Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
20692/15.5T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI MOREIRA
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
ESTADO
ERRO JUDICIÁRIO
Nº do Documento: RP2017012420692/15.5T8PRT.P1
Data do Acordão: 01/24/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS N.º 748, FLS.128-135)
Área Temática: .
Sumário: A responsabilização civil extracontratual do Estado, por erro judiciário, nos termos do art 13º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas exige a prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. 20692/15.5T8PRT.P1

Comarca do Porto - Porto
Inst. Central - 1ª Secção Cível - J1

REL. N.º 387
Relator: Rui Moreira
Adjuntos: Fernando Samões
Vieira e Cunha
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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

1. - RELATÓRIO

B… intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra o réu Estado Português pedindo a condenação deste no pagamento da quantia de €540.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até efectivo pagamento, bem como contra o «Tribunal de Execução de Penas do Porto», entretanto absolvido da instância por falta de personalidade judiciária, quantia aquela que entende ser-lhe devida a título de indemnização pelos danos que lhe advieram de uma injustificada privação de liberdade, já que, apesar de ter estado em cumprimento de uma pena de prisão de 4 anos e 6 meses de prisão, lhe deveria ter sido concedida liberdade condicional e isso lhe foi negado.
Alegou, assim, que foi condenado na pena de 4 anos e 6 meses de prisão efectiva, por acórdão proferido, em 15/07/2011, pela 3ª Vara Criminal do Porto, transitado em julgado em 06/09/2011; encontrava-se em prisão preventiva desde 12/01/2010 e, liquidada a pena, ficou fixado o meio da pena em 12/04/2012, os dois terços em 12/01/2013 e o termo em 12/07/2014. Segundo tal liquidação, o período máximo de antecipação da adaptação à liberdade condicional seria em 12/01/2012. Considera, porém, que o Tribunal de Execução de Penas violou ostensivamente os seus direitos fundamentais, por o ter mantido preso, sem motivo e sem necessidade, até ao termo da pena (12/07/2014), quando lhe devia ter sido concedida a liberdade condicional pelo menos em 12/01/2013, altura em que cumpriu os dois terços da pena, pois que se verificavam todas as condições objectivas e subjectivas de concessão da liberdade condicional. Certo é que a liberdade condicional lhe foi negada por despacho de 27/03/2012, aquando da metade da pena (que ocorria em 12/04/2012), bem como aquando dos dois terços da pena (em 12/01/2013), como é regra para todos os reclusos primários (como era o seu caso. Alegou que o magistrado judicial titular do processo nunca permitiu a renovação da instância tendente à concessão da liberdade condicional, fugindo de dar uma decisão devidamente instruída e fundamentada, onde explicasse os reais motivos, de facto e de direito, pelos quais sempre recusou conceder ao Autor a liberdade condicional, mantendo o Autor preso, ininterruptamente, até ao termo da pena (12/07/2014).
Pretende, pois, a indemnização pelos danos não patrimoniais que tal injustificada privação de liberdade lhe determinou.
Citado, o Réu contestou.
A título de questão prévia, o Réu invocou a falta de um elemento constitutivo do direito invocado pelo Autor, uma vez que a responsabilidade por erro judiciário exige a prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente, o que não aconteceu.
De facto, na altura em que o Autor ia completar os dois terços da pena, o Tribunal de Execução de Penas entendeu não ser oportuna a designação de data para Conselho Técnico, atendendo a que se encontrava pendente contra o Autor um processo de inquérito de natureza penal, aberto por factos ocorridos no decurso de uma licença de saída jurisdicional (entre 23 e 29 de Julho de 2012). O Autor formulou requerimento, em 15/01/2013, no sentido de ser marcado um Conselho Técnico, para apreciação da liberdade condicional, mas o Tribunal de Execução de Penas, em despacho de 21/02/2013, indeferiu tal pretensão, considerando que a pendência de inquérito contra o Autor impedia a prolação de uma decisão conscienciosa quanto à liberdade condicional, afigurando-se necessário aguardar, por mais algum tempo, pelo desfecho do mencionado processo de inquérito. Ora, foi este despacho (de 21/03/2013) que negou ao Autor a possibilidade de sair em liberdade condicional (aos dois terços da pena) e o mesmo não foi objecto de recurso, tendo transitado em julgado, pelo que falta o apontado elemento constitutivo do direito invocado pelo Autor (prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente), previsto no art. 13º, nº 2, do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas (RRCEEEP – Lei nº 67/2007, de 31-12), circunstância que conduz à absolvição do Réu do pedido.
Para além disso, o Réu impugnou, por desconhecimento, os factos pessoais relativos à vida do Autor e aos danos por si alegados.
Procedeu-se à realização da audiência prévia, na qual foi proferido despacho a fixar o valor da acção, foi proferido despacho saneador tabelar e foi proferido despacho a facultar às partes a discussão de facto e de direito dos termos da presente causa, em face da possibilidade, vislumbrada pelo tribunal, de conhecimento imediato do mérito da causa.
As partes produziram as alegações consignadas na acta da audiência prévia.
Depois foi proferida sentença, que concluiu pela absolvição do réu por, em suma, por não se encontrar preenchido um pressuposto da responsabilização do Estado réu: a prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente.
É desta decisão que vem interposto recurso pelo autor, por entender estarem preenchidos todos os pressupostos da responsabilização do Estado. Terminou o seu recurso elencando as seguintes conclusões, que aliás se limitam a reproduzir o próprio corpo das alegações:
“1. Logo na sua petição, o recorrente levou todos os factos de que tinha conhecimento e relevantes para a sua causa, todos eles, afinal, centrados em um processo judicial, com o nº 657/11.7TXPRT-B, objeto do documento nº 6, que comportou, nada mais, nada menos, do que 186 páginas.
2. Factos que o réu não infirmou, nem trouxe, ao processo, nada de diferente ou com mais valia.
3. Tanto assim, que o Exmo. Senhor Juiz do Tribunal “a quo”, na sua douta sentença ora sob recurso, apenas se baseou neles (e reconhecendo haver outros mais) para dar por provados 29 desses factos.
4. O número de factos que o Exmo. Senhor Juiz, na sua motivação, disse achar suficientes, os quais, “…por si só, impedem a produção do efeito jurídico pretendido pelo Autor, com a presente acção (sendo manifesta a improcedência da acção), torna-se dispensável (configurando até um acto inútil) a averiguação de outros factos que se mostrem controvertidos (com consequente desnecessidade de se proceder a julgamento e com antecipação da prolação da decisão [de improcedência] para a fase intermédia do processo, proferindo-se saneador sentença”.
5. Portanto, clara e convictamente, que o Exmo. Senhor Juiz se sentiu habilitado a decidir do mérito da causa, mesmo sem audiência de discussão e julgamento, dando, no saneador, uma sentença que, julgando a acção manifestamente improcedente, dela absolveu o réu do pedido.
6. A convicção do Exmo. Senhor Juiz, na sua posição definitiva, está em que, para ele, o recorrente não satisfez uma condição de procedência da acção de responsabilidade civil por erro judiciário, o caso dos autos, prevista no nº 2 do artigo 13 do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei 67/2007, de 31.12.
7. Regime que o recorrente, na acção, mostrou conhecer, ao referir-se a ele em vários artigos da sua petição.
8. Já na parte do direito da sua decisão, o Ilustre Magistrado disse que a pretensão do recorrente não pode obter ganho de causa por faltar “um elemento constitutivo do direito que invocou…”.
9. Decorre da petição e do seu documento nº 6, que o recorrente, durante anos, muito se ocupou a requerer, a reclamar e a recorrer, sempre na expectativa de fazer valer os seus direitos, não se podendo dizer, dele, falta de empenho e de interesse.
10. O exequente foi bem exaustivo na demonstração de como o Exmo. Senhor Juiz do Tribunal de Execução de Penas do Porto, se absteve de dar uma decisão, uma verdadeira decisão, que fosse susceptível de reclamação ou de recurso, como se pode ver nos artigos 56 a 64 da sua petição, com prova documental.
11. Para o recorrente, o Exmo. Senhor Juiz do Tribunal de Execução de Penas do Porto, foi até capcioso na forma como geriu, processualmente, o pedido do ora recorrente, sempre com despachos de mero expediente, como se sabe insusceptíveis de recurso.
12. Como aconteceu, de resto, na factualidade dada por provada pelo Exmo. Senhor Juiz subscritor da decisão ora sob recurso, no seu ponto 19.
13. Ora, naquelas condições processuais, que podia ter o recorrente feito, de diferente ou de melhor, para fundamentar o seu pedido de indemnização na acção cível, como pretende o Ilustre Magistrado titular desta acção.
14. O recorrente entende que satisfez todos os requisitos de que o referido Regime faz depender a propositura deste tipo de acção.
15. E é isto, modesta e singelamente, o que o recorrente submete à apreciação deste corpo de Juízes mais aptos, no intuito de corrigirem o erro, dos factos e do direito aplicável, por parte do Exmo. Senhor Juiz do Tribunal “a quo”.
16. Pois, se assim não tivesse sucedido, a acção não terminava aqui, no saneador, por certo que teria seguido para julgamento.
Termos em que deve ser anulada a douta sentença dada pelo Tribunal “a quo”, substituindo-a por outra que ordene o prosseguimento dos autos para a audiência de julgamento.”
O recurso mereceu resposta desfavorável da parte contrária, que concluiu pela confirmação da decisão recorrida.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo.
Foi, depois, recebido, nesta Relação, considerando-se o mesmo devidamente admitido, no efeito legalmente previsto.
Cumpre decidir.

2- FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (cfr. art. 639º e nº 4 do art. 635º, ambos do CPC).
Identifica-se, em tais conclusões, como questão a decidir a de saber se o ora apelante, no processo de execução de penas que lhe respeitou, tratou de impugnar a decisão que o privou do benefício de liberdade condicional, ou se o não fez apenas por tal jamais lhe ter sido sequer proporcionado, devendo por isso terem-se por preenchidos os pressupostos de demanda do Estado, em função do concreto exercício da função jurisdicional sobre o autor.
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A solução da questão apontada torna útil a ponderação da decisão do tribunal a quo sobre a matéria de facto em discussão, que não vem posta em causa pelo apelante e que se passa a transcrever.
1. Por acórdão proferido, em 15/07/2011, no âmbito do Processo nº 48/08.7P6PRT, da então 3ª Vara Criminal do Porto, transitado em julgado em 06/09/2011, o aqui Autor foi condenado na pena de 4 anos e 6 meses de prisão efectiva, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes.
2. O Autor havia sido detido em 12/01/2010 e ficou ininterruptamente em prisão preventiva após ter sido submetido a interrogatório judicial.
3. O tribunal da condenação homologou a liquidação da pena proposta pelo Ministério Público, nos seguintes termos: Meio da pena: 12/04/2012; Dois terços: 12/01/2013; Termo: 12/07/2014; Adaptação à liberdade condicional (período máximo de antecipação): 12/01/2012.
4. No cumprimento da pena a que foi condenado, o Autor passou para a alçada do então Tribunal de Execução de Penas do Porto (TEP), no âmbito do Processo nº 657/11.7TXPRT, do 1º Juízo.
5. Por despacho proferido em 27/09/2011, no âmbito do mencionado processo do TEP, foi ordenado que, em 12/01/2012 ou no dia útil imediatamente anterior, fossem realizados os procedimentos com vista à possibilidade de concessão ao Autor da liberdade condicional (requisição do CRC e solicitação dos relatórios a que alude o art. 173º, nº 1, als. a) e b) do CEP).
6. Elaborados os relatórios, ouvido o Autor, realizado o Conselho Técnico e lavrada no processo a posição do Ministério Público, foi proferido despacho, pelo magistrado judicial titular do processo do TEP, em 28/03/2012, pelo qual foi decidido não colocar o Autor em liberdade condicional, por se entender não resultar preenchido o condicionalismo previsto no art. 61º, nº 2, alíneas a) e b), do Código Penal, mais se decidindo que os autos ficassem a aguardar a renovação da instância para 12/01/2013, com solicitação dos relatórios a que alude o art. 173º, nº 1, als. a) e b) do CEP, três meses antes daquela data (despacho junto a fls. 105 a 107 dos presentes autos, com a correcção constante do despacho junto a fl. 245 dos presentes autos, cujo teor aqui é dado como reproduzido).
7. Notificado do teor da decisão de 28/03/2012, o Autor dirigiu ao processo do TEP a exposição que consta de fls. 321 a 330 dos autos (cujo teor aqui é dado como reproduzido), pedindo a revogação da decisão de 28/03/2012 e substituição por outra que concedesse (ainda que em regime de permanência na habitação fiscalizada por meios técnicos e sujeito a regime de prova) a adaptação à liberdade condicional.
8. Após audição do Ministério Público (com promoção de indeferimento liminar da pretensão do Autor), foi proferido despacho pelo magistrado titular do processo do TEP, em 16/05/2012, com decisão de rejeição da pretensão do Autor (despacho junto a fl. 122 dos presentes autos, cujo teor aqui é dado como reproduzido).
9. Com vista à apreciação da concessão da liberdade condicional em 12/01/2013 (dois terços da pena), na sequência da decisão (de renovação da instância para aquela data) proferida em 28/03/2012, foram elaborados, em Novembro e Dezembro de 2012, os relatórios a que alude o art. 173º, nº 1, als. a) e b), do CEP (documentos de fls. 123 a 128 e 132 a 137 dos autos, cujo teor aqui é dado como reproduzido).
10. Na «nota biográfica» remetida ao processo do TEP pelo Estabelecimento Prisional do Porto (e também num dos referidos relatórios) foi mencionado que o Autor tinha um processo pendente, em fase de inquérito (Processo nº 534/12.4SJPRT, da 1ª Secção do Departamento de Investigação e Acção Penal do Porto), encontrando-se indiciado pela prática de um crime de ofensa à integridade física, alegadamente praticado na pessoa da sua companheira, durante o gozo da licença de saída jurisdicional ocorrida entre 23 e 29 de Julho de 2012 (sendo igualmente referido no relatório que o Autor, já depois do regresso ao Estabelecimento Prisional, apresentou queixa crime contra a companheira por ameaças – Processo nº 10224/12.2TDPRT, da 5ª Secção do DIAP do Porto).
11. Por requerimento enviado ao processo do TEP (com entrada de 15/01/2013), o Autor fez notar que ainda não se encontrava agendada a reunião do Conselho Técnico para apreciação da aplicação da liberdade condicional e requereu a presença do seu Mandatário em tal diligência.
12. Aberta vista ao Ministério Público, foi exarada posição no sentido de não parecer oportuna a designação de data para Conselho Técnico, atenta a situação jurídico-penal do Autor (manutenção de um processo pendente por factos ocorridos durante uma LSJ), promovendo-se a solicitação de informação sobre o estado do inquérito pendente contra o Autor.
13. Em 21/02/2013, o magistrado titular do processo do TEP, proferiu a seguinte decisão (fl. 140 dos presentes autos; fl. 376 do processo do TEP):
«Req. de fl. 363, entrado em 15/01/2013:
De acordo com a liquidação da pena em vigor, o meio, os dois terços e o termo da pena de 4A6M de prisão ora em execução reportam-se, respectivamente, a 12.04.2012, 12.01.2013 e 12.07.2014. Por decisão de 27.03.2012 foi denegada a concessão de liberdade condicional em sede de metade da pena.
Resulta da nota biográfica de fls. 366-367 e do apenso H (Impugnação) que se encontra pendente contra o recluso um processo de inquérito de natureza penal, aberto por factos que terão ocorrido no decurso de uma LSJ concedida para gozo entre os dias 23 e 29 de Julho de 2012. Esta realidade impede a prolação de uma decisão conscienciosa quanto à liberdade condicional, afigurando-se necessário aguardar, por mais algum tempo, pelo desfecho do mencionado processo.
Assim, não se afigurando oportuno nem adequado proceder ao agendamento da reunião do Conselho Técnico e da audição do recluso, determino se solicite informação sobre o estado do processo nº 534/12.4SJPRT, da 1ª Secção do DIAP do Porto (1).
Pelo exposto, indefere-se o requerimento em apreciação.
Notifique.
Porto, d.s.
(1). Na decisão sumária do TRP, proferida em 20.06.2012 no quadro do processo nº 4624/10.0TXPRTE.P1, considerou-se que “se não há lugar à apreciação da possibilidade de concessão de liberdade condicional, por isso de haver uma condenação ainda não transitada em julgado em virtude da qual a situação jurídico-penal do recorrente ainda não se encontra estabilizada, não há lugar a Conselho Técnico. Claro como a água”. Em acórdão do STJ, proferido em 06.09.2012 no processo nº 87/12.3YFLSB.S1, entendeu-se que “a liberdade condicional, quer a facultativa (na metade ou nos dois terços do cumprimento da pena), quer a «obrigatória» (nos cinco sextos de cumprimento das penas superiores a 6 anos de prisão), só poderá ser determinada pelo TEP quando a situação prisional do arguido estiver estabilizada”.».
14. Por requerimento enviado ao processo do TEP (com entrada de 05/03/2013 – fls. 141 a 146 dos presentes autos; fls. 380 e ss. do processo do TEP), o Autor manifestou discordância face à decisão de 21/02/2013 e solicitou o deferimento da marcação do Conselho Técnico.
15. Aberta vista ao Ministério Público, foi exarada posição no sentido da manutenção da posição já assumida nos autos.
16. Em 14/03/2013, o magistrado titular do processo do TEP, proferiu a seguinte decisão (fl.155 dos presentes autos – fl. 394 do processo do TEP):
«Req. de fls. 380 e ss., entrado em 05.03.2013:
Nada há a alterar ao despacho de fls. 376, proferido em 21.02.2013.
Notifique.».
17. Notificado do teor do despacho atrás identificado, o Autor interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, nos termos que constam do requerimento junto a fls. 156 a 162 dos presentes autos (fls. 397 a 403 do processo do TEP), com entrada em juízo em 01/04/2013.
18. O Ministério Público respondeu ao recurso, nos termos que constam de fls. 169 a 189 dos presentes autos (fls. 406 a 426 do processo do TEP).
19. Em 29/04/2013, o magistrado titular do processo do TEP, proferiu a seguinte decisão (fl. 190 dos presentes autos – fl. 427 do processo do TEP):
«Vem interposto a fls. 397-404, com envio electrónico em 01.04.2013, recurso sobre o despacho de fl. 394, proferido em 14.03.2013, despacho esse que tem o seguinte teor:
“Req. de fls. 380 e ss., entrado em 05.03.2013: Nada há a alterar ao despacho de fl. 376, proferido em 21.02.2013. Notifique.”
Como facilmente se alcança, o despacho do qual se pretende recorrer nada decidiu, não tem objecto susceptível de controlo jurisdicional, não dando, deste modo, lugar à formação de caso julgado. Reconduz-se, assim, à figura de despacho de mero expediente (1), por isso irrecorrível, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 400.º, n.º 1, alínea a), do CPP, e 239.º, do CEP (2).
Pelo exposto, no âmbito do preceituado no artigo 414.º, n.º 2, do CPP, aplicável ex vi do artigo 239.º, do CEP, não admito o recurso interposto.
Condeno o recorrente no pagamento da taxa de justiça de 2 (duas) UC.
Notifique, ao recorrente também a resposta apresentada pelo Ministério Público.
Porto, d.s.
(1). Como é sabido, o despacho de mero expediente é o que se destina a regular ou a disciplinar o andamento ou a tramitação do processo e que não importa decisão, julgamento, denegação, reconhecimento ou aceitação de qualquer direito (sobre o ponto, v. J. A. dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, V, p. 250, bem como Leal Henriques e Simas Santos, Código de Processo Penal Anotado – 1996, 2.º Volume, p. 468).
(2). De resto, também não é clara a própria recorribilidade do despacho de fl. 376, anteriormente proferido, anteriormente proferido em 21/02/2013 (que, de qualquer modo, transitou em julgado em data anterior à da expedição do recurso ora apresentado), o qual pretendeu o recorrente ver alterado através do requerimento subsequente que conduziu à prolação do despacho do qual agora recorre.».
20. O Autor reclamou do despacho de não admissão do recurso, para o Presidente do Tribunal da Relação do Porto, tendo sido proferida decisão, em 07/06/2013, pelo Vice-Presidente do Tribunal da Relação do Porto, que julgou improcedente a reclamação (fls. 192 a 194 dos presentes autos).
21. Por requerimento enviado ao processo do TEP (com entrada de 16/08/2013 – fls. 195 a 197 dos presentes autos; fls. 440 a 442 do processo do TEP), o Autor requereu a apreciação da sua situação actual, a realização do conselho técnico e a concessão da liberdade condicional.
22. Aberta vista ao Ministério Público, foi exarada posição no sentido da manutenção da posição já assumida nos autos e da consequente rejeição da pretensão do Autor.
23. Em 13/09/2013, o magistrado titular do processo do TEP, proferiu a decisão que consta de fl. 204 dos presentes autos (fl. 445 do processo do TEP), cujo teor aqui é dado como reproduzido, pela qual foi rejeitado o requerimento apresentado pelo Autor.
24. Por sentença proferida, em 08/10/2013, no então 1º Juízo, 3ª Secção, dos Juízos Criminais do Porto, o Autor foi condenado, pela prática, em 25/07/2012, de um crime de ofensa à integridade física simples, na pena de 14 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período (fls. 292 a 307 dos presentes autos, cujo teor é aqui dado como reproduzido).
25. Na sequência de recurso interposto pelo Ministério Público, foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação do Porto, em 02/04/2014, pelo qual, na procedência do recurso, foi decidido revogar a aplicação da pena substitutiva de suspensão da execução da pena principal de prisão, determinando-se o cumprimento efectivo daquela pela de prisão pelo Autor (fls. 308 a 321 dos presentes autos, cujo teor é aqui dado como reproduzido).
26. O Autor interpôs recurso do acórdão do Tribunal da Relação do Porto para o Supremo.
27. Do despacho de não admissão do recurso, o Autor apresentou reclamação (nos termos do art. 405º do CPP), tendo o Supremo Tribunal de Justiça mantido o despacho reclamado (decisão proferida em 16/06/2014).
28. Daquela decisão do Supremo Tribunal de Justiça, o Autor interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, o qual decidiu não tomar conhecimento do mesmo (acórdão proferido em 14/01/2015).
29. O Autor foi colocado em liberdade, por termo da pena, em 12/07/2014.
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No recurso sob apreciação resulta evidente das conclusões do apelante que não estão em discussão nem os pressupostos de facto ajuizados pelo tribunal recorrido, nem o enquadramento jurídico das questões suscitadas na acção.
O tratamento conferido a cada um desses segmentos, na decisão recorrida, é exemplar e, sem prejuízo da reavaliação da solução proferida como é próprio da intervenção deste tribunal de recurso, não se fará mais do que importar para o presente acórdão o que ali foi descrito a esse propósito, pois que qualquer fundamentação suplementar seria supérflua e fastidiosa, tanto mais que é o próprio apelante que o não põe em causa.
Assim, como se refere na decisão recorrida, em termos que se subscrevem integralmente “O litígio inerente aos presentes autos desenvolve-se no âmbito da responsabilidade civil extracontratual do Estado por danos decorrentes do exercício da função jurisdicional, concretamente, no campo da responsabilidade civil fundada em erro judiciário. (…)
O Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas (RRCEEEP ou RCEEP), aprovado pela Lei nº 67/2007, de 31-12 (alterada pela Lei nº 31/2008, de 17-07), com entrada em vigor em 30/01/2008 (sendo aplicável ao caso dos autos, em face da data dos factos em causa), veio concretizar, no plano infraconstitucional, o disposto no art. 22º da Constituição da República Portuguesa (CRP), estabelecendo, inovadoramente (com excepção dos dois casos da jurisdição penal que já tinham regulamentação específica: privação injustificada da liberdade [art. 27º, nº 5, da CRP e arts. 225º e 226º do CPP] e sentença penal condenatória [art. 29º, nº 6, da CRP e art. 462º do CPP]), um regime de responsabilidade por danos resultantes da função jurisdicional. (…).
O art. 13º do RRCEEEP (“Responsabilidade por erro judiciário”), por seu turno, estabelece, no seu nº 1, que «Sem prejuízo do regime especial aplicável aos casos de sentença penal condenatória injusta e de privação injustificada da liberdade, o Estado é civilmente responsável pelos danos decorrentes de decisões jurisdicionais manifestamente inconstitucionais ou ilegais ou injustificadas por erro grosseiro na apreciação dos respectivos pressupostos de facto».
Esta norma reporta-se ao erro in judicando, ao erro judiciário patenteado em actos materialmente jurisdicionais.
A configuração do conteúdo do direito de indemnização emergente da responsabilidade do Estado por «erro judiciário» (aquele que releva para a apreciação do caso dos autos) surge, em primeira linha, na norma do nº 1 do art. 13º do RRCEEEP.
Os pressupostos materiais, aqui estabelecidos, limitam a responsabilidade por erro judiciário às situações de erro grave, ou porventura muito grave, do ponto de vista da percepção do direito ou dos factos exigível ao decisor jurisdicional, já que apenas poderá caber nos casos em que tal percepção contrarie, de modo manifesto, o sentido normativo da Constituição ou da lei, ou se traduza numa análise grosseiramente errada dos factos (cfr. Cardoso da Costa, “Sobre o novo regime da responsabilidade do Estado por actos da função judicial”, in RLJ, Ano 138º (2009), nº 3954, pags. 138-162). (…) O erro na apreciação dos pressupostos de facto releva se for um erro grosseiro, circunscrevendo-se “aos casos em que houve um clamoroso erro de avaliação dos meios de prova”; erro que “tanto poderá respeitar a um erro na apreciação das provas, isto é, um erro sobre a admissibilidade e valoração dos meios de provas, como a um erro sobre a fixação dos factos materiais da causa”.
O erro de direito terá de ser manifestamente inconstitucional ou ilegal: não basta a mera existência de inconstitucionalidade ou ilegalidade, devendo tratar-se de erro evidente, crasso, indesculpável, que o magistrado tem a obrigação de não cometer.
O erro na apreciação da matéria de facto deve ser grosseiro e, por isso, também indesculpável, inadmissível e sem justificação, que só por desatenção ou desleixo foi cometido.
A configuração do conteúdo do direito de indemnização emergente da responsabilidade do Estado por «erro judiciário» não se limita, contudo, à norma do nº 1 do art. 13º, concorrendo igualmente para tal configuração a norma do nº 2 do mesmo artigo:
«2. O pedido de indemnização deve ser fundado na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente.».”
Aqui chegados, confrontamo-nos com o elemento fundamental da decisão recorrida, sendo, aliás, a ele que aponta a essência do recurso, como bem referiu o MºPº na resposta que ofereceu.
Assinalando a natureza de condição de acção, mais do que a de um pressuposto processual, ao requisito prescrito no nº 2 do referido art. 13º do RRCEEEP e citando a esse propósito e com pertinência Carlos Cadilha, (“Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas Anotado”, pag.156 e ss.), tem-se por inequívoca a correspondente ratio legis: “No que se refere ao regime do erro judiciário, para além da delimitação genérica do instituto, assente num critério de evidência do erro de direito ou na apreciação dos pressupostos de facto, entendeu-se dever limitar a possibilidade de os tribunais administrativos, numa acção de responsabilidade, se pronunciarem sobre a bondade intrínseca das decisões jurisdicionais, exigindo que o pedido de indemnização seja fundado na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente. (Exposição de Motivos da Proposta de Lei nº 56/X/2006, antecedente da Lei nº 67/2007, de 31-12). A referência à competência da jurisdição administrativa perdeu a sua pertinência, com a fixação da competência para a apreciação deste tipo de situações nos tribunais da ordem comum.
Como se refere ainda na decisão recorrida, quanto ao preenchimento de uma tal condição de procedência da acção, a “prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente, no nº 2 do art. 13º do RRCEEEP, significa que o erro judiciário deve ser demonstrado no próprio processo judicial em que foi cometido e através dos meios de impugnação que forem aí admissíveis, estando excluída a possibilidade de tal erro ser demonstrado (é dizer, a decisão danosa ser revogada) na acção de responsabilidade em que se pretenda efectivar o direito de indemnização (cfr. Ac. STJ, de 24/02/2015; relator: Pinto de Almeida; in www.dgsi.pt).”
Como sobressai das conclusões 10ª e 11ª do recurso, o apelante admite que não ocorreu, no processo onde foram proferidas, a revogação de qualquer das decisões em resultado das quais se viu privado do benefício da liberdade condicional. Alega, porém, é que nem chegou a poder impugnar em recurso qualquer dessas decisões, pois que o juiz titular do processo até isso prejudicou, ao reduzir-se à prolação de decisões de mero expediente, insusceptíveis de recurso e, por isso, de revogação. Daí que defenda – parece-nos - no seu caso concreto não pode ser exigida a verificação de uma tal condição de procedência da sua pretensão.
Entendemos, porém, que os factos descritos supra, que são elementos do próprio processo do TEP respeitante ao apelante e à respectiva instância sobre liberdade condicional, desmentem aquela interpretação por este proposta: é que houve duas efectivas decisões que rejeitaram a concessão da liberdade condicional pretendida e com elas se conformou o ora apelante. É certo que, tardiamente, à luz de um expediente que infra se analisará, se viu impedido de obter a apreciação da situação pelo tribunal de recurso; mas isso foi mera consequência da não impugnação tempestiva da efectiva decisão que indeferira a sua pretensão.
Com efeito, analisado o rol de factos provados, o que se constata é que, perante a aproximação do meio da pena e da correspondente hipótese legal de concessão de liberdade condicional, cumprido o procedimento pertinente, acabou por ser proferida decisão que rejeitou a colocação do apelante em liberdade condicional. Isso aconteceu em 28/3/2012 e o ora apelante não impugnou tal decisão por requerimento, limitando-se a reformular a sua pretensão perante o mesmo órgão, o que deu azo à simples rejeição da sua pretensão. A decisão em causa consolidou-se, pois, por não ter sido impugnada por recurso - cfr. itens 6 a 8 dos factos provados.
Nestas circunstâncias, jamais poderia ser em relação a essa decisão que se poderia considerar verificada ou dispensada a verificação do pressuposto constante do nº 2 do art. 13º do RRCEEEP: o ora apelante, confrontado com uma decisão desfavorável à sua pretensão de concessão de liberdade condicional não providenciou pela sua revogação através do meio adequado para o efeito, designadamente o recurso.
Em qualquer caso, parece-nos não ser neste primeiro conjunto de factos que o apelante funda a sua discordância para com a sentença em crise.
É que, perante a aproximação de uma nova data relevante em sede de execução da pena que se encontrava a cumprir, correspondente aos dois terços da pena e fixada em 12/1/2013, renovou-se a instância para reprocessamento de um tal incidente, conforme, aliás, logo se estipulara naquela primeira decisão negatória, em observância do regime estabelecido no art. 180º do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade. É o que resulta do item 9º dos factos provados.
Foi em pleno curso desta renovada instância do procedimento para concessão de liberdade condicional e em resultado da instrução da correspondente decisão que algo tido por relevante aconteceu: foi recolhida informação sobre a existência de um processo crime em fase de inquérito em que ao ora apelante era imputada a prática de um crime contra a integridade física, alegadamente cometido por ocasião de uma das suas saídas autorizadas do E.P.
Perante as informações assim chegadas, o MºPº propôs nos autos algo que prejudicaria a oportuna decisão sobre a liberdade condicional do ora apelante, em contradição para com um requerimento por este formulado: que se aguardasse o conhecimento do resultado daquele inquérito criminal.
Neste quadro de circunstâncias, o juiz titular do processo pronunciou-se clara e efectivamente sobre a questão da concessão de liberdade condicional que se encontrava pendente, por ocasião do alcance dos 2/3 do tempo da pena do ora apelante: rejeitou a prática de outros actos instrutórios da decisão de concessão de liberdade condicional, designadamente a realização do Conselho Técnico a que haveria de se seguir a audição do próprio recluso, ora apelante, nos termos do art. 174º, nº 1 do C.Exec Penas. De resto, e uma vez que havia um requerimento expresso do ora apelante para que o seu Mandatário estivesse presente nesse acto, o juiz expressamente se lhe dirigiu, indeferindo-o.
Esta decisão prejudicou, ainda numa fase anterior do procedimento, que a instância reaberta para a hipótese de concessão de liberdade condicional ao ora apelante alcançasse um tal resultado; ela traduziu-se inequivocamente numa negação de concessão de liberdade condicional por ocasião dos 2/3 do tempo da pena em que ele se encontrava condenado. E teve um fundamento: “se encontra pendente contra o recluso um processo de inquérito de natureza penal, aberto por factos que terão ocorrido no decurso de uma LSJ concedida para gozo entre os dias 23 e 29 de Julho de 2012. Esta realidade impede a prolação de uma decisão conscienciosa quanto à liberdade condicional, afigurando-se necessário aguardar, por mais algum tempo, pelo desfecho do mencionado processo.”- excerto da decisão, constante do item 13º dos factos provados. De resto, ainda que optando por, graficamente, o colocar em nota de rodapé, o Sr. Juiz fundamentou com jurisprudência a sua decisão de não só não conceder, mas a montante disso nem prosseguir para a apreciação da possibilidade de concessão da liberdade condicional do recluso, ora apelante.
Esta decisão é uma decisão passível de recurso, nos termos do art. 179º, nºs 1 e 2 do C.Exec. Penas, na medida em que dela resulta a recusa de concessão da liberdade condicional, numa fase em que tal poderia ser decidido pelo tribunal. Isso mesmo, aliás, foi salientado pelo Sr. Vice-presidente do Tribunal da Relação do Porto quando apreciou uma reclamação subsequente à não admissão de um outro recurso, num momento ulterior, como veremos.
Temos, pois, que o ora apelante – contrariamente ao que parece ser a sua própria compreensão dos factos – não providenciou pela revogação, por recurso, da decisão judicial que vem de analisar-se e que, resultando na recusa da concessão da liberdade condicional por si pretendida e requerida, lhe teria determinado os danos que agora invoca.
Esta conclusão contém, então, um juízo de não verificação da condição de procedência da acção prevista no nº 2 do art. 13º do RRCEEEP. O que, tal como decidido na decisão recorrida, conduz necessariamente à improcedência da presente acção, com a absolvição do réu.
E essa conclusão em nada é contrariada – pelo contrário, surge reforçada – com a ponderação do que, sucessivamente, teve lugar naquele procedimento de liberdade condicional. É que, em vez de impugnar por recurso a decisão que tinha por efeito a recusa da liberdade condicional por si pretendida, o ora apelante limitou-se a enunciar a sua discordância perante o mesmo tribunal, insistindo pela realização do Conselho Técnico que fora tido por inútil (cfr. item 14º dos factos provados). Sobre esta questão, após pronúncia do MºPº, o tribunal nada decidiu, pois que já a apreciara. E, decidindo requerimento tendente à impugnação deste último despacho, rejeitou tal recurso, por ter considerado que ali nada havia sido decidido, pois que a decisão que apreciara a pretensão do recluso, ora apelante, fora a proferida em 21/2/2013. Esta solução foi, depois, ratificada pelo Sr. Vice-presidente deste TRP, como se referiu, supra – cfr. item 20º dos factos provados – que, em sede de reclamação de não admissão de recurso salientou que a decisão que deveria ter sido impugnada era aquela de 21/2/2013, e não o mero despacho que para ela remeteu, quando o arguido suscitou ao tribunal, imediatamente depois, a reponderação do decidido.
Ulteriormente – em 16/8/2013 – novamente o ora apelante formulou requerimento tendente a que fosse retomado o procedimento para a concessão de liberdade condicional, manifestando disponibilidade para sujeição a período de adaptação à liberdade condicional (item 21º). E, após pronúncia desfavorável do MºPº, tal pretensão foi indeferida, por decisão de 13/9/2013: o Sr. Juiz considerou inaplicável a solução do período de adaptação à liberdade condicional e considerou que, estando pendente processo crime contra o recluso, não lhe poderia ser concedida liberdade condicional, ficando prejudicada ma realização do Conselho Técnico tendente à instrução dessa decisão.
Note-se que, de novo, esta decisão ficou consolidada nos autos, sem impugnação por recurso, apesar de dela resultar a recusa da concessão de liberdade condicional e não, como acontecera nas circunstâncias imediatamente anteriores, por ser meramente remissiva para uma decisão anterior.
Por outro lado, o que se veio a verificar é que, no âmbito daquele processo crime cuja pendência foi sucessivamente invocada para obviar à decisão de concessão de liberdade condicional, o ora apelante veio a ser condenado pela prática de um crime p. e p. pelo art. 143º, nº 1 ,do C.P., na pena de 14 meses de prisão efectiva (após recurso da decisão que determinara a suspensão da execução dessa pena), o que, a posteriori, acaba por revelar o acerto das decisões que obviaram à concessão da liberdade condicional pretendida pelo ora apelante, em sede do cumprimento da pena a que então estava sujeito.
Sem prejuízo, cumpre salientar com veemência que não é nestes autos que cumpre avaliar sem mais o mérito de tais decisões do TEP. O que é relevante constatar, por isso gerar necessariamente a improcedência da acção, é que, independentemente do seu mérito, tais decisões proferidas no próprio processo, em sede de instância de apreciação de liberdade condicional, jamais foram revogadas pelo órgão jurisdicional que para tal seria competente.
Essa factualidade, de per si, compromete a verificação da condição de acção prescrita no nº 2 do art. 13º do RRCEEEP, como se referiu. Por consequência, a mesma só poderia improceder, como bem ajuizou o tribunal a quo, nada justificando a sua tramitação para além da fase em que foi decidida.
Inexiste qualquer outra questão que, colocada pelo apelante, deva ser apreciada.
Resta, por isso, confirmar a douta decisão recorrida, na improcedência da apelação contra ela oferecida.
*
Sumariando:
- A responsabilização civil extracontratual do Estado, por erro judiciário, nos termos do art 13º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas exige a prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente.

3 - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar improcedente o presente recurso de apelação, confirmando integralmente a douta decisão recorrida.
Custas pelo apelante.
Registe e notifique.

Porto, 24/1/2017
Rui Moreira
Fernando Samões
Vieira e Cunha