade e da igualdade quando comparado com outras decisões dos tribunais superiores – veja-se, a título de exemplo, os seguintes acórdãos: Ac. do STJ de 03.02.2022, (proc. nº 24267/15.0T8SNT.L1.S1) (relator Tibério Nunes da Silva); Ac. do STJ de 18.03.2021 (proc. nº 1337/18.8T8PDL.L1.S1 (relator Ferreira Lopes); Ac. do STJ de 21.01.2021 (proc. nº 6705/14.1T8LRS.L1.S1) (relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza); Ac. do STJ de 29.10.2020, (proc. nº 111/17.3T8MAC.G1.S1) (relatora Maria da Graça Trigo), Ac. do STJ de 07.03.2019, (proc. nº 203/14.0T2AVR.P1.S1) (relator Tomé Gomes); Ac. Do STJ de 30.05.2019 (proc. nº 3710/12.6TJVNF.G1.S1) (relator Bernardo Domingos); Ac. do STJ de 29.10.2019 (proc. nº 7614/15.2T8GMR.G1.S1) (relator Henrique Araújo); Ac. do STJ de 10.12.2019 (proc. nº 497/15.4T8ABT.E1.S1) (Relator António Magalhães) e Ac. do STJ de 10.12.2019 (proc. nº 497/15.4T8ABT.E1.S1).
VIII. No presente caso temos um sinistrado com 53 anos de idade à data do acidente, com um défice funcional permanente de 13 pontos, sendo este compatível com o exercício da profissão habitual, pelo que o valor a arbitrar ao mesmo não deverá ser superior a €45.000,00, requerendo-se, nessa medida, seja a decisão recorrida revogada nesta parte, substituindo-se a mesma por uma outra que, a este título, condene a ré em montante não superior a €45.000,00.
IX. Também no que tange aos danos não patrimoniais o tribunal recorrido pecou por excesso, condenando a ré em valor muito superior ao devido atentas as consequências do sinistro para o autor - dano estético de 4/7, quantum doloris de 6/7 e de repercussão nas actividades físicas e de lazer de 3/7 – e tendo uma vez mais por referência decisões de tribunais superiores em situações similares – veja-se os supra referidos acórdãos de 10.02.2022, de 30.05.2019 e de 29.10.2019 e ainda o Ac. Do STJ de 14.12.2017 (proc. nº 589/13.4TBFLG.P1.S1) (relator Fernanda Isabel Pereira); Ac. do STJ de 02.06.2016 (2603/10.6TVLSB.L1.S1) (relator Tomé Gomes) -, pelo que também neste ponto deverá a sentença recorrida ser revogada, substituindo-se a mesma por decisão que, a este título, condene a ré em montante não superior a €30.000,00.
X. A matéria de facto dada como provada nos pontos 21 e 22 da sentença recorrida não permite aferir da previsibilidade de danos futuros para o Autor, muito menos no que ao agravamento da incapacidade de que o mesmo ficou afectado se refere. Quanto a isto nada foi questionado nem referido quer em sede de relatório pericial elaborado pelo INML – pois que nem sequer questionado pelo Autor àquele órgão – quer em qualquer outro meio de prova.
XI. A condenação da ré constante da alínea d) da decisão da sentença recorrida, mostra-se, pois, totalmente injustificada e mesmo abusiva devendo a sentença recorrida ser, nesta parte, revogada e a recorrente absolvida relativamente a qualquer pedido de danos futuros, em especial no que ao agravamento da incapacidade do Autor se refere.
Contra-alegou o autor pela improcedência da apelação e manutenção da sentença apelada.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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Do objecto do recurso
Considerando, conjugadamente, a sentença recorrida (que constitui o ponto de partida do recurso) e as conclusões das alegações (por estas se delimita o objecto dos recursos, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso - artigos 608º, nº 2, 5º, nº 3, 635º, nºs 4 e 5 e 639, nº 1, do CPC), as questões a decidir reconduzem-se:
a- a apreciar dos montantes indemnizatórios fixados para ressarcir o autor pelos danos patrimoniais (quer quanto às perdas salariais, quer quanto ao dano ‘pela perda da capacidade de ganho e pelos esforços acrescidos’) e pelos danos não patrimoniais - a ré insurge-se contra os valores arbitrados por os considerar exagerados (uns e outros) e, ademais, incorrectamente calculados os patrimoniais (calculados por referência a rendimento bruto, não líquido, exclusivamente ponderado em atenção aos meses do ano de 2018 decorridos até ao embate),
b- a apreciar da condenação ilíquida – a ré considera que a mesma se mostra injustificada, por o dano nela pressuposto não se mostrar previsível, ponderando a matéria julgada provada.
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FUNDAMENTAÇÃO
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Fundamentação de facto
Na sentença recorrida consideraram-se provados os seguintes factos:
1. No dia 25 de Setembro de 2018, pelas 15:45 horas, na EN ..., Km ..., ..., Penafiel, ocorreu um embate, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros, de cor ..., da marca Renault, modelo ..., de matrícula ..-UO-.., conduzido por BB e pertença de F..., S.A., e o motociclo, da marca BMW, de matrícula ..-..-LU.
2. O autor, nas circunstâncias de tempo e lugar descritas em 1, estava no sentido Entre-Os-Rios/Penafiel no veículo com a matrícula ..-..-LU e sem nada que o fizesse prever, o veículo com a matrícula ..-UO-.. segurado pela ré, ao mudar de direção para a esquerda embate-lhe, projetando-o para o pavimento.
3. O local do acidente a via é uma recta, composta por duas vias de trânsito, uma em cada sentido, tendo a faixa de rodagem 5,70m, sendo boas as condições de visibilidade em profundidade.
4. No momento do embate o tempo estava bom, o piso era em paralelo, encontrava-se seco e limpo e em regular estado de conservação.
5. O condutor do veículo segurado pela ré invadiu a faixa de rodagem onde se encontrava o autor.
6. O autor nasceu em .../.../1964 e tinha 53 anos de idade à data do acidente.
7. O autor foi embatido no membro inferior esquerdo, com queda do seu veículo, tendo sofrido traumatismo da face com fractura dos ossos próprios do nariz e uma fratura exposta, com esfacelo a nível da perna esquerda.
8. O autor foi socorrido no local do acidente e enviado para o Centro Hospitalar ..., EPE, em Penafiel, onde permaneceu internado até 02/11/2018.
9. Neste hospital foram efetuados os seguintes diagnósticos: fractura exposta dos ossos da perna esquerda, tendo tido necessidade de ser submetido a tratamento cirúrgico, sendo que no pós-operatório foi verificada uma área de sofrimento cutânea, fractura dos ossos próprios do nariz e fractura/avulsão da cabeça do perónio.
10. Durante a hospitalização foi operado em 26/09/2018, com fixação externa (osteotaxia) da tíbia esquerda com fixador tubular; fez antibioticoterapia, profilaxia de trombose venosa profunda (TVP/TEP) com enoxaparina e fez adaptação e treino de marcha.
11. Foi, mais tarde, sujeito a desbridamento cirúrgico em 02/11/2018 pela especialidade de cirurgia plástica no Centro Hospitalar 1..., mantendo acompanhamento de especialidade até data de alta. Entretanto, realizou uma angiografia, verificando-se uma progressão distal do contraste.
12. Teve alta em 02/11/2018, deslocando-se nessa altura em cadeira de rodas e utilizando canadianas para apoio.
13. Posteriormente, em 04/02/2019, foi internado no Centro Hospitalar 1... para retirar o fixador externo, onde esteve hospitalizado até 05/02/2019.
14. Mais tarde, em 24/03/2019, foi novamente internado em Gaia para encavilhamento da tíbia, tendo saído do internamento em 03/04/2019.
15. Foi internado no Hospital ..., desta vez já sob a responsabilidade da Companhia Seguradora, a 14/11/2019 para cirurgia aos ossos próprios do nariz, tendo tido alta em 18/11/2019.
16. Voltou a sofrer novo internamento para encerramento de uma loca na perna (tíbia) esquerda em 07/02/2020, tendo tido alta em 14/02/2020.
17. Durante estes meses o sinistrado desenvolveu infeções com úlceras na área atingida pelo traumatismo que sofreu no acidente e teve de ser submetido a diversos tipos de vigilâncias clínicas por especialidades de ortopedia, cirurgia plástica, ambulatório intensivo de pensos.
18. Realizou, também, tratamentos de fisioterapia e dependeu de duas canadianas.
19. Permaneceu sem trabalhar até finais de agosto de 2020, uma vez que é comercial imobiliário e tem que visitar e frequentar, no dia-a-dia, obras públicas e privadas, andar sobre superfícies irregulares o que não conseguia dadas as dores sentidas e a instabilidade na perna e tornozelo esquerdo.
20. Retomou, progressivamente, atividade profissional, mantendo à data de hoje actividade com esforços acrescidos.
21. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 29/06/2020, apresentando o autor as seguintes sequelas:
a) na face: ligeiro desvio do septo para a esquerda, sem condicionar alteração nas vias respiratórias;
b) no membro inferior direito: na face interna da coxa, cicatriz de região dadora de pele, com 15 cm por 15 cm de maiores dimensões;
c) no membro inferior esquerdo: sobre a espinha ilíaca antero-superior, cicatriz oblíqua, para baixo e para dentro, hiperpigmentada, com 5 cm de comprimento. Na face anterior do joelho, cicatriz linear, vertical, hipopigmentada, com 5 cm de comprimento. Externamente à extremidade distal da cicatriz anteriormente descrita, cicatriz linear, vertical, com vestígios de pontos de sutura, com 1,5 cm de comprimento. Complexo cicatricial na face anterior e interna da perna direita, com 23 cm por 18 cm de maiores dimensões, com múltiplas deformidades, com uma tumefação com 6 cm por 4 cm, com perda de volume, sem exsudados. Perda da pilosidade. Sem amiotrofia da coxa. Mobilidade de joelho completa. Perda de volume da perna em cerca de 1,5 cm. Aumento ligeiro de volume do tornozelo esquerdo. Bastantes queixas dolorosas ao toque da cicatriz na perna esquerda. Tornozelo com dorsiflexão abolida (15º contralateral) e flexão plantar mantida (50º bilateral). Inversão e eversão simétricas.
Apresenta marcha claudicante e existe o risco de desenvolvimento de novo processo infeccioso.
22. O período de défice funcional temporário total é de 78 dias; o período de défice funcional temporário parcial é de 566 dias; o período de repercussão temporária na atividade profissional total é de 644 dias; o quantum doloris é fixado no grau 6/7; o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica é de 13 pontos; as sequelas descritas, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, são compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares; o dano estético permanente é de grau 4/7; a repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer é de grau 3/7.
23. O autor, antes do acidente, era uma pessoa sem qualquer incapacidade física ou estética que lhe dificultasse a sua normal vida pessoal e profissional, era dinâmico e alegre e tornou-se, após o mesmo, uma pessoa triste e introvertida.
24. Deixou de poder fazer os Caminhos de Santiago e de jogar futebol com os filhos, actividades que antes realizava.
25. O autor apresentou no ano de 2018 um rendimento tributável respeitante a prestação de serviços imobiliários, ramo de actividade a que o autor se dedica, no valor total de 31.750,00€ e, em 2017, de 11.413,42€.
26. A título de perdas salariais a ré já atribuiu e adiantou ao autor o valor de 29.765,60€.
27. A última proposta de indemnização formal da ré foi de 30.000,00€.
28. À data do acidente, a responsabilidade civil pelos danos causados a terceiros pelo veículo ligeiro de matrícula ..-UO-.., achava-se transferida para a ré A..., Companhia de Seguros, SA, através da apólice n.º ... (marca ...).
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Fundamentação de direito
A. Do montante indemnizatório fixado para ressarcir o autor pelos danos patrimoniais.
Não vem questionada na presente apelação a verificação dos pressupostos da responsabilidade extracontratual como fonte da obrigação de indemnizar, estando já assente a existência do dever da ré de indemnizar o autor pelos danos ligados ao evento lesivo por adequado nexo causal.
Para lá de impugnar o montante arbitrado para compensar o autor pelo dano não patrimonial e, bem assim, a condenação ilíquida proferida (questões de que mais adrede se cuidará), a recorrente censura os montantes fixados na decisão recorrida para indemnizar o autor pelos danos patrimoniais – quer o relativo ao lucro cessante (as perdas salariais sofridas no período em que o autor se viu impedido de exercer a sua actividade profissional, em consequência das lesões sofridas no embate), quer o respeitante ao dano futuro (dano decorrente do défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de que ficou a padecer, fixado em 13 pontos, que sendo compatível com o exercício da actividade profissional habitual, implica esforços suplementares).
Não questiona a apelante a existência dos referidos danos patrimoniais (e a obrigação de os indemnizar que sobre si impende), apenas os montantes arbitrados, sustentando que foi ponderado o rendimento bruto do autor, ao invés de ter sido ponderado o rendimento líquido (pois é este o que corresponde ao efectivo ganho do lesado retirado do exercício da actividade propiciadora de rendimento), tendo o cálculo do rendimento mensal valorizado, tão só, o rendimento tributável relativo ao ano de 2018 (quando deveriam ter sido ponderados os anos de 2017 e 2108, que reflectem grande disparidade – e sendo certo que os rendimentos declarados quanto ao ano de 2018 se reportam tão só a 9 meses do ano).
Quer o lucro cessante, quer o dano futuro, são determinados (art. 562º do CC) segundo juízos de verosimilhança e probabilidade[1] – os benefícios que o lesado deixou de auferir em consequência da lesão (os lucros cessantes) correspondem aos ganhos que se frustraram ou prejuízos que advieram ao lesado por não ter aumentado, em consequência da lesão, o seu património; os danos futuros tanto se desenvolvem na categoria dos dano emergente como na dos lucros cessantes (caso paradigmático da perda da capacidade aquisitiva ou, também, nas situações em que o lesado se vê obrigado, em consequência das sequelas das lesões sofridas, a despender esforços acrescidos para manter os rendimentos que auferia).
O recurso aos juízos de probabilidade, de verosimilhança, impõem-se na apreciação da questão, pois que o prejuízo a ressarcir se traduz nas vantagens que, segundo o curso normal das coisas ou de harmonia com as circunstâncias especiais do caso, o lesado teria obtido, não fora o facto lesivo (tendo de fixar-se a indemnização em dinheiro, a sua medida, como determina o nº 2 do art. 566º do CC, é traçada pela teoria da diferença, ou seja, pela diferença entre a situação patrimonial em que o lesado se encontra e que teria se não se tivesse verificado o evento causador da lesão).
Estando provado que o autor se viu impossibilitado, em resultado das lesões sofridas no embate, de exercer, durante cerca de 21 meses, a actividade profissional a que se vinha dedicando ao tempo do evento lesivo (facto provado número 22), fácil é concluir que não auferiu, no referido período, os rendimentos que teria com toda a probabilidade e verosimilhança auferido – de acordo com juízos de probabilidade, verosimilhança e normalidade, não fora o embate e consequências dele resultantes (consequências ao nível da sua integridade física), o autor teria continuada a exercer a sua actividade profissional sem qualquer hiato e sem qualquer limitação, auferindo os correspondentes rendimentos (ou seja, deixou o autor de auferir, de acordo com os referidos juízos de probabilidade e verosimilhança, os rendimentos correspondentes ao período de tempo em que se viu impossibilitado de exercer a sua actividade como consequência directa e necessária das lesões sofridas no embate).
Os rendimentos que o autor teria, com suficiente probabilidade auferido não fora a lesão, não poderão deixar de considerar-se como continuação dos que vinha auferindo ao longo desse ano (ou seja, que continuaria a auferir nos meses subsequentes ao evento os rendimentos que vinha auferindo nos meses que o precederam) – nada nos autos permite concluir que se verificaria um decréscimo de tais rendimentos, antes pelo contrário o mecanismo do nexo causal permite considerar como suficientemente provável que os rendimentos que auferiria nos meses que seguiram ao eventos lesivo não sofressem variação relativamente aos meses exactamente anteriores (a probabilidade e verosimilhança andam de mãos dadas com a constância e a estabilidade).
Por isso que se afigura como correcto e conforme aos critérios legalmente estabelecidos para o cálculo da indemnização ponderar o rendimento do ano do embate (e não recorrer à média dos rendimentos encontranda pela consideração dos rendimentos dos anos de 2017 e 2018).
Certo, porém, que o rendimento tributável não corresponde ao rendimento efetivo auferido pelo contribuinte que o declara (na qualificação que interessa aos autos, pelo lesado) - a indemnização a arbitrar corresponde ao montante de rendimento efectivamente perdido pelo lesado (deixado de auferir em consequência da lesão), e tal medida não é dada pelo rendimento tributável, pois que este está sujeito a tributação em IRS. Haverá assim que ponderar (assistindo, nesta particular questão, razão à apelante) o rendimento líquido[2] (pois esse corresponderá ao dano a ressarcir – foi na exacta medida de tal rendimento efectivo que o autor deixou de aumentar o seu património), pelo que sendo-lhe atribuída indemnização que os desconsidere estará a atribuir-se indemnização superior à diminuição patrimonial causada pelo evento lesivo: o rendimento bruto considerado estaria sujeito a IRS, ao contrário da indemnização a arbitrar no âmbito dos presentes autos, que não está sujeita a tributação em IRS (de acordo com o art. 12º, nº 1, b) do CC do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, que estabelece uma delimitação negativa de incidência do imposto, o IRS não incide sobre as indemnizações devidas em consequência de lesão corporal pagas ou atribuídas, nelas se incluindo as pagas ao abrigo de contrato de seguro, decisão judicial ou acordo homologado judicialmente).
Assim, ponderando que no ano de 2018, considerando a Lei do Orçamento de Estado para 2018 (Lei n.º 114/2017, de 29/12), a taxa média de IRS para rendimentos de 25.000,00€ a 36.856,00€ foi de 28,838, encontramos com suficiente grau de segurança um rendimento líquido de IRS auferido pelo autor, em cada um dos nos nove meses em que desenvolveu a sua actividade profissional, de cerca de 2.470,00€ – o rendimento tributável terá de ser sujeito a uma redução de cerca de 30% (em vista de se considerar a tributação de IRS a que estava sujeito), mas terá de ser ponderado que o mesmo foi auferido apenas em nove meses do ano, e assim que o rendimento global anual, depois de deduzido dos 30% relativos à tributação, terá de ser dividido por cada um dos nove meses para assim se encontrar o valor mensal (não por doze – os últimos três meses do ano de 2018 vão ser incluídos na indemnização a arbitrar ao autor a título de perdas salariais).
No período de 21 meses em que esteve impossibilitado de exercer a sua actividade profissional como consequência directa e necessária das lesões sofridas no embate, deixou o autor de auferir o montante global líquido de 51.870,00€ (que com suficiente probabilidade teria auferido), pelo que tendo-lhe sido adiantada pela ré a quantia de 29.796,83€, lhe assiste ainda o direito a haver a quantia de 22.104,40€ a título de perdas salariais (lucro cessante).
Na apreciação do valor indemnizatório do dano futuro (dano que na decisão recorrida se qualifica como ‘dano pela perda da capacidade de ganho e pelos esforços acrescidos’) vale a ponderação que se faz sobre o montante de rendimento mensal do autor a considerar – quer no que respeita ao rendimento efectivamente perdido (ou seja, tem de ser considerado que o rendimento tributável está sujeito a tributação em IRS[3]), quer no que concerne a que se deve atender ao valor do rendimento mensal auferido no ano de evento lesivo (essa a data mais recente a que a tribunal pode atender – art. 566º, nº 2 do CC).
A decisão apelada entendeu fixar em cem mil euros (100.000,00€) a indemnização pelo dano futuro, seguindo como critério auxiliar (em vista de apurar ‘capital equivalente ao rendimento de que o lesado foi privado e de que irá ser até ao final da sua vida’) fórmula encontrada no acórdão do STJ de 8/02/2001, proferido no processo n.º 3940/2000 e relatado pelo Ex.mo Senhor Juiz Conselheiro Dionísio Correia, considerando o limite da vida activa do lesado até aos setenta anos, uma ‘incapacidade de 13 pontos’, o rendimento mensal de 2.645,83€ e uma taxa de juros de 2%.
Quantia que a ré entende ser totalmente desproporcionada e até violadora dos princípios da equidade e da igualdade, quando comparado com outras decisões dos tribunais superiores (veja-se a conclusão 6ª das alegações da apelante), propondo que a indemnização por tal dano seja fixada em valor não superior a 45.000,00€, ponderando a idade do autor à data do embate e as sequelas de que ficou a padecer (um défice funcional de 13 pontos, compatível com o exercício da profissão habitual, exigindo porém esforços suplementares).
Vimos considerando que o défice permanente da integridade física do indivíduo (uma sequela funcional permanente, como repercussão na capacidade de usar o corpo de forma plena) traduz uma lesão do direito à integridade física (art. 25º, nº 1 da CRP), direito que constitui irradiação da tutela geral da personalidade humana (art. 70º do CC).
Ainda que não implique verdadeira diminuição da capacidade aquisitiva, por não contender com o normal exercício da actividade profissional habitual, implicando esforços acrescidos ao lesado (situações em que o lesado fica afectado por défice funcional genérico que não implica qualquer incapacidade parcial permanente para o exercício da actividade profissional), constitui-se como lesão que se perspectiva como dano biológico, como uma ‘diminuição somático-psíquica e funcional do lesado’, com repercussão na sua vida pessoal e profissional, sendo ‘sempre ressarcível, como dano autónomo, independentemente do seu específico e concreto enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial ou não patrimonial’[4].
Repercute-se, objectivamente, na diminuição da condição física e na capacidade de realização de esforços, o que redunda numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo no desenvolvimento das actividades pessoais, em geral, e numa consequente e igualmente previsível maior penosidade, dispêndio e desgaste físico na execução de tarefas antes desempenhadas, em todas as vertentes do quotidiano pessoal.
Logo que se verifique, o dano biológico merece tutela, seja ao nível compensatório, seja ao nível indemnizatório, seja até a ambos. A ‘extrema amplitude que o nosso legislador confere ao conceito de incapacidade para o trabalho, aliada à orientação sedimentada da jurisprudência, de que é de indemnizar, quer esta leve a diminuição de proventos laborais, quer não leve’, contempla-o indemnizatoriamente, enquanto ‘a relevância que a nossa lei confere aos danos não patrimoniais, também aliada à amplitude deste conceito que a jurisprudência vem acolhendo – englobando, nomeadamente os prejuízos estéticos, os sociais, os derivados da não possibilidade de desenvolvimento de actividades agradáveis e outros – já o contempla’ ao nível compensatório[5].
Dano biológico que é de valorizar (para lá do que signifique na diminuição da qualidade de vida do lesado, a ponderar e atender no âmbito do dano não patrimonial) no âmbito do dano patrimonial (sem que isso signifique uma repetição ou duplicação de valorização do mesmo dano) quando ele se repercuta na actividade laboral do lesado, seja directamente, implicando perda efectiva ou previsível de rendimentos, seja quando implique ao lesado maior esforço e dispêndio de energia no desenvolvimento da actividade propiciadora de rendimento (e assim, em última análise, uma maior esforço para não sofrer diminuição de rendimentos) – tal dano deve ser indemnizado na vertente patrimonial independentemente da prova do lesado sofrer ou vir a sofrer diminuição dos seus proventos futuros (isto é, diminuição da sua capacidade de ganho) se for de concluir que tal incapacidade funcional ou fisiológica, repercutindo-se nuclearmente na diminuição da condição física, resistência e capacidade de esforços por parte do lesado, irá implicar, previsivelmente, maior penosidade, dispêndio e desgaste físico na execução de tarefas e assim, se for de considerar que essa incapacidade exige do lesado um esforço suplementar físico e psíquico para obter o mesmo resultado da sua actividade[6].
Estando em causa dano que se consubstancia numa limitação ou défice funcional (apesar de não imediatamente reflectida em perdas salariais ou na privação duma específica capacidade profissional), ‘perspectivado na óptica de uma capitis deminutio na vertente profissional’[7], o fundamento da sua ressarcibilidade assentará (nos casos em que tal défice se repercute na exigência de maior esforço para o desempenho de actividades e tarefas) - para lá do que aporte como restrição ‘às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança ou reconversão de emprego pelo lesado, enquanto fonte actual de possíveis e eventuais acréscimos patrimoniais, frustrada irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar’ -, na acrescida penosidade e esforço no exercício da actividade diária e corrente, de modo o compensar e ultrapassar as deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas[8].
Nestas situações em que é previsível que o rendimento auferido com o exercício de actividade laboral não sofra diminuição em razão da limitação funcional resultante do evento que está na génese da obrigação de indemnizar (casos em que não se apresenta como verosímil a perda efectiva de rendimentos laborais), valoriza-se a circunstância de tal não diminuição de rendimentos ter como correspectivo um acréscimo de esforço corporal e/ou intelectual[9], na exacta medida do grau de incapacidade/limitação funcional, não compensado com qualquer acréscimo de retribuição, sendo por isso adequado atender e valorizar pecuniariamente tal maior esforço ou dispêndio de energia.
Tem, pois, o dano biológico, na vertente patrimonial, uma vasta e alargada abrangência – desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da actividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras actividades ou tarefas de cariz económico, passando ainda pelos custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas actividades ou tarefas[10].
Na situação dos autos resulta provado que o autor ficou a padecer, pelas sequelas resultantes das lesões sofridas no evento, de um défice permanente da integridade físico-psíquica de treze (13) pontos (compatível com o exercício da actividade habitual, mas a exigir esforços suplementares) – ou seja, num grau já atendível na escala médica de valorização da afectação definitiva da integridade física e/ou psíquica da pessoa, com relevante repercussão nas suas actividades diárias, incluindo aquelas com repercussão económica (desde a actividade profissional até às simples tarefas domésticas) e, assim, diminuindo em tal grau a sua capacidade económica geral.
Não sendo previsível ou verosímil (o dano futuro é apreciado segundo juízos de normalidade, previsibilidade e verosimilhança – art. 564º, nº 2 do CC) que tal limitação funcional acarrete, directamente, qualquer perda futura de rendimentos, tem de reconhecer-se que acarreta uma limitação da capacidade do autor desenvolver actividades com relevo na vertente económica ou patrimonial na sua vida, designadamente no exercício da sua actividade profissional habitual – ou, doutro modo, que tal défice representa uma ‘diminuição da sua capacidade económica geral com relevo em sede do chamado dano biológico patrimonial, susceptível, portanto, de indemnização reparatória’[11].
Trata-se de dano enquadrável na categoria de dano patrimonial futuro, cujo montante indemnizatório deve apurar-se (por não ser possível averiguar do seu exacto valor) com recurso à equidade (art. 566º, nº 3 do CC), segundo juízos de verosimilhança e probabilidade.
A equidade (tratada como fonte de direito sem que necessariamente o seja) é, como resulta do art. 566º, nº 3 do CC, uma ‘via que serve de recurso para permitir alcançar uma definição concreta do conteúdo de um direito subjectivo, nomeadamente um crédito indemnizatório, quando o valor exacto dos danos não foi apurado’[12].
Diferentemente do que acontece relativamente ao apuramento do valor monetário para compensar o dano não patrimonial (em que a equidade funciona como único recurso), relativamente ao julgamento do dano patrimonial, designadamente do dano patrimonial futuro, a ‘equidade funciona como último recurso, para permitir alcançar uma definição concreta do conteúdo de um direito subjectivo, designadamente do direito a uma indemnização, quando o valor exacto dos danos não foi apurado’[13].
Equidade não significa arbitrariedade, convocando a ponderação do curso normal das coisas, a particular situação do caso concreto e o próprio dano a reparar – a particular situação do lesado, que dedicando-se à prestação de serviços imobiliários, ramo de actividade, próximo de completar 55 anos de idade (ponderando a data da consolidação das lesões, vinte e um meses depois do acidente) ficou a padecer de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de treze pontos.
O apelo a critérios de equidade tem em vista encontrar no caso concreto a solução mais justa – a equidade é uma forma de justiça: por seu intermédio não se criam regras jurídicas nem se encontra a solução através da mediação ou intervenção de regra elaborada pelo julgador, que tão só recorre ao exame das características do caso concreto[14]; a equidade é a ‘justiça do caso concreto, flexível, humana, independente de critérios normativos fixados na lei, devendo o julgador ter em conta as regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida’[15].
A equidade é uma forma de justiça concreta, que intenta superar a própria ideia de justiça já cristalizada pela norma legal, pois que o ‘equitativo, sendo embora o justo, não o é em conformidade com a lei, mas antes como aperfeiçoamento do justo legal’[16].
A decisão de acordo com a equidade é norteada pela particular situação do caso concreto.
O que está em causa, no apuramento da indemnização que se vem tratando, não é repor qualquer situação de efectiva ou previsível perda patrimonial, mas antes ressarcir o autor pelo défice funcional de que padece – um défice atendível, com repercussão nas suas actividades diárias, incluindo aquelas com repercussão económica (v. g., as tarefas exercidas no âmbito profissional).
A jurisprudência do STJ tem vindo a considerar que a indemnização pelo dano futuro, onde se compreende a incapacidade funcional, ainda que não impeça o lesado de trabalhar e que dela não resulte perda de rendimento, deve ser arbitrada equitativamente, de modo a corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado não irá auferir (ou cujo ganho tenha como correspectivo o esforço suplementar implicado pelo défice funcional resultante, com nexo de causalidade adequado, das lesões sofridas no evento lesivo), que se extinga no fim da sua vida provável e que seja susceptível de garantir, durante essa vida, o rendimento frustrado ou o rendimento auferido com aquele acrescido esforço[17] – deve considerar-se o termo provável da vida do lesado, determinado com base na esperança média de vida (e não apenas em função da duração da vida profissional activa do lesado, até este atingir a idade normal da reforma), pois ‘que as necessidades básicas do lesado não cessam obviamente no dia em que deixar de trabalhar por virtude da reforma, sendo manifesto que será nesse período temporal da sua vida que as suas limitações e situações de dependência, ligadas às sequelas permanentes das lesões sofridas, com toda a probabilidade mais se acentuarão’[18].
O apuramento do capital produtor do rendimento que se venha a extinguir no final do período considerado e que proporcione ao lesado prestações periódicas correspondentes à sua perda efectiva de rendimento ou ao esforço acrescido na execução das actividades profissionais (e outras, com relevância económica) não directamente compensado no rendimento auferido só pode ser conseguido através da equidade, ainda que para tanto se recorra, como elemento meramente auxiliar e orientador, a fórmulas ou critérios financeiros (mais ou menos simples), que permitem tornar a indemnização o mais possível justa, actualizada e condizente com o caso concreto a valorizar. O recurso a tais elementos auxiliares permite evitar o subjectivismo que, em última análise, poderia afectar a segurança do direito e o princípio da igualdade: através de tal método a procura do quantum respondeatur inicia-se com ‘recurso a processos objectivos, através de fórmulas matemáticas, cálculos financeiros, aplicação de tabelas, com vista a calcular o referido capital produtor de um rendimento vitalício para o lesado’ (designadamente a descrita no acórdão do STJ de 4/12/2007, no processo nº 07A3836)[19], submetendo depois tal valor estático ‘alcançado através da automática aplicação de tal tabela «objectiva» – e que apenas permitirá alcançar um «minus» indemnizatório’ – ao tempero da ‘equidade – que naturalmente desempenha um papel corrector e de adequação do montante indemnizatório às circunstâncias específicas e à justiça do caso concreto, permitindo ainda a ponderação de variantes dinâmicas que escapam, em absoluto, ao referido cálculo objectivo’, sejam a evolução provável na situação profissional do lesado, o aumento previsível da produtividade e do rendimento disponível e melhoria expectável das condições de vida, a inflação provável ao longo do período temporal a que se reporta o cômputo da indemnização (e que, ao menos em parte, poderão ser mitigadas ou compensadas pelo «benefício da antecipação», decorrente do imediato recebimento e disponibilidade de valores pecuniários que normalmente apenas seriam recebidos faseadamente ao longo de muitos anos, com a consequente possibilidade de rentabilização imediata em termos financeiros)[20], e bem assim a especificidade do concreto dano a indemnizar.
De forma concisa – as ‘tabelas funcionam apenas como orientação para o cálculo da indemnização, não sendo, em caso algum, susceptíveis de dispensar ou substituir o juízo de equidade que cabe ao julgador nesta hipótese’[21], pois que da aplicação das tabelas só poderá resultar quer ‘uma justiça abstracta, insensível à circunstância de o caso concreto ter especificidades juridicamente relevantes’, quer uma ‘justiça estática, insensível à circunstância de, entre as especificidades juridicamente relevantes do caso concreto, estarem variantes dinâmicas’[22].
Método que temos por adequado a casos como o dos autos – neste juízo equitativo de último recurso, servirão os dados colhidos da aplicação dos referidos cálculos financeiros (fórmulas e/ou tabelas matemáticas) como ponto de partida referencial (uma referência primeira) do valor indemnizatório do dano decorrente do défice funcional, nessa primeira abordagem apreciado como se se tratasse, exclusiva e verdadeiramente, dum défice com directo reflexo na perda de rendimento; depois, sempre numa aproximação à ideia de justiça da situação concreta e, assim, do aperfeiçoamento do justo legal, a temperança do juízo equitativo, a valorização das características e especificidades do caso concreto e o recurso aos padrões jurisprudenciais (decisões preferidas em situações ‘similares, apesar da dificuldade que se reveste uma tal operação, dadas as particularidades de cada caso: ponderação conjugada da idade, grau de défice funcional de que o lesado fica a padecer, função que vinha desempenhando e reflexos na continuação dessa actividade, bem como, nalguns casos, tendo em conta as qualificações e competências do lesado, as limitações, advindas das sequelas, em encontrar alternativas profissionais’[23]).
De acordo com o critério orientador da tabela financeira do referido acórdão da Relação de Coimbra de 4/04/1995, considerando que à data da consolidação das lesões (não a data do evento lesivo – entre a data do evento lesivo e a data da consolidação das sequelas decorreram 21 meses, durante os quais o autor se viu impossibilitado de exercer a actividade profissional, sendo indemnizado a título de perda de rendimentos por tal lucro cessante) o autor se aproximava dos 55 anos, ponderando uma taxa de juro de 3% (o juízo de ponderação não pode ser perturbado pela crise económico-financeira que atravessamos – e atenderemos a tal taxa de juro, pois que o critério utilizado é meramente orientador e a indemnização a atribuir parte de um juízo de verosimilhança e previsibilidade a longo prazo, sendo certo que valorizando o espaço temporal a considerar, essa taxa, face ao passado, se apresenta como adequada[24]), o valor de 2% para a inflação (os peculiares, críticos e extraordinários tempos de guerra que atravessamos determinam um enorme e conjuntural aumento da inflação, mas as entidades públicas, designadamente no seio da União Europeia, têm anunciado e manifestado o propósito de tomar medidas e adoptar políticas que limitem a inflação ao máximo de 2%, já no futuro próximo, num par de anos), não valorizando qualquer facto para progressão na carreira (pois que o autor desempenha actividade de prestação de serviços, e por isso por conta própria), o valor de retribuição líquida anual auferida (o rendimento mensal reportado ao tempo do evento, no valor de 2.470,00€, auferido doze meses por ano – na actividade de prestação de serviços não há que ponderar os subsídios de férias ou de Natal), o défice funcional permanente da integridade física de que ficou a padecer (treze pontos), e projectando o cálculo até aos setenta anos (independentemente da esperança de vida, em Portugal, para indivíduos do sexo masculino ser, relativamente a pessoas nascidas no ano de 1964 ser superior, aqui si ponderarão os setenta anos final para efeitos de operar a fórmula matemática utilizada – assim comparando o resultado com o obtido na decisão apelada, que efectuou os seus cálculos até se completarem os setenta anos do autor), encontra-se montante pouco superior a cinquenta e três mil euros (53.000,00€)[25].
Esta primeira aproximação na busca do valor indemnizatório permite-nos concluir que a quantia a tal propósito encontrada na decisão apelada é manifestamente excessiva e desproporcionada, ponderando as particulares circunstâncias do caso.
Joeirando o valor que encontramos como ponto de partida referencial, libertando-o dos espartilhos presentes nos enquadramentos inflexíveis e rígidos das fórmulas matemáticas, aproximando-o à ideia de justiça concreta através do juízo equitativo, importa conformá-lo com os padrões jurisprudenciais na valorização de tal dano e ponderá-lo em função da concreta situação a valorizar – não está em causa repor qualquer situação de efectiva ou previsível perda patrimonial, mas antes ressarcir lesado que, com 55 anos ao tempo da consolidação das lesões sofridas no evento lesivo, ficou a padecer de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 13 pontos que o afecta no âmbito das suas actividades, mormente naquelas com repercussão económica (que a experiência da vida permite concluir que terá tendência para agravar com o decurso do tempo – presunção que no caso concreto é tanto mais de afirmar quanto resulta provado o risco de deflagração de novo processo infecioso, o que tem ínsito o agravamento da sequela), não devendo desconsiderar-se os seguintes aspectos: o primeiro é o de que a fórmula matemática acima usada (que mostrou um primeiro ponto de referência ao juízo equitativo) é própria para o cálculo do dano decorrente duma incapacidade profissional, não duma incapacidade para todos os actos e gestos correntes do dia-a-dia como é o défice funcional resultante da aplicação da Tabela Indicativa para a Avaliação do Dano em Direito Civil (aprovada, juntamente com a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais pelo DL 352/2007, de 23/10); depois (aspectos que apontam, na sua valorização, em sentidos opostos), importa ponderar, por um lado, que o cálculo foi projectado até aos setenta anos (sendo certo que a esperança de vida, em Portugal, para indivíduos do sexo masculino nascidos em 1964 é já superior) e, por outro (o que não pode deixar de ser tido em conta num juízo que tem por fundamento o curso normal das coisas – que se funda, assim, na segurança da continuidade e da constância, rejeitando fenómenos conjunturais que perturbam juízos de prognose futuros), que teve como factor de referência o rendimento mensal auferido no ano do embate (nos nove meses de 2018, prévios ao embate), substancialmente mais elevado (bem superior ao dobro) do que auferira no ano exactamente anterior.
Temos, assim – ponderando todo este circunstancialismo do caso concreto –, que o montante de 50.000,00€ se mostra como equilibrado, ajustado, adequado e proporcionado a indemnizar o dano em causa e conforme aos (aproximado ou ao menos não substancialmente afastado dos) critérios ou padrões jurisprudenciais para casos com pontos de contacto e semelhanças com a situação dos autos, de que são exemplo os acórdãos do STJ de 7/03/2019[26] (teve-se como razoável atribuir indemnização de 40.000,00€ relativa ao dano biológico de lesada que, com 35 anos à data do evento lesivo, empregada de mesa, auferindo o vencimento mensal base de 475,00€, ficou a padecer de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 19 pontos, compatível com o exercício da actividade profissional ainda que nele se repercutindo, implicando esforços suplementares), de 29/10/2019[27] (teve-se por ajustado o montante de 36.000,00€ para indemnizar o dano futuro de lesado a quem, com 34 anos e auferindo o rendimento mensal de 600,00€, 14 vezes por ano, foi atribuído défice funcional de 16 pontos, sem rebate profissional mas com subsequente sobrecarga de esforço no desempenho regular da sua actividade profissional), de 29/10/2020[28] (foi considerado justo e equitativo o valor de 32.000,00€ para indemnizar lesada que, com 62 anos, professora, que auferia o vencimento mensal base de 2.137,00€, ficou afectada de défice funcional de 9,71 pontos, compatível com o exercício da actividade habitual, implicando todavia esforços acrescidos), de 18/03/2021[29] (atribuída indemnização no valor de 45.000,00€ para ressarcir lesada com 50 anos, médica que auferira o rendimento líquido global de 58.266,33€ no ano anterior ao do evento lesivo, que ficou afectada de incapacidade de 13 pontos, compatível com o exercício da actividade profissional exigindo, todavia, esforços acrescidos) e de 3/02/2022[30] (fixada indemnização no valor de 35.000,00€ a lesado com 51 anos à data da consolidação médico-legal das lesões, professor, com vencimento mensal base de 1.053,43€, que ficou portador de défice funcional de 10 pontos, compatível como exercício da actividade profissional, exigindo esforços suplementares).
Assiste, pois, parcial razão à apelante, impondo-se reduzir os valores indemnizatórios fixados para ressarcir o autor pelos danos patrimoniais sofridos aos montantes, respectivamente, de 22.104,40€ (indemnização a título de perdas salariais) e de 50.000,00€ (dano biológico).
B. Do montante arbitrado para compensar o autor pelo dano não patrimonial.
Insurge-se a apelante contra a sentença recorrida discordando do montante fixado para compensar o autor pelos danos não patrimoniais, que reputa como excessivo e desconforme aos padrões jurisprudenciais – a decisão apelada entendeu equitativa a quantia de 50.000,00€, sustentando a apelante não poder a mesma ser fixada em valor superior a 30.000,00€.
A indemnização por danos não patrimoniais, justificada nas situações em que a sua gravidade mereça a tutela do direito (art. 496º, nº 1 do CC), não visa propriamente ressarcir ou tornar indemne o lesado, mas oferecer-lhe uma compensação que contrabalance o mal sofrido ou até uma satisfação (tal dano, porque relativo a bens que não integram o património do lesado, apenas pode ser compensado com a obrigação pecuniária imposta ao lesante, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização)[31].
Na responsabilidade civil por factos ilícitos, como é o caso dos autos, a indemnização por danos não patrimoniais reveste uma natureza mista: se por um lado visa compensar o lesado (função essencialmente reparatória), não lhe é alheio o propósito (acessório) de reprovar, sancionar ou castigar o lesante pela conduta causadora do dano[32].
O montante da reparação pecuniária dos danos não patrimoniais é fixado equitativamente em atenção ao grau de culpa do lesante, sua situação económica e demais circunstâncias relevantes (arts. 496º, nº 3 e 494º do CC).
A equidade (que neste âmbito funciona como único recurso) convoca as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida, sendo este um dos domínios onde mais necessário se torna o bom senso, o equilíbrio e a noção das proporções com que o julgador deve decidir[33] - exige-se juízo que, ponderando os critérios jurisprudenciais, atenda o curso normal das coisas, a particular situação do caso concreto e o próprio dano a reparar.
O critério legal a atender para a fixação do montante indemnizatório do dano não patrimonial é o da sua gravidade, nos termos do art. 496º, nº 1 do CC e deve ser adequado e suficiente para compensar o lesado pelo dano sofrido e para conter em si a afirmação da validade do bem tutelado (para lá de proporcionado à reprovação ou castigo pela conduta causadora do dano).
O ponto de referência – a unidade de medida ou unidade de conversão do valor imaterial lesado a dinheiro – para a justa medida do montante compensatório é encontrado nos padrões jurisprudenciais atinentes à indemnização destes danos.
Constata-se presentemente a tendência para alargar o círculo de danos ressarcíveis, conformando o ordenamento à compreensão abrangente do ser humano – o ‘homo faber ou homo economicus da época industrial dá lugar ao homo ludicus ou homo aestheticus da época do lazer, da cultura e da informação’, e a pessoa humana corporeamente encarnada ‘dá-se a conhecer em todas as suas concretas dimensões (v. g., trabalhador, pai de família, amigo, ser lúdico e relacional) e interioriza e vivencia como todas elas são decisivas no seu estado de equilíbrio físico-psíquico, em que a saúde se consubstancia’, erigindo-se um conceito de dano que questiona e repudia a concepção puramente economicista do ser humano, reconhecendo antes uma intrínseca dignidade e uma ‘essencialidade ontológica da pessoa que está muito para além (antes, durante e depois) do chamado homo faber, radicando em sólidos princípios civilizacionais que os ordenamentos normativos foram erigindo à categoria de direitos fundamentais de personalidade’[34].
Componentes relevantes do dano não patrimonial, ao lado do dano biológico – aqui visto na sua vertente de alteração morfológica, enquanto privação da capacidade de utilizar o corpo da forma como antes do evento lesivo o lesado fazia, a perda da fruição dos prazeres da vida e mesmo a diminuição da expectativa da duração da vida –, surgem[35] o dano estético – o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima –, o ‘pretium doloris’ – as dores físicas e psíquicas (desgostos, inibições, frustração, revolta, etc.) –, o prejuízo de afirmação pessoal e social – dano indiferenciado que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes (familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica) –, o prejuízo da saúde geral e da longevidade – o dano da dor e o défice de bem estar, e que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem estar da vítima e o corte na expectativa de vida –, o ‘pretium juventutis’ ou prejuízo da distracção ou passatempo – que põe em evidencia a especificidade da frustração do viver a vida na plenitude das funções do corpo e espírito – e a perda de qualidade de vida.
No caso concreto, emergem as seguintes circunstâncias:
- o autor, que ao tempo do embate tinha 53 anos de idade e era pessoa dinâmica e alegre, sem qualquer incapacidade física ou estética que lhe dificultasse a sua normal vida pessoal e profissional, foi embatido (sem que para o evento haja contribuído) no membro inferior esquerdo quando tripulava o seu motociclo, caindo e sofrendo traumatismo da face com fractura dos ossos próprios do nariz, uma fratura exposta, com esfacelo, a nível da perna esquerda e ainda fractura/avulsão da cabeça do perónio,
- sofreu internamento hospitalar desde 25/09/2018 (data do embate) até 2/11/2018 no Centro Hospitalar ..., em Penafiel,
- houve necessidade de tratamento cirúrgico da fractura exposta dos ossos da perna esquerda, verificando-se no pós-operatório uma área de sofrimento cutânea, sendo ainda operado para fixação externa (osteotaxia) da tíbia esquerda com fixador tubular, fazendo pertinente medicação (antibióticos e profiláticos para trombose venosa profunda, fazendo adaptação e treino de marcha,
- na data da saída do internamento hospitalar (2/11/2028), foi sujeito a desbridamento cirúrgico pela especialidade de cirurgia plástica no Centro Hospitalar 1... (mantendo acompanhamento de especialidade) e teve alta nesse dia, deslocando-se nessa altura em cadeira de rodas e utilizando canadianas para apoio,
- em 4/02/2019, foi internado (até 5/02/2019) no Centro Hospitalar 1... para retirar o fixador externo e, em 24/03/2019, foi novamente internado nesse Centro Hospitalar para encavilhamento da tíbia (saindo do internamento em 03/04/2019),
- entre 14/11/2018 e 18/11/2018 foi internado no Hospital ... para cirurgia aos ossos próprios do nariz,
- voltou a ser novamente internado para encerramento de uma loca na perna (tíbia) esquerda em 07/02/2020, tendo alta em 14/02/2020,
- durante esse período temporal desenvolveu infeções com úlceras na área atingida pelo traumatismo que sofreu no acidente e teve de ser submetido a diversos tipos de vigilâncias clínicas pelas especialidades de ortopedia e cirurgia plástica e a ambulatório intensivo de pensos, realizando, também, tratamentos de fisioterapia, tendo dependido de duas canadianas,
- não conseguia andar sobre superfícies irregulares, dadas as dores sentidas e a instabilidade na perna e tornozelo esquerdo,
- a consolidação médico-legal das lesões ocorreu em 29/06/2020, apresentando o autor as seguintes sequelas: i) na face: ligeiro desvio do septo para a esquerda, sem condicionar alteração nas vias respiratórias; ii) no membro inferior direito: na face interna da coxa, cicatriz de região dadora de pele, com 15 cm por 15 cm de maiores dimensões; iii) no membro inferior esquerdo: a) sobre a espinha ilíaca antero-superior, cicatriz oblíqua, para baixo e para dentro, hiperpigmentada, com 5 cm de comprimento, b) na face anterior do joelho, cicatriz linear, vertical, hipopigmentada, com 5 cm de comprimento, c) externamente à extremidade distal da cicatriz anteriormente descrita, cicatriz linear, vertical, com vestígios de pontos de sutura, com 1,5 cm de comprimento, d) complexo cicatricial na face anterior e interna da perna direita, com 23 cm por 18 cm de maiores dimensões, com múltiplas deformidades, com uma tumefação com 6 cm por 4 cm, com perda de volume, sem exsudados, e) perda da pilosidade, f) perda de volume da perna em cerca de 1,5 cm, g) aumento ligeiro de volume do tornozelo esquerdo, h) bastantes queixas dolorosas ao toque da cicatriz na perna esquerda, i) apresentando marcha claudicante com risco de desenvolvimento de novo processo infecioso,
- teve um período de défice funcional temporário total é de 78 dias, um período de défice funcional temporário parcial é de 566 dias e um período de repercussão temporária na atividade profissional total é de 644 dias,
- o quantum doloris foi fixado no grau 6/7, o dano estético permanente no grau 4/7 e a repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer no grau 3/7,
- o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica é de 13 pontos (sendo as sequelas, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, compatíveis com o exercício da actividade habitual, implicando esforços suplementares), e
- após o acidente o autor passou a ser pessoa triste e introvertida e deixou de poder fazer os Caminhos de Santiago e de jogar futebol com os filhos (actividades que realizava).
A matéria de facto espelha a considerável gravidade dos danos sofridos – além dos períodos de encarceramento hospitalar (que se foram repetindo), releva o quantum doloris, quantificado no sexto grau duma escala ascendente com sete graus de gravidade, merecendo também sublinhado e realce o dano estético permanente (quantificado no quarto grau de escala crescente de sete graus) e a repercussão permanente sentida pelo autor nas actividades desportivas de lazer (quantificada no terceiro grau de escala crescente de sete graus), para lá da perda da qualidade de vida, considerando as sequelas definitivas de que ficou a padecer e reveladas no défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 13 pontos que o afecta (que impedem o pleno fruir da vida e até implicam, em termos de previsibilidade, uma diminuição da esperança de vida).
A decisão recorrida entendeu justa e adequada, como referimos, para compensar tais danos, a quantia de cinquenta mil euros (50.000,00€), que se não nos afigura merecedora de censura por aproximada e conforme à sensibilidade que se extrai dos padrões jurisprudenciais a atender, ponderando as seguintes decisões do STJ:
- de 19/04/2018[36], que fixou em 45.000,00€ o dano não patrimonial de lesada que, com 45 anos de idade, se viu sujeita a duas intervenções cirúrgicas, a longo período de clausura hospitalar, que ficou a padecer de extensas sequelas anátomo-funcionais, traduzidas em défice funcional permanente de 26 pontos, correspondente a uma IPP de 42,2495%, sofreu um dano estético de grau 4, numa escala de 1 a 7, padeceu de quantum doloris de grau 5 numa escala de 1 a 7, além do desgosto de se ver fisicamente limitada e sem perspectivas futuras em termos laborais,
- de 12/06/2018[37], que manteve em 60.000,00€ o montante da indemnização por danos não patrimoniais (julgando improcedente a revista da seguradora, que pretendia a sua redução para 40.000,00€, entendendo que o valor encontrado na decisão recorrida se não afastava significativamente dos padrões jurisprudenciais seguidos em casos equiparáveis) de lesado que, com 45 anos à data do evento lesivo, sofreu quatum doloris fixável no grau 6/7, ficou (como sequela) com um dano estético fixável no grau 3/7, uma repercussão permanente nas atividade desportivas e de lazer fixável em 3/7, uma repercussão permanente na atividade sexual fixável no grau 3/7, necessitando no futuro de ajudas medicamentosas, ajudas técnicas e tratamentos médicos regulares, e ficando afectado de funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 39 pontos,
- de 10/12/2019[38], que não viu razão para divergir do montante de 60.000,00€ arbitrado para compensar lesada com 21 anos ao tempo do evento que ficou afectada por défice funcional permanente de 19 pontos (que não impossibilitando a lesada de exercer a actividade profissional de enfermeira, para que cursava, comporta limitações para actos que exijam maior esforço físico e que impede o desempenho de actividades anteste exercidas), que sofreu período de internamento hospitalar de 35 dias (dez deles em coma induzido), que apresenta lesões/cicatrizes no crânio, na face, no tórax e nos membros inferiores, que sofreu quantum doloris de grau 6/7, que padece de dano estético permanente de 5/7 e que necessita de ajuda de terceiros para actividades da vida diária que impliquem esforços maiores (e que viu esfumada a possibilidade de fazer trabalhos de modelo fotográfico, que realizava antes do evento),
- de 10/02/2022[39], que teve como equilibrada (não vendo razões para dela divergir, negando a revista à responsável pela indemnização) a quantia de 60.000,00€ para compensar lesado com 21 anos que (tendo sofrido traumatismo e fracturas ao nível craniano, da face, mandibular, orbital, do ombro, úmero, clavícula, antebraço esquerdo e estrutura pélvica e que foi submetido a duas operações cirúrgicas do foro ortopédico e maxilo-facial) esteve internado durante o mês seguinte ao evento (tendo registado outros internamentos), vindo a ser sujeito a mais três operações (à mandíbula, ao nariz e à coluna vertebral, clavícula e antebraço), que ficou afectado de défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 14 pontos, sendo fixado o quantum doloris de 7/7, o grau 5 de 7 na afectação da imagem do lesado em relação a si e aos outros e o grau 5 de 7 para a repercussão nas actividades desportivas e de lazer, e
- de 11/05/2022[40] que entendeu ser de fixar em 60.000,00€ (concedendo total procedência à pretensão do autor recorrente a esse propósito) a indemnização por danos não patrimoniais a lesado com 17 anos ao tempo do embate, ponderando o dano estético (4/7), o quantum doloris (6/7), o período de incapacidade (período de défice funcional temporário parcial fixável de 1987, período de repercussão temporária na atividade profissional total fixável em 80 dias e um período de repercussão temporária na atividade profissional total fixável em 1954 dias), a dimensão dos danos crâneo-encefálicos, na face, vertebral e de membros, a repercussão permanente em atividades de lazer e desportivas avaliada em 4/7 e o funcional permanente da integridade físico-psíquica/dano biológico de 18 pontos.
Ponderando, assim, o tempo de clausura hospitalar (superior aos trinta dias, logo após o embate, tendo sofrido posteriormente outros internamentos mais curtos), o longo período de recuperação até à consolidação das lesões (vinte e um meses), o quantum doloris (6/7), o dano estético (4/7), a repercussão nas actividades desportivas e de lazer (3/7), o défice funcional de 13 pontos, tudo a repercutir-se na perda de qualidade de vida do autor (que ao tempo do embate estava a nove dias de completar 54 anos), tem de concluir-se apresentar-se se como equilibrado, justo, ponderado e conforme aos padrões jurisprudenciais atendíveis o montante de 50.000,00€ encontrado na decisão apelada para indemnizar o autor pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do evento lesivo, improcedendo, neste segmento, a pretensão recursória da ré apelante.
C. Da condenação ilíquida.
A decisão apelada condenou a ré a pagar a autor a quantia que ulteriormente se liquidar relativamente a tratamentos, medicação e cirurgias devidos a agravamento ou a novo processo infeccioso decorrente das lesões resultantes do evento dos autos, ponderando para tanto ter resultado provado (facto 21º) que o autor, no membro inferior esquerdo, ‘apesar de todas as intervenções realizadas, apresenta, ainda, tumefacção, havendo o risco de desenvolvimento de novo processo infeccioso’, o que, a ocorrer, "originará, necessariamente, intervenção médica/medicamentosa que deve ser assegurada pela ré, uma vez que a sua ocorrência continua a atribuir-se ao acidente dos autos e às implicações que o mesmo originou."
Contra o assim decidido se insurge a apelante, argumentando que a matéria de facto provada (factos 21º e 22º) não permite aferir da previsibilidade do dano futuro, ‘muito menos ‘no que ao agravamento da incapacidade’ de que o autor ficou afectado, resultando assim como injustificada e abusiva a condenação da ré relativamente a ‘qualquer pedido de danos futuros, em especial no que ao agravamento da incapacidade do Autor se refere’ (conclusões Xª e XIª das alegações da apelante).
De linear clareza a improcedência da argumentação da apelante.
A condenação ilíquida, à luz do art. 609º, nº 2 do CPC e art. 564º, nº 2 do CC, não se refere, no caso dos autos, ao agravamento da incapacidade do autor, antes e apenas ao agravamento ou a novo processo infeccioso decorrente das lesões resultantes do evento dos autos.
Dano futuro cuja previsibilidade, considerando a parte final do facto provado 21 (conjugado com o facto 17), se apresenta manifesta – a suficiente probabilidade de tal dano futuro, dentro do mecanismo do nexo causal[41], é patente, pois que o desenvolvimento de novo processo infeccioso (cujo risco de verificação é julgado provado no facto 21) é expectável ponderando as circunstâncias especiais do caso, sendo prognosticável como normal (possível – como ocorrência futura a ter em atenção) em razão do autor, no seu processo de cura, ter desenvolvido infecções com úlceras na área atingida pelo traumatismo que sofreu no acidente, necessitando de ser submetido a diversos tipos de vigilâncias clínicas por especialidades de ortopedia, cirurgia plástica e ambulatório intensivo de pensos (facto 17º).
Nenhuma censura merece, pois, a decisão apelada neste segmento, improcedendo a apelação (nesta parte).
D. Síntese conclusiva.
Conclui-se de tudo o exposto pela parcial procedência do recurso (parcial procedência na parte relativa à indemnização pelo dano patrimonial e improcedência nos demais segmentos), podendo sintetizar-se a argumentação decisória (nº 7 do art. 663º do CPC) nas seguintes proposições:
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DECISÃO
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Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, mantendo-a quanto a tudo o demais, em alterar a decisão recorrida nos segmentos em que condenou a ré a pagar ao autor quantias a título de danos patrimoniais (por perdas salarias e pelo ‘dano pela perda da capacidade de ganho e pelos esforços acrescidos’), condenando a ré a pagar a autor (quantias em ambos os casos acrescidas de juros de mora à taxa de 4% ao ano, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, como decidido na sentença apelada, nessa parte não impugnada):
- a quantia de 22.104,40€ (vinte e dois mil cento e quatro euros e quarenta cêntimos) a título de perdas salariais, e
- a quantia de cinquenta mil euros (50.000,00€) a título de dano patrimonial futuro.

Custas da apelação e da acção na proporção do decaimento.
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Porto, 13/09/2022
João Ramos Lopes
Rui Moreira
João Diogo Rodrigues

(por opção exclusiva do relator, o presente texto não obedece às regras do novo acordo ortográfico, salvo quanto às transcrições/citações, que mantêm a ortografia de origem)
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[1] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 3ª edição revista e actualizada (com a colaboração de Henrique Mesquita), p. 549 e Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª Edição, revista e actualizada (7ª reimpressão da edição de 2000), p. 911.
[2] Cfr., a propósito, p. ex., por mais recente, o acórdão do STJ 21/01/2019 (Maria dos Prazeres Pizarro Beleza), no sítio www.dgsi.pt.
[3] Cfr., além do citado acórdão de 21/01/2019 (Maria dos Prazeres Pizarro Beleza) – que expressamente refere ‘para o cálculo de indemnizações por danos patrimoniais, passados ou futuros, nos quais o montante das remunerações auferidas à data da lesão assume naturalmente um relevo determinante, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu por diversas vezes que deve ser considerada a remuneração líquida do lesado e não a ilíquida’, citando jurisprudência comprovativa da asserção –, o acórdão do STJ de 27/05/2021 (Rijo Ferreira), também no sítio www.dgsi.pt
[4] Acórdãos do STJ de 16/12/2010 e de 6/12/2011 (Lopes do Rego), no sítio www.dgsi.pt.
[5] Acórdão do STJ de 26/01/2012 (João Bernardo), no sítio www.dgsi.pt.
[6] Acórdãos do STJ de 17/01/2008 (Pereira da Silva) e de 19/05/2009 (Fonseca Ramos). Vasta a jurisprudência do STJ a este propósito – assim, p. ex., circunscrevendo-nos à mais recente (e sem preocupações exaustivas), os acórdãos do STJ de 7/03/2019 (Tomé Gomes), de 28/03/2019 (Tomé Gomes), de 11/04/2019 (Bernardo Domingos), de 10/12/2020 (Ferreira Lopes), de 11/11/2021 (Abrantes Geraldes) e de 3/02/2022 (Tibério Nunes da Silva), todos no sítio www.dgsi.pt.
[7] Acórdão do STJ de 10/11/2016 (Lopes do Rego), no sítio www.dgsi.pt.
[8] Citados acórdãos do STJ de 16/12/2010 e de 6/12/2011.
[9] Esforços acrescidos relativamente àqueles que o normal desempenho das actividades já acarretaria, independentemente daquela limitação.
[10] Acórdão do STJ de 28/03/2019 (Tomé Gomes), no sítio www.dgsi.pt.
[11] Citado acórdão do STJ de 28/03/2019.
[12] Acórdão do STJ de 19/04/2018 (Rosa Ribeiro Coelho), no sítio www.dgsi.pt.
[13] Acórdão do STJ de 14/03/2019 (Nuno Pinto de Oliveira), no sítio www.dgsi.pt.
[14] Oliveira Ascensão, O Direito Introdução e Teoria Geral, 2ª edição, p. 219, apud acórdão do STJ de 14/03/2019 (Nuno Pinto de Oliveira).
[15] Acórdão do STJ de 10/02/98, na Colectânea de Jurisprudência, 1998, Tomo I, p. 65.
[16] Castanheira Neves, Questão de Facto - Questão de Direito, 1967, p. 317, citando Aristóteles.
[17] Acórdão do STJ de 28/03/2021 (Tomé Gomes).
[18] Acórdão do STJ de 10/11/2016 (Lopes do Rego), no sítio www.dgsi.pt. Cfr., ainda, nos mesmos termos, o citado acórdão do STJ de 7/03/2019 (Tomé Gomes).
[19] Tabela que constitui simplificação das fórmulas matemáticas utilizadas pelo acórdão do STJ de 5/05/1994, publicado na Colectânea de Jurisprudência do STJ, Ano II, Tomo II, pp. 86 e ss, ou pelo acórdão da Relação de Coimbra de 4/04/1995, publicado na Colectânea de Jurisprudência, 1995, Tomo II, p. 26 (esta, uma evolução daquela, introduzindo os factores da inflação e da progressão na carreira).
[20] Citado acórdão do STJ de 10/11/2016 (Lopes do Rego).
[21] Acórdão do STJ de 8/01/2019 (Catarina Serra), no sítio www.dgsi.pt.
[22] Acórdão do STJ de 21/03/2019 (Nuno Pinto Oliveira), louvando-se (quanto às expressões utilizadas) nos acórdãos do STJ de 10/11/2016 (Lopes do Rego), acima citado e de 25/05/2017 (Lopes do Rego), todos no sítio www.dgsi.pt.
[23] Citado acórdão do STJ de 3/02/2022 (Tibério Nunes da Silva).
[24] Essa também a taxa usada no citado acórdão do STJ de 27/05/2021 (Rijo Ferreira).
[25] Mais exactamente (desprezando nos cálculos todos os algarismos que, para lá da dúzia, compõem os números a operar) o valor de 53.505,82€ – dispensamo-nos de reproduzir quer a fórmula utilizada quer as operações matemáticas por ela implicadas (fórmula que poderá ser consultada no acórdão da Relação de Coimbra acima referido, devendo fazer-se as necessárias adaptações resultantes de considerarmos taxa de juros e taxa de inflação em pontos percentuais diversos e de desconsiderarmos, no caso concreto, qualquer facto para valorizar ganhos de produtividade e promoção profissional), pois, mais uma vez o dizemos, o critério é meramente orientador do juízo de equidade que, nos termos da lei, deve presidir à decisão.
[26] Proferido no processo nº 203/14.0T0AVR.P1.S1 (Tomé Gomes), no sítio www.dgsi.pt.
[27] Proferido no processo nº 7614/15.2T8GMR.G1.S1 (Henrique Araújo), no sítio www.dgsi.pt.
[28] Proferido no processo nº 111/17.3T8MAC.G1.S1 (Maria da Graça Trigo), no sítio www.dgsi.pt.
[29] Proferido no processo nº 1337/18.8T8PDL.L1.S1 (Ferreira Lopes), no sítio www.dgsi.pt.
[30] Proferido no processo nº 24267/15.0T8SNT.L1.S1 (Tibério Nunes da Silva), já acima citado.
[31] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral (…), p. 601.
[32] Cfr., p. ex., acentuando este carácter repressivo e sancionatório, A. Varela, Das Obrigações em Geral (…), p. 608 e Meneses Cordeiro, Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedades Comerciais, Lex, 1997, p. 481, que dá nota do carácter punitivo da indemnização (o seu papel retributivo e carácter preventivo).
[33] A. Varela, Das Obrigações em Geral (…), p. 605, nota 4.
[34] João António Álvaro Dias, Dano Corporal, Quadro Epistemológico e aspectos resarcitórios, Almedida, 2001, pp. 13 e 14 e 100.
[35] Acórdãos do STJ de 5/07/2007 (Nuno Cameira), de 18/06/2009 (Raúl Borges), de 14/09/2010 (Sousa Leite) e de 18/10/2018 (Hélder Almeida), todos no sítio www.dgsi.pt.
[36] Acórdão proferido no processo nº 196/11.6TCGMR.G2.S1 (António Piçarra), no sítio www.dgsi.pt.
[37] Acórdão proferido no processo nº 1842/15.8T8STR.E1.S1 (Rosa Tching), no sítio www.dgsi.pt.
[38] Acórdão proferido no processo nº 32714.1TBMTR.G1.S1 (Maria do Rosário Morgado), no sítio www.dgsi.pt.
[39] Acórdão proferido no processo nº 12213/15.6T8LSB.L1.S1 (Vieira e Cunha), no sítio www.dgsi.pt.
[40] Acórdão proferido no processo nº 33/14.0T8MCN.P1.S1 (Maria Clara Sottomayor), no sítio www.dgsi.pt.
[41] Dario Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, 3ª Edição, revista e actualizada, p. 394.