Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
6450/15.0T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: DOMINGOS MORAIS
Descritores: DISSOLUÇÃO
EMPRESA MUNICIPAL
CONTRATO DE TRABALHO
CEDÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO
PROCEDIMENTO CONCURSAL
Nº do Documento: RP201609126450/15.0T8VNG.P1
Data do Acordão: 09/12/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º 244, FLS.320-339)
Área Temática: .
Sumário: I – A dissolução de uma empresa local, ao abrigo da Lei n.º 50/2012, de 31.08, não importa a transmissão ope legis, por cessão dos contratos de trabalho com aquela celebrados.
II – A cessão para os municípios de trabalhadores vinculados por contrato de trabalho por tempo indeterminado, que não se encontrem ao abrigo de instrumentos de mobilidade, pressupõe não só que se tenha integrado, no universo de actividades do município, o sector de actividade onde o trabalhador prestava funções, mas também que fosse necessária a sua cedência para o cumprimento dessa específica actividade.
III – Os trabalhadores abrangidos em tais condições podem sujeitar-se ao procedimento concursal, a que alude o art. 62.º, n.º 8, da Lei.
IV – Cabe ao trabalhador o ónus de alegação e prova dos pressupostos mencionados em II.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 6450/15.0T8VNG.P1
Origem: Comarca do Porto V. N. Gaia - Inst. Central - 5ª Sec.Trabalho – J1
Relator - Domingos Morais – 602
Adjuntos - Paula Leal Carvalho
António José Ramos

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

IRelatório
1. B… intentou acção comum emergente de contrato individual de trabalho, na Comarca do Porto V. N. Gaia - Inst. Central - 5ª Sec.Trabalho – J1, contra C…, E.M., e Município D…, nos autos identificados, alegando, em resumo, que:
- A 1ª Ré, é uma entidade pública empresarial, local (DL. 133/2003), que tem como objecto principal, a promoção do desenvolvimento local mediante a exploração de actividades de interesse geral;
- A 2ª Ré uma autarquia local, de natureza territorial, pessoa colectiva de direito público, com atribuições legais que compreendem a administração do domínio público municipal;
- No dia 01 de Julho de 2008, o Autor e a 1ª Ré celebraram um contrato de trabalho a termo certo, por escrito, pelo período de 12 (dozes) meses;
- Este contrato teve início no dia 01 de Julho de 2008 e o seu termo no dia 01 de Julho de 2009;
- O Autor foi contratado pela 1ª Ré com a categoria de Técnico Superior de Nível 1, para exercer funções na área da sua especialidade e formação académica, e nomeadamente desempenhar funções ao nível de organização do departamento de tesouraria e da sua gestão;
- Como contrapartida do trabalho prestado pelo Autor, este recebia a retribuição mensal ilíquida de € 1.083,77 até final do contrato;
- Findo o termo do prazo contratual (ocorrido em 01 de Julho de 2009), ocorreram duas renovações automáticas do contrato, em virtude de não ter sido denunciado pela entidade patronal;
- Acontece, ainda, que, ocorreu uma terceira renovação ao contrato inicial, através de documento escrito celebrado pelas partes em 13 de Julho de 2011, por um período de 12 meses;
- Esta terceira renovação produziu efeitos a partir de 01 de Juno de 2011, tendo vindo cessar em 30 de Junho de 2012;
- Findo o prazo desta última terceira renovação (em 30 de Junho de 2012), no dia 04 de Setembro de 2012, o Autor recebeu a informação, pela Coordenação de Recursos Humanos da 1ª Ré, assinada por E…, informando-o que, em Reunião do Conselho de Administração no dia 06 de Julho de 2012, tinha sido aprovada a sua integração nos quadros pessoais da 1ª Ré;
- Entretanto, no dia 06 de Fevereiro de 2013, foi deliberado na Assembleia Municipal D1…, a dissolução da 1ª Ré;
- Esta deliberação de dissolução da 1ª Ré teve em vista aplicar a lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto de 2012, relativo ao Regime Jurídico da Actividade Empresarial Local e das Participações Locais, tendo tido por objecto a aprovação de dissolução da 1ª Ré, (nos termos da alínea l) do n.º2 do art.º 53.º da lei n.º 169/99, de 18 de Setembro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 5.º-A/2002, de 11de Janeiro e da Lei n.º 50/2012 de 31 de Agosto de 201;
- No que concerne aos trabalhadores da Ré, (e apenas relativamente aos trabalhadores que preenchessem os requisitos legais previstos no n.º11 do artigo 62.º da Lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto) e considerando a integração das actividades da empresa no universo municipal, o Conselho de Administração veio propor:
a) A Celebração de Acordos de Cedência de Interesse Público com os trabalhadores no limite até 31 de Julho de 2013;
b) A Abertura de procedimentos concursais pelo Município D… até 31 de Julho de 2013, com vista a constituição de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado com os trabalhadores;
- Sucede que, encontrando-se a 1ª Ré na fase final de liquidação subsequente à dissolução, o Presidente do Conselho de Administração da 1ª R. , F…, comunicou ao A., por carta datada de 17 de Novembro de 2014, a cessação do contrato de trabalho, com efeitos a partir de 31 de Dezembro de 2014;
- Cessação esta ilícita, por violação do artigo 62.º n.ºs 6 e 10, da Lei 50/2012, de 31 de Agosto.
Termina, pedindo:
Nestes termos e nos melhores de direito deve a presente acção ser julgada procedente e ser declarada nula a cessação do contrato de trabalho operada pela comunicação e decisão de 17.11.2014 e o Autor ser reintegrado ao cargo das suas funções.
Subsidiariamente ser o Autor integrado como trabalhador na Camara Municipal D….”.
2. – Por despachos de 02.09.2015 e 21.09.2015, o autor foi notificado para esclarecer determinados aspectos da sua petição inicial.
3. - Tais esclarecimentos foram prestados por requerimentos de 16.09.2015 e de 30.09.2015.
4. – Por despacho de 05.10.2015 foi indeferida liminarmente a petição inicial contra a 1.ª ré, nos seguintes termos:
Da certidão de registo comercial ora junta a fls. 73 a 78 retira-se que a 1ª Ré, C…, E.M., viu registada a sua dissolução em 28/02/2013 (fls. 76) e viu registado o encerramento da sua liquidação em 30/06/2015 (fls. 77).
Ora, por via do disposto no art. 160º, nº 2, do Cód. Sociedades Comerciais, aquela entidade colectiva “considera-se extinta (…) pelo registo do encerramento da liquidação”. O que vale por dizer que deixou de ter personalidade jurídica desde 30/06/2015, deixando então de ter também e por inerência personalidade judiciária, ou seja, susceptibilidade de ser parte em juízo – cfr. art. 11º do Cód. Proc. Civil.
Mais: tal ausência de personalidade judiciária já se verificava aquando da propositura da presente ação, intentada em 8/07/2015 (vd. fls. 18), pelo que nem sequer pode in casu operar a prossecução da instância ressalvada no art. 162º do C.S.C..
No caso, verifica-se pois e de modo insanável a falta de um pressuposto processual básico, o da personalidade judiciária da entidade demandada, sendo esta uma exceção dilatória de conhecimento oficioso, nos termos e com os efeitos dos arts. 576º, nº 2, 577º, al. c), e 578º do C.P.C.
Em conformidade e atenta a fase liminar do processo em que nos encontramos, decide-se, ao abrigo do art. 54º, nº 1, do Cód. Proc. Trabalho, conjugado com o art. 590º, nº 1, do C.P.C., indeferir liminarmente a petição apresentada pelo Autor B… quanto à 1ª Ré por ele demandada, “C…, E.M.”.
Custas, nessa parte, pelo A..
Notifique e, após trânsito, conclua para os efeitos do nº 2 do citad art. 54º do C.P.C. em relação ao 2º Réu, Município D….”.
5. - Tal despacho transitou em julgado, por não impugnado, em tempo oportuno.
6. - Frustrada a conciliação na audiência de partes (com a presença, apenas, do autor e do 2.º réu), o Município D… contestou, excepcionando erro na forma de processo, a caducidade do direito de acção, a impossibilidade/inconstitucionalidade do pedido, e impugnando os factos essenciais da causa de pedir, alegando, em resumo, a caducidade do contrato de trabalho do autor, por força da dissolução da 1.ª ré, deliberada em 13.02.2013, pela Assembleia Municipal D1….
Termina pela improcedência da acção e consequente absolvição do pedido.
7. - O autor respondeu, concluindo pela procedência da acção com a declaração de nulidade da cessação do contrato de trabalho comunicada em 17.11.2014 e consequente integração como trabalhador na Câmara Municipal D….
8. - O Mmo Juiz, proferindo saneador/sentença, fixou o valor à causa e decidiu:
Pelo exposto, decide-se julgar improcedente a presente acção que o Autor B… intentou contra o Réu Município D…, absolvendo-se este do pedido formulado por aquele.”.
9. - O autor, inconformado, apresentou recurso de apelação, concluindo:
I. O regime de responsabilidade previsto no artigo 501.° do CSC configura uma derrogação ao principio geral de que cada sociedade responde única e exclusivamente pelas suas próprias dividas (Cfr. artigos 397.° e 601.° do Código Civil).
II. De acordo com a jurisprudência e a doutrina, o regime do artigo 501.° do CSC prevê uma responsabilidade ipso jure, automática, objetiva, direta, ilimitada e solidária.
III. Questão diversa é a de saber se a responsabilidade prevista no artigo 501.º do CSC se mantém, mesmo após o termo do contrato de subordinação ou da relação de domínio total.
IV. A jurisprudência e a doutrina maioritária têm-se pronunciado em sentido afirmativo.
V. Assim, independentemente da dissolução/liquidação da C…, E.M, a responsabilidade da Câmara Municipal D… não se extingue.
VI. O Recorrente não foi chamado a celebrar qualquer acordo de cedência de interesse com o Município;
VII. Nunca lhe foi facultada a possibilidade de concorrer a procedimentos concursais do Município D… destinados a trabalhadores como ele.
VIII. A justificação que foi dada ao Autor, no dia 06 de Fevereiro de 2013, era de que este não cumpria o requisito da admissão como trabalhador por tempo indeterminado há pelo menos um ano sobre a data de dissolução da C…, E.M.
IX. Não resta dúvidas, que o requisito da admissão como trabalhador por tempo indeterminado há pelo menos um ano sobre a data de dissolução da C… está preenchido, dada a sua antiguidade na empresa (contada desde 1 de Julho de 2008).
X. O que significa, que há uma violação clara às normas mencionadas e que, tanto a C…, como o Município incorreram em violação das citadas normas para com o Recorrente.
XI. O prazo de cedência, dada a conjugação do n.º 13 do art. 58.° da LVCR e do art. 62.°, resulta que a cedência tem a duração de um ano sendo que o respetivo acordo deve ser celebrado no prazo máximo de seis meses a contar da data da deliberação ele dissolução da empresa local.
XII. Claro está que foi violado esse prazo.
XIII. Ora, a sentença apesar de dar como provado a ilicitude da conduta de ambos os Réus, não retirou nenhuma consequência jurídica de tal conduta ilícita nem lhes aplicou nenhuma sanção.
XIV. Sendo certo que a relação jurídica laboral existente inicialmente entre o Autor e 13 Ré passou por força da lei e a título impositivo (ope legis) a incluir, também, na posição contratual de empregador o Réu Município.
XV. Consequentemente nunca poderia a sentença prostrar esta responsabilidade e conduta do Município devendo, pelo contrárío:
XVI. Ou condenar o Município a integrar o Autor nos seus quadros;
XVII. Ou atribuir uma indemnização pelo despedimento ilícito.
XVIII. A sentença recorrida constitui uma decisão surpresa.
XIX. Porque tendo o Autor direito a alternativa ao pedido de integração peticionar a indemnização atribuída pelo artigo 391.° do Código Trabalho, alternativa esta que pode ser usada até ao encerramento da 1 a instância, tendo o Autor ficado prejudicado pela decisão recorrida,
XX. Singelamente o Réu poderia ter optado pela indemnização, a sentença foi proferida quando já estava marcada a audiência de discussão e julgamento.
XXI. Se o Meritíssimo Juiz entendia não necessitar de produção de prova já na produção da sentença então deveria ter ouvido previamente o Autor sobre a possibilidade, desde já, optar pela indemnização em alternativa à integração (que a sentença entende ser impossível)
XXII. Assim, foi, pois violado o art 3.°, n.º 3 do Código Processo Civil.
Termos em que o douto suprimento de V.ª Ex.ª deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida e procedendo a acção.
10. – O 2.º réu contra-alegou, concluindo:
1. Considerando que o objecto do recurso é balizado pelas conclusões apresentadas pelo Recorrente facilmente se apreende que nenhuma nulidade ou irregularidade é assacada à decisão sob censura.
2. A questão da responsabilidade prevista no artigo 501.º do Código das Sociedade Comerciais é Questão Nova, nunca antes invocada, pelo que é legalmente inadmissível a sua apreciação nesta fase processual.
3. Seja como for, na situação dos autos não ocorre qualquer contrato de subordinação, previsto e regulado pelo artigo 493° e seguintes do C.S.C. entre o Município aqui Recorrido e a C…, nem resulta dos factos assentes, nem sequer as partes o invocaram.
4. A C… era uma entidade empresarial municipal, com autonomia patrimonial e jurídica que se regia pelo regime jurídico da actividade empresarial local e das participações locais, previsto na Lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto.
5. Por isso, nunca seria de aplicar o artigo 501.º do C.S.C. à responsabilidade do Município que está limitada ao montante que receber da partilha resultante da extinção da C…, nos termos do disposto no artigo 163° n.º 1 do C.S.C.
6. O Recorrente não era titular de um direito legal de candidatura, uma vez que apenas os trabalhadores cedidos que à data da dissolução da empresa detivessem, na empresa dissolvida, pelo menos um ano de contrato de trabalho por tempo indeterminado poderiam candidatar-se aos concursos a que se refere o n.º 8 do artigo 62° da Lei n.º 50/2012.
7. Por isso, o Recorrente não preenchia os requisitos cumulativos previstos no n.º 11 do artigo 62° da Lei n.º 50/2012, de 31.08, pois, teria necessariamente que ter sido admitido em contexto de contrato de trabalho sem prazo e, consequentemente, integrado no quadro da C… pelo menos um ano antes da data da deliberação de dissolução daquela empresa municipal, o que não se verificou.
8. Não se verifica qualquer violação do artigo 62° da Lei n.º 50/2012, o que existe é uma confusão de conceitos por parte do Recorrente, pois, uma coisa é a antiguidade do trabalhador na empresa e a partir de que momento essa contagem é relevante para efeitos do Código do Trabalho, outra bem distinta é a data de admissão do trabalhador em regime de contrato de trabalho por tempo indeterminado para efeitos do n.º 11 do citado artigo 62°.
9. Quanto à questão da cedência de interesse público prevista no artigo 58.º da Lei n.º 12-A-2008 importa dizer que a mesma sempre pressuponha a existência de um acordo escrito tripartido entre entidade cedente, o próprio trabalhador e a entidade que receberia o trabalhador cedido, e esse acordo não existe na situação sub judice.
10. A cedência de interesse público não ocorre por imposição ou exigência de uma parte contra a vontade da outra, além de que não existia, nem existe, qualquer obrigação legal ou contratual do Município celebrar com o Recorrente acordo de cedência de interesse público.
11. Também nunca seriam de aplicar à situação dos autos os artigos 58° e 62° do Regime de Vinculação, de Carreiras e de Remunerações em Funções Públicas, porquanto sempre estavam revogados à data da cessação do contrato de trabalho do Recorrente, por força da entrada em vigor da Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho.
12. Quanto à pretensão do Recorrente ser integrado nos quadros do Município, aqui Recorrido, tal pretensão é manifestamente ilegal, diremos mesmo que se trata de um pedido impossível.
13. Como decidiu a sentença recorrida, o Município, aqui Recorrido "nunca poderia ser compelido a abrir concurso de admissão sem necessidades de serviço ou que garantissem a selecção do A. entre outros possíveis candidatos., além disso, impô-lo redundaria, não só numa ilegalidade por violação das citadas normas, como numa inconstitucionalidade por violação da regra consagrada no artigo 42.º n.º 2 da CRP.
14. Quanto ao pedido de atribuição de uma indemnização, trata-se de um Novo Pedido, sendo certo que a sentença recorrida não podia condenar o aqui Recorrido no pagamento de uma indemnização ao Recorrente porque nenhum pedido pecuniário foi formulado nesse sentido.
15. Além de que, qualquer decisão condenatória no sentido agora defendido pelo Recorrente seria NULA, porquanto a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 609.º conjugado com a al. c) do n.º 1 do artigo 615.º, ambos do Código de Processo Civil.
16. Por outro lado, inexiste qualquer fundamento legal para tanto, dado que, a indemnização em substituição de integração a pedido do trabalhador prevista no artigo 3910 do Código do Trabalho, apenas teria lugar no caso de ilicitude no despedimento e, só nesse caso - o que não se verificou na situação na situação sub judice.
17. Quanto à invocada decisão surpresa e violação do contraditório, tal não se verifica, uma vez que o Recorrente pronunciou-se sobre todas as questões pertinentes e relevantes para a boa decisão da causa, exerceu em pleno o contraditório, em articulado autónomo, respondendo às excepções aduzidas na contestação.
18. Nem a decisão sob censura padece de qualquer efeito surpresa, muito menos retirou ao Recorrente a possibilidade de optar por um pedido de indemnização em alternativa ao pedido de integração, previsto no artigo 391.º do Código do Trabalho, porque, para tanto, era preciso que o despedimento do Recorrente fosse declarado ilícito e como decidiu a sentença recorrida nenhuma ilicitude ocorreu.
19. Independentemente de qualquer outra possibilidade de pronúncia por parte do Recorrente antes da sentença, o sentido da decisão nunca seria diferente do que foi proferido pelo tribunal 'a quo".
20. Em suma, a decisão recorrida apreciou e decidiu de forma justa e perfeita quer a matéria de facto, quer as questões de direito que se lhe colocaram.
21. Ao decidir como decidiu o Tribunal 'a quo" fez a correcta interpretação e aplicação do direito nada havendo a censurar, pelo que deverá improceder o presente recurso.
Nestes termos e nos demais que V. Exas. tão doutamente suprirão, deverá o recurso ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se a decisão recorrida, assim se fazendo a sempre tão desejada JUSTIÇA!”.
12. - O M. Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
13. - Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. - Fundamentação
1. - Os factos
1.1. - Na 1.ª instância foi proferida a seguinte decisão de facto:
“1. A C…, E.M. - inicialmente demandada como 1ª R., mas relativamente á qual foi liminarmente indeferida a petição - era uma entidade pública empresarial, local (DL. 133/2003), que tinha como objecto principal, a promoção do desenvolvimento local mediante a exploração de actividades de interesse geral.
2. O inicialmente 2º e ora único (após o sobredito indeferimento liminar da petição quanto à 1ª R.) Réu, o Município D…, é uma autarquia local, de natureza territorial, pessoa colectiva de direito público, com atribuições legais que compreendem a administração do domínio público municipal.
3. No dia 01 de Julho de 2008, o Autor e a C…, EM, celebraram um contrato de trabalho a termo certo, por escrito, pelo período de 12 (dozes) meses, conforme documentos junto s fls. 20 e 21, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
4. Este contrato teve início no dia 01 de Julho de 2008 e o seu termo no dia 01 de Julho de 2009.
5. O Autor foi contratado pela C… com a categoria de Técnico Superior de Nível 1, para exercer funções na área da sua especialidade e formação académica, e nomeadamente desempenhar funções ao nível de organização do departamento de tesouraria e da sua gestão.
6. O local da prestação de trabalho do Autor foi na sede da 1ª Ré, sita na Rua …, n.º .., …, Vila Nova de Gaia.
7. O período normal de trabalho do Autor era de 35 horas semanais, intercaladas pelo período legalmente estabelecido para as refeições.
8. Como contrapartida do trabalho prestado pelo Autor, este recebia a retribuição mensal ilíquida de € 1.083,77 (mil e oitenta e três euros e setenta e sete cêntimos) até final do contrato, passível de descontos legais, líquida ao dia 25 (vinte e cinco) de cada mês.
9. O Autor teve direito por parte da Ré ao subsídio de refeição, no valor de € 4,11/dia, (quatro euros e onze cêntimos), nos dias em que prestasse, pelo menos, seis horas de serviço efectivo.
10. O Autor auferia, em virtude desse contrato, do subsídio de férias no valor correspondente aos dias de férias a que tivesse direito, auferindo igualmente o subsídio de Natal correspondente a tantos duodécimos quantos os meses de serviço até ao fim do ano.
11. Findo o termo do prazo contratual (ocorrido em 01 de Julho de 2009), ocorreram duas renovações automáticas do contrato, em virtude de não ter sido denunciado pela entidade patronal (conforme previsto na cl. 1ª, nº 3, do contrato).
12. Assim, ocorreram duas renovações automáticas do contrato (em 1/07/2009 e em 1/07/2010).
13. Acontece, ainda, que, ocorreu uma terceira renovação ao contrato inicial (que havia sido celebrado em 01-07-2008) através de documento escrito celebrado pelas partes em 13 de Junho de 2011, por um período de 12 meses, conforme documento junto a fls. 22 e cujo teor aqui se dá por reproduzido.
14. Esta terceira renovação produziu efeitos a partir de 01 de Julho de 2011, tendo vindo cessar em 30 de Junho de 2012.
15. Ou seja, o contrato celebrado em 01 de Julho de 2008 foi alvo de sucessivas renovações que produziram efeitos até ao dia 30 de Junho de 2012 (vd. cl. 1ª da renovação escrita).
16. A C… justificou a 3ª renovação do contrato por forma a satisfazer uma necessidade temporária da 1ª Ré, resultante da necessidade de possuir recursos humanos que asseguravam a organização, o controlo e a gestão da prestação de serviços de manutenção nos diversos equipamentos municipais sob a gestão da Ré (vd. cl. 2ª da renovação escrita).
17. Findo o prazo desta terceira renovação (ocorrida em 30 de Junho de 2012), o A. recebeu, no dia 04 de Setembro de 2012, a informação, pela Coordenação de Recursos Humanos daquela entidade, assinada por E…, informando-o que, em Reunião do Conselho de Administração no dia 06 de Julho de 2012, tinha sido aprovada a sua integração nos quadros pessoais da 1ª Ré, conforme consta do documento junto a fls. 23 e cujo teor aqui se dá por reproduzido.
18. Tendo assim ocorrido um transformação do contrato de trabalho de termo certo em contrato de trabalho sem termo, ou seja, efetivo.
19. Entretanto, no dia 06 de Fevereiro de 2013, foi deliberado na Câmara Municipal D… (órgão executivo do Município), a dissolução da dita C…, EM., conforme consta da ata de reunião da Câmara junta a fls. 27 e cujo teor aqui se dá por reproduzido; tendo tal deliberação da Câmara sido aprovada por maioria pela Assembleia Municipal (órgão deliberativo) em 13/02/2013, conforme consta do edital junto a fls. 84 e 85, cujo teor também se dá por reproduzido.
20. Esta decisão de dissolução da C…, EM, teve em vista, conforme consta das deliberações da Câmara e Assembleia Municipais, aplicar a Lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto de 2012, relativo ao Regime Jurídico da Actividade Empresarial Local e das Participações Locais.
21. O plano de dissolução/liquidação da actividade da 1ª Ré – aceite pela Câmara e Assembleia Municipais nas deliberações anteriormente referidas - tinha os objectivos descritos na cópia junta a fls. 30 a 36, de que se destacam os seguintes:
a) O cumprimento do artigo 62.º da Lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto de 2012, que estabelecia o regime aplicável à dissolução obrigatória das empresas locais;
b) O cumprimento por parte do disposto nas alíneas a), b) e d) do n.º 1 do mencionado artigo, pelo que seria obrigatoriamente objecto de deliberação de dissolução pela Assembleia Municipal até 28 de Fevereiro de 2013, sendo as suas actividades integradas no universo municipal;
c) A execução do procedimento administrativo de dissolução da empresa que devia realizar-se imediatamente após a deliberação da Assembleia Municipal que o determina e, conforme se prescreve no n.º 3 do artigo 62.º, obedecer ao regime jurídico dos procedimentos administrativos de dissolução e de liquidação de entidades comerciais e,
d) O cumprimento do orçamento e opções do plano de 2013 do Município D…, que referia que a Câmara desenvolvesse os processos conducentes à integração da empresa da C… na estrutura orgânica municipal, com preservação das “condições de segurança e garantia de vínculo laboral a todos os trabalhadores”.
22. O conselho de administração da C…, EM., aprovara, por unanimidade, na reunião ordinária realizada em 30 de Janeiro de 2013, o sobredito “Plano de dissolução/liquidação da actividade da C…, E.M..
23. No que concerne aos trabalhadores da C… - mas apenas relativamente aos que preenchessem os requisitos legais previstos no n.º11 do artigo 62.º da Lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto - e considerando a integração das actividades da empresa no universo municipal, o Conselho de Administração propunha, conforme consta do ponto II do Plano de Dissolução (vd. fls. 35 v.):
a) A Celebração de Acordos de Cedência de Interesse Público com os trabalhadores no limite até 31 de Julho de 2013;
b) A Abertura de procedimentos concursais pelo Município D… até 31 de Julho de 2013, com vista a constituição de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado com os trabalhadores.
24. O Autor fora, como resulta do já referido, integrado nos quados de pessoal da C… com uma antiguidade reportada a 1 de Julho de 2008, data do primeiro contrato (então a termo)
25. Sucede que, encontrando-se a C… na fase final de liquidação subsequente à dissolução, o respetivo Presidente do Conselho de Administração, F…, comunicou ao A., por carta datada de 17 de Novembro de 2014, a cessação do contrato de trabalho que mantinha com aquela entidade, com efeitos a partir de 31 de Dezembro de 2014, invocando que a mesma já não desenvolvia qualquer actividade e o demais que consta da cópia junta a fls. 26, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
26. O Autor não foi chamado a celebrar qualquer acordo de cedência de interesse com o Município, ora R..
27. Não lhe foi facultada a possibilidade de concorrer a procedimentos concursais do R. destinados a trabalhadores como ele.
28. A C…, EM, viu registada a sua dissolução em 28/02/2013 e o encerramento da sua liquidação em 30/06/2015, conforme resulta da certidão de registo comercial junta a fls. 73 a 78 e cujas menções aqui se dão por reproduzidas (pelo que já não existia à data da propositura da presente ação, conforme exarado no despacho de indeferimento liminar parcial da petição de 5/10/2015, a fls. 118 e 119).

2. – O direito
2.1. - Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) e artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho (CPT), e salvo questões de conhecimento oficioso, o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da recorrente, supra transcritas.
Mas essa delimitação é precedida de uma outra, qual seja a do reexame de questões já submetidas à apreciação do tribunal recorrido, isto é, o tribunal de recurso não pode criar decisões sobre matéria nova, matéria não submetida ao exame do tribunal de que se recorre.
2.2. – Questão prévia.
Nas conclusões de I a V do recurso, o autor suscita a questão da responsabilidade do 2.º réu, por força do disposto no artigo 501.º do Código das Sociedades Comerciais.
Sobre esta matéria nada foi alegado na petição inicial, nem apreciado na sentença recorrida.
Na petição inicial foi alegado apenas o seguinte (artigos 1.º e 2.º):
“1. A 1ª Ré, é uma entidade pública empresarial, local (DL. 133/2003), que tem como objecto principal, a promoção do desenvolvimento local mediante a exploração de actividades de interesse geral.
2. A 2ª Ré uma autarquia local, de natureza territorial, pessoa colectiva de direito público, com atribuições legais que compreendem a administração do domínio público municipal.”.
Por sua vez, na sentença recorrida apenas foi consignado:
“(…).
Desde logo, cumpre observar que a entidade empregadora do A. era, tão só e desde o início da relação laboral em causa, a C…, E.M., ou seja, uma empresa municipal, com autonomia não só patrimonial mas também jurídica.
Ora, essa entidade empregadora do A. deixou de existir como pessoa colectiva como o registo do encerramento da sua liquidação (em 30/06/15), face ao disposto no art. 160º, nº 2, do Cód. Sociedades Comerciais, pelo que nunca a relação laboral que tinha com o A. poderia continuar. (…)”.
Ou seja, nem na petição inicial o autor alegou qualquer facto relativo a eventual relação societária subordinada entre as rés, nem a sentença recorrida se pronunciou sobre tal matéria.
Assim, ao ser invocada apenas nas alegações de recurso, configura questão nova, não passível de ser conhecida nesta instância de recurso, pelo que não se conhece.

2.3. - Objecto do recurso:
1.ª - O não chamamento do autor a celebrar acordo de cedência com o Município D…,
2.ª - Ao autor não foi facultada a possibilidade de concorrer a procedimentos concursais no Município de D…, destinados a trabalhadores como ele,
3.ª - A sentença recorrida constitui decisão surpresa.

2.4. - O não chamamento do autor a celebrar acordo de cedência ou a concorrer a procedimentos concursais no Município de D…, destinados a trabalhadores como ele.
O regime jurídico da actividade empresarial local e das participações locais está regulado pela Lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto, e respectivas actualizações, cujo artigo 62.º - Dissolução das empresas locais – dispõe:
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais, as empresas locais são obrigatoriamente objeto de deliberação de dissolução, no prazo de seis meses, sempre que se verifique uma das seguintes situações:
a) As vendas e prestações de serviços realizados durante os últimos três anos não cobrem, pelo menos, 50 /prct. dos gastos totais dos respetivos exercícios;
b) Quando se verificar que, nos últimos três anos, o peso contributivo dos subsídios à exploração atribuídos pela entidade pública participante é superior a 50 /prct. das suas receitas;
c) Quando se verificar que, nos últimos três anos, o valor do resultado operacional subtraído ao mesmo o valor correspondente às amortizações e às depreciações é negativo;
d) Quando se verificar que, nos últimos três anos, o resultado líquido é negativo.
2 - O disposto no número anterior não prejudica a aplicação dos regimes previstos nos artigos 63.º a 65.º, devendo, nesses casos, respeitar-se igualmente o prazo de seis meses.
3 - O disposto na alínea a) do n.º 1 só é aplicável após o início da fase de exploração pela empresa local.
4 - A dissolução das empresas locais obedece ao regime jurídico dos procedimentos administrativos de dissolução e de liquidação de entidades comerciais.
5 - Ao pessoal em efetividade de funções nas empresas locais que incorram numa das situações previstas no n.º 1, que não se encontre ao abrigo de instrumentos de mobilidade previstos na Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, aplica-se o regime do contrato de trabalho, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
6 - As empresas locais em processo de liquidação podem ceder às entidades públicas participantes os seus trabalhadores contratados ao abrigo do regime do contrato de trabalho, nos termos do disposto no artigo 58.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, na exata medida em que estes se encontrem afetos e sejam necessários ao cumprimento das atividades objeto de integração ou internalização.
7 - Os acordos referidos no número anterior devem ser celebrados no prazo de seis meses após a deliberação de dissolução da empresa local, não sendo aplicável o disposto no artigo 72.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, sob pena de nulidade.
8 - Na pendência dos procedimentos de dissolução e de liquidação, os trabalhadores com relação jurídica de emprego por tempo indeterminado, que se encontrem na situação de cedência de interesse público ao abrigo e nos termos do n.º 6, podem candidatar-se aos procedimentos concursais exclusivamente destinados a quem seja titular de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida, prevista na Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, que sejam abertos pelas entidades públicas participantes às quais se encontrem cedidos, nos termos do número seguinte.
9 - O direito de candidatura a que se refere o número anterior aplica-se apenas aos procedimentos concursais para a ocupação de postos de trabalho correspondentes às funções ou atividade que o trabalhador cedido se encontra a executar, na exata medida do âmbito da integração ou internalização previstas no n.º 1 do artigo 64.º e no artigo 65.º, e que sejam abertos no período máximo de 12 meses a contar da data do acordo de cedência de interesse público a que se referem os n.os 6 e 7, independentemente da duração máxima deste poder vir a ser excecionalmente superior. (negritos nossos)
10 - O disposto nos n.os 8 e 9 não prejudica a exigência de verificação dos demais requisitos legais para a constituição da relação jurídica de emprego público.
11 - O disposto nos n.os 6 a 10 aplica-se apenas aos trabalhadores detentores de contrato de trabalho por tempo indeterminado que tenham sido admitidos pelo menos um ano antes da data da deliberação de dissolução da empresa local, aos quais, no caso de constituição de relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, não é devida qualquer compensação pela extinção do anterior posto de trabalho.
12 - Para efeitos do disposto no presente artigo, a deliberação de dissolução da empresa local que implique a integração ou a internalização de quaisquer atividades é acompanhada do respetivo plano, o qual deve incluir os seguintes elementos:
a) Definição das atividades a integrar ou a internalizar;
b) Listagem dos postos de trabalho indispensáveis para a prossecução das atividades a integrar ou a internalizar, identificando a carreira e as áreas funcional, habilitacional e geográfica, quando necessárias;
c) Previsão das disponibilidades orçamentais necessárias, nos termos da Lei n.º 8/2012, de 21 de fevereiro, que «Aprova as regras aplicáveis à assunção de compromissos e aos pagamentos em atraso das entidades públicas».
13 - Para efeitos de candidatura aos procedimentos concursais referidos no n.º 8, os trabalhadores cedidos ao abrigo e nos termos do n.º 6 são equiparados a candidatos com relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida.
14 - O disposto na alínea a) do n.º 1 não é aplicável às empresas locais que exercem, a título principal, as atividades de ensino e formação profissional.
15 - O disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 não é aplicável às empresas locais que exercem, a título principal, as atividades de gestão de equipamentos e prestação de serviços na área da cultura.
16 - Relativamente às entidades a que se refere o n.º 3 do artigo 58.º, a contagem do decurso dos três anos a que se referem as alíneas a) a d) do n.º 1 só se inicia com a entrada em vigor da Lei n.º 69/2015, de 16 de julho, para todos os efeitos constantes da presente lei.”.

Ao caso do autor, descrito nos autos, aplica-se o regime previsto no n.º 5, da citada norma, isto é, não se encontrando ao abrigo de instrumentos de mobilidade previstos na Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, aplica-se-lhe o regime do contrato de trabalho, sem prejuízo do disposto no número seguinte:
“6 - As empresas locais em processo de liquidação podem ceder às entidades públicas participantes os seus trabalhadores contratados ao abrigo do regime do contrato de trabalho, nos termos do disposto no artigo 58.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, na exata medida em que estes se encontrem afetos e sejam necessários ao cumprimento das atividades objeto de integração ou internalização.”.
Resulta do citado normativo, com evidente clareza, que a cedência de trabalhadores é uma possibilidade – “podem ceder” – e não uma obrigatoriedade para as entidades públicas participantes.
E a cedência acordada está condicionada a dois pressupostos cumulativos:
- Ao regime de contratação do trabalhador e
- À sua necessidade para o cumprimento das actividades objecto de integração ou internalização.
Ora, o autor recorrente, embora tenha alegado e provado documentalmente, o seu regime de contratação ao serviço da 1.ª ré (contrato a termo convertido em contrato por tempo indeterminado), não alegou nem provou, como lhe competia, que o Município D…:
- Tenha integrado, no seu universo de actividades, o sector de actividade onde o autor prestava funções, ao serviço da 1.ª ré, ou seja, “na área da sua especialidade e formação académica, e nomeadamente desempenhar funções ao nível de organização do departamento de tesouraria e da sua gestão” (cf. ponto 5 dos factos provados),
- E que fosse necessária a sua cedência para o cumprimento dessa específica actividade.
Além disso, os acordos de cedência, previstos nos n.ºs 6 e 7.º, do mesmo artigo 62.º, para produzirem o seu efeito jurídico útil, deviam ter sido celebrados no prazo de seis meses, após a deliberação de dissolução da empresa local (neste caso, em 13.02.2013), sendo certo que a acção deu entrada em juízo no dia 08 de julho de 2015.
Refira-se que, à data da dissolução da 1.ª ré, a cedência de interesse público estava regulada no artigo 58.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27.02, cujo n.º 2 dispunha: “O acordo pressupõe a concordância escrita do órgão ou serviço, do membro do Governo respectivo, da entidade e do trabalhador e implica, na falta de disposição em contrário, a suspensão do estatuto de origem deste.
Ora, o autor também não alegou, nem provou, a celebração de qualquer acordo de cedência de interesse público, para poder beneficiar do regime previsto no n.º 8 do citado artigo 62.º, que dispõe:
“8 - Na pendência dos procedimentos de dissolução e de liquidação, os trabalhadores com relação jurídica de emprego por tempo indeterminado, que se encontrem na situação de cedência de interesse público ao abrigo e nos termos do n.º 6, podem candidatar-se aos procedimentos concursais exclusivamente destinados a quem seja titular de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecida, prevista na Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, que sejam abertos pelas entidades públicas participantes às quais se encontrem cedidos, nos termos do número seguinte.”. (negrito nosso)
Dito de outro modo: só os trabalhadores com relação jurídica de emprego por tempo indeterminado, que se encontrem na situação de cedência de interesse público ao abrigo e nos termos do n.º 6, é que podem candidatar-se aos procedimentos concursais exclusivamente destinados a quem seja titular de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, previamente estabelecida.
Em resumo: cabendo ao autor o ónus de alegação e prova – cf. artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil - dos factos constitutivos do direito a que se arroga - ser integrado como trabalhador na Camara Municipal D… -, apenas alegou, neste particular, o plano de dissolução/liquidação da actividade da 1.ª ré, e não também a efectiva integração de todos as suas actividades no universo do Município D…, bem como a necessidade da sua cedência para o cumprimento da específica actividade que desempenhava ao serviço da 1.ª ré.
A alegação e prova, desses dois factos, eram essenciais para a eventual aplicação, ao autor recorrente, do regime previsto nos n.ºs 6 a 10 do artigo 62.º da Lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto.
Assim, não tendo o autor alegado e provado tal factualidade, outra solução não resta do que concluir pela improcedência do recurso, e confirmar a sentença recorrida.

2.5. - A sentença recorrida constitui decisão surpresa
Por último, o autor alega nas suas conclusões de recurso que, tendo pedido a sua integração, como trabalhador, na Camara Municipal D…, tinha o direito de optar pela indemnização prevista no artigo 391.º do Código do Trabalho, “até ao encerramento da 1.ª instância”. Como o Tribunal da 1.ª instância proferiu decisão final na fase do saneador, isto é, antes da data marcada para julgamento na audiência de partes, sem o ouvir para tal efeito, violou o disposto no artigo 3.º, n.º 3, do CPC.
A apreciação desta última questão estava dependente da solução jurídica que fosse dada às 3.ª e 4.ª questões do objecto do recurso.
Concluindo-se, como se conclui, pela improcedência do recurso, e consequente improcedência do pedido subsidiário formulado pelo autor, fica prejudicada a apreciação da questão da “decisão surpresa”, por inutilidade.

III.A decisão
Atento o exposto, julga-se a apelação improcedente e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida.
Custas a cargo do autor.
*****
Sumário
(da exclusiva responsabilidade do relator).
Descritores: Extinção de empresa municipal local; Transmissão de contrato de trabalho; pressupostos; Ónus da prova; Despacho liminar; Recorribilidade

I – A dissolução de uma empresa local, ao abrigo da Lei n.º 50/2012, de 31.08, não importa a transmissão ope legis, por cessão dos contratos de trabalho com aquela celebrados.
II – A cessão para os municípios de trabalhadores vinculados por contrato de trabalho por tempo indeterminado, que não se encontrem ao abrigo de instrumentos de mobilidade, pressupõe não só que se tenha integrado, no universo de actividades do município, o sector de actividade onde o trabalhador prestava funções, mas também que fosse necessária a sua cedência para o cumprimento dessa específica actividade.
III – Os trabalhadores abrangidos em tais condições podem sujeitar-se ao procedimento concursal, a que alude o art. 62.º, n.º 8, da Lei.
IV – Cabe ao trabalhador o ónus de alegação e prova dos pressupostos mencionados em II.

Porto, 2016.09.12
Domingos Morais
Paula Leal de Carvalho
António José Ramos