Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1604/10.9TTPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANTÓNIO JOSÉ RAMOS
Descritores: FUNDO DE PENSÕES
CONTRATO DE ADESÃO
Nº do Documento: RP201407091604/10.9TTPRT.P1
Data do Acordão: 07/09/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I – É válida a cláusula inserta no Regulamento do Plano de Pensões em que se estatui que: “Se o contrato de trabalho com a Associada cessar antes da sua caducidade por reforma ou falecimento, o participante perderá o direito a qualquer prestação ao abrigo deste Plano de Pensões”.
II - Não é de qualificar como contrato de adesão, o acordo de cessação do contrato de trabalho em que as cláusulas que integram o acordo de vontades formado entre as partes quanto aos efeitos característicos essenciais do negócio jurídico (extinção do vínculo juslaboral e pagamento ao trabalhador de uma compensação pecuniária pelo fim do contrato) foram objecto de expressa declaração de aceitação por parte do trabalhador, previamente à sua elaboração, tendo este, nessa medida e por essa via, a possibilidade de influir na determinação do conteúdo essencial daquele acordo.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO

PROCESSO Nº 1604/10.9TTPRT.P1
RG 399

RELATOR: ANTÓNIO JOSÉ ASCENSÃO RAMOS
1º ADJUNTO: DES. EDUARDO PETERSEN SILVA
2º ADJUNTO: DES. PAULA MARIA ROBERTO

PARTES:
RECORRENTE: B…, COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.
RECORRIDO: C…
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Acordam os Juízes que compõem a Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
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I – RELATÓRIO
1.
1º - D…, casado e residente na Rua …, nº …, ….-… Porto, com o NIF ………..;
2º - E…, casado e residente na …, …, ….-… Penafiel com o NIF ………..;
3º - F…, casado e residente na Rua …, nº .., ….-… Maia, com o NIF ………;
4º - G…, casado e residente no …, .., …, Cinfães, ….-…, com o NIF ……….;
5º - H…, casado e residente na Rua …, .., ….-… …, com o NIF ………;
6º - I…, casado e residente na Rua … nº …, …, ….-…, com o NIF ……….;
7º - J…, casado e residente na Rua …, nº …, …, …, ….-… Cinfães, com o NIF ………;
8º - K…, casado e residente na …, nº .., ….-… …, com o NIF ……….;
9º - L…, casado e residente na Rua … …, ….-… Maia com o NIF ………;
10º - M…, casado e residente na Rua …, …, ….-… …, com o NIF ………;
11º - N…, casado e residente na Rua …, …, …, ….-… Marco de Canaveses, com o NIF ………;
12º - O…, casado e residente na Rua …, nº .., …, ….-… Maia, com o NIF ………;
13º - P…, casado e residente na …, nº .., …-… Porto, com o NIF ………;
14º - Q…, casada e residente no …, .., …. Maia com o NIF ………;
15º - S…, casado e residente na …, …, ….-… Cinfães, com o NIF ………;
16º - T…, casado e residente na …, …., .º Direito, ….-… Maia, com o NIF ………;
17º - U…, casado e residente na …, nº .., .º C, ….-… …, com o NIF ………;
18º- V…, casado e residente na Rua …, nº .., .º …, com o NIF ………;
19º - W…, casado e residente na Rua …, …, rés-do-chão, ….-… Gondomar, com o NIF ………;
20º - X…, casado e residente na …, …, ….-…, …, com o NIF ………;
21º - Y…, viúva, e residente na Rua …, …, .º ….-… Porto, com o NIF ………;
22º - Z…, casado e residente na Rua …, …, ….-… … com o NIF ………;
23º - AB…, casado e residente na Rua …, …., …. – …, …, com o NIF ………;
24º- AC…, casado e residente na Rua … nº …., ….-… …, BCL com o NIF ………;
25 º - AD…, casado e residente na Rua …, …, …, ….-… Matosinhos, com o NIF ………;
26º - AE…, casado e residente na Rua …, …, ….-… Maia, com o NIF ………;
27º - AF…, casado e residente na Rua …, nº .., .º Direito, Trás. ….-… …, com o NIF ………;
28º - AG…, casado e residente em …, …, ….-… …, com o NIF ………;
29º - AH…, casado e residente na Rua …, …, ….-… …, com o NIF ………, e
30º - AI…, casado e residente na Rua …, .., .º, Hb.., ….-… Porto, com o NIF ………,
Intentaram no Tribunal do Trabalho do Porto, a presente acção declarativa, com processo comum contra:
1º - AJ…, S.A., com sede em …, Matosinhos como NIPC ………;
2º - AK…, S.A., com sede na Rua … nº…, pedindo que a acção seja julgada procedente, por provada, e as Rés condenadas a:
- reconhecer o direito dos AA. ao recebimento das pensões devidas a título de complemento de reforma emergente do Fundo de Pensões, assim como outras regalias sociais emergentes desse contrato celebrado entre as 1ª e 2ª RR., retidas abusivamente, e de acordo com os valores que vierem a ser fixados depois dos elementos a fornecer pelas RR.
- pagar solidariamente a cada um dos AA o valor que vier a ser reconhecido, acrescido de juros demora à taxa legal aplicável, tudo a liquidar, por cada Autor, em execução de sentença, nos termos do artigo 308º, nº 4 do CPC, uma vez que a fórmula de cálculo contém incógnitas cujos valores somente as RR podem fornecer.
Para o efeito, alegaram, em síntese, que foram admitidos pela primeira ré, mediante contrato de trabalho, nas datas que indicam, e contratos de trabalho esses que cessaram por acordo, também nas datas que são indicadas, após um processo de despedimento colectivo e na sequência de negociações da iniciativa da empregadora e por imposição de profundas medidas de reestruturação e reorganização do serviço.
A primeira ré elaborou e distribuiu por Ordem de Serviço um Regulamento de Fundo de Pensões que teve o seu início em 01 de Janeiro de 1982, sendo que os direitos emergentes desse Regulamento passaram a ficar integrados no contrato individual de trabalho de cada um dos autores; o primeiro “Fundo de Pensões AJ…” foi constituído por escritura de14/12/1987, tendo sido alterado por escrituras de 16/12/1988 e de 19/12/1990, e por documentos particulares de 31/12/1996 e 15/5/2001, tendo o último título constitutivo do Fundo de Pensões sido publicado no DR, 3.ª Série, de 02/07/2003; os autores tinham à data da cessação do respectivo contrato de trabalho uma antiguidade superior a cinco anos, pelo que nos termos previstos no seu Regulamento são todos beneficiários do Fundo.
Acontece que os autores entretanto reformaram-se, especificando também a data da respectiva reforma, mas as rés não pagaram nem vêm pagando as pensões devidas a título de complemento de reforma emergente do Fundo de Pensões, nem pagaram aos autores qualquer quantia a título de reservas matemáticas, sendo que, no entanto, as rés passaram a pagar regularmente os complementos de reforma e as reservas matemáticas aos trabalhadores cujos contratos de trabalho cessaram depois de Abril de 2008.
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2.
Ambas as Rés apresentaram contestação.
2.1
A ré, AJ…, S.A., pugnou pela improcedência da acção, porquanto, e defendendo-se quer por excepção – da ilegitimidade passiva, da incompetência do Tribunal em razão da matéria, da prescrição dos créditos alegados pelos autores, da presunção de liquidação de todos os créditos alegados pelos autores e renúncia (abdicativa) a quaisquer outros direitos ou créditos por parte dos autores – quer por impugnação, tanto por negação como de forma motivada – conquanto tenha aceitado grande parte da factualidade alegada pelos autores, v.g. quanto a terem-se verificado as invocadas relações laborais e ao facto de terem terminado por acordos de revogação dos respectivos contratos de trabalho -, o Fundo de Pensões AJ… resultou de um acto unilateral da Empresa, nunca intervieram, quer no contrato constitutivo quer nas sucessivas formulações, nenhum dos autores nem nenhuma entidade que os representasse, o Plano de Pensões configurado e regulado no contrato constitutivo do Fundo de Pensões e as sucessivas formulações aplicáveis no caso excluem expressamente do acesso a qualquer das prestações previstas no respectivo Plano de Pensões os trabalhadores cujos contratos de trabalho tenham cessado antes da respectiva reforma, como sucedeu na situação em apreço, e para o caso de tudo assim se não entender o único responsável pela satisfação dos créditos dos autores seria o próprio Fundo de Pensões AJ….
2.2.
A Ré AK…, S.A, apresentou contestação, defendendo-se, na mesma linha da sua co-ré, deduzindo a excepção dilatória da sua ilegitimidade para a acção, da incompetência do Tribunal em razão da matéria, da prescrição, da presunção de cumprimento, e da renúncia, impugnando também, por alegado desconhecimento, parte da matéria alegada pelos autores, v.g. no que tange às “condições de admissão e execução dos contratos de trabalho invocados pelos autores, bem como as condições, pressupostos e razão da sua celebração, suspensão, cessação e da passagem à situação de reforma, de todos os A.A.”, e alegando, por sua vez, matéria, nomeadamente reportada ao contrato constitutivo do Fundo de Pensões e às suas reformulações, tendente a demonstrar a sem razão dos autores, argumentando, em essência, no mesmo plano que a primeira ré.
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3.
Na resposta às contestações apresentadas pelas Rés os Autores contrariando as deduzidas excepções e reafirmando, em suma, a posição já vertida na petição inicial.
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4.
Foi proferido despacho a mandar citar, ao abrigo do artigo 27.º, al. a), do CPT, o Fundo de Pensões AJ…, para intervir, querendo, e como parte principal, nos autos.
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5.
O FUNDO DE PENSÕES AJ… veio apresentar articulado próprio, deduzindo também defesa por excepção – excepção dilatória da incompetência absoluta do Tribunal, excepção da prescrição, excepção da presunção de cumprimento e excepção da renúncia – e no mais tomando uma posição muito semelhante aquela que expendeu a segunda ré na sua contestação, concluindo pela sem razão dos autores e pugnando pela improcedência da acção.
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6.
Responderam os autores, uma vez mais opondo-se às excepções deduzidas, e reclamando ter a razão do seu lado quanto ao pedido que fazem, enfatizando que a cessação do respectivo contrato de trabalho não lhes é imputável.
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7.
Realizou-se uma audiência preliminar, no âmbito da qual elaborou-se despacho saneador, conhecendo-se então das excepções, dilatórias, da incompetência do Tribunal em razão da matéria e ilegitimidade, que foram declaradas improcedentes, julgando-se verificados os necessários pressupostos processuais.
Conheceu-se também da excepção, peremptória, da prescrição, que igualmente se julgou improcedente.
Foi dispensada a selecção da matéria de facto assente e a organização da base instrutória.
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8.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal.
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9.
Foi proferida sentença, cuja parte decisória tem o seguinte conteúdo:
“Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgo improcedente a presente acção, absolvendo as rés, AJ…, SA, e AK…, SA, e a interveniente, Fundo de Pensões AJ…, do pedido.
Custas pelos autores.
Registe e notifique.”
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10.
Inconformados com esta decisão dela recorremos Autores, tendo formulado as seguintes conclusões:
1.
Os AA. na presente acção pretendem ver-lhes reconhecido o direito a Pensão complementar de reforma.
2.
A sentença em apreço nega-lhes tal direito com fundamento no teor de uma cláusula inserta em contrato de seguro que veio a ser celebrado entre as Rés com a seguinte redacção:
“Se um participante deixar de estar ao serviço da associada antes da reforma, perderá o direito a qualquer prestação ao abrigo deste plano de pensões”
3.
Por isso, a questão a dilucidar é a da validade ou invalidade desta cláusula transcrita nos números 23,24,26 e 27 dos factos.
Da economia do processo, resulta inquestionável que:
4.
Constituiu-se e manteve-se por mais de vinte e cinco anos na esfera jurídica de cada um dos Autores, integrando o respectivo contrato de trabalho, o direito a receberem, aquando da respectiva passagem à reforma, uma pensão complementar desta, instituída pela OS-../81.
5.
Para garantia desse direito, que passou a integrar a contrapartida da empresa pela prestação do trabalho de cada um dos Autores e demais seus trabalhadores, a AJ… afectou as verbas adequadas para obtenção das quais cada um dos Autores foi contribuindo com o seu trabalho, enquanto elemento da organização da empresa.
6.
Assim, o direito ao complemento de reforma dos autores e demais trabalhadores da AJ… não nasceria, ex novo, e como que por geração espontânea, no momento da respectiva reforma, antes se iniciou em 31 de Dezembro de 1981, aquando da ordem de serviço referida em 5) dos factos, se densificou ao longo da posterior vigência dos contratos de trabalho, com as contribuições pecuniárias da AJ… e a prestação laboral dos autores, atingindo a sua completude no momento da reforma.
7.
A quota-parte dessas verbas que seria destinada à pensão complementar de reforma de cada um dos Autores, não sendo afectada ao fim a que se destinava, será indevidamente apropriada por quem a ela não tem direito, num claro procedimento de enriquecimento sem causa, uma vez que dos autos não pode resultar que tal constituiu uma liberalidade dos trabalhadores a favor de qualquer uma das Rés - nº2 do artigo 863 do C.Civil.
8.
Apesar de repetidas solicitações dos Autores nestes autos para que as Rés explicassem o destino dessas verbas – afectas regularmente desde1981- as Rés não quiseram fazê-lo.
9.
Não restam dúvidas, portanto, que foram sendo constituídos, e por isso existem, fundos para pagar o complemento de pensão a cada um dos Autores e esses fundos encontram-se indevidamente na posse das Rés, que dessa forma, e sem causa, enriqueceram com o facto de a AJ… ter promovido a cessação dos contratos de trabalho de cada um dos Autores.
10.
O facto de, a partir de certo momento – 20 de Abril de 2008-, a AJ… passar a entregar a cada trabalhador, que viu o seu contrato de trabalho cessar rigorosamente nas mesmas circunstâncias dos Autores, importância relativa ao que designam por “reservas matemáticas”demonstra bem que as Rés se apropriaram de forma indevida, de valor com que os Autores com o seu trabalho e a AJ… foram alimentando o fundo.
11.
Quantias que já existiam no fundo para garantir o respectivo complemento de reforma no momento da cessação do contrato de cada um dos AA.
12.
Pela Ordem de Serviço “OS-../81” de 31-12-1981 a Ré AJ… atribuiu aos seus trabalhadores o direito a um complemento de reforma.
13.
Para garantir o respectivo pagamento a AJ… afectou adequada importância pecuniária, que como resulta dos autos, proveio também de valores não pagos ao fisco por se destinarem à dotação de um sistema de pensões complementares de reforma.
14.
Mais tarde, em 14-12-1987, veio para o mesmo efeito, a constituir o “fundo de pensões AJ…”.
15.
Quer a ordem de serviço, quer o fundo de pensões, quer o contrato de seguro celebrado entre a AJ… e o AK…, são instrumento sem cuja elaboração os Autores, directamente, ou através dos seus representantes, não tiveram qualquer intervenção nem foram ouvidos para a respectiva elaboração.
16.
Os Autores apenas tomaram conhecimento que passavam a ter direito a uma pensão complementar de reforma, direito que dessa forma ingressou no âmbito e extensão do conteúdo do contrato individual de trabalho de cada um.
17.
Estamos perante uma cláusula contratual geral, inserta num contrato de seguro – a favor de terceiros - elaborada sem prévia negociação individual e cujo conteúdo os autores não só não puderam influenciar, como nem sequer sobre ele foram directa ou indirectamente ouvidos.
18.
Por isso, era inafastável dever, imposto pelo mais elementar princípio da boa-fé, que a Ré houvesse, com clareza, instruído os Autores de todas as consequências que o acordo de cessação do contrato de trabalho implicaria.
19.
Não o tendo feito – e sendo claro que os AA. não intervieram na celebração desses contratos mas até por isso, devem prevalecer-se da protecção da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais – verifica-se a impossibilidade da remissão abdicativa, até porque esse direito não havia atingido ainda a sua completude no momento da cessação do contrato de trabalho.
20.
Nem o texto da cláusula faz a menor referência a tal abdicação que sempre teria de ter ali a mínima correspondência.
21.
O regime jurídico das CCG impõe a observância de requisitos formais e materiais, concordantes com os princípios da boa-fé, da proibição do abuso do direito e da protecção da parte mais fraca, funcionando o princípio da boa fé como estruturante de todo o regime legal e as cláusulas proibidas como manifestações ou concretizações desse princípio.
22.
A referida cláusula ao excluir totalmente o direito à pensão complementar de reforma aos trabalhadores cujo contrato de trabalho cesse antes da reforma, não é justificada, não respeita os princípios da Boa-fé, da Confiança, da Lealdade, nem o principio da irredutibilidade da retribuição - nºs 2 e 3 do artigo 258 e nº1 alínea d) do 129 do Código de Trabalho, como não respeita o principio da equivalência das prestações.
23.
O regime jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais é indiscutivelmente de aplicar a qualquer terceiro que possa beneficiar da existência e validade de um contrato de seguro e privilegiar-se da sua protecção contra cláusulas inválidas ou abusivas.
24.
Assim:
a) As Rés fixaram e determinaram autoritária e unilateralmente o conteúdo da cláusula em análise e as circunstâncias em que a mesma opera
b) E a Ré AJ… tem e teve o poder de colocar qualquer seu trabalhador na situação de abrangido pela referida cláusula de exclusão total, nomeadamente - como fez com os Autores após mais de 30 anos de trabalho e a menos de 30 meses da reforma – fazendo cessar os respectivos contratos de trabalho no âmbito de processos de reestruturação empresarial e consequente redução de postos de trabalho, e negando-lhes qualquer prestação emergente daquele direito para o qual contribuíram desde 1981.
25.
A cláusula contratual que pretende com a sua literalidade estrita excluir o direito dos trabalhadores à pensão complementar de reforma “se o contrato de trabalho cessar antes da sua caducidade por reforma ou falecimento” é NULA por violação do disposto na alínea a) do art.16º e alíneas a) e b) do artigo 21 do DL 446/85 de 25 de Outubro comas alterações introduzidas até ao DL nº 249/99, de 7 de Julho, e sempre o seria por aplicação directa das normas ínsitas nos artigos227 e 762 nº2 do C.C. que erigem o Principio da Boa-fé como estruturante de todo o direito das obrigações.
26.
A sentença recorrida ao decidir como decidiu conforma-se claramente com uma solução que constitui indiscutível abuso de direito desde logo porque frustra o fim económico e social do direito dos AA. Àpcr.
Sem prescindir,
27.
Se este não for o entendimento de Vossas Excelências então as Rés devem ser condenadas a pagar a cada um dos Autores a importância do Fundo afecta a garantir o respectivo complemento de reforma, sob pena de tal importância ser indevidamente apropriada por quem criou condições para que os autores dela não beneficiassem o que também resultaria da previsão da “redução” definida no art. 14º DL 446/85, de25 de Outubro.
Termos em que, deve ser revogada a decisão constante da sentença em análise porquanto esta fez menos correcta aplicação das normas legais citadas, nos artigos227, 762 nº2 e 334 do Código Civil; na alínea a) do art.16º e alíneas a) e b) do artigo 21 e 14 do DL 446/85 de25 de Outubro com as alterações introduzidas até ao DL nº 249/99, de 7 de Julho, e ainda nos nºs 2 e 3 do artigo258 e nº1 alínea d) do 129 do Código de Trabalho e, Substituída por Acórdão que, na obediência a estes preceitos declare a Invalidade Total da cláusula transcrita supra sob o nº2 das Conclusões e, no reconhecimento do invocado sob a conclusão 6ª, julgue procedente o pedido dos Autores, Ou, pelo menos, dê procedência ao pedido formulado supra sob a conclusão 27ª.
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11.
As Rés apresentaram contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido e pela improcedência do recurso.
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12.
A Ex.ª Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta deu o seu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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13.
Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II – QUESTÕES A DECIDIR
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da recorrente (artigos 653º, nº 3 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil), não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, temos que as questões a decidir são as seguintes:
1ª – A CLÁUSULA CONTRATUAL QUE PRETENDE EXCLUIR O DIREITO DOS TRABALHADORES À PENSÃO COMPLEMENTAR DE REFORMA -“ SE O CONTRATO DE TRABALHO CESSAR ANTES DA SUA CADUCIDADE POR REFORMA OU FALECIMENTO O PARTICIPANTE PERDERÁ O DIREITO A QUALQUER PRESTAÇÃO AO ABRIGO DESTE PLANO DE PENSÕES” – É NULA, POR VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NA ALÍNEA A) DO ARTIGO 16º E ALÍNEAS A) E B) DO ARTIGO 21º DO DL 446/85, DE 25/10, COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELO DL 249/99, DE 07/07, E POR APLICAÇÃO DAS NORMAS DOS ARTIGOS 272º E 762º AMBOS DO CÓDIGO CIVIL, POR VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ.
2ª – IMPOSSIBILIDADE DE REMISSÃO ABDICATIVA, PORQUANTO ERA OBRIGAÇÃO DA ENTIDADE EMPREGADORA INSTRUIR OS RECORRENTES DE TODAS AS CONSEQUÊNCIAS QUE O ACORDO DE CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO IMPLICARIA.
3ª – CASO ASSIM SE NÃO ENTENDA, DEVERÃO AS RÉS SER CONDENADAS A PAGAR A CADA UM DOS AUTORES A IMPORTÂNCIA DO FUNDO AFECTA A GARANTIR O RESPECTIVO COMPLEMENTO DE REFORMA, SOB PENA DE INDEVIDA APROPRIAÇÃO, COMO RESULTA DO ARTIGO 14º DO DL 446/85, DE 25/10.
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III – FUNDAMENTOS
1.
SÃO OS SEGUINTES OS FACTOS QUE A SENTENÇA RECORRIDA DEU COMO PROVADOS E QUE NÃO FORAM OBJECTO DE QUALQUER IMPUGNAÇÃO:
1 - Os AA. foram admitidos pela 1ª Ré para trabalhar sob as suas ordens, direcção e orientação, mediante o pagamento de retribuição mensal, respectivamente, em:
- o 1º em 15/01/1974;
- o 2º em 8/5/1975 ;
- o 3º em 15/04/1974;
- o 4º em 22712/1980;
- o 5º em 7/04/1975;
- o 6º em 27/03/1972;
- o 7º em 10/03/1977;
- o 8º em 9/03/1977;
- o 9º em 26/11/1973;
- o 10º em 2/06/1970;
- o 11º em 21/05/1975;
- o 12º em 20/10/1964;
- o 13º em 16/06/1975;
- o 14º em 2/01/1973;
- o 15º em 5/02/1973;
- o 16º em 6/09/1971;
- o 17º em 16/08/1979;
- o 18º em 30/04/1974;
- o 19º em 9/04/1973;
- o 20º em 4/05/1971;
- o 21º em 29/01/1973;
- o 22º em 23/10/1975;
- o 23º em 10/03/1977;
- o 24º em 8/03/1971;
- o 25º em 3/06/1974;
- o 26º em 2/06/1975;
- o 27º em 8/04/1974;
- o 28º em 10/03/1977;
- o 29º em 7/05/1975;
- o 30º em 1/08/1972.
2 - Os contratos de trabalho entre os AA. e a 1ª Ré cessaram por acordo, no quadro de uma profunda reestruturação da AJ…, com a consequente e significativa redução do volume de emprego, em:
1- o 1º em 20/02/2006 quando detinha a categoria profissional de Técnico de Recursos Humanos e auferia o vencimento mensal de 999,98€;
2- o 2º em 3/11/2006 quando detinha a categoria profissional de Técnico Industrial e auferia o vencimento mensal de 1.024,77€;
3 – o 3º em 31/10/2006 com o categoria de Técnico de Máquinas e o vencimento mensal de 859,00€;
4 – o 4º em 15/12/2006 com a categoria de Técnico de Movimentação Logística com o vencimento mensal de 1 053,98€;
5 – o 5º em 31/10/2006, com a categoria de Técnico Industrial e o vencimento mensal de892,41€;
6 - o 6º em 31/50/2006 com a categoria de Responsável Equipa de Vendas com o vencimento mensal de 1 422,84€;
7 – o 7º em 3/11/2006 como Técnico Industrial com o vencimento de 958,16€;
8 – o 8º em 28/12/2006 com a categoria profissional de Técnico de Movimentação Logística e o vencimento mensal de 1 093,05€;
9 – o 9º em 27/12/2006 com a categoria profissional de Técnico de Movimentação Logística e o vencimento mensal de 940,68€;
10 – o 10º em 21/03/2006 com a categoria de Promotor de Vendas e o vencimento de992,54€;
11 – o 11º em 27/12/2006 quando tinha a categoria de Técnico de Movimentação e Logística e o vencimento mensal de 901,77€;
12 – o 12º em 3/11/2006 com a categoria profissional de Técnico de Manutenção Mecânica e o vencimento mensal de 1 140,73€;
13 – o 13º em 27/12/2006 com a categoria profissional de Técnico Administrativo e o vencimento mensal de 1 124,00€;
14 – o 14º em 26/12/2006 com a categoria profissional de Técnica Administrativa e o vencimento mensal de 1 613,73€;
15 – o 15º em 30/01/2006 com a categoria profissional de Técnico de Enchimento – … e o vencimento mensal de 979,64€;
16 – o 16º em 16/10/2006 com a categoria de Técnico Superior Industrial e o vencimento de 2081,00€;
17 – o 17º - em 26/12/2006 com a categoria profissional de Responsável Industrial e o vencimento mensal de 1558,03€;
18 – o 18º - em 27/12/2006 com a categoria profissional de Técnico de Movimentação e Logística e o vencimento mensal de 933,77€;
19 – o 19º - em 15/12/2006 como Responsável da Equipa de Vendas e o vencimento de 1353,98€;
20 – 20ª – em 27/12/2006 como Técnico Industrial e o vencimento mensal de 955,98€;
21 – o 21º - em 20/12/2006 como Técnica Administrativa e o vencimento mensal de 1088,03€;
22 – o 22º - em 31/10/2006 como Técnico da Fabricação e o vencimento mensal de 1182,22€;
23 – o 23º - em 27/12/2006 como Técnico de Movimentação de Logística e o vencimento mensal de 925,15€;
24 – 0 24º - em 23/1/2006 como Técnico Industrial e o vencimento mensal de 1123,80€;
25 – o 25º - em 27/12/2006 como Técnico de Movimentação e Logística e o vencimento mensal de 994,81€;
26- o 26º - em 27/12/2006 como Director de Atendimento e Back Office e o vencimento de 3.920,00€;
27 – o 27º - em 3/11/2006 como Técnico de Vendas e o vencimento mensal de 1140,88€;
28 – o 28º - em 30/11/2006 como Técnico de Movimentação e Logística e o vencimento mensal de 880,37€;
29 – o 29º - em 3/11/2006 como Técnico de Vendas e o vencimento mensal de 1176,94€;
30 – o 30º - em 3/11/2006 como Supervisor da Distribuição e o vencimento de 1161,48€.
3 - Os contratos de trabalho existentes entre os AA e a 1ª Ré cessaram, antes da respectiva reforma.
4 - As Rés não pagaram e não vêm pagando a cada um dos AA. Qualquer quantia a título de complemento de reforma emergente do Fundo de Pensões ou a título de reservas matemáticas.
5 - A 1ª Ré elaborou e divulgou a Ordem de Serviço – “OS-../81, que está datada de31/12/1981 e está junta de fls. 83 a 95 (doc. junto com a p.i. sob o nº 4), cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
6 - O primeiro “Fundo de Pensões AJ…” foi constituído por escritura de 14/12/1987lavrado a fls. 38 verso do Livro 68H de Notas do 8º Cartório Notarial de Lisboa escritura essa cuja cópia consta de fls. 96 a 105 (doc. junto com a p.i. sob o nº 5) e cujo conteúdo aqui se dá aqui por integralmente reproduzido.
7 - Por escritura lavrada no mesmo cartório aos 16/12/1988 foi alterado o título constitutivo nos seus pontos 3º, 4º e 15º, cujos termos foram aprovados pelo Instituto de Seguros de Portugal, e constante do Documento Complementar junto à escritura, conforme documento de fls. 106 a 117 (doc. junto com a p.i. sob o nº 6), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
8 - Este título foi mais uma vez alterado, no seu nº1 do ponto 4º, por escritura lavrada no Cartório Notarial da Maia aos 19 de Dezembro de 1990, nos termos do documento de fls.119 a 122 (Doc. 7 junto com a p.i.), conforme autorização do Instituto de Seguros de Portugal, e documento esse cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
9 - Entretanto, mediante escritura pública de fusão celebrada em 21 de Dezembro de2000 no 4º Cartório Notarial do Porto, a Sociedade AJ…, SA, pessoa colectiva nº ……… sucedeu em todos os seus direitos e obrigações à Sociedade AJ1…, SA PC ……… o que veio a constar da publicação no Diário da República, 3ª série em 2/7/2003.
10 - Em 01/05/2003 foi efectuada uma nova alteração ao contrato constitutivo daquele Fundo de Pensões, publicada no D.R. III Série de 02/7/2003, conforme documento junto de fls. 123 a 127 (doc. junto com a p.i. sob o nº 8), cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
11 - Os AA. tinham à data da cessação de cada contrato de trabalho uma antiguidade na 1ª Ré superior a cinco anos.
12 - Nos termos da cláusula 5ª da alteração ao contrato constitutivo do Fundo de Pensões efectuada em 01/05/2003 é “… objecto do Fundo garantir o pagamento das pensões de reforma por velhice, invalidez ou sobrevivência de acordo com o plano de pensões constante do anexo I ao título constitutivo publicado na III série do Diário da República nº150 de 2/7/2003.”
13 - Integrado no mesmo processo de reestruturação verificou-se a cessação dos contratos de trabalho de parte dos restantes trabalhadores da ré “AJ…”.
14 - Entre outros considerandos, no ponto 3 do Anexo a cada título de “Cessação de Contrato de Trabalho por Mútuo Acordo” diz-se o seguinte:
“De toda esta reestruturação resultou (e vai resultar) a desactivação e extinção de diversos postos de trabalho e consequente redução de efectivos, com o inevitável recurso à rescisão de contratos privilegiando, contudo, a Empresa a consensualização de acordos de cessação por mútuo acordo.
Todos estes factos são naturalmente alheios à vontade dos colaboradores abrangidos e decorrem, pois, das profundas mudanças e reorganizações operadas pela empresa”.
15 - As referidas circunstâncias – reestruturação e consequente redução do volume de emprego – podiam ter fundamentado, tal como no referido anexo expressamente se reconhece, formas de cessação decididas unilateralmente pelo Empregador (extinção de posto de trabalho ou despedimento colectivo).
16 - Não foi isso o que sucedeu com os AA.
17 - Nenhum deles foi abrangido por qualquer processo de despedimento colectivo.
18 - Em qualquer caso, a natureza objectiva das causas que levaram a cada um dos acordos de revogação justificaram que a consequente situação de desemprego dos AA. pudesse ser qualificada e reconhecida pela Segurança Social como de natureza involuntária.
19 - Os AA. tiveram, por isso, acesso ao Subsídio de Desemprego – que todos eles receberam.
20 - Para além disso, cada um deles, recebeu com a celebração do acordo de revogação, uma compensação pecuniária global, em conformidade com o expressamente regulado na Clª 3ª respectiva.
21 - Mais concretamente:
a) o 1º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 48.124,04 (doc. nº 3 – da contestação da 1.ª ré -, junto de fls 234 a 237 e aqui dado por integrado);
b) o 2º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 47.822,60 (doc. nº 4, junto de fls 238 a 241e aqui dado por integrado);
c) o 3º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 44.328,42 (doc. nº 5, junto de fls 242 a 245 e aqui dado por integrado);
d) o 4º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 39.963,00 (doc. nº 6, junto de fls 246 a 250 e aqui dado por integrado);
e) o 5º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 43.045,80 (doc. nº 7, junto de fls 251 a 254 e aqui dado por integrado);
f) o 6º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 74.391,19 (doc. nº 8, junto de fls 255 a fls 258 e aqui dado por integrado);
g) o 7º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 41.919,50 (doc. nº 9, junto de fls 259 a fls 262 e aqui dado por integrado);
h) o 8º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 47.820,93 (doc. nº 10, junto de fls 263 a fls 267 e aqui dado por integrado);
i) o 9º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 49.120,22 (doc. nº 11, junto de fls 268 a fls 272 e aqui dado por integrado);
j) o 10º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 54.732,30 (doc. nº 12, junto de fls 273 a fls 276 e aqui dado por integrado);
l) o 11º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 42.082,60 (doc. nº 13, junto de fls 277 a fls 281 e aqui dado por integrado);
m) o 12º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 75.994,97 (doc. nº 14, junto de fls 282 a fls 285 e aqui dado por integrado);
n) o 13º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 52.453,33 (doc. nº 15, junto de fls 286 a fls 290e aqui dado por integrado);
o) a 14ª A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 80.014,11 (doc. nº 16, junto de fls 291 a fls 295 e aqui dado por integrado);
p) o 15º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 47.145,18 (doc. nº 17, junto de fls 296 a fls 297 e aqui dado por integrado);
q) o 16º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 109.252,50 (doc. nº 18,junto de fls 298 a fls 301 e aqui dado por integrado);
r) o 17º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 65.901,33 (doc. nº 19, junto de fls 302 a fls 306 e aqui dado por integrado);
s) o 18º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 47.825,18 (doc. nº 20, junto de fls 307 a fls 311 e aqui dado por integrado);
t) o 19º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 67.134,84 (doc. nº 21, junto de fls 312 a fls 316 e aqui dado por integrado);
u) o 20º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 50.188,95 (doc. nº 22, junto de fls 317 a fls 321 e aqui dado por integrado);
v) a 21ª A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 53.948,00 (doc. nº 23, junto de fls 322 a fls 326 e aqui dado por integrado);
x) o 22º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 43.046,27 (doc. nº 24, junto de fls 327 a fls 330 e aqui dado por integrado);
z) o 23º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 40.475,31 (doc. nº 25, junto de fls 331 a fls 336 e aqui dado por integrado);
aa) o 24º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 57.360,63 (doc. nº 26,junto de fls 337 a fls 340 e aqui dado por integrado);
bb) o 25º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 47.875.23 (doc. nº 27,junto de fls 341 a fls 345 e aqui dado por integrado);
cc) o 26º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 231.591,00 (doc. nº 28,junto de fls 346 a fls 350 e aqui dado por integrado);
dd) o 27º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 54.904,85 (doc. nº 29,junto de fls 351 a fls 354 e aqui dado por integrado);
ee) o 28º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 38.516,00 (doc. nº 30,junto de fls 355 a fls 359 e aqui dado por integrado);
ff) o 29º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 54.923,87 (doc. nº 31, junto de fls 360 a fls 363 e aqui dado por integrado);
gg) o 30º A. recebeu, a título de compensação pecuniária global, € 59.692,20 (doc. nº 32,junto de fls 364 a fls 367 e aqui dado por integrado).
22 - A Clª 4ª de todos e cada um dos acordos de revogação em causa tem o mesmo teor:
“A compensação pecuniária referida na antecedente Clª 3ª será paga na data prevista na Clª 2ª,dando aqui o trabalhador integral quitação de todas as importâncias ou direitos por ele exigíveis emergentes da relação de trabalho”.
23 - O ponto 4.2.3. do Documento Complementar à escritura, de 14/12/1987, de constituição do Fundo de Pensões, contendo a regulamentação do Fundo de Pensões AJ…, sob a epígrafe “Cessação do Serviço antes da Reforma”, estabelecia o seguinte:
“Se um Participante deixar de estar ao serviço do Associado, antes da reforma, perderá o direito a qualquer indemnização ao abrigo deste Plano de Pensões”.
24 - No Documento Complementar relativo à escritura de alteração do Fundo de Pensões de 16/12/1988, continuou a consagrar-se o mesmo princípio:
“Se o contrato de trabalho com o Associado cessar antes da sua caducidade por reforma ou falecimento, o participante perderá o direito a qualquer indemnização ao abrigo deste Plano de Pensões”.
25 - O Diário da República, III Série, de 26 de Fevereiro de 1997, publicitou uma nova alteração ao contrato constitutivo, agora outorgado entre a AJ1…, S.A., por um lado, e o AK…, S.A., por outro, alteração essa efectuada em 31/12/1996, e dando-se aqui como reproduzido integralmente essa alteração constante do documento de fls. 163 a 165 (doc. n.º 2 junto com a contestação da ré "AK…").
26 - Na Cláusula 10ª do Anexo I desse novo contrato, ficou estabelecido o seguinte:
“Se o contrato de trabalho com a associada cessar antes da sua caducidade por reforma ou falecimento, o participante perderá o direito a qualquer prestação ao abrigo deste plano de pensões”.
27 - Na alteração ao contrato constitutivo do Fundo de Pensões, publicitada em 2003,a 2 de Julho, na III Série do Diário da República, a Clª 10ª do Anexo I manteve, na íntegra, o seu teor:
“Se o contrato de trabalho com a associada cessar antes da sua caducidade por reforma ou falecimento, o participante perderá o direito a qualquer prestação ao abrigo deste plano de pensões”.
28 - Foi, finalmente, acordada em 21 de Abril de 2008, uma última alteração do contrato constitutivo do Fundo de Pensões AJ…, alteração essa conforme documento junto de fls. 175 a 200 (doc. n.º 6 da contestação da ré "AK…"), cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, e alteração essa de acordo prévio autorização do ISP, de10/4/2008.
29 - O novo regime veio criar duas alternativas – as chamadas Opção A e Opção B.
30 - A Clª 11ª do Regulamento do Plano de Pensões A (Anexo I à “alteração ao Contrato Constitutivo” de 21/04/2008) continuou a manter o mesmo princípio:
“Se o contrato de trabalho com a Associada cessar antes da sua caducidade por reforma ou falecimento, o participante perderá o direito a qualquer prestação ao abrigo deste Plano de Pensões”.
31 - A Opção A – do regime criado, em 21 de Abril de 2008, pela última alteração ao contrato constitutivo do Fundo de Pensões AJ… - trata-se de um plano de reforma para o qual os trabalhadores não contribuíram.
32 - Nenhum dos AA. fez, alguma vez, qualquer entrada, em dinheiro ou em espécie, nem fez, ou consentiu que fosse feita, alguma dedução aos seus créditos salariais que tivesse dado entrada no Fundo, nem nunca para ele contribuiu, fosse de que forma fosse.
33 - A constituição do Fundo de Pensões AJ… resultou de um acto unilateral da Empresa – isto é, foi fruto de uma iniciativa sua, própria e exclusiva.
34 - Não foi, assim, resultado de qualquer compromisso precedente, acordado com os trabalhadores, ou com os seus representantes.
35 - Nem correspondeu à concretização de qualquer responsabilidade convencionada em Instrumento de Regulamentação Colectiva de trabalho aplicável à Empresa e nesse âmbito por ela assumida
36 - O contrato constitutivo do Fundo de Pensões AJ…, nas suas sucessivas formulações anteriores a 2008, foi, sempre exclusivamente, celebrado entre a AJ… e a correspondente entidade gestora do Fundo.
37 - Nunca intervieram, em qualquer desses contratos, nenhum dos Autores, nem nenhuma entidade, designadamente, Sindicato ou Comissão de Trabalhadores, que os representasse.
38 - Nunca as Convenções Colectivas de Trabalho aplicáveis na AJ… regularam ou, por alguma forma, contratualizaram o direito dos trabalhadores a um complemento de reforma, designadamente sob a garantia de um Fundo de Pensões.
39 - Através da ordem de serviço “OS-../81” foi regulamentado um “sistema de pré-reforma”, com carácter provisório e temporário (máximo de três anos), “com vista a proporcionar a adequada transição da vida activa do trabalhador para a situação de reforma”.
40 - O sistema previa algumas regalias (designadamente, a redução e flexibilização do horário de trabalho, ampliação do conceito de faltas justificadas e a concessão de licença remunerada) tendentes a amenizar a transição da vida activa em direcção à reforma.
41 - A sua aplicação estava dependente da adesão individual dos trabalhadores que dele quisessem beneficiar, dela derivando a obrigação para os aderentes de se reformarem logo que atingissem a idade mínima da reforma.
42 - Os valores de cada uma das referidas “compensações pecuniárias globais”excederam, sempre, em cada um dos casos, o que a cada trabalhador corresponderia se se lhe aplicasse o critério legal para a indemnização em caso de despedimento colectivo, isto é: cada trabalhador recebeu, no âmbito da referida compensação, mais do que um mês, e até mais do que um mês e meio, de retribuição por cada ano de antiguidade, no momento da cessação do seu contrato.
◊◊◊
2.
Debrucemo-nos sobre as questões que nos foram trazidas:
A CLÁUSULA CONTRATUAL QUE PRETENDE EXCLUIR O DIREITO DOS TRABALHADORES À PENSÃO COMPLEMENTAR DE REFORMA - “SE O CONTRATO DE TRABALHO CESSAR ANTES DA SUA CADUCIDADE POR REFORMA OU FALECIMENTO O PARTICIPANTE PERDERÁ O DIREITO A QUALQUER PRESTAÇÃO AO ABRIGO DESTE PLANO DE PENSÕES” – É NULA, POR VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NA ALÍNEA A) DO ARTIGO 16º E ALÍNEAS A) E B) DO ARTIGO 21º DO DL 446/85, DE 25/10, COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELO DL 249/99, DE 07/07, E POR APLICAÇÃO DAS NORMAS DOS ARTIGOS 272º E 762º AMBOS DO CÓDIGO CIVIL, POR VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ.

Os recorrentes para sustentarem a invalidade das normas acima citadas alegam o seguinte:
- A AJ… afectou as verbas adequadas à garantia dos direitos dos Autores a receberem, aquando sua passagem à reforma, a pensão complementar instituída pela OS-../81, para obtenção das quais cada um deles foi contribuindo com o seu trabalho.
- Não sendo afectada ao pagamento da pensão complementar de reforma de cada um dos Autores, fim a que se destinava, será indevidamente apropriada por quem a ela não tem direito, num claro procedimento de enriquecimento sem causa.
- Quer a ordem de serviço, quer o fundo de pensões, quer o contrato de seguro celebrado entre a AJ… e o AK…, são instrumentos em cuja elaboração os Autores, directamente, ou através dos seus representantes, não tiveram qualquer intervenção nem foram ouvidos para a respectiva elaboração.
- A AJ… tem e teve o poder de colocar os aqui trabalhadores na situação de exclusão da pensão complementar de reforma fazendo cessar os respectivos contratos de trabalho no âmbito de processos de reestruturação empresarial e consequente redução de postos de trabalho.
-Era dever, imposto pelo mais elementar princípio da boa-fé, que a entidade empregadora houvesse instruído os Autores de todas as consequências que o acordo de cessação do contrato de trabalho implicaria.

Vejamos:
Começam os Recorrentes por alegar que para garantir o pagamento aos seus trabalhadores o direito a um complemento de reforma a AJ… afectou adequada importância pecuniária que proveio também de valores não pagos ao fisco por se destinarem à dotação de um sistema de pensões complementares de reforma.
Acontece, porém, que não resultou provado que a AJ… tenha afectado quaisquer verbas adequadas à garantia dos direitos dos Autores a receberem, aquando das suas passagens à reforma, a pensão complementar instituída pela OS-../81.
Aliás, esclareça-se que, e aqui citando a sentença recorrida, «não se afigura correcta a afirmação dos autores (cf.art. 12.º da petição inicial) de que pela Ordem de Serviço “OS-../81” a ré AJ… elaborou e fez distribuir “um Regulamento de Fundo de Pensões cujo sistema teve o seu início em 1 de Janeiro de 1982”.
Os próprios autores contradizem tal afirmação ao dizerem (cf. art.º 14.º da petição inicial) que o primeiro “Fundo de Pensões AJ…” foi constituído por escritura de14/12/1987. E a matéria de facto provada – cf. particularmente pontos 5, 6, 39, 40 e 41 da matéria de facto – também desmente aquela inicial afirmação/conclusão dos autores: através da ordem de serviço “OS-../81” foi regulamentado um sistema de pré-reforma, com carácter provisório e temporário (máximo de três anos), com vista a proporcionar a adequada transição da vida activa do trabalhador para a situação de reforma, sistema esse que previa algumas regalias (designadamente, a redução e flexibilização do horário de trabalho, ampliação do conceito de faltas justificadas e a concessão de licença remunerada) tendentes a amenizar a transição da vida activa em direcção à reforma.
Não se pode, assim, radicar na identificada Ordem de Serviço o Fundo de Pensões AJ... – que apenas viria a ser constituído cerca de seis anos mais tarde –, nem nenhuma relevância, para o regime do Fundo, advém da dita OS, mostrando-se esta matéria inócua para a resposta a dar à questão em análise».

Por outro lado, no que ao enriquecimento sem causa diz respeito e que os Recorrentes dizem existir, na medida em que tais verbas não sendo afectadas ao pagamento da pensão complementar de reforma de cada um dos Autores, fim a que se destinava, serão indevidamente apropriadas por quem a ela a não tem direito, num claro procedimento de enriquecimento sem causa, também não tem razão de ser.
Dispõe o artigo 473º do Código Civil, que “[a]quele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou” (nº 1) e “[a] obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou” (nº 2).
Assim, pressupostos constitutivos do instituto do enriquecimento sem causa, são os seguintes:
(i) – Existência de um enriquecimento;
(ii) – Obtenção desse enriquecimento à custa de outrem; e
(iii) – Ausência de causa justificativa para o enriquecimento.
De acordo com o estatuído no artigo 474º do Código Civil o enriquecimento sem causa, como fonte de obrigação, tem carácter subsidiário, na medida em que o mesmo só tem lugar quando a lei não facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído.

Da noção acima dada, podemos concluir que não basta «que uma pessoa tenha obtido vantagem económica à custa de outra, sendo ainda necessária a ausência de causa jurídica justificativa da deslocação patrimonial (sendo apenas esta e não qualquer outra situação de enriquecimento que aqui poderá estar em causa).
Sendo, pois, necessária, repete-se, a ausência de causa jurídica para a recepção da prestação que foi realizada.
Cabendo ao autor que pede a restituição com base no enriquecimento da ré à sua custa sem causa justificativa, por força do preceituado no art. 342º, nº 1 do CC, o ónus de alegação e prova dos referidos pressupostos.
Designadamente, o ónus da prova da ausência de causa da sua prestação pecuniária, sendo a carência de causa justificativa da deslocação patrimonial facto constitutivo de quem requer a restituição.
Onerando, assim, o autor, que invocou o direito em referência, com a sua prova (citado art. 342º, nº 1).
Tendo, pois, a falta de causa de ser não só alegada, como também provada, por quem pede a restituição.
Não bastando, segundo as regras do ónus probandi, que não se prove a existência de uma causa da atribuição, sendo preciso convencer o tribunal da falta de causa.
Ora, a ausência de causa justificativa é, seguramente, o conceito mais indeterminado no âmbito do enriquecimento sem causa. Sendo o mesmo muito controvertido e difícil de definir.
Considerando, em regra, a doutrina que o enriquecimento não terá causa justificativa quando, segundo os princípios legais, não haja razão de ser para ele; quando, segundo o sistema jurídico, deve pertencer a outrem e não ao efectivo enriquecido.
Acontecendo a falta de causa justificativa do enriquecimento quando não existe uma relação ou um facto que, à luz do direito, da correcta ordenação jurídica dos bens ou dos princípios aceites pelo ordenamento jurídico, legitime tal enriquecimento, por dever pertencer a outra pessoa, por se tratar de uma vantagem que estava reservada ao titular do direito.
Verificando-se a falta de causa justificativa do enriquecimento quando, segundo a lei, este não deve pertencer àquele que dele beneficia, mas a outrem.
Devendo o enriquecimento ser reputado sem justa causa quando o direito o não consente ou aprova e quando no caso concreto se não configure uma relação ou um facto que, de acordo com os princípios do sistema jurídico, justifique a deslocação patrimonial operada.
Traduzindo-se, em suma, a falta de causa justificativa na inexistência de uma relação ou de um facto que, à luz dos princípios aceites no sistema, legitime o enriquecimento.
Devendo, in dubio, considerar-se que a deslocação patrimonial verificada teve justa causa»[1].

Transportando estes ensinamentos para o caso que nos ocupa, logo chegamos à conclusão de que não tendo ficado provado – e esse ónus impendia sobre os recorrentes - qualquer afectação de verbas ao Fundo de Pensões, não houve enriquecimento por parte da Ré empregadora[2].
Por outro lado, também não podemos olvidar que ficou provado que nenhum dos Autores fez, alguma vez, qualquer entrada, em dinheiro ou em espécie, nem fez, ou consentiu que fosse feita, alguma dedução aos seus créditos salariais que tivesse dado entrada no Fundo, nem nunca para ele contribuiu, fosse de que forma fosse.
Assim sendo, sem mais considerações, porque desnecessárias, improcede esta questão.

Alegam ainda os recorrentes, que era obrigação, da entidade empregadora, imposta pelo mais elementar princípio da boa-fé, que houvesse, com clareza, instruído os Autores de todas as consequências que o acordo de cessação do contrato de trabalho implicaria, nomeadamente, que deixariam de ter direito ao fundo de pensões.
Esta questão ora invocada é pelos recorrentes uma questão nova.
Como "questões novas" entendem-se aquelas que, colocadas ao tribunal de recurso, não tenham merecido pronúncia por parte do tribunal a quo, sendo indiferente que essa omissão provenha de insuficiência alegatória da parte, nos seus articulados, ou do mero silêncio do órgão recorrido, posto que, nesta última hipótese, o vício da omissão de pronúncia não haja sido atempadamente invocado[3].
Os recursos são meios de impugnação de decisões com vista ao reexame da matéria apreciada pela decisão recorrida.
Como já se deixou exarado, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (653º, nº 3 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil), só abrangendo as questões que nelas se contêm, ainda que outras tenham sido afloradas nas alegações propriamente ditas, salvo tratando-se de questões que o tribunal deva conhecer oficiosamente.
Assim sendo, sem prejuízo destas últimas questões, o tribunal de recurso não deve conhecer de matéria que não tenha sido suscitada no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar. Na verdade, os recursos visam apenas modificar as decisões impugnadas mediante o reexame das questões nelas equacionadas e não apreciar matéria nova sobre a qual o tribunal recorrido não teve ensejo de se pronunciar.
Como refere ABRANTES GERALDES[4],“A diversidade de graus de jurisdição determina que, em regra, os tribunais superiores apenas devam ser confrontados com questões que as partes discutiram em momentos próprios.”
Por fim, para não sermos fastidiosos sobre esta questão, deixamos aqui o sumário de dois Acórdãos do STJ, sobre a questão.
O primeiro, refere que “ As questões novas não podem ser apreciadas no recurso, quer em homenagem ao princípio da preclusão, quer por desvirtuar a finalidade dos recursos, pois estes destinam-se a reapreciar questões e não a decidir questões novas, por tal apreciação equivaler a suprimir um ou mais órgãos de jurisdição.”[5]
O segundo, diz que “Os recursos destinam-se à apreciação de questões já antes levantadas e decididas pelo tribunal recorrido e não a provocar decisões sobre questões que não foram antes submetidas ao contraditório e decididas pelo tribunal recorrido, a menos que se trate de questões de conhecimento oficioso.”[6]
Acontece que os recorrentes nunca levantaram na primeira instância a questão que agora suscitam nas alegações de recurso.
Tendo em conta, o atrás mencionado, não temos dúvidas em afirmar que estamos perante uma “questão nova”, nunca suscitada no Tribunal recorrido, razão pela qual o seu conhecimento é inadmissível e este Tribunal de Recurso não conhecerá da mesma.
Mas mesmo que dela pudéssemos conhecer, sempre diremos que o recurso teria na mesma de improceder.
Na verdade, não ficou provado que a entidade empregadora tenha feito cessar os contratos de trabalho celebrados com os recorrentes por sua iniciativa, nomeadamente, mediante despedimento colectivo. O que ficou demonstrado e provado é que nenhum dos aqui recorrentes foi abrangido por qualquer processo de despedimento colectivo tendo, sim, feito cessar os respectivos contratos de trabalho mediante mútuo acordo.
Ora, como é óbvio, estes acordos de cessão do vínculo laboral não estão abrangidos pelo regime das cláusulas contratuais gerais uma vez que, do que resulta dos factos apurados, não preenchem os mesmos os requisitos do artigo 1º do DL 446/85,maxime a "não negociação".
Por outro lado, como os próprios recorrentes admitem, os mesmos não foram parte no contrato constitutivo do Fundo de Pensões, nem a cláusula em causa (“Se o contrato de trabalho com a associada cessar antes da sua caducidade por reforma ou falecimento, o participante perderá o direito a qualquer prestação ao abrigo deste plano de pensões”) constava dos acordos de cessação dos contratos de trabalho assinados pelos recorrentes, pelo que não impendia sobre os proponentes de tais contratos os deveres de comunicação e de esclarecimento consagrados nos arts. 5.° e 6.° do DL 446/85, de 25/10, as quais, coo refere a Exª Procuradora-Geral Adjunta no seu parecer, devem ser comunicadas na integra e esclarecidas pelos proponentes, mas apenas aos aderentes subscritores de determinado contrato e não a terceiros.
Assim, a cláusula mencionada, que excluiu o direito dos Autores/recorrentes à pensão complementar de reforma, não constava dos acordos de cessação dos contratos de trabalho, ou de quaisquer outros celebrados pelos recorrentes, pelo que não era objecto dos deveres de informação e esclarecimento a que respeitam os arts 5.° e 6º daquele diploma legal.
Além de que é manifesto que, tendo em conta o preceituado nos artigos 236.º a 238.º do Código Civil, quanto à interpretação dos negócios jurídicos e conjugando essa disciplina jurídica com a matéria de facto dada como provada, não se mostra coberto pelo fundo de pensões o pagamento de um complemento de reforma aqueles que, à data em que se reformam, não tinham qualquer nexo laboral com a entidade empregadora.
Esta restrição, não demanda a necessidade de tutela da confiança e da aparência geradas.
Em consonância com tal fundo de pensões, é legítimo que os recorrentes tenham criado a expectativa de que, se atingissem a idade de reforma ao serviço da ré empregadora, beneficiariam do complemento de reforma. Mas só isso.
Do clausulado do Regulamento do Plano de Pensões resulta de forma inequívoca que a exclusão do participante a receber a prestação complementar de reforma deriva da circunstância de antes da sua reforma, o contrato de trabalho já não se encontrar em vigor. Assim, a circunstância de a cessação do contrato ter resultado de um acto unilateral da empregadora ou de mútuo acordo ou da iniciativa do trabalhador, mesmo com justa causa, é irrelevante.
Na verdade, tal circunstância, em abstracto, nada adianta quanto ao efeito objectivo da cessação contratual. No caso dos autos a cessação verificou-se e estabilizou-se na ordem jurídica porque não impugnadas as cessações por mútuo acordo.
Como tem considerado, a jurisprudência maioritária, a expectativa quanto à ulterior atribuição do complemento de reforma constitui uma “expectativa jurídica” que integra o contrato de trabalho e a que a lei dispensa protecção, através de providências destinadas a defender o interesse do respectivo titular e a garantir-lhe, tanto quanto possível, a aquisição futura do direito à reforma ou ao complemento desta, que permanece como que em estado de gestação, nascendo no momento em que se mostrem verificados todos os seus pressupostos.
Mas a verdade é que, cessando o contrato de trabalho que constituía o suporte dessa expectativa antes de perfectibilizados os pressupostos do direito à pensão de reforma, deixa a mesma de merecer a protecção da ordem jurídica[7][8].

No que concerne à invocada violação das normas dos artigos 16º, al. a) e 21°, alíneas a) e b) do DL 446/85, uma vez que também estas referem às relações das partes no âmbito de um contrato (o que ora não verifica relativamente ao contrato em que está inserida a cl.ª em causa), salvo o devido respeito, também entendemos não assistir qualquer razão aos recorrentes.
Além de mais uma vez estarmos perante uma questão nova, sempre diremos que, na esteira do que refere a Srª Procuradora-Geral Adjunta no seu parecer “Dispõe o artº 1º do DL 446/85 que são nulas as cláusulas contratuais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, e aquelas que são inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar.
Tal conceito abrange, salvo disposição legal em contrário, todas as cláusulas contratuais gerais independentemente da forma da sua comunicação ao público, da extensão que assumam ou que venham a apresentar nos contratos a que se destinem, do conteúdo que as informe ou de terem sido elaboradas pelo proponente, pelo destinatário ou por terceiros.
As cláusulas contratuais gerais proibidas pelo Decreto-Lei n.º 446/85 são nulas nos termos nele previstos–artº 12º
Assim, se estas forem utilizadas na celebração de contratos singulares encontram-se feridas de nulidade.
Esta solução corresponde ao direito comum, nomeadamente ao disposto nos artigos 280°, nº 1 (é nulo o negócio jurídico contrário à lei) e 294º (os negócios jurídicos contra disposição legal de carácter imperativo são nulos), ambos do Código Civil.
Com o Decreto-Lei 446/85, o legislador teve, como objectivo central a proibição absoluta ou relativa de cláusulas injustas, inconvenientes ou inadequadas.
Como princípio geral, são proibidas as cláusulas contratuais gerais contrarias à boa fé - art.° 15°.
O preceito em referência reporta-se à boa fé objectiva, ou seja, a uma cláusula geral que exprime um princípio normativo, não fornecendo, portanto, ao julgador urna regra apta a uma aplicação imediata. Apenas lhe dá uma proposta de disciplina sendo, assim, necessária a sua acção concretizadora.
Na aplicação concreta da norma que proíbe as cláusulas contratuais gerais, contrárias à boa fé, devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face da situação considerada e devem ponderar-se, em especial, a confiança suscitada nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa, pelo processo de formação do contrato singular celebrado, pelo teor deste e, ainda, por quaisquer outros elementos atendíveis. Deve, também, ponderar-se o objectivo que partes visam atingir negocialmente, procurando-se a sua efectivação à luz do tipo de contrato utilizado - art.° 16°, alíneas a) e b).
A boa-fé é, deste modo, a consideração razoável e equilibrada dos interesses dos outros, a honestidade e a lealdade nos comportamentos e, designadamente, na celebração e na execução dos negócios jurídicos.
Não se confirmam no caso, como se expôs supra, os fundamentos invocados pelos recorrentes para justificar a nulidade da clª em causa.
Acresce que o regime das cláusulas contratuais gerais não é, efectivamente, aplicável ao caso dos autos».
E não é aplicável ao caso dos autos, acrescentamos nós, porque tais normas apenas têm aplicação e relevância no quadro das relações entre as partes outorgantes de um determinado contrato e apenas no quadro dessas relações, não sendo invocáveis por terceiros, que não são parte outorgante do contrato.
Como se sabe, os recorrentes não intervieram, em momento algum, nem na negociação, nem na elaboração, nem na outorga do contrato constitutivo do Fundo de Pensões. Aliás, seria de todo chocante que uma empresa, por sua iniciava, sem qualquer intervenção, quer individual, quer associativa, dos seus trabalhadores, constitua um Fundo de Pensões, com o intuito de beneficiar no futuro os mesmos trabalhadores, tivesse que informar os trabalhadores e ter o seu assentimento, no estabelecimento de cláusulas que excluam, limitem ou concedam a mencionada pensão complementar. Desde que não haja violação do princípio da igualdade, nem manifestações discriminatórias na atribuição de tais complementos, não vemos como é que determinadas condicionantes objectivas da aquisição de tais regalias possam ser censuradas pelos potenciais beneficiários.
Como se salienta no Acórdão do STJ de 26/03/2008[9], não é de qualificar como contrato de adesão, o acordo de cessação do contrato de trabalho em que as cláusulas que integram o acordo de vontades formado entre as partes quanto aos efeitos característicos essenciais do negócio jurídico (extinção do vínculo juslaboral e pagamento ao trabalhador de uma compensação pecuniária pelo fim do contrato) foram objecto de expressa declaração de aceitação por parte do trabalhador, previamente à sua elaboração, tendo este, nessa medida e por essa via, a possibilidade de influir na determinação do conteúdo essencial daquele acordo.

Mas mesmo que assim se não entendesse, sempre diríamos que, tais cláusulas tiveram a publicidade exigida, tendo sido publicadas no Diário da República.
Mas mesmo que assim não ocorresse e que se entendesse que o DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, tivesse aplicação à situação dos autos, e que a nulidade da cláusula seja de conhecimento oficioso (artigo 286º do CC), ou seja, o Tribunal deve conhecer da mesma, mesmo que não invocada, a verdade é que sendo oficiosa a apreciação da eventual nulidade, a mesma tem como pressuposto que os recorrentes tenham alegado em tempo útil e no momento adequado que o “contrato em causa tem as referidas características de contrato de adesão ou de estabelecimento de cláusulas contratuais gerais, não negociadas especificamente pelas partes, por forma a integrar a previsão do artigo 1.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei 446/85. Ou seja, está subordinada ao ónus de alegação nos momentos de conformação da acção e do seu objecto: na petição ou na réplica, esta quando legalmente permitido.
Tal não se confunde com o ónus da prova a que alude o n.º 3, da norma citada.”[10]
Só assim, as rés teriam tido a oportunidade de, estando em causa o aludido contrato, alegarem e provarem que fizeram as devidas comunicações e informações.

Improcedem, destarte, as conclusões do recurso
◊◊◊
3.
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA

As custas do recurso ficam a cargo dos recorrentes [artigo 527º, nºs 1 e 2, do actual Código de Processo Civil].
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IV
DECISÃO
Em face do exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em:
a) Julgar improcedente o recurso interposto pelos autores e, em consequência manter a decisão recorrida.
b) Condenar os Recorrente no pagamento das custas do recurso.
◊◊◊
Anexa-se o sumário do Acórdão – artigo 663º, nº 7 do actual CPC.
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(Processado e revisto com recurso a meios informáticos (artº 131º nº 5 do Código de Processo Civil).
Porto, 09 de Julho de 2014
António José Ascensão Ramos
Eduardo Petersen Silva
Paula Maria Roberto
_______________
[1] Acórdão do STJ de 02/07/2009, Processo nº 123/07.5TJVNF.S1, in www.dgsi.pt.
[2] “Constituindo o fundo de pensões um património autónomo exclusivamente afetoà realização de um ou mais planos de pensões, o mesmo não suporta outro tipo de obrigações que eventualmente existam do empregador face ao trabalhador que não estejam refletidas no plano de pensões, ou seja, no programa que define as condições em que se constitui o direito ao recebimento de uma pensão a título de reforma por invalidez, por velhice ou ainda em caso de sobrevivência ou de qualquer outra contingência equiparável (cf. artigo 11.° do De­creto-Lei nº 12/2006, de 20 de janeiro)” - PEDRO ROMANO MARTINEZ, PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR: IMPACTOS DE DECISÕES JUDICIAIS V. MUTUALISMO, Revista do Instituto do Direito Brasileiro, Ano 2 (2013), nº 3 Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, consultável in http://www.idb-fdul.com/modo1_cat.php?sid=52&ssid=116&cid=18.
[3] Acórdão do STJ de 27/04/2007, in www.dgsi.pt.
[4] “Recursos em Processo Civil – Novo Regime”, 2ª ed., Revista e Actualizada, pág. 94.
[5] Acórdão de 01/10/02, CJSTJ, Tomo III, pág. 65.
[6] Acórdão de 29/04/1998, BMJ 476º/401.
[7] Apenas assim não é se houver regulação que o acautele, como ocorre no âmbito do sector bancário em que a relação previdencial constituída com a celebração do contrato de trabalho se desenvolve durante a execução do contrato e se mantém para além da vigência da relação laboral, porque assim está estabelecido nos instrumentos de regulamentação colectiva.
[8] Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2000.05.16, Revista n.º 291/99 - 4.ª Secção, sumariado in www.stj.pt
[9] Processo nº 07S4653, in www.dgsi.pt.
[10] Acórdão da Relação de Lisboa de 21/03/2013, Processo nº 2587/10.0TVLSB.L1-6, in www.dgsi.pt.
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SUMÁRIO – a que alude o artigo 663º, nº 7 do CPC.
I – É válida a cláusula inserta no Regulamento do Plano de Pensões em que se estatui que: “Se o contrato de trabalho com a Associada cessar antes da sua caducidade por reforma ou falecimento, o participante perderá o direito a qualquer prestação ao abrigo deste Plano de Pensões”.
II - Não é de qualificar como contrato de adesão, o acordo de cessação do contrato de trabalho em que as cláusulas que integram o acordo de vontades formado entre as partes quanto aos efeitos característicos essenciais do negócio jurídico (extinção do vínculo juslaboral e pagamento ao trabalhador de uma compensação pecuniária pelo fim do contrato) foram objecto de expressa declaração de aceitação por parte do trabalhador, previamente à sua elaboração, tendo este, nessa medida e por essa via, a possibilidade de influir na determinação do conteúdo essencial daquele acordo.

Porto, 09 de Julho de 2014