Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1568/20.0T8VNG-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: COVID-19
MEDIDAS EXCECIONAIS E TEMPORÁRIAS
PRAZO PARA CONTESTAR
PROCESSOS URGENTES
PROCURAÇÃO CONJUNTA
JUSTO IMPEDIMENTO
Nº do Documento: RP202102221568/20.0T8VNG-A.P1
Data do Acordão: 02/22/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE, CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - O prazo para contestar é um prazo judicial, logo, não se lhe aplicando o n.º3, do art.º 7.º Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março.
II - No que respeita aos processos urgentes, as alterações introduzidas pela Lei n.º 4-A/2020, ao art.º 7.º da Lei n.º 1-A/2020, apenas produzem efeitos a partir da entrada em vigor daquela primeira.
III - Da conjugação das normas do n.º 7 e das alíneas a) e b), da Lei n.º 1- A/2020, de 19 de Março, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril, resulta estarem em causa atos ou diligências processuais que requeiram a presença física dias partes. O propósito do legislador não foi seguramente o de abranger contactos ou reuniões entre mandatários e os seus clientes.
IV - A procuração conjunta visa assegurar que qualquer uma das mandatárias possa indistintamente assegurar o patrocínio, desde logo, praticando actos processuais e intervindo em diligências. Nada exigia que ambas as mandatárias fossem notificadas, antes lhe cabendo articular entre si o adequado exercício do patrocínio judiciário para que foram mandatadas através de procuração conjunta.
V - O justo impedimento só pode ser invocado em situações em que ainda não tenha decorrido o prazo peremptório estabelecido na lei para a prática do acto processual.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO nº 1568/20.0T8VNG.A.P1
SECÇÃO SOCIAL

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I.RELATÓRIO
I.1 No Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia, B…, apresentou o formulário a que se referem os artigos 98.º C e 98.º D, do CPT, visando a declaração da ilicitude e regularidade do despedimento que lhe foi comunicado por escrito pela sua entidade empregadora “C…, S.A., Ré”.
Com o formulário juntou procuração constituindo mandatárias forenses as Ex.mas Senhoras Dr.ªs D… e E….
Realizada a audiência de partes sem que se tenha logrado alcançar o acordo, a Ré foi notificada nos termos e para os efeitos previstos no art.º 98.º I, n.º 4, al. a), do CPT.
Na sequência dessa notificação, a Ré empregadora, em 10 de Março de 2020, apresentou o articulado motivador do despedimento.
A trabalhadora foi notificada da apresentação desse articulado através de ofício electrónico – via Citius – elaborado em 1 de Abril de 2020, na pessoa da ilustre mandatária E…, “para no prazo de 15 dias contestar, querendo, sob pena de se considerarem confessados os factos articulados pelo empregador, sendo logo proferida sentença a julgar a causa conforme for de direito”, bem assim com a menção “O prazo corre em férias, visto que se tratar de um processo urgente”.
I.1.1 Através de requerimento apresentado em 28/04/2020, veio a Trabalhadora requerer que o Tribunal determinasse a suspensão do prazo para apresentação da contestação, por força do disposto no artigo 7° n.º 7 alínea c) da Lei n.º 1-A/2020, de 19/03, na redacção introduzida pela Lei n.º 4-A/2020, de 06/04.
Para sustentar o pedido, no essencial, começou por defender que a mencionada norma prevê a suspensão dos prazos nos processos urgentes quando não seja possível, nem adequado, assegurar a prática de actos. De seguida, alegou os factos que, na sua perspectiva, permitem a aplicação ao caso de tal regime, designadamente a doença autoimune e gravidez de risco de uma das suas ilustres mandatárias e a doença incapacitante, aliada à idade, do marido da outra das suas mandatárias, circunstâncias que obrigam ambas a manter-se confinadas no seu domicílio e impossibilitadas de contactar com a Trabalhadora, de forma a poder elaborar a contestação.
Sustentou, ainda, entender que apenas foi notificada para contestar na dia 13 de Abril de 2020, uma vez que, tendo a Lei n.º 4-A/2020 entrado em vigor a 07 de Abril, o acto de notificação apenas nesse dia se tem por efectuado.
Com o e requerimento juntou documentos e arrolou duas testemunhas.
I.1.2 A Empregadora respondeu, defendendo que a norma invocada pela Trabalhadora apenas se aplica a actos e diligências procedimentais e não aos prazos, quando seja possível a prática dos mesmos através de meios de comunicação à distância, designadamente a plataforma informática "CITIUS". Acresce, que a Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril passou a prever que os processos urgentes continuam a ser tramitados, sem suspensão ou interrupção de prazos, atos ou diligências (art.º 7.º, n.º 7).
Assim sendo, tendo a Trabalhadora sida notificada para contestar em 06 de Abril de 2020, quando apresentou o requerimento decorrera já o prazo para aquele fim.
Alegou ainda que a Trabalhadora e as suas Ilustres Mandatárias tinham perfeita conhecimento de todos os elementos necessários à elaboração da contestação, uma vez que intervieram em dois processos judiciais relacionados com as mesmas, para além da resposta à nota de culpa ter sido apresentada por uma das mandatárias da autora, não tendo fundamento a invocação de que a preparação da Contestação tenha ficado dependente da “presença física, diálogo, apresentação de documentos”.
Concluiu, pedindo a indeferimento do requerido, com a subsequente declaração de confissão dos factos alegadas na articulada de motivação do despedimento.
I.2 Pronunciando-se sobre a questão, o Tribunal a quo proferiu a decisão seguinte:
- «[..]
Com relevo para a decisão que se nos coloca, são os seguintes os fados a considerar, todos provados documentalmente:
a) A presente acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento deu entrada no dia 20 de Fevereiro de 2020.
b) No dia 10 de Março de 2020 foi realizada a audiência de partes, não tendo sido possível alcançar um acordo.
c) No dia 30 de Março de 2020 a Empregadora apresentou o articulado de motivação do despedimento.
d) A Trabalhadora foi notificada da apresentação de tal articulado através de ofício electrónico remetido no dia 1 de Abril de 2020.
e) A Dr.ª E… padece de diabetes, de doença do foro gastroenterológico e de lesões vasculares arteriais, o que tudo lhe acarreta uma incapacidade de 78%.
f) A escola frequentada pelo filho da Dr.ª E… encontra-se encerrada.
g) O marido da Dr.ª D… nasceu em 06/09/1953 e padece de doenças do foro neurológico que lhe acarretam uma IPP de 83,5 %.
2.2 - Pretende a Trabalhadora que o Tribunal declare que em 28 de Abril de 2020 se encontrava ainda suspenso o prazo para ela deduzir contestação, por força do regime consagrado no artigo 7° n.º alínea c) da Lei n.º 1-A/2020, de 19/03, na redacção resultante da aprovação da Lei n.º 4-A/2020, de 06/04.
Vejamos.
O artigo 7° n.º 5 da Lei n.º 1-A/2020, de 1 9/03 (que veio impor uma série de medidas excepcionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19), na sua redacção original, determinou a suspensão dos prazos nos processos urgentes, a partir do dia 09 de Março de 2020 (data esta que resulta do disposto no artigo 10.º do mencionado diploma, na sua redacção original; e da norma interpretativa constante do artigo 5.º da Lei n.º 4-A/2020, de 06/04).
Saliente-se desde já ser meu entendimento firme que - e ao contrário do que a Empregadora defende na alínea K da sua resposta, sustentada num trabalho publicado pelo Centro de Estudos Judiciários - enquanto esta norma esteve em vigor os prazos para a prática pelas partes de quaisquer actos processuais no âmbito de processos com natureza urgente estiveram suspensos.
Com efeito, o regime excepcional ali consagrado no n.º 8 dia artigo 7° (segundo o qual, “sempre que tecnicamente viável, é admitida a prática de quaisquer atos processuais e procedimentais através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente por teleconferência ou videochamada”) - como resulta de uma interpretação literal do mesmo, não contrariada por qualquer elemento teleológico conhecido - apenas tinha aplicação às diligências processuais (actos processuais e procedimentais) que pudessem ser realizadas através de meios de comunicação à distância (designadamente por teleconferência ou videochamada) e que não implicavam a contagem de qualquer prazo. É o que sucede, por exemplo, e especificamente nos processos de natureza laboral, com as audiências de partes (de cujo insucesso depende o início do prazo para contestar) e com as audiências de julgamento (cuja realização pressupõe necessariamente que já decorreram todos os prazos de que as partes dispunham para instruir o processo).
Porém, este artigo 7.º do citado diploma foi objecto de relevantes alterações, introduzidas pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2020, de 06/04.
Assim, e no que concerne aos processos urgentes, o novo n.º 7 passou a ter a seguinte redacção:
"7 - Os processos urgentes continuam a ser tramitados, sem suspensão ou interrupção de prazos, atos ou diligências, observando-se quanto a estes o seguinte:
a) Nas diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, a prática de quaisquer atas processuais e procedimentais realiza-se através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente;
b) Quando não for possível a realização das diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, nos termos da alínea anterior, e esteja em causa a vida, a integridade física, a saúde mental, a liberdade ou a subsistência imediata dos intervenientes, pode realizar-se presencialmente a diligência desde que a mesma não implique a presença de um número de pessoas superior ao previsto pelas recomendações das autoridades de saúde e de acordo com as orientações fixadas pelos conselhos superiores competentes;
c) Caso não seja possível, nem adequado, assegurar a prática de atas ou a realização, de diligências nos termos previstos nas alíneas anteriores, aplica-se também a esses processos o regime de suspensão referido no n.º 1".
Ou seja, e desde logo, esta norma veio determinar que os processos urgentes passariam afinal a ser tramitados sem qualquer suspensão ou interrupção de prazos, actos ou diligências.
Por outro lado - e agora ao contrário do que é defendido pela Trabalhadora - é meu entendimento que para mim evidente que o regime consagrado nas alíneas a) a c) dessa mesma norma apenas se aplica aos actos e diligências processuais e não aos prazos.
Em primeiro lugar, porque é isso que resulta da expressão ''observando-se quanto a estes o seguinte", constante da parte final do 1.º parágrafo do artigo. Com efeito, se o Legislador se quisesse reportar também aos prazos, mencionados em primeiro lugar (e não apenas aos actos e diligências, mencionados imediatamente antes da referida expressão) não haveria necessidade de utilizar tal expressão, afigurando-se suficiente que tivesse simplesmente escrito 'observando-se o seguinte".
Depois, porque tanto a alínea a) como a alínea b) se referem expressamente a "diligências que requeiram a presença física das partes". Aliás, se atentarmos nas especificidades de tais alíneas, facilmente constatamos que as mesmas se reportam apenas a situações de diligências que requeiram a presença física dias partes. Ou seja, neste âmbito laboral, a audiência de partes, a audiências prévias, a audiências de julgamento ou a juntas médicas. Tudo casos em que está em causa a aglomeração de pessoas e, portanto, a possibilidade de propagação da doença Covid 19.
Isto é, nos processos urgentes deixou de estar prevista qualquer possibilidade de suspensão dos prazos para a apresentação de articulados pelas partes, com fundamento em qualquer motivo directa ou indirectamente ligado à pandemia de Covid 19,
Por outro lado, o artigo 6.º n.º 2 deste novo diploma esclarece que as alterações introduzidas ao n.º 7 do artigo 7.º apenas produzem efeitos na data da entrada em vigor do mesmo, ou seja, no dia 07 de Abril de 2020 (dia seguinte ao da sua publicação, tal como preceitua o artigo 7°).
Daqui se conclui que no presente processo, que tem natureza urgente, os prazos estiveram suspensos desde 09 de Março até 07 de Abril de 2020, tendo-se reiniciado a partir desta data.
Ora, a Trabalhadora foi notificada através de ofício electrónico remetido no dia 01 de Abril de 2020, pelo que se presume que tal notificação ocorreu no terceiro dia útil posterior, ou seja, no dia 06 de Abril de 2020. Saliente-se que - também ao contrário do que a Trabalhadora veio defender- o acto da notificação "stricto sensu" não foi minimamente afectado pelo regime da suspensão de prazos que então vigorava, pelo que tal notificação se considera perfeitamente efectuada e operante (o que a suspensão implicava, outrossim, era a dilação do inicio do prazo para contestar, subsequente a tal notificação).
Como tal, o prazo de 15 dias de que a Trabalhadora dispunha para deduzir contestação teve início no dia seguinte, 07 de Abril (ou seja, no próprio dia em que entrou em vigor o novo regime introduzido pela Lei n.º 4-A/2020); tendo terminado no dia 21 de Abril e sendo prorrogável até ao dia 24 de Abril, ao abrigo do disposto no artigo 139.º n.º 5 do Código de Processo Civil.
Ou seja, quando em 28 de Abril a Trabalhadora veio requerer a declaração de suspensão do processo, já há quatro dias que havia terminado o prazo para a mesma deduzir contestação.
Apenas resta, portanto, julgar a improcedência do requerido pela Trabalhadora.
Sem prejuízo, não posso deixar de tecer uma breve consideração complementar.
Com efeito, independentemente da improcedência da pretensão da Trabalhadora em ver declarada a suspensão do prazo para contestar, nada obstaria a que o Tribunal pudesse apreciar a questão levantada sob um outro prisma jurídico, mais concretamente sob a eventual verificação de justo impedimento,
Assim, dispõe o artigo 140.º n.º 1 do Código de Processo Civil que 'considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que oeste à prática atempada do acto".
Por outro lado, o n.º2 do mesmo normativo determina que o requerente será admitido a praticar o acto "fora do prazo" se o juiz "julgar verificado o impedimento e reconhecer que a parte se apresentou a requerer lago que ele cessou".
Assim sendo, a actual definição do justo impedimento passou a dar o merecido relevo à culpa, isto é, passou a centrar-se na não imputabilidade à parte, nem aos seus representantes ou mandatários, pela ocorrência do obstáculo que impediu a prática do acto.
Decisivo para a verificação do justo impedimento é, pois, a inexistência de culpa da parte, seu representante ou mandatário na ultrapassagem do prazo peremptório de que dispunham. Tal não obsta à possibilidade de a parte ou o mandatário terem tido participação na ocorrência, desde que, em termos gerais, tal não envolva um juízo de censurabilidade.
Resumindo, e como ensinava Alberto dos Reis, in "Comentário ao Código de Processo Civil", volume II, página 72, 'o interessado não pode colocar-se ao abrigo do justo impedimento quando lenha havido, da sua parte, culpa, negligência ou imprevidência. Se o evento era susceptível de previsão normal e a parte não se acautelou contra ele, sibi imputet: a parte foi imprevidente.
Ora, cabe à parte interessada - a que não praticou tempestivamente o acto - alegar e provar a sua falta de culpa, isto é, a ocorrência de caso fortuito ou de força maior que esteve na origem do respectivo impedimento - neste sentido, vide Lebre de Freitas/João Redinha/Rui Pinto, in "Código de Processo Civil Anotado", 1999, Volume 1°, páginas 257 e 258; Lopes do Rêgo, in "Comentários ao Código de Processo Civil", página 125; para além de, entre outros, os Acórdãos da Relação do Porto de 07/03/2005; o Acórdão da Relação de Lisboa de 04/11/2004; e o Acórdão da Relação de Coimbra de 20/04/2018, todos consultáveis in www.dgs.pt.
Sucede, porém, que no caso presente os elementos existentes nos autos não permitem ao tribunal concluir pela existência de justo impedimento.
É certo que está demonstrado que uma das mandatárias da Trabalhadora sofre de doenças incapacitantes, uma delas diabetes, o que a torna uma pessoa de risco; e que o marido da outra mandatária é também uma pessoa de risco.
Contudo, tais factos, só por si, não são suficientes para permitir concluir que as referidas mandatárias estão impossibilitadas de contactar com a Trabalhadora, com vista a recolher os elementos necessários à elaboração da contestação.
Tenha-se em consideração que o formulário inicial com que a Trabalhadora deu entrada à acção foi já acompanhado de procuração a favor das duas referidas mandatárias, o que permite presumir que as mesmas estavam já dentro das contingências específicas do processo. Tanto mais que uma delas interveio presencialmente na audiência de partes.
Por outro lado, não foi alegado nenhum facto relativo à impossibilidade de as referidas mandatárias poderem comunicar com a Trabalhadora, sua cliente, através de qualquer meio de comunicação à distância.
Não existem nos autos, portanto, elementos bastantes para o Tribunal poder concluir pela ocorrência de justo impedimento.
3. Pelo exposto, indefiro o requerido pela Trabalhadora.
(..)».
I.3 Inconformada com esta decisão a autora interpôs recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram finalizadas com as conclusões seguintes:
1- A A. não pode conformar-se com a decisão que determinou que a Lei 4-A/2020 no seu art. 7 n. º 7, quanto à suspensão, não se aplica no ato processual contestação e ainda indeferindo o requerimento de justo impedimento.
2- A situação epidemiológica do COVID-19 determinou o encerramento dos escritórios de advogados, entre eles, o das aqui mandatárias, que se viram confinadas cada uma na sua residência a saber, Porto e Gondomar, em regime de teletrabalho.
3- A excecionalidade do Estado de Emergência impôs medidas de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção do SARS-COV-2 nomeadamente em relação a prazos das diligências e atos processuais.
4- Mesmo as diligencias em Tribunal no caso de Mandatários “imunodeprimidos ou portadores de doenças crónicas” que devam ser “consideradas de risco” deixaram de ter obrigatoriedade de se deslocar a Tribunal ou qualquer diligencia que envolva presença física (art. 6º -A n.º 4 da lei 4-A/2020).
5- O art. 7º da Lei 1-A/2020 dispunha:
a) ” Nº 1” - Aos atos processuais e procedimentais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos, que corram termos ….nos tribunais judiciais,…aplica-se o regime das férias judiciais até à cessação da situação excecional de pandemia.
b) O regime previsto no presente artigo cessa em data a definir por decreto-lei, no qual se declara o termo da situação excecional.
c) “N.º 3”-A situação excepcional suspende os prazos de caducidade e prescrição relativos a todos os tipos de processos e procedimentos.
d) “N.º 5” - Nos processos urgentes os prazos suspendem-se, exceto:
1- “N.º 8” Quando tecnicamente viável, é admitida a prática de quaisquer atos processuais por teleconferência ou videochamada.
2- N.º 9” Só se realizam atos e diligências urgentes presenciais quando estejam em causa direitos fundamentais, menores em risco, arguidos presos.
6- A Lei 4 – A/2020 no seu art. 7.º mantem o n.º 3 inalterado pelo que, se deve entender que os prazos de prescrição e caducidade se mantêm suspensos em relação a todo o tipo de processos.
7- O prazo de apresentação da contestação é um prazo peremptório de prescrição sempre o mesmo se encontraria suspenso.
Sem Prescindir
8- A nova redação do n.º 7 do art. 7º da Lei 4-A/2020 passa a determinar a tramitação dos processos urgentes sem suspensão ou interrupção de prazos excepto quando não seja possível, nem adequado assegurar a prática de atos, caso em que se aplica o regime de suspensão.
9- A contestação da A. na impugnação do despedimento é um acto processual a realizar pela parte representada por mandatário que se exprime ou finaliza na peça processual “contestação” definida no art. 131º; 132º e 137º do CPC.
10- A entrega por via eletrónica da contestação é apenas o finalizar de um processo mais complexo de elaboração da mesma que passa por reunir presencialmente com a Autora.
11- A A. na audiência de partes esteve representada pela Mandatária, D…, enquanto a Dra. E… já estava confinada por causa do filho menor e encerramento do pré-escolar por apuramento de um caso de COVID-19 com um funcionário e o confinamento impunha-se atento o facto de ser uma doente crónica de alto risco.
12- Não se compreende que o prazo para a prática do acto “motivação do empregador” “estivesse suspenso até 7 de Maio e a prática do acto Contestação da A. seja exclusivamente um prazo não abarcado pelas alíneas a) a c) do n.º 7 do art. 7º da Lei 4-A/2020.
13- Ou seja, (alínea c) do n.º 7 do art. 7º) quando não for possível assegurar a prática do ato, elaboração da contestação, em virtude de impossibilidade ou não adequação da reunião presencial que se impõe com a A. o regime é o geral da suspensão (n.º 1 do art. 7.º) como anteriormente o era. Por isso se mantém o n.º 3 do art. 7.º inalterado.
14- A diferença entre os 2 diplomas reside em atender a que, enquanto a suspensão de prazos na Lei 1-A/2020 é o regime regra, na Lei 4-A/2020 a suspensão do prazo no processo urgente é um regime excepcional que apenas não corre, quando o ato sujeito a prazo não é possível ou adequado assegurar a sua prática (art. 7º, n.º 7 c) da Lei 4 - A/ 2020).
15- A reunião para estabelecer uma defesa eficaz, obter testemunhas e discutir a motivação da empresa não é possível de ser realizada por videoconferência nem a trabalhadora domina tais técnicas.
16- A adequação e a possibilidade devem ser aferidas pelo respectivo mandatário como aferidas são as possibilidades de realizar julgamento e audiências de parte por videoconferência.
17- A separação defendida pelo douto Tribunal “a quo” entre prazos e actos no caso de apresentação em Juízo de uma contestação não é sustentável.
18- O decurso de um prazo não envolve, nem nunca envolveu presença física e o momento temporal pré-definido para a prática de um ato ou diligência não tem existência ou relevância fora do ato ou diligência condicionado pelo prazo, conforme melhor descreve o CPC no art. 206.º e ss.
DO JUSTO IMPEDIMENTO
19- Em relação ao justo impedimento convém realçar que apesar de na audiência de partes, conforme consta da respectiva ata, a A. ter estado representada pela mandatária D… e na procuração, ainda que conjunta com a Dra. E…, a actual subscritora desta peça constar em primeiro lugar, sempre as respectivas notificações foram enviadas via Citius exclusivamente para esta última, nunca sendo visíveis no Citius da Dra. D….
20- A douta decisão em crise refere que, pese embora poder apreciar a questão do ponto de vista do justo impedimento nos termos do art.º 140 n.º 1 do CPC, o mesmo se não verifica por haver culpa do respectivo mandatário.
21- Conforme alegado no requerimento do justo impedimento as mandatárias estavam em teletrabalho, em residências e concelhos diferentes, diferentes entre si e diferentes do da Autora (Porto, Gondomar e Vila Nova de Gaia).
22- Foi alegada a necessidade de reunião presencial e não é o facto do requerimento inicial (modelo 98-F), ter sido acompanhado de procuração das mandatárias, que excluí a necessidade e o dever de reunir presencialmente e preparar uma defesa que se apoia no articulado do empregador que a A. e as mandatárias desconhecem de todo.
23- Ainda que fosse possível “presumir” que as mandatárias “estavam dentro das contingências especificas do processo”, uma delas, a aqui subscritora, não foi notificada e as presunções podem ser elididas, sendo que o requerimento estava munido de prova testemunhal que o Mm. Juiz, pura e simplesmente, dispensou, ouvir.
24- A audiência de partes limitou-se a notificar a entidade empregadora de que tinha 15 dias para apresentar a motivação de despedimento, frustrada que foi a tentativa de conciliação.
25- No artigo 7 do requerimento do justo impedimento é claramente alegado que a contestação “implica a prática dum ato que envolve presença física, diálogo e apresentação de documentos pela Autora”. Matéria que deveria ser dada como provada.
26- Este diálogo envolve naturalmente a apresentação da peça processual da R., o escalpelizar dos documentos da defesa, o respectivo aconselhamento e a recolha de novos dados, testemunhas, documentos, etc.
27- Mais ainda, foi alegado que a mandatária notificada se encontrava com uma gravidez de risco, para além de ter uma doença auto-imune considerada “de per si” de risco, agravada pela pandemia e pela gravidez. Matéria que deveria ser dada como provada.
28- A prova testemunhal, uma vez que, à data, nem sequer possuía ainda qualquer relatório, poderia ter esclarecido este facto. Omissão da prova testemunhal.
29- A doença auto-imune de que a mandatária padece é uma doença que afecta a circulação sanguínea, daí as hemorragias.
30- A doença, o confinamento e o confronto com uma gravidez de risco deveriam ter sido fundamentos suficientes para dotar o Mm. Juiz de algum discernimento na avaliação da culpa.
Da impossibilidade absoluta do Mandatário exercer o Mandato
31- Por último e em relação à mandatária impossibilitada de exercer o seu mandato e a única notificada nos presentes autos, determina o art. 269.º do CPC no seu n.º 1 b) que,“ A instância suspende-se quando este ficar absolutamente impossibilitado de exercer o seu mandato”.
32- O art. 275.º n.º 2 do CPC determina que os prazos judiciais não correm enquanto durar a suspensão, suspensão essa que inutiliza a parte do prazo que tiver decorrido anteriormente.
33- Termos em que o Mmo Juiz fez uma errónea aplicação e interpretação da Lei e omissão do dever de ouvir a prova testemunhal apresentada.
Conclui pedindo a revogação da decisão recorrida, determinando-se o prosseguimento dos autos admitindo-se a contestação da A. entretanto apresentada e, reconhecendo-se a suspensão do prazo de apresentação da contestação decorrente da lei 4-A/2020 na interpretação da A. e o invocado justo impedimento bem como a impossibilidade absoluta do exercício do Mandato pela Dra. E….
I.4 A recorrida apresentou contra-alegações, que finalizou com as conclusões seguintes:
(1) Não é aplicável à situação nos presentes autos o n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março que estabelecia que “A situação constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos.”, na medida em que o prazo para apresentação de Contestação é um prazo judicial e não substantivo;
(2) Como bem se percebe, o intuito do legislador era, nesta matéria, salvaguardar os prazos de prescrição e de caducidade associados ao contexto da Pandemia, procurando salvaguardar as situações em que o exercício de um determinado direito implicava iniciativa processual, isto é, a instauração de um processo ou de um procedimento (prazo substantivo e não adjetivo).
(3) Ora, no caso em apreço, está em causa a apresentação de Contestação, pelo que, claramente, não foi para uma situação como esta que foi estabelecido o n.º 3 do artigo 7.º.
(4) Relativamente aos processos urgentes, no período compreendido entre 9 de março a 6 de abril de 2020, era aplicável a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na sua primitiva redação;
(5) O artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, apenas suspendeu alguns prazos para a prática de atos processuais e procedimentais. Nomeadamente, quanto a processos urgentes os prazos não ficaram suspensos sempre que fosse tecnicamente viável a prática de quaisquer atos processuais e procedimentais através de meios de comunicação à distância adequados (art. 7.º, n.º 8);
(6) É o caso do presente processo, pois a contestação é apresentada via CITIUS e não houve qualquer notícia de falha no seu funcionamento, pelo que não vislumbra, assim, a Recorrida como poderá considerar-se inviável o envio de uma peça processual através do sistema informático CITIUS;
(7) A partir de 7 de abril de 2020, aplicou-se a redação introduzida pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril que veio dissipar quaisquer dúvidas que pudessem existir ao estabelecer que os processos urgentes passavam a ser tramitados, sem qualquer suspensão ou interrupção de prazos, atos ou diligências;
(8) E, como é óbvio, o que está em causa nas diversas alíneas do n.º 7 do art. 7.º são atos ou diligências processuais, que se tenham de realizar presencialmente no Tribunal e não, nomeadamente, contactos ou reuniões entre mandatários e os seus clientes;
(9) Também não assiste razão à Recorrente ao invocar a necessidade de reunião presencial entre a Recorrente e suas Mandatárias para a preparação da Contestação, invocando o regime de suspensão dos prazos processuais por via do art. 7.º, n.º 7, al. c);
(10) Não só não se concebe a necessidade dessa reunião presencial, como a matéria objeto dos presentes autos é do pleno conhecimento das Mandatárias da Recorrente na medida em que a mesma foi já, de modo conexo ou relacionado, discutido no âmbito da providência cautelar que correu termos sob o processo n.º 3499/18.5T8VNG – Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia – Juiz 2 e que veio dar origem ao Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto sob o proc. n.º 3499/18.5T8VNG.P1, ou mesmo no processo n.º 705/20.0T8VNG, que correu termos no Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia – Juiz 2;
(11) Quanto à questão de justo impedimento cumpre esclarecer que a necessidade de um período de isolamento para evitar risco de contágio do Covid-19, apenas seria relevante para efeitos de invocação de “justo impedimento à prática de atos processuais e procedimentais que devam ser praticados presencialmente no âmbito de processos, procedimentos, atos e diligências que corram os seus termos nos tribunais judiciais”, havendo “declaração emitida por autoridade de saúde” (art. 14.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março), o que não é o caso dos autos;
(12) Acresce que a alegação de justo impedimento não pode aproveitar à Recorrente porquanto o prazo para contestar terminou no dia 21.04.2020, tendo a Recorrente apenas alegado justo impedimento para a prática do ato depois de decorrido o prazo para o mesmo, i.e., em 28.04.2020;
(13) Assim, a apresentação da Contestação é manifestamente extemporânea, não obstante o alegado justo impedimento, na medida em que a sua invocação ocorreu decorrido o prazo “normal” perentório;
(14) Tal circunstância não é alterada pelo facto de se juntar (apenas com o Recurso!) declaração médica datada de 4 de junho de 2020, em que se atesta que a Ilustre Mandatária da Recorrente se encontra em gravidez de risco desde 18 de abril de 2020, altura em que – de resto -, já se encontrava a correr prazo para apresentação da Contestação, pois tal só veio a ser invocado em 28.04.2020;
(15) A Mandatária subscritora do recurso é D… e quanto a eventual impedimento para a prática do ato a si associado, nada é invocado, alegado e muito menos provado no âmbito do recurso apresentado.
(16) Acresce que, estando em causa procuração conjunta, outorgando poderes a ambas as Mandatárias da Recorrente, o patrocínio poderia ser assegurado indistintamente por qualquer uma delas.
Conclui pugnando pela improcedência do recurso.
I.5 O Ministério Público junto desta Relação teve visto nos autos, para os efeitos do art.º 87.º3 do CPT, não tendo emitido parecer na consideração de se tratar de questão eminentemente de natureza processual.
I.6 Verificando-se que o recurso subiu sem que tivesse sido fixado o valor da causa, pelo relator foi proferida decisão, nos termos do disposto no art.º 652.º 1 do CPC, determinando a baixa dos autos à 1.ª instância para que fosse cumprido o disposto no art.º 306.º do CPC.
I.6.1 Em cumprimento do determinado, a 1.ª instância proferiu a decisão seguinte:
Para efeitos de recurso, fixo o valor da causa em € 2.000,00 – artigo 98º-P, nº 1 do CPT».
I.6.2 Os autos subiram a esta instância antes do trânsito daquela decisão fixando o valor da causa e, entretanto, a autora veio interpor recurso da mesma.
Assim, determinou-se de novo a baixa dos autos à 1.ª instância, desta feita para que proferisse despacho sobre a amissibilidade do recurso.
A 1.ª instância proferiu despacho admitindo o recurso, para subir nestes próprios autos, na consideração de a fixação do valor da causa neste circunstancialismo é provisória e releva apenas para efeito do recurso sobre a decisão 20-05-2020, que indeferiu o requerimento de 28-04-2020.
Tendo os autos subido a esta relação, pelo relator foi proferido despacho, acolhendo-se aquela decisão.
I.6.3 As alegações que sustentam o recurso dirigido à decisão que fixou o valor da causa foram encerradas com as conclusões seguintes:
1- A Apelante não pode conformar-se com a decisão do Mmo. Juiz de fixar o valor da causa em € 2.000,00 “para efeitos de recurso” nos termos do art.º 98 – P, n.º 1 do CPT.
2- O art.º 98 – P do CPT dispõe no seu n.º 1 que apenas para efeitos de “pagamento das custas” na impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento o valor da causa é atendido como um valor tributário.
3- Determina o art.º 12, n.º 1 e) do Regulamento das Custas Processuais que esta fixação do valor tem lugar na medida em que se torne impossível, no momento da entrada do Requerimento, a fixação do valor da causa.
4- A mesma alínea determina a possibilidade de posteriores acertos a efetuar pelo Juiz.
5- Nesta fase processual é inaplicável o disposto no art.º 98 – P, n.º 1 do CPT, mas o seu n.º 2 e particularmente o n.º 3.
6- No momento da admissão do recurso deveria o Mmo. Juiz fixar o respetivo valor no despacho, o que não fez.
7- E, nos termos do art.º 305 do CPC deveria a A/Apelada C… ter indicado desde logo o valor da ação, o que não fez.
8- O articulado motivador do despedimento não está isento de fixação do valor que será ou deverá ser o valor da indemnização por antiguidade acrescida das retribuições vincendas, valor que ascenderia a mais de € 25 000,00.
9- Sempre o valor do processo ainda que provisório e decidido antes do final da ação (o que implica o trânsito em julgado) deveria atender ao art.º 98 – P, n.º 2 do CPT e ter em conta “a utilidade económica do pedido” designadamente com recurso aos elementos existentes no processo que lhe permitem fixar o valor da ação, na senda da mais recente jurisprudência do STJ.
10- O despacho de que se recorre deveria pois, ter aplicado o at.º 98-F, n.º 2 e n.º 3 e nunca lançar mão do vertido no art.º 98 – F, n.º 1, todos do CPT, termos em que o presente despacho faz uma incorreta aplicação de lei do processo comprometendo nessa medida o direito da Apelante a ver apreciado o justo impedimento.
I.6.4 Não foram apresentadas contra-alegações.
I.7Foram colhidos os vistos legais e determinou-se a inscrição do processo em tabela para ser submetido a julgamento.
I.8 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 640.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho], as questões colocadas para apreciação pelo recorrente consistem em saber se o tribunal a quo errou o julgamento quanto ao seguinte:
i) Recurso dirigido à decisão que fixou o valor da acção
Ao fixar o valor da causa em € 2.000,00 “para efeitos de recurso” nos termos do art.º 98 – P, n.º 1 do CPT.
ii) Recurso dirigido à decisão que indeferiu o requerimento para suspensão do prazo para apresentação da contestação
a) Por não ter considerado que “[O] prazo de apresentação da contestação é um prazo peremptório de prescrição sempre o mesmo se encontraria suspenso” [Conclusões 6 e 7];
b) Por ter considerado “que a Lei 4-A/2020 no seu art. 7 n.º 7, quanto à suspensão, não se aplica no ato processual contestação” [conclusão 1 e 8 a 18];
c) Por ter indeferido “o requerimento de justo impedimento” [conclusão 1 e 19 e sgts].
FUNDAMENTAÇÃO
II.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO
Os factos relevantes para a decisão do recurso são os que constam do relatório, bem assim os que foram fixados pelo Tribunal a quo, acrescidos dos dois que se após a enumeração daqueles, nomeadamente, sob as alíneas h) e i), perfazendo o elenco seguinte:
a) A presente acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento deu entrada no dia 20 de Fevereiro de 2020.
b) No dia 10 de Março de 2020 foi realizada a audiência de partes, não tendo sido possível alcançar um acordo.
c) No dia 30 de Março de 2020 a Empregadora apresentou o articulado de motivação do despedimento.
d) A Trabalhadora foi notificada da apresentação de tal articulado através de ofício electrónico remetido no dia 1 de Abril de 2020.
e) A Dr.ª E… padece de diabetes, de doença do foro gastroenterológico e de lesões vasculares arteriais, o que tudo lhe acarreta uma incapacidade de 78%.
f) A escola frequentada pelo filho da Dr.ª E… encontra-se encerrada.
g) O marido da Dr.ª D… nasceu em 06/09/1953 e padece de doenças do foro neurológico que lhe acarretam uma IPP de 83,5 %.
h) O requerimento apresentado pela autora, visando que fosse determinado pelo Tribunal a quoa suspensão do prazo para apresentação da Contestação”, foi apresentado em 28 de Abril de 2020.
i) A autora veio apresentar contestação nos autos, via CITIUS, em 18 de Maio de 2020, subscrita pela ilustre mandatária Dr.ª D….
II.2 Recurso dirigido à decisão que fixou o valor da acção
Insurge-se a recorrente contra a decisão do tribunal a quo fixando o valor da causa, “para efeitos do recurso (..) em € 2.000,00 - artigo 98 – P, n.º 1 do CPT.
Defende que “nesta fase processual é inaplicável o disposto no art.º 98 – P, n.º 1 do CPT, mas o seu n.º 2 e particularmente o n.º 3”, e ter em conta “a utilidade económica do pedido” designadamente com recurso aos elementos existentes no processo que permitem fixar o valor da acção.
Alega, ainda, que a recorrida ré, ao apresentar o articulado motivador do despedimento deveria ter indicado o valor tendo em conta o valor da indemnização por antiguidade acrescida das retribuições vincendas, valor que ascenderia a mais de € 25.000,00.
Vejamos se lhe assiste razão, começando por enunciar os princípios gerais sobre o valor da causa, enunciados no Código de Processo Civil, com relevância para o caso.
Estabelece o art.º 296.º, com a epígrafe “Atribuição de valor à causa e sua influência”. O seguinte:
1. A toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica do pedido.
2. Atende-se a esse valor para determinar a competência do tribunal, a forma do processo de execução comum e a relação da causa com a alçada do tribunal.
3. Para efeitos de custas judicias, o valor da causa é fixado segundo as regras previstas no presente diploma e no Regulamento das Custas Processuais.”.
Por seu turno, o art.º 297.º, “Critérios gerais para a fixação do valor”, tem o teor seguinte:
1 - Se pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela ação se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício.
2 - Cumulando-se na mesma ação vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles; mas quando, como acessório do pedido principal, se pedirem juros, rendas e rendimentos já vencidos e os que se vencerem durante a pendência da causa, na fixação do valor atende-se somente aos interesses já vencidos.
3 - No caso de pedidos alternativos, atende-se unicamente ao pedido de maior valor e, no caso de pedidos subsidiários, ao pedido formulado em primeiro lugar.”.
Do art.º 299º, que rege sobre o “Momento a que se atende para a determinação do valor”, interessa-nos o n.º1, dispondo que “Na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a ação é proposta, exceto quando haja reconvenção ou intervenção principal”.
Por último, o art.º 306º -“Fixação do valor”) – dispõe o seguinte:
1 - Compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes.
2- O valor da causa é fixado no despacho saneador, salvo nos processos a que se refere o n.º 4 do artigo 299.º e naqueles em que não haja lugar a despacho saneador, sendo então fixado na sentença.
3 - Se for interposto recurso antes da fixação do valor da causa pelo juiz, deve este fixá-lo no despacho referido no artigo 641.º.”.
Estando-se perante uma acção especial de impugnação da regularidade licitude e licitude do despedimento, importa também atender à norma especial do CPT, nomeadamente, ao art. 98º-P, sob a epígrafe “Valor da causa”, nos termos da qual:
1 - Para efeitos de pagamento de custas, aplica-se à acção de impugnação judicial de regularidade e licitude do despedimento o disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 12.º do Regulamento das Custas Processuais.
2 - O valor da causa é sempre fixado a final pelo juiz tendo em conta a utilidade económica do pedido, designadamente o valor de indemnização, créditos e salários que tenham sido reconhecidos.
3 - Se for interposto recurso antes da fixação do valor da causa pelo juiz, deve este fixá-lo no despacho que admite o recurso.”
Revertendo ao caso, no despacho em que admitiu o recurso, o Senhor Juiz não deu cumprimento ao disposto no n.º 3, do art.º 98.º P, que acolhe o princípio enunciado no n.º3, do art.º 641.º do CPC.
Justamente por isso, foi determinada a baixa do processo para cumprimento do determinado nessas normas.
O Tribunal a quo limitou-se a proferir singelo despacho, com o teor seguinte:
Para efeitos de recurso, fixo o valor da causa em € 2.000,00 – artigo 98º-P, nº 1 do CPT».
A recorrente tem alguma razão na sua argumentação, em concreto, quando se insurge contra a aplicação do n.º1, do art.º 98-º-P, do CPT, mas já não quando vem defender que a recorrida Ré deveria ter indicado o valor considerando o valor provável da indemnização por despedimento ilícito e das retribuições intercalares vencidas desde o despedimento até à decisão declarando a ilicitude do despedimento, a sugerir, embora sem o dizer expressamente, que o tribunal a quo deveria ter fixado o valor nesses pressupostos.
Conforme flui da norma invocada pelo Tribunal a quo, a mesma tem em vista afirmar um critério para a fixação de valor válido “Para efeitos de pagamento de custas(..)”.
Ora, como decorre do n.º2, do art.º 296.º, do CPC, o valor da causa releva, além do mais, “(..) para determinar (..) a relação da causa com a alçada do tribunal”, importando, por conseguinte, para efeitos de admissibilidade de recurso, que é coisa diferente.
Não sendo despiciendo deixar esclarecido, que mesmo nos casos, como aqui acontece, em que está sempre assegurada a possibilidade de recurso para a 2.ª instância, independentemente do valor da causa e da sucumbência, a fixação do valor não perde esse interesse, antes pelo contrário, para a hipótese de eventual recurso de revista ordinária ou excepcional.
Acontece, porém, que na fase processual em que foi fixado o valor do recurso - nos termos previstos no n.º3, do art.º 98.-P, que acolhe o disposto no art.º 306.º n.º3, do CPC-, os autos não dispunham dos elementos necessários e suficientes para o tribunal a quo ter fixado o valor atendendo à utilidade económica do pedido, designadamente ao valor de indemnização, créditos e salários que venham a ser reclamados, em consonância com o disposto no n.º1, do art.º 296.º do CPC e n.º2, do art.º 98.º P (que acolhe aquela regra). Nesse momento o Tribunal a quo apenas dispunha do formulário a que se referem os artigos 98.º C e 98.º D, do CPT, bem assim do articulado motivador do despedimento apresentado pela ré empregadora.
Ora, como sabido, o conteúdo daquele formulário limita-se ao essencial, designadamente, a conter já a menção que o trabalhador se vem opor ao despedimento, bem assim a menção “PELO QUE REQUER A V/EXA. SEJA DECLARADA A ILICITUDE OU A IRREGULARIDADE DO MESMO, COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS”, não contendo qualquer indicação sobre a retribuição do trabalhador, nem qualquer concretização dos pedidos, o que só terá lugar na contestação ao articulado motivador do despedimento que o trabalhador vier a apresentar e, mais do que isso, em sede de pedido reconvencional que aí venha a ser deduzir. Assim decorre do art.º 98.º L, n.º3, do CPT, ao dispor: Na contestação, o trabalhador pode deduzir reconvenção nos casos previstos no n.º 2 do artigo 266.º do Código de Processo Civil, bem como para peticionar créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou da sua cessação, incluindo a indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do Código do Trabalho, independentemente do valor da ação”.
Por outro lado, contrariamente ao que defende a autora, a empregadora não tem que atribuir o valor à causa ficcionando que o despedimento irá ser declarado ilícito. Como é lógico, ao apresentar o articulado motivador do despedimento o empregador vem procurar que seja reconhecida a existência da justa causa que invocou para a decisão de despedimento, pugnando pela declaração da regularidade do procedimento disciplinar e da licitude na aplicação da mais grave sanção prevista na lei, pondo termo à relação de trabalho subordinado. Daí que, nesse momento inicial, seja legítimo que faça uso do disposto no n.º1, do art.º 98.º P, do CPT.
Acresce dizer, para que fique esclarecido, que a contestação entretanto apresentada nos autos, via CITIUS, em 18 de Maio de 2020, subscrita pela ilustre mandatária Dr.ª D…, não podia ser considerada, dado não estar admitida, colocando-se a questão da sua inadmissibilidade por intempestiva.
Neste quadro, não dispondo de elementos para determinar o valor o valor atendendo à utilidade económica do pedido, restaria ao Tribunal a quo definir um critério que melhor se enquadrasse nos fins visados pela lei, nomeadamente, no n.º2, do art.º 296.º, do CPC, ou seja, à função de servir “(..) para determinar (..) a relação da causa com a alçada do tribunal”.
Sendo de referir que o n.º2, do art.º 98.º P, do CPT, tem também em vista assegurar essa finalidade de se determinar a relação da causa com a alçada do tribunal.
Diz-se alçada de um tribunal o limite de valor das causas dentro do qual, em regra, o tribunal julga sem admissibilidade de recurso ordinário.
Na presente acção, está em causa o despedimento da trabalhadora por iniciativa da empregadora e, logo, nos termos do art.º 79.º n.º 1, al. a), independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso para a Relação.
Pode assim dizer-se, estar a ficciona-se que a acção tem pelo menos o valor superior ao da alçada da 1.ª instância, a qual, como se sabe é de € 5.000,00 (art.º 44.º /1, da Lei n.º 163/2013, de 28-06).
Por conseguinte, afigura-se-nos como mais correcto atribuir à acção o valor de € 5.000,01.
Concluindo, reconhece-se razão à recorrente, devendo ser revogada a decisão recorrida, em substituição fixando-se o valor da acção em € 5.000,01 (cinco mil euros e um cêntimo).
II.3 Recurso dirigido à decisão que indeferiu o requerimento para suspensão do prazo para apresentação da contestação
A recorrente impugna a decisão que lhe indeferiu o requerimento apresentado em 28 de Abril de 2020, visando que pelo tribunal a quo fosse determinada a “a suspensão do prazo para apresentação da Contestação”, com base em três fundamentos distintos, nomeadamente:
i) “[O] prazo de apresentação da contestação é um prazo peremptório de prescrição sempre o mesmo se encontraria suspenso” [Conclusões 6 e 7];
b) A Lei 4-A/2020 no seu art. 7 n. º 7, quanto à suspensão de prazos, aplica-se ao ato processual contestação” [conclusão 1 e 8 a 18];
c) Existir fundamento para ser reconhecida a existência de justo impedimento, para além disso tendo o Tribunal a quo feito “uma errónea aplicação e interpretação da Lei e omissão do dever de ouvir a prova testemunhal apresentada” [Conclusões 19 a 31].
II.3.1 Quanto ao primeiro fundamento, defende a recorrente que “a Lei 4 – A/2020, no seu art.º 7.º mantem o n.º 3 inalterado pelo que, se deve entender que os prazos de prescrição e caducidade se mantêm suspensos em relação a todo o tipo de processos. O prazo de apresentação da contestação é um prazo peremptório de prescrição sempre o mesmo se encontraria suspenso.
Contrapõe a recorrida que esse preceito não é aplicável ao caso, na medida em que o prazo para apresentação de Contestação é um prazo judicial e não substantivo. Não foi para uma situação como esta que foi estabelecido o n.º 3 do artigo 7.º.
O Tribunal a quo não se pronunciou quanto à eventual aplicação desta norma, o que se explica por duas razões: a recorrente não invocou a norma no requerimento apresentado; a norma não tem aplicação ao caso.
Se fosse aplicável, poderia e deveria fazê-lo, na medida em que nesse caso seria de conhecimento oficioso (art.º 608.º 2, do CPC). Por essa precisa razão, não se está perante uma questão nova e, logo, nada obsta a que a recorrente a coloque agora e este tribunal ad quem se pronuncie.
A norma em causa foi introduzida pelo art.º 7.º n.º3, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, diploma que, conforme enunciado pelo artigo 1.º, visou proceder à "ratificação do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março", e à "aprovação de medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2, agente causador da doença COVID-19".”
De referir, que nos termos do artigo 11.º, foi fixada a entrada em vigor no dia seguinte ao da publicação.
Na sua versão inicial o art.º7.º daquele diploma, com a epígrafe “Prazos e diligências”, no que aqui releva, veio dispor o seguinte:
1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, aos atos processuais e procedimentais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos, que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal, aplica-se o regime das férias judiciais até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, conforme determinada pela autoridade nacional de saúde pública.
2 - O regime previsto no presente artigo cessa em data a definir por decreto-lei, no qual se declara o termo da situação excecional.
3 - A situação excecional constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos.
4 - O disposto no número anterior prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo em que vigorar a situação excecional.
5 - Nos processos urgentes os prazos suspendem-se, salvo nas circunstâncias previstas nos n.os 8 e 9.
[..]
8 - Sempre que tecnicamente viável, é admitida a prática de quaisquer atos processuais e procedimentais através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente por teleconferência ou videochamada.
9 - No âmbito do presente artigo, realizam-se apenas presencialmente os atos e diligências urgentes em que estejam em causa direitos fundamentais, nomeadamente diligências processuais relativas a menores em risco ou a processos tutelares educativos de natureza urgente, diligências e julgamentos de arguidos presos, desde que a sua realização não implique a presença de um número de pessoas superior ao previsto pelas recomendações das autoridades de saúde e de acordo com as orientações fixadas pelos conselhos superiores competentes.
[…]».
Este artigo suscitou várias dúvidas quanto à sua interpretação, para além do mais, no que concerne ao regime de suspensão de prazos judiciais em processo urgentes, razão que determinou o legislador a introduzir-lhe alterações, através da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril.
A disposição agora em causa, ou seja, o n.º3 (em conjugação com o n.º4), ofereceu igualmente dúvidas, designadamente, quanto ao sentido da parte final da norma, isto é, quando refere relativos “a todos os tipos de processos e procedimentos”, mas nunca quanto à natureza dos prazos que se refere. A norma refere-se expressamente aos “prazos de caducidade e prescrição”, os quais, como sabido, têm natureza substantiva, não sendo confundíveis com os prazos judiciais.
Como se sintetiza no Ac. do STJ de 02-03-1994 [Proc.º076282, Conselheiro Martins da Costa, disponível em www.dgsi.pt]:
Os prazos judiciais destinam-se a determinar o período de tempo «para se produzir um determinado efeito processual», ou seja, a «regular a distância entre os actos do processo», e, dada essa função específica, pressupõem, necessariamente, a prévia propositura de uma acção, a existência de um processo (A. Reis, Comentário ..., II, pp. 52 e segs.).
Os prazos substantivos respeitam ao período de tempo exigido para exercício de direitos materiais e são-lhes «aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição» (artigo 298.º, n.º 2, do Código Civil), tendo o seu decurso, em princípio, sem prejuízo das regras respeitantes à necessidade da sua indicação em juízo, a consequência de extinção do respectivo direito.
Ora, como bem refere a recorrida, o prazo para contestar é um prazo judicial, logo, não se lhe aplicando o n.º3, do art.º 7.º Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março.
Improcede, pois, esta linha de argumentação.
II.3.2 Prossegue a recorrente defendendo que o n.º7, do art.º 7.º da Lei 4-A/2020, “quanto à suspensão de prazos, aplica-se ao ato processual contestação” [conclusões 1 e 8 a 18].
Na fundamentação da decisão recorrida, a este propósito, consta o seguinte:
[..]
Porém, este artigo 7.º do citado diploma foi objecto de relevantes alterações, introduzidas pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-A/2020, de 06/04.
Assim, e no que concerne aos processos urgentes, o novo n.º 7 passou a ter a seguinte redacção:
"7 - Os processos urgentes continuam a ser tramitados, sem suspensão ou interrupção de prazos, atos ou diligências, observando-se quanto a estes o seguinte:
a) Nas diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, a prática de quaisquer atas processuais e procedimentais realiza-se através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente;
b) Quando não for possível a realização das diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, nos termos da alínea anterior, e esteja em causa a vida, a integridade física, a saúde mental, a liberdade ou a subsistência imediata dos intervenientes, pode realizar-se presencialmente a diligência desde que a mesma não implique a presença de um número de pessoas superior ao previsto pelas recomendações das autoridades de saúde e de acordo com as orientações fixadas pelos conselhos superiores competentes;
c) Caso não seja possível, nem adequado, assegurar a prática de atas ou a realização, de diligências nos termos previstos nas alíneas anteriores, aplica-se também a esses processos o regime de suspensão referido no n.º 1".
Ou seja, e desde logo, esta norma veio determinar que os processos urgentes passariam afinal a ser tramitados sem qualquer suspensão ou interrupção de prazos, actos ou diligências.
Por outro lado - e agora ao contrário do que é defendido pela Trabalhadora - é meu entendimento que para mim evidente que o regime consagrado nas alíneas a) a c) dessa mesma norma apenas se aplica aos actos e diligências processuais e não aos prazos.
Em primeiro lugar, porque é isso que resulta da expressão ''observando-se quanto a estes o seguinte", constante da parte final do 1.º parágrafo do artigo. Com efeito, se o Legislador se quisesse reportar também aos prazos, mencionados em primeiro lugar (e não apenas aos actos e diligências, mencionados imediatamente antes da referida expressão) não haveria necessidade de utilizar tal expressão, afigurando-se suficiente que tivesse simplesmente escrito 'observando-se o seguinte".
Depois, porque tanto a alínea a) como a alínea b) se referem expressamente a "diligências que requeiram a presença física das partes". Aliás, se atentarmos nas especificidades de tais alíneas, facilmente constatamos que as mesmas se reportam apenas a situações de diligências que requeiram a presença física dias partes. Ou seja, neste âmbito laboral, a audiência de partes, a audiências prévias, a audiências de julgamento ou a juntas médicas. Tudo casos em que está em causa a aglomeração de pessoas e, portanto, a possibilidade de propagação da doença Covid 19.
Isto é, nos processos urgentes deixou de estar prevista qualquer possibilidade de suspensão dos prazos para a apresentação de articulados pelas partes, com fundamento em qualquer motivo directa ou indirectamente ligado à pandemia de Covid 119,
Por outro lado, o artigo 6.º n.º 2 deste novo diploma esclarece que as alterações introduzidas ao n.º 7 do artigo 7.º apenas produzem efeitos na data da entrada em vigor do mesmo, ou seja, no dia 07 de Abril de 2020 (dia seguinte ao da sua publicação, tal como preceitua o artigo 7°).
Daqui se conclui que no presente processo, que tem natureza urgente, os prazos estiveram suspensos desde 09 de Março até 07 de Abril de 2020, tendo-se reiniciado a partir desta data.
Ora, a Trabalhadora foi notificada através de ofício electrónico remetido no dia 01 de Abril de 2020, pelo que se presume que tal notificação ocorreu no terceiro dia útil posterior, ou seja, no dia 06 de Abril de 2020. Saliente-se que - também ao contrário do que a Trabalhadora veio defender- o acto da notificação "stricto sensu" não foi minimamente afectado pelo regime da suspensão de prazos que então vigorava, pelo que tal notificação se considera perfeitamente efectuada e operante (o que a suspensão implicava, outrossim, era a dilação do inicio do prazo para contestar, subsequente a tal notificação).
Como tal, o prazo de 15 dias de que a Trabalhadora dispunha para deduzir contestação teve início no dia seguinte, 07 de Abril (ou seja, no próprio dia em que entrou em vigor o novo regime introduzido pela Lei n.º 4-A/2020); tendo terminado no dia 21 de Abril e sendo prorrogável até ao dia 24 de Abril, ao abrigo do disposto no artigo 139.º n.º 5 do Código de Processo Civil.
Ou seja, quando em 28 de Abril a Trabalhadora veio requerer a declaração de suspensão do processo, já há quatro dias que havia terminado o prazo para a mesma deduzir contestação.
Apenas resta, portanto, julgar a improcedência do requerido pela Trabalhadora»
Para sustentar aquela posição, a recorrente alega, no essencial, que a contestação «é um acto processual a realizar pela parte representada por mandatário que se exprime ou finaliza na peça processual “contestação” definida no art. 131º; 132º e 137º do CPC. A entrega por via eletrónica da contestação é apenas o finalizar de um processo mais complexo de elaboração da mesma que passa por reunir presencialmente com a Autora». Segue, defendendo, com base na al. c), do n.º 7, do art.º 7.º, que “quando não for possível assegurar a prática do ato, elaboração da contestação, em virtude de impossibilidade ou não adequação da reunião presencial que se impõe com a A. o regime é o geral da suspensão (n.º 1 do art. 7.º)”.
Nesses pressupostos, conclui que «A separação defendida pelo douto Tribunal “a quo” entre prazos e actos no caso de apresentação em Juízo de uma contestação não é sustentável”.
Contrapõe a recorrida, também no essencial, que o artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, apenas suspendeu alguns prazos para a prática de atos processuais e procedimentais. Quanto a processos urgentes os prazos não ficaram suspensos sempre que fosse tecnicamente viável a prática de quaisquer atos processuais e procedimentais através de meios de comunicação à distância adequados (art. 7.º, n.º 8). É o caso do presente processo, por essa razão tendo sido apresentado o seu articulado via CITIUS.
Mais refere, que a partir de 7 de Abril de 2020, aplicou-se a redação introduzida pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril que veio dissipar quaisquer dúvidas que pudessem existir ao estabelecer que os processos urgentes passavam a ser tramitados, sem qualquer suspensão ou interrupção de prazos, atos ou diligências. O que está em causa nas diversas alíneas do n.º 7 do art. 7.º são atos ou diligências processuais, que se tenham de realizar presencialmente no Tribunal e não, nomeadamente, contactos ou reuniões entre mandatários e os seus clientes.
Diremos, desde já, que concordamos com a fundamentação do tribunal a quo e, logo, por decorrência lógica, com a conclusão a que chegou, julgando improcedente o requerido. Mas importa que justifiquemos esta asserção.
Como já referimos, o art.º 7.º da Lei n.º1-A/2020, de 19 de Março, suscitou várias dúvidas quanto à sua interpretação, designadamente, no que concerne ao regime de suspensão de prazos judiciais, maxime em processo urgentes, razão que determinou o legislador a introduzir-lhe alterações, através da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril.
No que concerne aos processos urgentes, que é o que aqui nos ocupa [art.º 26.º n.º1, al, a), do CPT], importa ter presente que artigo 6.º da Lei n.º 4-A/2020, começando por afirmar no seu n.º1, a produção dos efeitos da Lei n.º1-A/2020, de 19 de Março, na data da produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, dispõe depois no n.º 2, o seguinte:
-"O artigo 7.º da Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março, na redação introduzida pela presente lei, produz os seus efeitos a 9 de março de 2020, com exceção das normas aplicáveis aos processos urgentes e do disposto no seu n.º 12, que só produzem efeitos na data da entrada em vigor da presente lei".
Em suma, no que respeita aos processos urgentes, as alterações introduzidas pela Lei n.º 4-A/2020, ao art.º 7.º da Lei n.º 1-A/2020, apenas produzem efeitos a partir da entrada em vigor daquela primeira.
Assim, estabelecendo, depois, o art.º 7.º, da Lei n.º 4-A/2020, que “A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação”, conclui-se, que as normas “aplicáveis aos processos urgentes”, como é o caso, entraram em vigor a 7 de Abril de 2020.
Como referiu o Tribunal a quo, o acto da notificação não foi afectado pelo regime da suspensão de prazos ou da prática de actos, pelo que deve considerar-se efectuada e operante a notificação do articulado motivador do despedimento, através de ofício electrónico – via Citius – elaborado em 1 de Abril de 2020 (quarta-feira), na pessoa da ilustre mandatária E…, “para no prazo de 15 dias contestar, querendo, sob pena de se considerarem confessados os factos articulados pelo empregador, sendo logo proferida sentença a julgar a causa conforme for de direito”, bem assim com a menção “O prazo corre em férias, visto que se tratar de um processo urgente”.
Presumindo-se a notificação feita no 3.º dia posterior ao da elaboração ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando não o seja (art.º 248.º do CPC), é de considerar que a autora foi notificada a 6 de Abril (segunda-feira).
O prazo de 15 dias para contestar, a menos que estivesse suspenso, iniciou-se, pois a 7 de Abril, ou seja, no preciso dia em que entrou em vigor o art.º 7.º, da Lei n.º 1- A/2020, de 19 de Março, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril, dispondo, no que concerne aos processos urgentes e no que aqui interessa, o seguinte:
Artigo 7.º Prazos e diligências
[..]
7 - Os processos urgentes continuam a ser tramitados, sem suspensão ou interrupção de prazos, atos ou diligências, observando-se quanto a estes o seguinte:
a) Nas diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, a prática de quaisquer atos processuais e procedimentais realiza-se através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente;
b) Quando não for possível a realização das diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, nos termos da alínea anterior, e esteja em causa a vida, a integridade física, a saúde mental, a liberdade ou a subsistência imediata dos intervenientes, pode realizar-se presencialmente a diligência desde que a mesma não implique a presença de um número de pessoas superior ao previsto pelas recomendações das autoridades de saúde e de acordo com as orientações fixadas pelos conselhos superiores competentes;
c) Caso não seja possível, nem adequado, assegurar a prática de atos ou a realização de diligências nos termos previstos nas alíneas anteriores, aplica-se também a esses processos o regime de suspensão referido no n.º 1.
Decorre desta norma que os processos urgentes continuam a ser tramitados sem suspensão ou interrupção de prazos, actos ou diligências, excepto nas situações que se enquadrem na previsão da alínea c), ou seja, quando “não seja possível, nem adequado, assegurar a prática de atos ou a realização de diligências” a que se referem as precedentes alíneas a) e b), nesse caso ficando abrangidos pelo regime de suspensão referido no n.º 1, do artigo, que passou a dispor – com efeitos retroagidos a 9 de Março de 2020 (art.º 6.º n.º2, da Lei 4-A/2020) – o seguinte:
1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, todos os prazos para a prática de atos processuais e procedimentais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal ficam suspensos até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, a decretar nos termos do número seguinte».
A recorrente pretende defender que na situação em apreço não se aplica a regra definida no n.º 7 do art.º 7º, para os processos urgentes, ou seja, de continuarem a ser tramitados sem suspensão ou interrupção de prazos, actos ou diligências, procurando enquadrá-la na excepção prevista na alínea c), desse mesmo número, defendendo que a contestação é um acto processual a realizar pela parte representada por mandatário que se exprime ou finaliza na peça processual “contestação”, mas sem que essa construção possa merecer acolhimento.
Com o devido respeito, da conjugação das normas do n.º 7 e das alíneas a) e b), resulta com clareza estarem em causa atos ou diligências processuais que, como bem refere o tribunal a quo, requeiram a presença física dias partes, por exemplo, “neste âmbito laboral, a audiência de partes, a audiências prévias, a audiências de julgamento ou a juntas médicas”.
O propósito do legislador não foi seguramente o de abranger contactos ou reuniões entre mandatários e os seus clientes.
Assim sendo, como refere o tribunal a quo, o prazo de 15 dias para a apresentação da contestação, tendo-se iniciado a 07 de Abril (no próprio dia em que entrou em vigor o novo regime introduzido pela Lei n.º 4-A/2020), atingiu o seu termo no dia 21 de Abril, podendo ainda o acto ser praticado até ao dia 24 de Abril, mediante o pagamento de multa, nos termos permitidos pelo artigo 139.º n.º 5 do CPC.
Assim, por um lado, em 28 de Abril, quando a autora veio requerer a declaração de suspensão do prazo para contestar, já há quatro dias que havia terminado o prazo para a prática desse acto. Por outro, ainda que tivesse vindo em prazo, o certo é que a situação não fugia à regra estabelecida no n.º7, do art.º 7, para os processos urgentes, repete-se, de continuarem a ser tramitados sem suspensão ou interrupção de prazos, actos ou diligências, não devendo esquecer-se que a contestação só veio a ser em 18 de Maio de 2020, bem assim que a apresentação daquele requerimento, só por si, não era idónea a produzir qualquer efeito no decurso do prazo para apresentação da contestação.
Em conclusão, não se reconhece razão à recorrente, inexistindo fundamento para pôr o decidido em causa.
II.3.3 Numa derradeira linha de argumentação, insurge-se a recorrente contra a decisão do Tribunal a quo, por ter indeferido ”o requerimento de justo impedimento2 [conclusão 1 e 19 e sgts].
Começando por contextualizar a questão, deve assinalar-se que embora a autora tenha iniciado o requerimento de 28 de Abril, com o título “QUESTÃO PRÉVIA DO PRAZO PARA CONTESTAR/JUSTO IMPEDIMENTO”, depois, ao longo do articulado não se encontra qualquer referência ao justo impedimento, nos termos previstos nos artigos 139.º n.º5 e 140.º do CPC, antes resultando que as invocações factuais feitas, nomeadamente, que uma das mandatárias (art.º9.º) “é doente auto-imune com incapacidade de 78%, por isso doente de alto risco na atual situação de Pandemia que o País atravessa, que a escola do seu filho se encontra encerrada, e encontra-se no inicio de uma gravidez de risco, encontrasse impedida de contactar pessoalmente com a Autora” e que a outra (art.º10.º) “é casada e que o seu marido é doente de elevado risco, quer pela idade (66 anos), quer pela incapacidade que possui de 83,5 %, (..) foi absolutamente impossível diligenciar no sentido de preparar a respectiva Contestação”, visaram sustentar a aplicação da al. c), do n.º7, do art.º 7.º, da Lei n.º 1- A/2020, de 19 de Março, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril, ou seja, a questão apreciada no ponto antecedente.
Com efeito, o requerimento é rematado com o pedido seguinte (art.º 12.º): “Considerando-se verificado o disposto no art.º 7.º n.º 7 al. c) da lei supra mencionada, requer-se a V. Exa. se digne determinar a suspensão do prazo para apresentação da Contestação”.
Entendeu o tribunal, como o explica- e a nosso ver correctamente, atento o disposto no n.º3, do art.º 140.º do CPC - que deveria apreciar a questão na perspectiva de eventual verificação de justo impedimento, pronunciando-se nos termos seguintes:
-«[..]
Sem prejuízo, não posso deixar de tecer uma breve consideração complementar.
Com efeito, independentemente da improcedência da pretensão da Trabalhadora em ver declarada a suspensão do prazo para contestar, nada obstaria a que o Tribunal pudesse apreciar a questão levantada sob um outro prisma jurídico, mais concretamente sob a eventual verificação de justo impedimento,
Assim, dispõe o artigo 140.º n.º 1 do Código de Processo Civil que 'considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que oeste à prática atempada do acto".
Por outro lado, o n.º2 do mesmo normativo determina que o requerente será admitido a praticar o acto "fora do prazo" se o juiz "julgar verificado o impedimento e reconhecer que a parte se apresentou a requerer lago que ele cessou".
Assim sendo, a actual definição do justo impedimento passou a dar o merecido relevo à culpa, isto é, passou a centrar-se na não imputabilidade à parte, nem aos seus representantes ou mandatários, pela ocorrência do obstáculo que impediu a prática do acto.
Decisivo para a verificação do justo impedimento é, pois, a inexistência de culpa da parte, seu representante ou mandatário na ultrapassagem do prazo peremptório de que dispunham. Tal não obsta à possibilidade de a parte ou o mandatário terem tido participação na ocorrência, desde que, em termos gerais, tal não envolva um juízo de censurabilidade.
Resumindo, e como ensinava Alberto dos Reis, in "Comentário ao Código de Processo Civil", volume II, página 72, 'o interessado não pode colocar-se ao abrigo do justo impedimento quando lenha havido, da sua parte, culpa, negligência ou imprevidência. Se o evento era susceptível de previsão normal e a parte não se acautelou contra ele, sibi imputet: a parte foi imprevidente.
Ora, cabe à parte interessada - a que não praticou tempestivamente o acto - alegar e provar a sua falta de culpa, isto é, a ocorrência de caso fortuito ou de força maior que esteve na origem do respectivo impedimento - neste sentido, vide Lebre de Freitas/João Redinha/Rui Pinto, in "Código de Processo Civil Anotado", 1999, Volume 1°, páginas 257 e 258; Lopes do Rêgo, in "Comentários ao Código de Processo Civil", página 125; para além de, entre outros, os Acórdãos da Relação do Porto de 07/03/2005; o Acórdão da Relação de Lisboa de 04/11/2004; e o Acórdão da Relação de Coimbra de 20/04/2018, todos consultáveis in www.dgs.pt.
Sucede, porém, que no caso presente os elementos existentes nos autos não permitem ao tribunal concluir pela existência de justo impedimento.
É certo que está demonstrado que uma das mandatárias da Trabalhadora sofre de doenças incapacitantes, uma delas diabetes, o que a torna uma pessoa de risco; e que o marido da outra mandatária é também uma pessoa de risco.
Contudo, tais factos, só por si, não são suficientes para permitir concluir que as referidas mandatárias estão impossibilitadas de contactar com a Trabalhadora, com vista a recolher os elementos necessários à elaboração da contestação.
Tenha-se em consideração que o formulário inicial com que a Trabalhadora deu entrada à acção foi já acompanhado de procuração a favor das duas referidas mandatárias, o que permite presumir que as mesmas estavam já dentro das contingências específicas do processo. Tanto mais que uma delas interveio presencialmente na audiência de partes.
Por outro lado, não foi alegado nenhum facto relativo à impossibilidade de as referidas mandatárias poderem comunicar com a Trabalhadora, sua cliente, através de qualquer meio de comunicação à distância.
Não existem nos autos, portanto, elementos bastantes para o Tribunal poder concluir pela ocorrência de justo impedimento.
3. Pelo exposto, indefiro o requerido pela Trabalhadora».
Alega a recorrente, no essencial, ter alegado no artigo 7 do requerimento que a contestação “implica a prática dum ato que envolve presença física, diálogo e apresentação de documentos pela Autora”, matéria que deveria ser dada como provada.
Mais refere ter alegado que a mandatária notificada se encontrava com uma gravidez de risco, para além de ter uma doença autoimune considerada “de per si” de risco, agravada pela pandemia e pela gravidez, matéria que deveria ser dada como provada. À data, nem sequer possuía ainda qualquer relatório, mas a prova testemunhal oferecida poderia ter esclarecido este facto.
Defende, assim, que a doença, o confinamento e o confronto com uma gravidez de risco deveriam ter sido fundamentos suficientes para dotar o Mm. Juiz de algum discernimento na avaliação da culpa.
Por último, alega que em relação à mandatária impossibilitada de exercer o seu mandato e a única notificada nos presentes autos, determina o art.º 269.º do CPC no seu n.º 1 b) que,“ A instância suspende-se quando este ficar absolutamente impossibilitado de exercer o seu mandato” e o art.º 275.º n.º 2 do CPC determina que os prazos judiciais não correm enquanto durar a suspensão, suspensão essa que inutiliza a parte do prazo que tiver decorrido anteriormente.
Conclui, defendendo que o Tribunal a quo fez uma errónea aplicação e interpretação da Lei e omissão do dever de ouvir a prova testemunhal apresentada.
Contrapõe a recorrida, também no essencial, que a necessidade de um período de isolamento para evitar risco de contágio do Covid-19, apenas seria relevante para efeitos de invocação de “justo impedimento à prática de atos processuais e procedimentais que devam ser praticados presencialmente no âmbito de processos, procedimentos, atos e diligências que corram os seus termos nos tribunais judiciais”, havendo “declaração emitida por autoridade de saúde” (art. 14.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março), o que não é o caso dos autos.
E, que “[N]ão só não se concebe a necessidade dessa reunião presencial, como a matéria objeto dos presentes autos é do pleno conhecimento das Mandatárias da Recorrente na medida em que a mesma foi já, de modo conexo ou relacionado, discutido no âmbito da providência cautelar que correu termos sob o processo n.º 3499/18.5T8VNG – Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia – Juiz 2 e que veio dar origem ao Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto sob o proc. n.º 3499/18.5T8VNG.P1, ou mesmo no processo n.º 705/20.0T8VNG, que correu termos no Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia – Juiz 2”.
Mais refere que a alegação de justo impedimento não pode aproveitar à Recorrente porquanto o prazo para contestar terminou no dia 21.04.2020, tendo a Recorrente apenas alegado justo impedimento para a prática do ato depois de decorrido o prazo para o mesmo, em 28.04.2020. A apresentação da Contestação é manifestamente extemporânea, não obstante o alegado justo impedimento, na medida em que a sua invocação ocorreu decorrido o prazo “normal” perentório.
Refere, ainda, que a Mandatária subscritora do recurso é D… e quanto a eventual impedimento para a prática do ato a si associado, nada é invocado, alegado e muito menos provado no âmbito do recurso apresentado. Estando em causa procuração conjunta, outorgando poderes a ambas as Mandatárias da Recorrente, o patrocínio poderia ser assegurado indistintamente por qualquer uma delas.
Vejamos então.
Em primeiro lugar, a alegação que a recorrente entende deveria ser considerada provada, ou seja, que a apresentação da contestação “implica a prática dum ato que envolve presença física, diálogo e apresentação de documentos pela Autora”, é conclusiva e, logo, nunca poderia ser considerada provada.
Conforme é entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, as conclusões apenas podem extrair-se de factos materiais, concretos e precisos que tenham sido alegados, sobre os quais tenha recaído prova que suporte o sentido dessas alegações, sendo esse juízo conclusivo formulado a jusante, na sentença, onde cabe fazer a apreciação crítica da matéria de facto provada. Dito de outro modo, só os factos materiais são susceptíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados. As conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas serem objecto de prova [cfr. Acórdão de 23.9.2009, Proc. n.º 238/06.7TTBGR.S1, Bravo Serra; e, mais recentemente, reiterando igual entendimento jurisprudencial: de 19.4.2012, Proc.º 30/08.4TTLSB.L1.S1, Pinto Hespanhol; de 23/05/2012, proc.º 240/10.4TTLMG.P1.S1, Sampaio Gomes; de 29/04/2015, Proc.º 306/12.6TTCVL.C1.S1, Fernandes da Silva; de 14/01/2015, Proc.º 488/11.4TTVFR.P1.S1, Fernandes da Silva; 14/01/2015, Proc.º 497/12.6TTVRL.P1.S1, Pinto Hespanhol; todos disponíveis em http://www.dgsi.pt/jstj].
Entendimento igualmente sustentado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-03-2014, afirmando-se que “Só acontecimentos ou factos concretos podem integrar a seleção da matéria de facto relevante para a decisão, sendo, embora, de equiparar aos factos os conceitos jurídicos geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, verificado que esteja um requisito: não integrar o conceito o próprio objeto do processo ou, mais rigorosa e latamente, não constituir a sua verificação, sentido, conteúdo ou limites objeto de disputa das partes” [Proc.º n.º 590/12.5TTLRA.C1.S1, Conselheiro Mário Belo Morgado, disponível em www.dgsi.pt].
Assim, as afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão. Daí que sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, tal ponto da matéria de facto deve ser eliminado [Ac. STJ de 28-01-2016, Proc. nº 1715/12.6TTPRT.P1.S1, António Leones Dantas, www.dgsi.pt.].
Mas para além disso, acontece que a recorrente, quer com esse argumento, quer com os que seguiram e acima apontámos, não está a levar em devida conta os fundamentos que levaram o Tribunal a quo a concluir pela inexistência de razões para se considerar existir justo impedimento, em síntese:
- Não existirem factos, entendam-se alegados, “suficientes para permitir concluir que as referidas mandatárias estão impossibilitadas de contactar com a Trabalhadora, com vista a recolher os elementos necessários à elaboração da contestação”, sendo que existe “procuração a favor das duas referidas mandatárias, o que permite presumir que as mesmas estavam já dentro das contingências específicas do processo. Tanto mais que uma delas interveio presencialmente na audiência de partes”.
- Não foi alegado nenhum facto relativo à impossibilidade de as referidas mandatárias poderem comunicar com a Trabalhadora, sua cliente, através de qualquer meio de comunicação à distância.
Veja-se que num primeiro momento o tribunal a quo afirma expressamente ser “(..) certo que está demonstrado que uma das mandatárias da Trabalhadora sofre de doenças incapacitantes, uma delas diabetes, o que a torna uma pessoa de risco; e que o marido da outra mandatária é também uma pessoa de risco”, perdendo qualquer relevo o argumento da recorrente, sustentado na gravidez de risco da mandatária notificada e da possibilidade de prova pelas testemunhas que arrolou.
Ademais, com o devido respeito, convenhamos, a prova testemunhal, a menos que a testemunha seja qualificada em termos de conhecimento médico-científico, não será seguramente a adequada para demonstrar uma gravidez de risco e os riscos inerentes.
Seja como for, o ponto não é esse, mas antes não ter sido alegada sequer a impossibilidade das duas mandatárias constituídas contactarem por qualquer meio a autora, de modo a recolher eventuais elementos concretos e precisos que fossem necessários para apresentar a contestação.
Dito de outro modo, era necessária uma alegação com factos concretos e precisos, de onde pudesse deduzir-se, mediante a sua demonstração, que tal contacto era de todo inviável, apesar de estarem duas mandatárias constituídas, bem assim que estavam em causa a recolha de determinados elementos, também devidamente concretizados. Ora, como se disse a recorrente limitou-se a alegar conclusivamente.
Embora o tribunal a quo não o tenha referido na fundamentação, para rebater a argumentação aqui trazida pela recorrente não é despiciendo assinalar que a contestação foi apresentada – em 18 de Maio de 2020, subscrita pela ilustre mandatária Dr.ª D…, tendo sido indicadas 8 testemunhas e juntos 13 documentos, lendo-se no articulado, para além do mais, o seguinte:
-« 28.º A 26 de Março a A. através da sua mandatária envia uma carta aos Recursos Humanos Centrais da C… informando este departamento da tentativa de alteração de funções e categoria que a A. tinha sofrido, tentando alcançar um eventual acordo para uma eventual cessação do vínculo laboral. (Doc. n.º 9, que aqui se junta e se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos)
29.º Através de carta datada de 29 de Março, a R. envia resposta esclarecendo que não existia na C… categoria de Controladora da Receção de Mercadorias, não tolerariam recusas no desempenho de tarefas e que não se encontrariam disponíveis para qualquer acordo de cessação. (Doc. n.º 10, que aqui se junta e se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos)
Por conseguinte, sendo certo que as circunstâncias invocadas no requerimento e aqui reiteradas pela recorrente não se alteraram, a apresentação da contestação em 18 de Maio de 2020, pela ilustre mandatária que subscreve o recurso em apreciação, devidamente instruída, que entretanto já trocara missivas com a recorrida, evidencia não só o conhecimento do processo que o tribunal a quo presumiu, mas também que afinal as alegas dificuldades não obstaram ao exercício do patrocínio.
Ademais, também não é irrelevante o conhecimento da matéria dos autos por parte das ilustres Mandatárias da Recorrente, que a recorrida invoca, reiterando o que já referira na oposição ao requerimento apresentado pela autora, decorrente da conexão da situação com o que foi discutido nos processos que identifica (providência cautelar que correu termos sob o processo n.º 3499/18.5T8VNG – Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia – Juiz 2 e que veio dar origem ao Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto sob o proc. n.º 3499/18.5T8VNG.P1, (..)”.
De resto, procedimento cautelar e recurso a que a recorrente faz referência na contestação que apresentou, nos artigos 51.º e segts, começando por alegar neste que “intentou a providência cautelar pedindo que fosse declarada a ilicitude da alteração da categoria profissional e funções da A., e pedindo a condenação da R a:
a) atribuir à A. as funções de Controladora da Receção de Mercadorias correspondentes á actual categoria de Operadora Principal de RM/ou Fiel de Armazém;
b) atribuir à A. o Horário que sempre praticou e que esta atribui a todas as Administrativas das 9h às 18h de segunda a sexta feira,
c) e, consequentemente, determinar como legitima a recusa da A. em não executar tarefas não compreendidas nas suas funções».
Em linha com o que se vem expondo, acresce dizer, como assinala a recorrida, que o recurso foca-se no alegado impedimento de uma das mandatárias, quando existe procuração outorgando poderes a ambas as mandatárias. Ora, a procuração conjunta visa assegurar que qualquer uma das mandatárias possa indistintamente assegurar o patrocínio, desde logo, praticando actos processuais e intervindo em diligências.
Aliás, a contestação e o presente recurso foram apresentados pela ilustre mandatária Dr.ª D….
Precisamente por isso, também não merece acolhimento o derradeiro argumento da recorrente, alegando que a notificação foi dirigida a uma das mandatárias, ou seja, a Sr.ª Dr.ª E…, para pretender a aplicação do disposto nos art.º 269.º e 275.º do CPC.
O facto da notificação para apresentar a contestação tenha sido dirigida àquela ilustre mandatária não significa que não produza todos os efeitos, nomeadamente, os previstos no art.º 237.º do CPC. Nada exigia que ambas as mandatárias fossem notificadas, antes lhe cabendo articular entre si o adequado exercício do patrocínio judiciário para que foram mandatadas através de procuração conjunta, enquanto “advogadas na Sociedade de Advogados, F…, RL”.
Concluindo, não procedem os fundamentos invocados pela recorrente e, logo, também nesta parte não merece censura a decisão recorrida.
Mas indo mais além, ainda que assim não se entendesse, sempre o pretendido reconhecimento de justo impedimento estaria votado ao insucesso e, diga-se, por razões que se colocam até a montante da apreciação que antecede. A recorrida tem razão quando vem defender que a alegação de justo impedimento não pode aproveitar à Recorrente, dado ter vindo requer a suspensão do prazo em 28-04-2020, já depois do termo do prazo para contestar, ocorrido no dia 21-04-2020.
Com efeito, como sintetiza o sumário do Ac. do STJ de 27-11-2008 [Proc.º 08B2372, Conselheiro Santos Bernardino, disponível em www.dgsi.pt, “O justo impedimento só pode ser invocado em situações em que ainda não tenha decorrido o prazo peremptório estabelecido na lei para a prática do acto processual, não o podendo ser no período temporal adicional de três dias úteis, estabelecido no n.º 5 do art. 145º do Cód. Proc. Civil”. Para que melhor se compreenda, atente-se na elucidativa fundamentação que conduziu àquela conclusão:
[…]
3.2. É nosso entendimento que a questão, tal como se desenha nos autos, não mereceu o tratamento adequado nas decisões das instâncias.
Em ambas se procurou saber se se verificaram, in casu, os requisitos da figura do justo impedimento, tal como a recorta o n.º 1 do art. 146º do CPC.
Mas, a nosso ver, a questão coloca-se a montante: antes de se indagar da verificação do justo impedimento, importa decidir se, na situação em apreço, podia ser invocado este instituto para legitimar a apresentação da contestação na data em que o foi, já depois de decorrido o prazo respectivo e os três dias subsequentes.
E a nossa resposta é no sentido negativo.
O art. 145º do CPC dispõe:
1. O prazo é dilatório ou peremptório.
2. O prazo dilatório difere para certo momento a possibilidade de realização de um acto ou o início da contagem de um outro prazo.
3. O decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto.
4. O acto poderá, porém, ser praticado fora do prazo em caso de justo impedimento, nos termos regulados no artigo seguinte.
5. Independentemente de justo impedimento, pode o acto ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento, até ao termo do 1º dia útil posterior ao da prática do acto, de uma multa de montante igual a um quarto da taxa de justiça inicial por cada dia de atraso, não podendo a multa exceder 3 UC.
6. (...)
7. (...)
Resulta do n.º 3 do preceito transcrito que é prazo peremptório o estabelecido para a prática de um acto processual que, uma vez ele decorrido, deixa de poder ser praticado. Deixando a parte decorrer o prazo peremptório de que legalmente disponha, extingue-se o direito de o praticar: é este o princípio geral, emergente do citado n.º 3.
A este regime preclusivo que decorre do decurso de prazo peremptório estabelece a lei duas excepções.
A primeira: a parte pode praticar o acto fora do prazo, havendo justo impedimento (entenda-se, de o praticar dentro do prazo).
A segunda: independentemente do justo impedimento, a parte pode praticar o acto fora do prazo desde que o faça num dos três dias seguintes ao seu termo, e pague a multa fixada na lei.
A regra é ser peremptório o prazo processual relativo a acto a praticar pela parte – como a apresentação da contestação.
A possibilidade, conferida pelo n.º 5 do art. 145º, de o acto processual, sujeito a prazo peremptório, ser praticado, mediante pagamento de multa, nos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, independentemente da existência de justo impedimento, é uma inovação introduzida na lei processual pelo Dec-lei 323/70, de 11 de Julho, embora em termos menos permissivos do que os actualmente previstos (a redacção inicial do mencionado n.º 5, introduzido pelo dito Dec-lei, apenas permitia a prática do acto no 1º dia útil posterior ao termo do prazo, na condição do pagamento imediato de multa equivalente a ¼ da taxa de justiça e não inferior a 500$00; a admissibilidade da prática do acto no segundo ou terceiro dia útil posterior ao termo do prazo, mediante o pagamento de multas sucessivamente mais gravosas, foi trazida pela reforma intercalar de 1985 (Dec-lei 242/85, de 9 de Julho), e manteve-se desde então, apenas com alterações quanto ao montante das multas).
Como explica o Prof. ANTUNES VARELA (2), a inovação aportada pelo Dec-lei 323/70 teve por base “o reconhecimento de uma velha pecha da nossa maneira colectiva de agir, a que não se mostram imunes os procuradores mais qualificados de negócios alheios, que são os mandatários judiciais” – o hábito condenável de guardar para a última hora todo o acto que tem um prazo para ser validamente praticado – visando, assim, fundamentalmente, prevenir o possível descuido, esquecimento ou negligência do interessado e evitar que a omissão de uma simples formalidade processual possa conduzir à perda definitiva de um direito material.
Por isso mesmo, para que a faculdade concedida não representasse um prémio ou um “bónus” para a parte processual negligente, fez-se depender a validade do acto do pagamento imediato de uma multa, que assume, assim, o carácter de sanção para um comportamento processual presumivelmente menos diligente ou negligente.
Que assim é, resulta da vincada preocupação do legislador em estabelecer multas gradativamente mais pesadas, conforme o acto for praticado no 1º, no 2º ou no 3º dia posterior ao termo do prazo: para sancionar graus de negligência sucessivamente mais intensos, multas correspondentemente mais pesadas.
Sendo esta a ratio legis, seria inaceitável que o justo impedimento pudesse funcionar e produzir efeitos relativamente a um período temporal adicional, que está fora do prazo peremptório estabelecido na lei e de que a parte só pode valer-se pagando uma multa, como sanção pelo desrespeito pelo prazo que devia ter observado, presumindo-se que o não observou por negligência.
Como decidiu este Supremo Tribunal, em acórdão de 04.05.2006 (3), protelando a prática do acto para os três dias seguintes ao termo do prazo, sem que haja qualquer impedimento à sua prática em tempo (i.e., dentro do prazo), a parte perde a salvaguarda do justo impedimento, pois que este só vale para o «impedimento» surgido no decurso do prazo peremptório. A parte não pode «acumular» o justo impedimento com o alternativo prazo suplementar de condescendência (este já «independente do justo impedimento»).
Em suma – lê-se no aludido aresto – “o «justo impedimento» não vale para o prazo de complacência (dele «independente») condescendido residualmente pelo art. 145º/5 do CPC”.
“Esse prazo residual, concedendo uma última oportunidade para a prática do acto e constituindo já de si uma «condescendência», não poderá contar – sob pena de descaracterização dos prazos peremptórios e da finalidade da sua peremptoriedade (maxime, a celeridade da marcha processual) – com o amparo concedido ao prazo peremptório pelo instituto do «justo impedimento».”
Acompanhamos este entendimento, o que vale por dizer que colocadas as coisas na perspectiva de indagar se há justo impedimento, a conclusão forçosa a retirar é que, em 28 de Abril de 2020, quando a recorrente veio apresentar o requerimento pedindo que fosse declarada a suspensão do prazo para apresentar a contestação já essa possibilidade estava arredada, em virtude do prazo peremptório para contestar já ter atingido o seu termo a 21 de Abril.
Concluindo, também quanto a esta questão improcede o recurso.
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar os recursos nos termos seguintes:
i) Procedente o recurso dirigido à decisão que fixou o valor da acção, revogando-se a decisão recorrida e, em substituição, fixando-se o valor da acção em € 5,000,01 (cinco mil euros e um cêntimo), sem prejuízo da sua fixação a final, nos termos determinados pelo n.º2, do art.º 98.º P do CPT.
ii) Improcedente o Recurso dirigido à decisão que indeferiu o requerimento para suspensão do prazo para apresentação da contestação, a qual se confirma.

Custas dos recursos (art.º 527.º do CPC):
i) Sobre a decisão que fixou o valor da acção, a cargo da recorrida
ii) Dirigido à decisão que indeferiu o requerimento para suspensão do prazo para apresentação da contestação, a cargo da autora, atento o decaimento.

Porto, 22 de Fevereiro de 2021
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
Rita Romeira