Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
59/13.0TTSTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: GRAVAÇÃO DA AUDIÊNCIA
CONTRATO DE TRABALHO A TERMO RESOLUTIVO
SUBSTITUIÇÃO DE TRABALHADOR AUSENTE
Nº do Documento: RP2015041359/13.0TTSTS.P1
Data do Acordão: 04/13/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Tendo em conta a natureza especial das normas do C.P.T., não resultando da Lei n.º 41/2013 de 26/06 qualquer indício de que foi intenção do legislador proceder à revogação das normas que regulam a gravação da audiência em processo laboral e face ao disposto no artigo 68.º, do C.P.T., não existe qualquer lacuna neste mas sim uma norma concreta que regula a gravação da audiência, norma esta que se encontra em vigor pois não foi revogada nem expressa nem tacitamente pela citada Lei.
II - O contrato de trabalho a termo incerto pode ser celebrado para substituição direta ou indireta de trabalhador ausente que se encontra temporariamente impedido de trabalhar (artigo 140.º, n.º 2, a) e n.º 3, do C.T.).
III - Se a A. substituiu as trabalhadoras identificadas nos respetivos contratos, dos quais não resultam as funções exercidas pelas mesmas e a sua prestação não se ficou por aí, acabando por substituir outras no âmbito dos mesmos, tal significa que os motivos justificativos não correspondem totalmente à realidade e, consequentemente, os contratos a termo incerto celebrados entre a A. e a Ré consideram-se sem termo, pois foram celebrados fora dos casos previstos no n.º 3, do artigo 140.º - (n.º 1, b), do artigo 147.º, do C.T.).
IV - O contrato a termo certo por seis meses celebrado entre a A. e a Ré, em 14/09/2010, quando a A. já se encontrava a desenvolver a sua prestação de trabalho no âmbito de uma relação de trabalho por tempo indeterminado, é completamente irrelevante, não tem qualquer eficácia.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 59/13.0TTSTS.P1
Tribunal do Trabalho de Santo Tirso
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Relatora – Paula Maria Roberto
Adjuntos – Desembargadora Fernanda Soares
– Desembargador Domingos Morais

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I - Relatório

B…, residente em Santo Tirso,

intentou a presente ação de processo comum, contra

C…, S.A., com sede em Lisboa

alegando, em síntese que:
Em 11/03/2009, celebrou com a Ré um contrato a termo incerto, com efeitos a partir de 01/04/2009 e para substituir uma empregada mas acabando por substituir outra; em 04/08/2009 celebrou outro contrato a termo incerto idêntico ao primeiro para substituir uma trabalhadora, acabando por substituir outra passados dois meses; em 08/12/2009 celebrou um novo contrato com a Ré para continuar a substituir a mesma funcionária que se encontrava doente, de licença de parto e de férias, o que durou até 04/09/2010; em 14/09/2010 celebra um novo contrato com a Ré a termo certo por seis meses e com a justificação de a A. ter declarado estar em situação de procura do primeiro emprego, sendo que a Ré não podia desconhecer que tal não correspondia à verdade; este contrato renovou-se até 15/03/2012; a A. subscreveu um aditamento ao contrato de trabalho; em abril de 2012 sofreu um acidente de trabalho e a Ré deu conta à A. de que não iria renovar o contrato de trabalho; no dia seguinte à alta média, 09/08/2012, a A. apresentou-se ao trabalho e no dia 30/08 a Ré deu-lhe conta de que não iria renovar o contrato de trabalho devido ao facto de o seu estado de saúde o não permitir; por carta registada de 27/08/2012 a Ré deu conta à A. de que o seu contrato iria caducar no dia 15/09/2012; o contrato de trabalho em causa, em 15/09/2012, deveria ser considerado sem termo; o despedimento da A. por caducidade do contrato é ilícito, tendo direito a ser reintegrada e indemnizada por todos os danos causados e tem direito a ver alterada a sua categoria profissional e correspondente retribuição;
Termina, dizendo que a presente ação deve proceder e, por via disso, ser a Ré condenada:
- a ver declarado como contrato sem termo o contrato de trabalho plasmado no doc. nº 1, dado ter sido celebrado a fim de iludir as disposições que regulam o contrato sem termo;
- a ver declarado ilícito o despedimento da A. com efeitos a partir de 15/09/2012;
- a reintegrar a A. no local de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, podendo optar pela indemnização devida e
- a pagar à A. as remunerações vencidas desde o seu despedimento até à decisão final com trânsito em julgado, bem assim as remunerações devidas por força da alteração da categoria profissional.
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A Ré contestou alegando, em sinopse, que:
A A. substituiu as trabalhadoras que foi contratada para substituir; na adenda ao contrato foi alterada a sua categoria profissional; a Ré contratou uma trabalhadora a tempo incerto para substituir a A. enquanto esteve de baixa por doença; o termo aposto no contrato é válido pois é pacífico que está em situação de primeiro emprego o trabalhador que nunca prestou atividade profissional ao abrigo de um contrato por tempo indeterminado; a Ré resolveu o contrato de forma lícita e procurou pagar à A. a compensação devida mas a mesma recusou recebê-la.
Conclui dizendo que a presente ação deve ser julgada totalmente improcedente por não provada e por via dela a Ré absolvida da totalidade dos pedidos formulados pela A..
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A A. apresentou resposta e na qual conclui como na p. i..
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Foi proferido o despacho saneador de fls. 138, selecionada a matéria assente e elaborada a base instrutória (fls. 138 a 140).
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Procedeu-se a julgamento e foi, depois, proferida sentença (fls. 291 e segs.) que julgou a presente ação procedente por provada e, em consequência:
“a-) Declara-se como “contrato sem termo” o contrato de trabalho celebrado com a autora;
b-) Declara-se ilícito o despedimento da mesma com efeitos a partir de 15 de Setembro de 2012;
c) Condena-se a ré a reintegrar imediatamente a autora no local de trabalho, sem prejuízo da sua categoria - praticante de padaria 2º - e antiguidade – reportada a 01/04/2009;
d) Condena-se a ré a pagar à autora as remunerações vencidas desde trinta dias antes da propositura da presente acção (26/12/2012) até ao trânsito em julgado da presente decisão.”
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A Ré notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:
“1ª - A sentença ora em crise, entendeu, que os três contratos com termo incerto que uniram as Partes foram celebrados para iludir as normas do contrato sem termo e por isso o termo neles aposto é nulo, tendo fundamentado tal decisão e entendimento com o facto da Recorrida ter desempenhado funções em diferentes área da Loja enquanto se encontrava a substituir uma colaboradora dessa mesma Loja;
2ª - Os vários contratos de trabalho que uniram as Partes, entre os quais os contratos de trabalho com termo incerto, são regulados pelo Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a APED - Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição, a FEPCES - Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e Outros, publicado no BTE n° 22 de 15 de Junho de 2008, com as alterações introduzidas na revisão publicada no BTE n° 18 de 15 de Maio de 2010;
3ª - Esse contrato define a categoria profissional de Operadora de Supermercado, que tinha a Recorrida nesse momento, da seguinte forma:
É o trabalhador que num supermercado, hipermercado ou Loja, alimentar ou não alimentar, desempenha de forma polivalente todas as tarefas inerentes ao seu bom funcionamento, nomeadamente, entre outros, aqueles ligados com a receção, marcação, armazenamento, embalagem, reposição e exposição de produtos, atendimento e acompanhamento de clientes. É também responsável por manter em boas condições de limpeza e conservação, quer o respetivo local de trabalho, quer as paletes e utensílios que manuseia. Controla as mercadorias vendidas e o recebimento do respetivo valor. Pode elaborar notas de encomenda ou desencadear, por qualquer forma, o processo de compra. Faz e colabora em inventários. Mantém atualizados os elementos de informação referentes às tarefas que lhe são cometidas. Desempenha funções de apoio a oficiais de carnes, panificação, manutenção e outros. Pode utilizar e conduzir aparelhos de elevação e transporte."
4ª - Dos autos não resultam provados quaisquer factos que determinem que a Recorrente tenha imposto à Recorrida a prática de quaisquer tarefas que extravasem as cabidas na mencionada categoria profissional;
5ª - O facto da Recorrida prestar trabalho na área de charcutaria e na área de padaria da Loja não determinam que a Recorrente tenha pretendido com isso iludir as normas que regulamentam o contrato de trabalho sem termo, nem que a Recorrida tenha estado a substituir uma trabalhadora diversa da que vem mencionada no contrato de trabalho e cuja impossibilidade para trabalhar deu causa à contratação com termo incerto;
6ª - Significam simplesmente que a Recorrida e bem assim a trabalhadora que esta substituiu podem e devem desempenhar as tarefas próprias da sua categoria e estas podem e devem ser desempenhadas em qualquer área ou secção da Loja como bem determina o Contrato Coletivo de Trabalho aplicável.
7ª - Ao decidir como decidiu, a Meritíssima Juíza fez tábua rasa do disposto no Contrato Coletivo de Trabalho, designadamente no Anexo dele constante no qual é definida a categoria profissional;
8ª - E bem assim, errou ao interpretar e aplicar o disposto nos artigos 140° e 147 n° 1 a), o que expressamente se invoca para todos os devidos e legais efeitos.
Acresce que,
9ª - Está em situação de primeiro emprego o trabalhador que nunca prestou atividade profissional ao abrigo de um contrato por tempo indeterminado,
10ª - É, aliás, o que consta do Diploma Legal que introduziu a possibilidade de celebração de contratos com temo certo com este fundamento, o DL 64-A/89 de 27 de Fevereiro cujo preambulo clarifica a questão de forma cabal;
11ª - A legislação que regula a política de emprego (estímulo à oferta/criação de emprego), no que a este respeito interessa, as Portarias n° 1191/2003 de 10 de Outubro n° 196-A/2001, de 10/03, 129/2009 de 30/01 e 131/2009 de 30/01, consagram uma definição de jovem à procura do primeiro emprego;
12ª - Essa definição não é válida nem aplicável à celebração de contrato com termo certo com o fundamento de primeiro emprego, mas sim e tão só para definir o modo de funcionamento dos estímulos à contratação e criação de emprego regulamentados por tais portarias.
13ª - O conceito de trabalhador à procura de primeiro emprego, aplicável para efeito da admissibilidade dos contratos de trabalho a termo, não é sobreponível ao conceito de jovem à procura de primeiro emprego, que releva apenas para a definição do âmbito pessoal da concessão de apoios financeiros à criação de empresas ou novos projetos de trabalho.
14ª - Ao decidir como decidiu a sentença recorrida violou o disposto no artigo 140° n° 4 b) do Código do Trabalho que desconsiderou de forma absoluta e flagrante, confundindo o conceito legalmente determinado no Código do Trabalho com a definição de jovem à procura de primeiro emprego constante das indicadas Portarias, que visam, outrossim regulamentar a concessão de incentivos à contratação e politicas de emprego.
Termos em que deverá dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-a por outra absolva a Recorrente de todos os pedidos contra si formulados, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”
*
A A. respondeu sustentando que:
A -- Quanto à primeira nulidade
Salvo melhor opinião, não assiste razão à Ré. Na verdade, reza o art° 1º do Código do Processo de Trabalho:
n° 1 - Processo de Trabalho é regulado pelo presente Código;
n° 2 - nos casos omissos, recorre-se sucessivamente:
- à legislação processual comum, civil ou penal, que diretamente os previna.
Por seu turno, reza o n° 2 do art° 68 do predito diploma legal:
- quando a discussão admita recurso ordinário - como é o caso - pode qualquer das partes requerer a gravação da audiência ou o tribunal determiná-la oficiosamente.
In casu, nem as partes nem o tribunal requereu a gravação. Consequentemente, nada impunha a gravação da audiência e, muito menos, o impunha o NCPC: o normativo, ínsito no seu art° 155, apenas vincula os actos praticados no âmbito do processo civil.
B – quanto à segunda e terceira nulidade
Antes de mais, há que realçar que a Ré não alegou que a autora usufruísse do subsídio de desemprego ou de qualquer outro rendimento de trabalho por actividade iniciada após o despedimento.
Ora, como refere o Ac do STJ, de 17.06.2010, em que é relator o insigne Conselheiro, Pinto Hespanhol, “a imperatividade do regime...não dispensa a entidade empregadora de alegar e provar que o trabalhador auferiu rendimentos de trabalho por actividade iniciada após o despedimento, pelo que, se o não fizer, não é possível operar a dedução...”
Em defesa da sua tese, a Ré socorre-se de um passagem vazada no Acórdão daquele mesmo tribunal, onde se diz que a dedução das importâncias, relativas a rendimentos do trabalho auferidos pelo trabalhador em actividades iniciadas depois do despedimento, decorre de uma lei de natureza imperativa.
Não transcreve, porém, a Ré o enquadramento em que é feita tal afirmação. E é óbvio que o tenha feito. É que, apesar da invocada imperatividade, o dito Acórdão não considerou que a decisão, que omitiu a referência às deduções de rendimentos, enfermava de nulidade.
Há que realçar, antes de mais que a teoria sustentada neste acórdão não é sufragada pelo acórdão de 17.06.2010. Depois, impõe-se proceder ao enquadramento processual do acórdão de 23.01.2002: tanto um como outro acórdão desenvolvem-se no âmbito de acções executivas, emergentes do não cumprimento, por parte da entidade empregadora, de decisões já transitadas e onde a questão das deduções de rendimentos de trabalho, auferidos, entretanto, pelo trabalhador, havia sido pura e simplesmente omitida.
Mas afinal o que, sobre esta questão, refere este acórdão? Exprime, apenas, um conselho: “importa que se diga, antes de mais, que a sentença aludida, ao remeter para execução de sentença, a liquidação das retribuições intercalares, deveria expressamente ter salvaguardado a eventualidade de dedução de rendimentos do trabalho entretanto auferidos pela trabalhadora. Seria cauteloso e evitaria uma discussão inútil."
E é, até por isso, que acrescenta o mesmo acórdão: “o exequente, ao proceder à liquidação, deve fazê-lo de harmonia com o direito que lhe assiste, pelo que se auferiu rendimentos de trabalho, durante o período a que se reportam as remunerações intercalares, a lei não lhe confere o direito a esta por inteiro, o que legitima que a entidade patronal, se o trabalhador não o fizer, deduza oposição que tiver por pertinente sobre esta questão”, mesmo que, acrescentamos nós, a sentença, de que emergiu a execução, seja omissa, no que tange à dedução dos rendimentos auferidos após o despedimento.
Do exposto resulta, irrefutavelmente, que a Meritíssima Juiz "a quo" não tinha obrigação legal de, expressa ou veladamente, se pronunciar sobre a dedução de montantes, eventualmente recebidos pela autora, quer a título de subsídio de desemprego, quer a título de quaisquer outros rendimento de trabalho, auferidos pela autora em actividades iniciadas após o despedimento.
Consequentemente e sem mais considerandos, que entendemos como despiciendos, deverão improceder as três arguidas nulidades.
II
SOBRE AS ALEGAÇÕES, PROPRIAMENTE DITAS, FORMULADAS PELA RÉ
Na modesta opinião da recorrida, são dois os fundamentos por que a recorrente impugna a douta decisão: um primeiro, que incide sobre uma pretensa validade dos contrato por termo incerto; um segundo, em que se insurge quanto ao motivo aposto no último contrato de trabalho com termo certo.
01 - A ALEGADA VALIDADE DO TERMO
A este propósito, diz a recorrente que os contrato em apreço são contratos de trabalho por termo incerto, cuja celebração foi motivada por sucessivas baixas médicas de. Colaboradoras suas.
E, de facto, assim foi. Só que, ao contrário do que a recorrente pretende fazer crer - e por isso, impugna a douta decisão recorrenda - tais contrato foram, efectivamente, celebrados para iludir as normas dos contratos sem termo.
Como se diz na douta decisão sob recurso, da prova produzida " ressaltou à saciedade que os fundamentos invocados para a celebração dos três primeiros contratos a termo incerto não têm integral correspondência com a realidade, pois que não se limitou a autora a substituir a funcionária para que foi exclusivamente contratada substituir, tendo estado também, ainda na vigência de cada um deles, a suprir outras necessidades da loja, substituindo e/ou ajudando outros colaboradores.”
E, justificando tal afirmação, a Meritíssima Juiz "a quo" concretiza: “ os contratos celebrados não deixam dúvidas: a autora foi contratada para substituir a funcionária D… (na charcutaria, tendo substituído, nesse período, também a funcionária E…, na padaria); depois seria novamente contratada para substituir a funcionária F… (sendo que esteve também a substituir, nesse período, a funcionária G…); depois celebraria um novo contrata a termo incerto para substituir a G… (a quem já estava a substituir quando se iniciou o contrato).
Não desmentindo a descrita realidade, a recorrente agarra-se a manifesta falácia: a de que a autora “jamais realizou tarefas que não fossem compatíveis com a categoria que lhe foi atribuída" Por amor de Deus: não se discute se a autora realizou ou não tarefas compatíveis com a sua categoria profissional...A essência do problema incide, tão somente, em saber se, legalmente, a autora, que foi contratada a termo incerto para substituir uma colaboradora, podia, nesse período e por imposição da entidade patronal, substituir outras colaboradoras.
Ora, a resposta tem necessariamente que ser negativa. Na verdade, o normativo plasmado nos n° 1 e 2, alínea a), do artigo 140 do Código do Trabalho, é taxativo quando determina que o contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo tempo estritamente necessário à satisfação dessa necessidade, como seja, por exemplo, a substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar. Até por isso é que o n° 3 do artigo 141 do citado normativo, no intuito de evitar que a estipulação do termo tenha por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem termo (n° 1 do artigo 147 do C.T.), determina que “ a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.
Perante tão cristalina e, por isso, irrefutável evidência, a afirmação da recorrente de que a Meritíssima Juiz “ teria que ter dado como provado que a trabalhadora foi alocada a realizar funções que extravasassem a definição das que são próprias da categoria profissional de Operadora de Supermercado” é manifestamente falaciosa.
02 - A NULIDADE DO ÚLTIMO CONTRATO DE TRABALHO COM TERMO CERTO.
A recorrente insurge-se contra a douta decisão na parte em que considerou que a autora, quando, em 15-09-2010, celebrou o último contrato de trabalho com termo, não se encontrava na situação de trabalhadora à procura do primeiro emprego.
Também aqui - e salvo melhor opinião - não assiste razão à recorrente. Desde logo, a tese sustentada pela recorrente, nesta questão, parte de um pressuposto errado: a de que os contratos celebrados, até então, pela autora, eram contratos a termo incerto e, como tal, à data da subscrição do último contrato com termo certo, ou seja, em 15-09-2010, a autora encontrava-se na situação de trabalhadora à procura do primeiro emprego.
Ora, como já ficou claro, os contrato com termo incerto, até então celebrados entre a recorrente e a recorrida, estão definitivamente feridos de nulidade, uma vez que, como doutamente o refere a decisão recorrenda, tendo as estipulações a termo sido colocadas com vista a iludir as disposições legais que regulam o contrato sem termo, o que nos cumpre concluir, então, que terão de se considerar sem termo os aludidos contratos, que se iniciaram em 01-04-2009, data a partir da qual a autora esteve sempre a trabalhar para a ré.
Aliás, a questão de se saber se a autora, à data da celebração do último contrato (15/09/2010), era ou não uma trabalhadora à procura do primeiro emprego, está de tal forma fundamentada na douta decisão que não merece, da parte da recorrida, qualquer adenda. Tudo o que mais se disser, não tem justificação, uma vez que a douta decisão já diz tudo. A explanação vertida na douta decisão é profundamente didáctica e legalmente irrefutável, tal é a clareza com que a questão é desenvolvida, tanto em termos de facto, como na aplicação do direito.
Como doutamente refere a M. Juiz “a quo”, deverá considerar-se trabalhador à procura do primeiro emprego, aquele que nunca havia prestado a sua actividade no quadro de uma relação de trabalho subordinado, de duração inferior a 12 meses.
Ora, tendo a autora trabalhado para a ré durante os 12 meses anteriores (de 1 de Abril de 2009 a 15/09/2010 - data da celebração do contrato, aqui, em causa -), aquando da celebração deste último contrato, a autora já não poderia ser considerada uma trabalhadora à procura do primeiro emprego. Assim sendo, forçoso se torna concluir, irrefutavelmente, que o último contrato de trabalho, celebrado entre a autora e a ré, se deve considerar sem termo, e que, por isso, a sua cessação, por iniciativa da ré, ocorreu de forma ilícita.
Do exposto resulta que é ilícito o despedimento da autora, uma vez que foi levado a cabo pela ré, sem processo disciplinar e sem justa causa, para além de não estar suportado em qualquer conduta culposa, ilícita e grave daquela.
Assim sendo: deverão, necessariamente, improceder as conclusões formuladas pela recorrente, mantendo-se, outrossim, intangível a douta decisão, assim se fazendo inteira
JUSTIÇA”
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O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 346 e segs., no sentido de que “a apelação merece ser provida”.
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A A. recorrida, notificada deste parecer veio responder ao mesmo concluindo como nas suas alegações.
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Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
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II – Fundamentação
a) Factos provados
A-) Em 31/03/2009, a Autora celebrou com a Ré um contrato de trabalho a termo incerto, conforme doc nº. 1, junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por reproduzido, com a categoria profissional de operadora/ajudante do 1º ano, e com efeitos a partir de 01/04/2009, sendo a remuneração salarial acordada de 500,00 euros mês.
B-) Tal contrato foi celebrado a coberto do nº. 3 do artº 140º do Código de Trabalho, em virtude de haver necessidade de se substituir a empregada D… – cfr. doc nº. 1, cláusulas 1, 3 e 4.
C-) Em 04/08/2009, a Autora acordou com a Ré um segundo contrato de trabalho a termo incerto, cujo conteúdo era, em tudo semelhante ao primeiro – cfr. doc. nº 2 – sendo que a única diferença consistia na pessoa a substituir que, neste caso, era a trabalhadora F….
D-) Em 08/12/2009, a Autora celebrou novo contrato de trabalho a termo incerto com a Ré para substituir a funcionária G… que se encontrava em situação de doença, licença de parto e férias – cfr. doc nº 3 - tendo este terceiro contrato durado até 4 de setembro de 2010 – cfr. doc nº 4.
E-) Em 14/09/2010, a Autora celebra novo contrato de trabalho com a Ré, agora já a termo certo por 6 meses, sendo a justificação dada para o mesmo na afirmação de que a “Autora ter declarado estar em situação de procura do primeiro emprego” – cfr. doc. nº 5, sendo-lhe atribuída a categoria profissional de operadora ajudante do 1º ano.
F-) Dado não ter sido resolvido, este último contrato de trabalho, seria sucessivamente renovado até 15 de março de 2012.
G-) Em 31/01/2012 foi assinado entre as partes um aditamento ao aludido contrato de trabalho, conforme doc. nº 6, cujo teor, aqui se dá por reproduzido, junto com a pi. e a fls. 71 a 73 com a contestação, ali se acordando também que a categoria profissional da autora passaria a ser de Praticante Padaria 2º ano.
H-) Em abril de 2012, a Autora sofreu um acidente de trabalho, tendo sido tratada no Porto pela seguradora da Ré, até 8 de maio de 2012, ficando em baixa médica.
I-) No dia seguinte à alta médica – 9 de agosto de 2012 – a Autora apresentou-se ao trabalho.
J-) Em 22 de agosto de 2012, a Autora foi examinada na loja de … por médico que atribuiu à Autora uma incapacidade temporária para as sua funções habituais, alvitrando que a mesma passasse a prestar serviços na frente da loja, até novo exame a realizar-se pelo médico da região.
K-) Por carta registada, com data de 27/08/2012, a Ré deu conta à Autora de que o seu contrato não seria renovado e, por força disso, caducava no dia 15/09/2012 – cfr. doc nº 7.
L-) Do “Certificado de trabalho”, as categorias profissionais atribuídas pela Ré à Autora foram as seguintes:
- de 15/09/2010 a 15/09/2011, operadora ajudante 1º ano;
- de 15/09/2011 a 1/02/2012, de operadora ajudante do 2º ano; e
- de 01/02/2012 até final do contrato, de praticante de padaria 2º – cfr doc nº. 8.
Mais se provou que:
Na sequência do contrato aludido em A-), a autora acabou por substituir também a trabalhadora E…, que se encontrava de baixa, período em que exerceu funções inerentes à padaria.
Na sequência do contrato aludido em C-), e antes da celebração do contrato aludido em D-), esteve a substituir a trabalhadora F… e, ainda na vigência desse primeiro contrato, regressou à padaria para cobrir funções da funcionária G…, que se encontrava de baixa médica por gravidez de risco.
Na assinatura do contrato aludido em E-) a autora foi colocada na charcutaria, onde, no decurso da vigência desse contrato, exerceu a sua atividade até final de abril de 2011, data a partir da qual passou a trabalhar na secção de padaria, para substituir uma colega, ausente por licença de parto, com problemas de saúde, para regressar ao seu primitivo setor de trabalho, a charcutaria, regressando depois novamente à secção de padaria, a fim de substituir outra colega.
No início de fevereiro de 2012, o Sr. H… comunicou à autora que a lei sobre contratos a termo tinha sido alterada em janeiro de 2012, pelo que, por força disso, a mesma só poderia manter-se na loja se assinasse um aditamento ao contrato, o que a autora, acreditando na boa fé daquele, que lhe havia assegurado que depois passaria a definitiva, assinou.
Após o acidente aludido em H-), o Sr. H… deu conta à Autora de que devido à doença daquela o seu contrato de trabalho não iria ser renovado e, muito menos, a mesma seria passada a efetiva.
A Ré contratou, por tempo incerto, a colaboradora I… para colmatar a ausência da autora enquanto esteve de baixa por doença (no período 25.05.2012 a 19.08.2012).
Tendo, mais tarde, contratado a mesma, com termo certo, o que ainda ocorreu na vigência do contrato de trabalho da autora.
Por força da adenda ao último contrato celebrado pela autora, foi atribuído à mesma a categoria profissional de Praticante de Padaria 2º ano, com vencimento ilíquido de 520,00 euros, o que passou a vigorar a partir de 01/02/2012, tal qual resulta de fls. 71 dos autos.
Resultam, ainda, provados os seguintes factos (documentos de fls. 137, 138 e 139:
9º Por carta de 27/07/2009, a Ré comunicou à A. que o contrato referido em A) caducaria no dia 03/08/2009, devido ao facto de a funcionária D… regressar ao serviço.
10º Por carta de 09/11/2009, a Ré comunicou à A. que o contrato referido em C) caducaria no dia 05/12/2009, devido ao facto de a funcionária F… regressar ao serviço.
11º Por carta de 19/07/2010, a Ré comunicou à A. que o contrato referido em D) caducaria no dia 04/09/2010, devido ao facto de a funcionária G… regressar ao serviço.
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b) - Discussão
Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 639.º, n.º 1 do C.P.C.), com exceção das de conhecimento oficioso.
Assim, cumpre apreciar as questões suscitadas pela Ré recorrente, quais sejam:
1ª questão:
- Nulidades processual e da sentença
2ª questão:
- Da validade do termo aposto nos contratos celebrados entre a A. e a Ré
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1ª questão
Nulidades processual e da sentença
Antes de mais, cumpre dizer que a recorrente veio arguir as nulidades nos termos previstos no artigo 77.º, do C.P.T., pelo que, as mesmas serão apreciadas por este tribunal.
Por outro lado, a Exm.ª juiz do tribunal a quo pronunciou-se sobre as nulidades invocadas e no sentido da sua inexistência.
Nulidade processual
A Ré recorrente veio invocar a nulidade de falta de gravação, com base no disposto no artigo 195.º, n.º 1, do C.P.C., alegando que face ao disposto no artigo 155.º, do C.P.C. a prova produzida em audiência de julgamento devia ter sido gravada.
Vejamos, então, se lhe assiste razão.
Conforme o disposto no n.º 1, do artigo 155.º, do N.C.P.C.[1], a audiência final de uma ação é sempre gravada.
Por outro lado, o n.º 2, do artigo 68.º, do C.P.T. estabelece que <<quando a decisão admita recurso ordinário, pode qualquer das partes requerer a gravação da audiência ou o tribunal determiná-la oficiosamente>>. E, no seu n.º 4, que <<a gravação da audiência (…) deve(m) ser requerida(s) na audiência preliminar, se a esta houver lugar, ou até 20 dias antes da data fixada para a audiência de julgamento>>.
Significa isto que estamos perante duas normas divergentes, uma reguladora do direito processual civil e outra especial respeitante ao processo laboral.
Ora, conforme o disposto no artigo 1º, do C.P.T., o processo do trabalho é regulado pelo respetivo Código e nos casos omissos recorre-se sucessivamente à legislação processual comum civil que diretamente os previna e demais regulamentação e princípios gerais previstos no seu n.º 2, sendo que, as normas subsidiárias não se aplicam quando forem incompatíveis com a índole do processo regulado no Código de processo do trabalho – n.º 3, do citado normativo.
Assim sendo, só no caso de existência de casos omissos é que deve recorrer-se à legislação processual comum civil.
Na verdade, <<o direito processual do trabalho é um ramo especial do direito, e não um conjunto de normas excepcionais, o que releva tanto em sede interpretativa como no âmbito da integração de lacunas>>[2], sendo certo que, <<a lei geral não revoga a lei especial, excepto se outra for a intenção inequívoca do legislador” – n.º 3, do artigo 7.º, do C.C.. Como refere Oliveira Ascenção[3], impõe-se <<uma presunção no sentido da subsistência da lei especial. Se não houver uma interpretação segura no sentido da revogação, ou se uma conclusão neste sentido não for isenta de dúvidas, intervém a presunção do art. 7.º, n.º 3, e a lei especial não é revogada>>.
Tendo em conta a natureza especial das normas do C.P.T., não resultando da Lei n.º 41/2013 de 26/06 qualquer indício de que foi intenção do legislador proceder à revogação das normas que regulam a gravação da audiência em processo laboral e face ao disposto no artigo 68.º, do C.P.T., facilmente se conclui que não existe qualquer lacuna neste mas sim uma norma concreta que regula a gravação da audiência, norma esta que se encontra em vigor pois não foi revogada nem expressa nem tacitamente pela citada Lei n.º 41/2013[4].
Face ao que ficou dito não assiste qualquer razão à recorrente quando alega a propósito do artigo 155.º do C.P.C. que “por ser mais abrangente e imperativa, regula de forma mais específica a matéria da gravação da prova, sendo por isso aplicável ao processo laboral”.
Improcede, assim, esta nulidade invocada pela recorrente.

Nulidades da sentença
A recorrente veio arguir a nulidade da sentença por omissão de pronúncia alegando, para tanto, que a sentença não se pronunciou sobre a questão da imperatividade da norma prevista no artigo 390.º, n.º 2, do C.T..
Vejamos:
Em caso de despedimento ilícito, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde aquele até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude – n.º 1, do artigo 390.º, do C.T..
<<Às retribuições referidas no número anterior deduzem-se:
a) As importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento;
b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento;
c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º 1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.>> - n.º 2, do mesmo normativo.
Compulsados os autos, mais concretamente a contestação da Ré, constatamos que esta não alegou qualquer facto respeitante a quantias auferidas pela A. após a cessação do contrato de trabalho que celebrou com a mesma.
Ora, constitui jurisprudência dominante o entendimento no sentido de que é à entidade empregadora que compete alegar e provar (artigo 342.º, n.º 2, do C. C.) os factos relativos ao recebimento por parte do trabalhador de rendimentos de trabalho auferidos após o despedimento, não sendo tal dedução de conhecimento oficioso[5].
Desta forma, não tendo a recorrente alegado quaisquer factos daquela natureza e que, como tal, não resultaram provados, facilmente se conclui que a sentença recorrida não tinha de se pronunciar sobre a dedução a que alude o n.º 2, a), do artigo 390.º, do C.T., não existindo, nesta parte, qualquer omissão de pronúncia.
*
A recorrente alega, ainda, que a sentença recorrida não se pronunciou sobre as deduções a que aludem as alíneas b) e c), do artigo 390.º, do C.T..
Como já referimos, às retribuições intercalares deduzem-se: a retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento e até 30 dias antes da propositura da ação, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao mesmo e o subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador entre a data do despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do mesmo.
Por outro lado, a sentença recorrida condenou a Ré a pagar à A. as remunerações vencidas desde trinta dias antes da propositura da presente ação (26/12/2012) até ao trânsito em julgado da decisão.
Assim sendo, ao contrário do que alega a Ré recorrente, a sentença recorrida pronunciou-se sobre esta dedução prevista na alínea b), do citado artigo 390.º, inexistindo, nesta parte, qualquer omissão de pronúncia.
*
Já no que concerne ao subsídio de desemprego a mesma decisão nada refere, sendo que, como vem sendo entendimento desta Relação[6], esta dedução é de conhecimento oficioso.
Na verdade, como refere Leal Amado[7], <<aquela conexão intrínseca já se verifica no caso do subsídio de desemprego auferido pelo trabalhador em consequência do despedimento, o qual, nos termos do n.º 2, al. c), do art. 390.º, será deduzido na compensação, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social, (…) Evita-se, desta forma, o locupletamento injusto do trabalhador despedido (que ocorreria caso o subsídio de desemprego não fosse deduzido ao montante dos salários intercalares) ou do empregador que o despediu (que ocorreria caso a dedução do subsídio revertesse em seu benefício), ficando salvaguardada a posição da segurança social>>.
No que respeita a esta dedução, existe um nexo causal entre o despedimento e o subsídio de desemprego auferido em consequência daquele, estando em causa direitos de natureza social e interesses de ordem pública que justificam a intervenção oficiosa do tribunal.
Acontece que, apesar deste conhecimento oficioso, tal não significa, sem mais, que a ausência do mesmo consubstancie uma nulidade por omissão de pronúncia.
Expliquemo-nos:
A sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar. Esta nulidade a que alude a alínea d), do artigo 615.º, do C.P.C. está diretamente relacionada com o disposto no n.º 2, do artigo 608.º do mesmo Código, ou seja, <<o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)>>, sendo certo, no entanto, que existem outras de conhecimento oficioso que não necessitam de ser suscitadas no decurso do processo.
Ora, a Ré recorrente, à semelhança do que ocorreu quanto aos rendimentos de trabalho nada alegou, nem se apurou qualquer facto relativamente à atribuição à A. de subsídio de desemprego, razão pela qual, não estamos perante uma omissão de pronúncia nos termos supra enunciados geradora de nulidade da sentença.
Assim sendo, a sentença recorrida também, nesta parte, não sofre da arguida nulidade por omissão de pronúncia.
Pelo exposto, improcedem as nulidades invocadas pela recorrente.

2ª questão
- Da validade do termo aposto nos contratos celebrados entre a A. e a Ré
Antes de mais, cumpre dizer que o contrato de trabalho é, aliás, como os seus semelhantes, uma figura negocial privada, subordinada ao princípio da autonomia da vontade, seja na vertente genérica da liberdade de celebração, seja na cambiante, mais específica, da liberdade de conformação concreta. É também um negócio jurídico bilateral, nominado, típico, causal, oneroso e sinalagmático. É um contrato de execução continuada e – ainda hoje, intuitu personae.
De forma simplista, podemos afirmar que o contrato de trabalho, enquanto acordo vinculativo, tem como finalidade a troca da atividade, do serviço, da “força do trabalho” pela retribuição, dinheiro ou equivalente. Ambos os lados da troca são objeto do negócio mas é a atividade que especialmente caracteriza o vínculo.
O contrato de trabalho a termo resolutivo encontra-se hoje – tal como ao momento da contratação em referência - regulado nos artigos 139º a 146º do Cód. do Trabalho de 2009 (o artigo 142.º com a redação que lhe foi dada pela Lei n.º 23/2012 de 26/06).
Como é sabido, a relação de trabalho é uma relação duradoura ou, pelo menos, tendencialmente duradoura, na medida em que, na generalidade das situações, visa a satisfação de interesses duradouros de ambas as partes. Consequência disso, o contrato de trabalho, que origina tal relação laboral, é um contrato normalmente estabelecido por tempo indeterminado.
A estabilidade do emprego constitui um dos princípios basilares do moderno direito do trabalho (com tutela constitucional art.º 53º da C.R.P.) e essa estabilidade não depende somente da vigência de um regime jurídico da extinção do contrato de trabalho que retire à entidade patronal a liberdade de desvinculação sem justa causa (...) outrossim, da vigência de um regime jurídico que restrinja a liberdade da empresa em recorrer ao trabalho precário”. Por assim ser, apenas se admite a contratação a termo quando exista uma razão objetiva para limitar temporalmente a relação de trabalho; em consonância a nossa lei é exigente e, além de exigir essa razão, expressamente indica quais as situações em que aquela contratação é admissível.
O regime jurídico aplicável ao contrato a termo parte de uma ideia central: a contratação por tempo determinado só deve ser admitida para satisfazer necessidades de trabalho objetivamente temporárias, de duração incerta ou de política de emprego.
Em conformidade, o artigo 140.º, nº 1, do C.T. estabelece que <<o contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para a satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade>>, sendo que no nº 2 desse normativo se exemplificam algumas situações que se consideram necessidade temporária da empresa.
Por outro lado, <<sem prejuízo do disposto no n.º 1, só pode ser celebrado contrato de trabalho a termo incerto em situação referida em qualquer das alíneas a) a c) ou e) a h) do número anterior>> - n.º 3 do citado artigo 140.º, no que ao caso interessa, no caso de <<substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar>> - alínea a), do n.º 2, do mesmo normativo.
À satisfação de necessidade temporária da empresa acrescentou ainda a lei duas outras causas da contratação a termo certo:
- lançamento de nova atividade de duração incerta ou início de laboração de uma empresa ou estabelecimento e
- contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego, de desempregado de longa duração ou noutras situações previstas em legislação especial de política de emprego (cfr. nº 4 do art.º 140.º do CT).
O contrato a termo não só é formal, como está também na dependência de vários requisitos formais, cuja indicação se elenca no art.º 141.º do C.T..
Por fim,
<<1. Considera-se sem termo o contrato de trabalho:
a) Em que a estipulação de termo tenha por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem termo;
b) Celebrado fora dos casos previstos nos n.ºs 1, 3 ou 4 do artigo 140.º;
(…)>> - artigo 147.º, do C.T..
Voltando à questão suscitada pela Ré recorrente:
Alega a Ré recorrente que o facto da Recorrida prestar trabalho na área de charcutaria e na área de padaria da Loja não determinam que a Recorrente tenha pretendido com isso iludir as normas que regulamentam o contrato de trabalho sem termo, nem que a Recorrida tenha estado a substituir uma trabalhadora diversa da que vem mencionada no contrato de trabalho e cuja impossibilidade para trabalhar deu causa à contratação com termo incerto; que está em situação de primeiro emprego o trabalhador que nunca prestou atividade profissional ao abrigo de um contrato por tempo indeterminado e, ainda, que o conceito de trabalhador à procura de primeiro emprego, aplicável para efeito da admissibilidade dos contratos de trabalho a termo, não é sobreponível ao conceito de jovem à procura de primeiro emprego, que releva apenas para a definição do âmbito pessoal da concessão de apoios financeiros à criação de empresas ou novos projetos de trabalho.
Resulta da matéria de facto provada que em 31/03/2009, a Autora celebrou com a Ré um contrato de trabalho a termo incerto, conforme doc nº. 1, junto com a p.i., com efeitos a partir de 01/04/2009, em virtude de haver necessidade de se substituir a empregada D…; em 04/08/2009, a Autora acordou com a Ré um segundo contrato de trabalho a termo incerto, cujo conteúdo era, em tudo semelhante ao primeiro – cfr. doc nº. 2 – sendo que a única diferença consistia na pessoa a substituir que, neste caso, era a trabalhadora F…; em 08/12/2009, a Autora celebrou novo contrato de trabalho a termo incerto com a Ré para substituir a funcionária G… que se encontrava em situação de doença, licença de parto e férias – cfr doc nº. 3 - tendo este terceiro contrato durado até 4 de setembro de 2010 – cfr doc nº. 4; em 14/09/2010, a Autora celebra novo contrato de trabalho com a Ré, agora já a termo certo por 6 meses, sendo a justificação dada para o mesmo na afirmação de que a “Autora ter declarado estar em situação de procura do primeiro emprego” - cfr doc nº. 5, sucessivamente renovado até 15 de março de 2012; em 31/01/2012 foi assinado entre as partes um aditamento ao aludido contrato de trabalho, conforme doc. nº 6, cujo teor aqui se dá por reproduzido, junto com a pi. e fls. 71 a 73 com a contestação.
Mais se provou que na sequência do contrato aludido em A-), a autora acabou por substituir também a trabalhadora E…, que se encontrava de baixa, período em que exerceu funções inerentes à padaria; que na sequência do contrato aludido em C-), e antes da celebração do contrato aludido em D-), esteve a substituir a trabalhadora F… e, ainda na vigência desse primeiro contrato, regressou à padaria para cobrir funções da funcionária G…, que se encontrava de baixa médica por gravidez de risco; na assinatura do contrato aludido em E-) a autora foi colocada na charcutaria, onde, no decurso da vigência desse contrato, exerceu a sua atividade até final de abril de 2011, data a partir da qual passou a trabalhar na secção de padaria, para substituir uma colega, ausente por licença de parto, com problemas de saúde, para regressar ao seu primitivo setor de trabalho, a charcutaria, regressando depois novamente à secção de padaria, a fim de substituir outra colega e, no início de fevereiro de 2012, o Sr. H… comunicou à autora que a lei sobre contratos a termo tinha sido alterada em janeiro de 2012, pelo que, por força disso, a mesma só poderia manter-se na loja se assinasse um aditamento ao contrato, o que a autora, acreditando na boa fé daquele, que lhe havia assegurado que depois passaria a definitiva, assinou.
Por outro lado, consta da sentença recorrida o seguinte:
“Ora, da apreciação crítica e conjugada da prova, ressalta logo à saciedade que os fundamentos invocados para a celebração dos três primeiros contratos a termo incerto não têm integral correspondência com a realidade ocorrida, pois que não se limitou a autora a substituir a funcionária para que foi exclusivamente contratada substituir, tendo estado também, ainda na vigência de cada um deles, a suprir outras necessidade da loja, substituindo e/ou ajudando outros colaboradores. E não se diga que tais funcionárias são polivalentes, que fazem um pouco de tudo…. Os contratos celebrados não deixam dúvidas, a autora foi contratada para substituir a funcionária D… (na charcutaria, tendo substituído nesse período também a funcionária E…, na padaria), depois teria que substituir a funcionária F… (sendo que esteve também a substituir nesse período a funcionária G…) após teria que substituiu a G… (a quem já estava a substituir quando se iniciou o contrato)…
Tendo como certo que o que verdadeiramente interessa, para efeitos de substituição, é que o trabalhador contratado vá exercer as mesmas funções que o trabalhador substituído vinha prestando, forçoso se torna concluir que tal não ocorreu nos autos. Por isso mesmo, este comportamento da ré só pode quanto a nós significar – segundo as regras da experiência comum e juízos de normalidade – que ela usou a contratação a termo certo para suprir carências que não são esporádicas na empresa, mas permanentes, utilizando a autora, como se disse em julgamento, “para tapar buracos” de forma indiferenciada e sem obediência ao consignado nos contratos a termo celebrados (muito precisos, para substituir determinada funcionária, e não qualquer outra ou para cobrir qualquer necessidade extra da loja).
A ser assim, tendo as estipulações a termo sido colocadas com vista a iludir as disposições legais que regulam o contrato sem termo, o que nos cumpre concluir, então teriam de se considerar sem termo os aludidos contratos, que se iniciaram em 01/04/2009, data a partir da qual a autora, com pequenos hiatos, esteve sempre a trabalhar para a ré – cfr. art. 147º nº 1 al. a-) e 3 do CT.
Mas, mesmo que assim se não entendesse, sempre a conclusão do tribunal conduziria ao mesmo, por força celebração do último contrato, datado de 14/09/2010, a termo certo e por seis meses, pelo facto do motivo nele aposto não corresponder à verdade, tal qual defende a autora em sede de acção.
Senão vejamos.
Sustenta a autora que o contrato celebrado com a ré não apresenta um motivo justificativo válido para a sua celebração a termo, uma vez que não corresponde à verdade que estivesse à procura de 1º emprego, pois, como bem sabe a ré, trabalhava para a mesma já desde Abril/2009.
Diz a ré que a definição de trabalhador à procura de 1º emprego encontra-se ainda hoje definida no DL n.º 64-C/89, publicado no dia 27 de Fevereiro e ainda não revogado, que no seu art. 4º n.º 3 consigna que, “consideram-se em situação de primeiro emprego os trabalhadores que nunca tenham sido contratados por tempo indeterminado”. Dizendo ainda ser pacífica e unânime a Jurisprudência neste ponto, citando a propósito o Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 21/10/2002.
Apreciando.
No caso em apreço, o “contrato de trabalho a termo” outorgado entre a autora e ré tinha a seguinte cláusula de justificação do termo: «terceira: O presente contrato é celebrado pelo período de seis meses, tendo inicio em 15/09/2010 a termo em 15/03/2011 e é feito de acordo com o art. 140.º nº 4 al. a) do CT aprovado pela Lei n.º 7/2009 de 12/02, em virtude de corresponder à vontade das partes e o trabalhador ter declarado que se encontra em situação de procura de 1º emprego”.
Relativamente à justificação aposta no contrato em análise, verifica-se que a fórmula utilizada é suficientemente concretizadora, sendo que é a própria autora que declara naquele contrato que se encontra em situação de procura de 1º emprego, sabendo as partes que a autora trabalhava para a ré já desde 2009 a coberto de contratação a termo.
Vejamos então.
O Código do Trabalho permite que a contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego, seja um dos motivos justificativos da contratação de um trabalhador a termo resolutivo.
Trata-se de uma das situações em que o legislador admite que a contratação a termo se justifica ainda que nada tenha a ver com necessidades temporárias ou transitórias da empresa, mas, simplesmente, com o objectivo de criar condições para absorção de um maior volume de emprego.
Está fundamentalmente em causa nos autos saber se a autora era ou não, à data da celebração do contrato datado de 15/09/2010 uma trabalhadora à procura de primeiro emprego.
(…)
Como todos os ditos diplomas redundavam sempre no jovem que nunca antes tivesse trabalhado a coberto de um contrato sem termo, repetida e pacificamente o STJ dizia que o conceito de jovem à procura de primeiro emprego, contido nos diversos diplomas relacionados com a política de emprego e com a atribuição de subsídios com vista à criação de emprego, nada tinha que a ver com o conceito de trabalhador à procura de primeiro emprego plasmado no CT, tratando-se de conceitos que não eram sobreponíveis, dado exprimirem realidades diferentes. Segundo a jurisprudência uniforme do STJ, trabalhador à procura de primeiro emprego, para efeitos do disposto naquela disposição legal, seriam as pessoas que nunca foram contratadas para trabalhar por conta de outrem por tempo indeterminado, por ser esse o conceito de trabalhador à procura de primeiro emprego que constava da legislação vigente na data em que a LCCT entrou em vigor, sendo certo que esse conceito não fora alterado pela legislação relacionada com os incentivos à criação de emprego que posteriormente fora publicada (ver Acórdão STJ de 21/01/2006, documento n.º SJ200601120031384 in dgsi.pt).
Tal noção veio todavia a ser alterada. Veja-se que, por efeitos da Portaria nº 1191/2003 de 10 de Outubro, consideram-se jovens à procura do primeiro emprego os trabalhadores com idade compreendida entre os 16 e os 30 anos que se encontrem inscritos nos centros de emprego e que nunca tenham exercido uma actividade profissional cuja duração, seguida ou interpolada, ultrapasse os seis meses e, em sentido semelhante, a Portaria nº 196-A/2001, de 10 de Março, define jovens à procura do 1º emprego os trabalhadores, com idade compreendida entre os 16 e os 30 anos, que se encontrem inscritos nos centros de emprego e que nunca hajam prestado a sua actividade no quadro de uma relação de trabalho subordinado, cuja duração, seguida ou interpolada, ultrapasse os seis meses.
E posteriormente - em vigor à data da celebração do contrato de que aqui cuidamos - teremos então de reter a Portaria n.º 130/2009, de 30/01, que entrou em vigor em 31/01/2009, e que no seu artigo 3.º, números 1, alínea c) e 2, definia aquele como o «que se encontra inscrito em centro de emprego há mais de nove meses», não sendo «a qualificação como desempregado de longa duração (…) prejudicada pela celebração de contratos a termo ou trabalho independente, por período inferior a 6 meses, cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses.».
Esta Portaria n.º 130/2009, de 30/01 foi revogada pela Portaria n.º 125/2010, de 1/03 (com retificação através da Declaração de Retificação n.º 13/2009, de 10/02), que deixou de ter qualquer referência ou noção do «desempregado de longa duração», repondo aparentemente a inicial (sem trabalho há mais de 12 meses).
Distinta da referida noção era, pois, e como vemos, aquela em que se apoiava largamente a jurisprudência, pelo que teremos de acompanhar a alteração da referência interpretativa de trabalhador à procura de primeiro emprego, deixando de lado a posição nos termos da qual o trabalhador à procura de primeiro emprego seria aquele que nunca tinha sido titular de um contrato de trabalho por tempo indeterminado, adoptando um conceito mais restrito, na linha, aliás, do que vem sendo a tendência jurisprudencial.
Com efeito, levando em consideração as alterações legislativas operadas, e ao que ao caso agora interessa, o trabalhador à procura de 1º emprego será aquele que não exerceu anteriormente actividade profissional subordinada ou autónoma, por período de há mais de 12 meses.
Concluímos assim que trabalhador à procura de primeiro emprego, no conceito constante na al. b), do nº4, do art. 140º, do Código do Trabalho, à data da celebração do contrato em causa, deverá considerar-se aquele que nunca haja prestado a sua actividade no quadro de uma relação de trabalho subordinado, de duração inferior a 12 meses. Não esqueçamos pois que, à data da contratação de que aqui cuidamos, os citados diplomas dispõem sobre o que se considera “desempregados de longa duração”, entendendo como tal os que estejam desempregados há mais de 12 meses, mas prevendo, no entanto e também, situações de prestação de trabalho que não afectam a qualificação de “desempregado de longa duração”.
Perante um tal conceito, tendo a autora trabalhado para a ré durante os 12 meses anteriores (de 01 de Abril de 2009 a 15/09/2010, data da celebração do aqui em causa), aquando dessa celebração a autora já não poderia ser considerada uma trabalhadora à procura de primeiro emprego.
Com efeito, considerando-se, que, por um lado, a autora não estava à procura de um primeiro emprego – estava já a trabalhar para a ré desde Abril/2009, ainda que em regime de contratação a termo – não integrando ela também o conceito de desempregada – que, como vimos, eram aqueles que estavam desempregados há mais de 12 meses – tal significa que o contrato de trabalho celebrado pelas partes a pretexto de trabalhadora à procura de 1º emprego, nunca poderia ser considerado como tal.
Nem tal, decorre, quanto a nós, do nº 3º nº 2, da Portaria 130/2009, de 30.01, pois que ai se estipula apenas que a qualificação de situação de desemprego de longa duração não é prejudicada pela celebração de contratos de trabalho inferior a 6 meses cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses, pois que no caso dos autos os contratos da autora, no seu total, ultrapassarem aqueles ditos 12 meses.
Ou seja, a celebração do contrato datado de 14/09/2010 e sua posterior renovação está em oposição com as normas do CT (veja-se, neste sentido, o Ac. da Relação do Porto de 11/07/2012, publicado na DGSI).
Sendo assim, e em conclusão, tanto pela via da ilicitude dos contratos a termo incerto como pela da ilicitude do último contrato a termo certo, forçoso se torna então concluir e considerar sem termo o contrato de trabalho firmado com a autora, que, deste modo, cessou de forma ilícita, dado a caducidade invocada pela ré para os mesmos não constituir um meio legal de pôr um fim à relação laboral de índole permanente que emerge daquele negócio, configurando-se, por isso, como um despedimento sem processo disciplinar e sem justa causa, nem suportado em qualquer conduta culposa, ilícita e grave da trabalhadora (cfr. artigos 340.º, 344.º, 351.º a 358.º, 381.º, 382.º, 387.º, 389.º a 392.º do Código do Trabalho).”
*
Apreciando, vejamos, então se assiste razão à recorrente.
Os contratos de trabalho a termo incerto:
Como já referimos, o contrato de trabalho a termo incerto pode ser celebrado para substituição direta ou indireta de trabalhador ausente que se encontra temporariamente impedido de trabalhar (artigo 140.º, n.º 2, a) e n.º 3, do C.T.).
Por outro lado, os três contratos de trabalho a termo incerto celebrados entre a A. e a Ré tiveram como fundamento, o primeiro, a necessidade de substituir a empregada D… que se encontrava em situação de licença de parto; o segundo, a necessidade de substituir a trabalhadora F… que se encontrava em licença de parto e, o terceiro, para substituir a funcionária G… que se encontrava em situação de doença, licença de parto e férias, tendo a A. sido admitida como operadora ajudante 1º ano. No entanto, apurou-se, ainda, que na sequência do primeiro contrato a A. acabou por substituir também a trabalhadora E… que se encontrava de baixa, exercendo funções inerentes à padaria; na sequência do segundo e antes da celebração do terceiro, esteve a substituir a trabalhadora F… e, ainda, a funcionária G… que se encontrava de baixa médica por gravidez de risco, regressando à padaria.
Resulta da matéria de facto apurada que a A. foi contratada a termo incerto para substituir as trabalhadoras identificadas nos respetivos contratos, substituição que ocorreu. Acontece que, além das trabalhadoras identificadas nos mesmos, a A. substituiu, ainda, outras trabalhadoras.
O contrato de trabalho a termo deve conter, além do mais, a indicação do respetivo motivo justificativo com menção expressa dos factos que o integram (artigo 141.º, n.º 1, e) e n.º 3, do C.T.), formalidade “ad substantiam”, prevista, desde logo, para que o tribunal possa exercer o controlo sobre a sua veracidade.
Ora, se é certo que a A. substituiu as trabalhadoras identificadas nos contratos, a sua prestação não se ficou por aí pois acabou por substituir outras no âmbito dos respetivos contratos, o que significa que os motivos justificativos não correspondem totalmente à realidade, pese embora se desconheça porque razão a A. foi substituir outra trabalhadora bem como o que ocorreu com a substituição anterior para a qual tinha sido contratada.
Acresce que, não resulta dos contratos em análise quais as funções exercidas pelas trabalhadoras substituídas pela A..
Assim sendo, tendo a A. substituído outras trabalhadoras no âmbito e para além das indicadas nos 1º e 2º contratos e desconhecendo-se as funções exercidas pelas ausentes substituídas, temos de concluir que os motivos justificativos não são totalmente verdadeiros e, consequentemente, os contratos a termo incerto celebrados entre a A. e a Ré, entre 01/04/2009 e 04/09/2010, consideram-se sem termo pois foram celebrados fora dos casos previstos no n.º 3, do artigo 140.º - (n.º 1, b), do artigo 147.º, do C.T.).
O contrato a termo certo
Resulta da matéria de facto apurada que em 14/09/2010, a Autora celebra novo contrato de trabalho com a Ré, agora a termo certo por 6 meses, sendo a justificação dada para o mesmo na afirmação de que a “Autora ter declarado estar em situação de procura do primeiro emprego” – cfr. doc. nº 5, sendo-lhe atribuída a categoria profissional de operadora ajudante do 1º ano, contrato de trabalho sucessivamente renovado até 15 de março de 2012.
Acontece que, a apreciação em concreto da celebração deste contrato afigura-se-nos desnecessária por prejudicada.
Na verdade, conforme ficou decidido no conhecimento da anterior questão, entre 01/04/2009 e 04/09/2010 a A. prestou o seu trabalho para a Ré ao abrigo de um contrato por tempo indeterminado, visto que os contratos a termo incerto foram considerados sem termo, razão pela qual, esta contratação a termo por seis meses não tem qualquer eficácia.
Quando a A. e a Ré, em 14/09/2010, celebram o contrato a termo certo por seis meses, renovado até 15/03/2012, já a A. se encontrava (com a envolvência dos efeitos retroativos da decisão judicial da 1ª instância e que esta, como se verá, irá confirmar) a desenvolver a sua prestação de trabalho no âmbito de uma relação de trabalho por tempo indeterminado sendo, assim, aquele, completamente irrelevante (tal como, de resto, os dois anteriores).
Concluindo, encontrando-se a A. a prestar o seu trabalho para a Ré ao abrigo de um contrato de trabalho sem termo, quando em 27/08/2012 esta lhe comunica que o seu contrato caducaria no dia 15/09/2012, tal comunicação consubstancia um despedimento ilícito tal como consta da sentença recorrida e com os efeitos definidos na mesma.
Desta forma, não assiste razão à Ré recorrente.
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Improcedem, assim, todas as conclusões formuladas pela recorrente, impondo-se a manutenção da sentença recorrida, devendo, no entanto, ser deduzido às retribuições que a A. deixou de auferir, o subsídio de desemprego que lhe tenha sido atribuído.
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IV – Sumário[8]
1. Tendo em conta a natureza especial das normas do C.P.T., não resultando da Lei n.º 41/2013 de 26/06 qualquer indício de que foi intenção do legislador proceder à revogação das normas que regulam a gravação da audiência em processo laboral e face ao disposto no artigo 68.º, do C.P.T., não existe qualquer lacuna neste mas sim uma norma concreta que regula a gravação da audiência, norma esta que se encontra em vigor pois não foi revogada nem expressa nem tacitamente pela citada Lei.
2. O contrato de trabalho a termo incerto pode ser celebrado para substituição direta ou indireta de trabalhador ausente que se encontra temporariamente impedido de trabalhar (artigo 140.º, n.º 2, a) e n.º 3, do C.T.).
3. Se a A. substituiu as trabalhadoras identificadas nos respetivos contratos, dos quais não resultam as funções exercidas pelas mesmas e a sua prestação não se ficou por aí, acabando por substituir outras no âmbito dos mesmos, tal significa que os motivos justificativos não correspondem totalmente à realidade e, consequentemente, os contratos a termo incerto celebrados entre a A. e a Ré consideram-se sem termo, pois foram celebrados fora dos casos previstos no n.º 3, do artigo 140.º - (n.º 1, b), do artigo 147.º, do C.T.).
4. O contrato a termo certo por seis meses celebrado entre a A. e a Ré, em 14/09/2010, quando a A. já se encontrava a desenvolver a sua prestação de trabalho no âmbito de uma relação de trabalho por tempo indeterminado, é completamente irrelevante, não tem qualquer eficácia.
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V - DECISÃO
Nestes termos, sem outras considerações acorda-se:
1-) em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida, devendo ser deduzido às retribuições que a A. deixou de auferir, o subsídio de desemprego que lhe tenha sido atribuído.
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Custas a cargo da Ré recorrente.
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Porto, 2015/04/13
Paula Maria Roberto
Fernanda Soares
Domingos Morais
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[1] Aplicável ao presente processo por força do disposto no n.º 1, do artigo 5.º da Lei n.º 41/2013 de 26/06.
[2] Abílio Neto, Código de Processo do Trabalho anotado, 4.ª edição, Janeiro de 2010, Ediforum, pág. 28.
[3] O Direito, Introdução e Teoria Geral, pág. 259.
[4] Neste sentido, pese embora com referência às normas que regulam os recursos, cfr. Abrantes Geraldes, “A reforma dos Recursos”, in Prontuário de Direito do Trabalho n.ºs 74-75, pág.
[5] Neste sentido, entre outros, os acórdãos desta Relação de 09/07/2014 e de 17/11/2014, ambos disponíveis em www.dgsi.pt e do STJ de 24/09/2003, Rec. n.º 1199/01 – 4ª, Sumários, setembro de 2003; de 12/07/2007 e de 10/07/2008, ambos disponíveis em www.dgsi.pt..
[6] Entre outros, os acórdãos de 19/03/2007 e de 09/07/2014, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
[7] Contrato de Trabalho à luz do novo Código do Trabalho, Coimbra Editora, 2009, págs. 407 e 408.
[8] O sumário é da exclusiva responsabilidade da relatora.