Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | FERNANDO SAMÕES | ||
Descritores: | PROCEDIMENTO CAUTELAR COMUM SUSPENSÃO IMEDIATA DAS FUNÇÕES DE ADMINISTRADOR MEIO PROCESSUAL ADEQUADO | ||
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Nº do Documento: | RP20150210572/14.2TYVNG-B.P1 | ||
Data do Acordão: | 02/10/2015 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - A suspensão prevista no n.º 2 do art.º 1055.º do CPC é uma providência cautelar inominada enxertada no processo principal de destituição, originando ambas decisões autónomas e pressupondo a apreciação judicial. II - Tendo sido deliberada a destituição de administrador pelo órgão social competente e pretendendo-se a suspensão imediata das suas funções, o meio processual adequado para satisfazer esta pretensão é o procedimento cautelar comum. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 572/14.2TYVNG-B.P1 Do 1.º Juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia, depois de para aí ter sido remetida pelo 3.ª Juízo do mesmo Tribunal, onde deu entrada em 30/5/2014, pertencendo agora, após a extinção daquele, à Comarca do Porto, Instância Central de Vila Nova de Gaia, 2.ª Secção de Comércio –J1. Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró * Acordam no Tribunal da Relação do Porto – 2.ª Secção:I. Relatório B…, residente na …, …, …, …, Vila Nova de Gaia, instaurou o presente procedimento cautelar comum contra C…, S.A., com sede na Rua …, n.º …, Porto, e D…, residente na Rua …, …, …, Maia, pedindo: 1. Que seja “ordenada a suspensão imediata do 2º Requerido das funções de Administrador;” 2. E se permita “que a 2.ª[1] Requerida proceda, desde já, à designação de um substituto, pelas vias legais e estatutárias adequadas”. Para tanto, alegou, em resumo, o seguinte: Por deliberação da assembleia geral da requerida, tomada em 9 de Maio de 2014, foi aprovada a destituição do requerido das funções de administrador, com justa causa, não obstante o respectivo Presidente da Mesa ter declarado a verificação de um empate, porque este contabilizou os votos da sua filha, quando não podia considerar, visto que se tratou de uma transmissão forjada de acções daquele para esta. Apesar de destituído, o requerido continua a exercer tais funções, havendo fundado receio de que venha a causar graves prejuízos à requerida, como já tentou com a apropriação, em proveito próprio, da denominação desta, o que pretende evitar que aconteça com a presente providência. Citados, ambos os requeridos deduziram oposição, em separado, invocando, no que aqui importa considerar, o erro na forma do processo, por entenderem que o meio adequado seria o procedimento cautelar especificado dos art.ºs 380.º a 383.º do CPC, referente à suspensão de deliberações sociais. Por decisão de 26/11/2014, foi declarada a existência de erro na forma de processo e a nulidade de todo o processo, tendo os requeridos sido absolvidos da instância e sido considerada prejudicada a apreciação das demais questões. Inconformado com o assim decidido, o requerente interpôs recurso de apelação para este Tribunal e apresentou a sua alegação com as seguintes conclusões: “I. Com a presente providência cautelar comum dependente da acção declarativa em que sustenta que o 2.º Requerido foi destituído por deliberação da 1.ª Requerida o Apelante requereu a suspensão de funções do administrador destituído, ora Apelado, e que continua a exercer funções. II. A sentença recorrida entendeu existir erro na forma de processo, porque o Requerente deveria ter instaurado o processo especial de suspensão e destituição de titulares de órgãos sociais previsto no artigo 1055º do Código do Processo Civil. III. Acontece que o Apelante não quer que o tribunal destitua o 2.º Requerido, pela simples razão de que o mesmo já está destituído, por deliberação da assembleia geral da 1.ª Requerida. IV. Na assembleia geral da Requerida de 09.05.2014 foi apresentada, pelo Requerente, uma proposta de destituição do 2º Requerido D… do cargo de administrador, tendo-se alegado na presente providência cautelar, que, na votação em causa, foram admitidos a votar e contabilizados votos que não o poderiam ter sido, o que levou o Presidente da Mesa da Assembleia Geral a proclamar a verificação de um empate, tendo considerado a votação “nula”. V. Como alegou na petição, o Apelante considera que a deliberação foi efectivamente aprovada, tendo o Presidente da Mesa cometendo um erro grosseiro decidido que o voto das acções de D… competia à nova accionista E…, além de não considerar o impedimento de voto de D…, em representação do accionista F…. VI. O Apelante fundamentou os motivos pelos quais não podiam ser contabilizados os votos tal como o foram, pelo que concluiu que a deliberação de destituição já está tomada, não sendo necessário requerer a destituição judicial do administrador. VII. O processo especial previsto no artigo 1055º do CPC apenas é aplicável aos casos de destituição judicial de titulares de órgãos sociais, pelo que, no presente caso, não é aplicável por estarmos perante uma destituição, com justa causa, já deliberada. VIII. O entendimento do tribunal a quo levaria ao absurdo que bastar que os sócios minoritários, conluiados com o Presidente da Mesa, fizessem constar da acta resultados errados da votação da proposta de deliberação de destituição, para obrigarem sempre à propositura de acção para prova dos fundamentos e destituição, subvertendo-se, por completo, as regras de apuramento de votações e de destituição dos titulares de órgãos sociais. IX. Face ao exposto, é manifesto - para quem tenha lido atentamente a petição inicial - que o pedido cautelar formulado pelo Apelante não devia seguir os termos do processo especial do art. 1055.º do CPC. X. Não houve, pois, qualquer erro na forma do processo. Houve sim, uma decisão errada por parte do tribunal recorrido. A sentença recorrida violou, pois, o disposto nos artigos 193º, 200, 576º, 577º, 578º, 362º e 1055º do Código do Processo Civil e 384º e 403º do Código das Sociedades Comerciais. Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a decisão recorrida e ordenada a baixa do processo à primeira instância para conhecer do pedido, como é de JUSTIÇA.” Os requeridos contra-alegaram pugnando pela confirmação da decisão recorrida. Tudo visto, cumpre apreciar e decidir o mérito do presente recurso. Sabido que o seu objecto e âmbito estão delimitados pelas conclusões do recorrente (cfr. art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do actual CPC, aqui aplicável), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser em situações excepcionais que aqui não relevam, e tendo presente que se apreciam questões e não razões, a única questão que importa dirimir consiste em saber se não ocorre a nulidade de erro na forma do processo. II. Fundamentação 1. De facto Os factos a considerar na decisão são os que se deixaram exarados no antecedente relatório[2], mais os seguintes: A) A presente providência cautelar, inicialmente com o n.º 552/14.8TYVNG, foi apensada ao processo n.º 572/14.2TYVNG, a requerimento do requerente, por considerara aquela dependente deste. B) Nessa acção, instaurada pelo aqui requerente contra os aqui requeridos, o autor pediu a anulação da deliberação que o destituiu do cargo de administrador (n.º 1) e que se se declare que “nessa mesma assembleia, foi aprovada uma deliberação de destituição do 2º Réu das funções de administrador da 1ª Ré, ou, subsidiariamente, declarar–se a anulação da deliberação proclamada pelo Presidente da Mesa, quando considerou ter havido um empate nesse escrutínio e, consequentemente, substituir–se tal proclamação pela declaração de que o 2º Réu foi destituído das funções de administrador da 2ª Ré” (n.º 2). 2. De direito O art.º 193.º do Código de Processo Civil estatui: “1. O erro na forma de processo importa unicamente a anulação dos actos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei. 2. Não devem, porém, aproveitar-se os atos já praticados, se do facto resultar uma diminuição de garantias do réu. 3. O erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando que se sigam os termos processuais adequados”. Os n.ºs 1 e 2 reproduzem o texto do art.º 199.º do CPC de 1961, tendo sido aditado o n.º 3, o qual é completamente novo e respeita, não ao erro na forma do processo (global), mas ao erro no meio processual utilizado pela parte no âmbito dum processo[3]. Cingindo-nos ao erro na forma do processo e servindo-nos do que já escrevemos outrora a este respeito noutro local[4], podemos afirmar que quer pela sua inserção sistemática, quer pela sua previsão normativa, verifica-se que esta norma trata da qualificação de uma anomalia processual como nulidade e prescreve a forma de a superar, elegendo como interesse principal o do aproveitamento dos actos processuais praticados, desde que seja possível. Como nulidade principal que é, deve ser conhecida oficiosamente pelo tribunal (cfr. art.º 196.º do CPC), cabendo-lhe fazê-lo no despacho saneador ou, não existindo este, até à sentença final (art.º 200.º, n.º 2 do mesmo Código), só podendo ser arguida até à contestação ou neste articulado (art.º 198.º, n.º 1, ainda daquele diploma). Ultrapassados estes momentos ou fases processuais, se não tiver sido invocado ou oficiosamente conhecido, o vício em apreço considera-se sanado[5]. Embora haja quem entenda que a causa de pedir é irrelevante para os efeitos do citado art.º 193.º, para os quais apenas interessa considerar o pedido formulado[6], afigura-se-nos que ela poderá ser confrontada com a pretensão deduzida, com o fim de aferir se o meio escolhido pelo autor está em conformidade com a lei, sem que isso tenha a ver com a questão distinta da procedência ou improcedência da acção. O Conselheiro Rodrigues Bastos escreveu que “O erro na forma de processo consiste em ter o autor usado de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão”, acrescentando mais adiante que “É pela pretensão que se pretende fazer valer, e portanto, pelo pedido formulado, que se há-de aquilatar do acerto ou do erro do processo que se empregou...”[7]. O, agora, Conselheiro Abrantes Geraldes salienta que “…a forma de processo escolhida pelo autor deve ser a adequada à pretensão que deduz e deve determinar-se pelo pedido que é formulado e, adjuvantemente, pela causa de pedir. É em face da pretensão de tutela jurisdicional deduzida pelo autor que deve apreciar-se a propriedade da forma de processo, a qual não é afectada pelas razões que se ligam ao fundo da causa…”[8]. Em suma, existe erro na forma de processo quando há desconformidade entre a forma prevista na lei e a que foi escolhida pelo autor/requerente, em face do pedido formulado e da causa em que o sustenta. Tal como consta do citado art.º 193.º, a nulidade nele contemplada apenas importa a anulação dos actos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os actos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei. Por outro lado, o art.º 547.º do actual CPC[9] consagra o princípio da adequação formal, nos termos do qual “O juiz deve adotar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo”. Sobre as relações entre os antecessores destes dois normativos, Pedro Madeira de Brito escreveu que «o erro na forma de processo era já “uma situação configurável como de adequação processual”. Por via dele, o juiz tinha já o poder de aproveitar actos já praticados e de ordenar ou praticar outros, de modo a adequar o processado à forma estabelecida na lei; e o “quanto possível” desejável para a aproximação concreta à tramitação legal abstracta implicava alguma margem de apreciação técnica judicial. Mas este poder de adequação à forma processual ganhou nova maleabililidade com a revisão de 1995-1996: podendo o juiz adotar uma forma divergente da legal, é-lhe também possível limitar a adequação à forma legal preterida no âmbito do que, tidas em conta as especificidades do caso, lhe parecer razoável»[10]. Assim, nesta hipótese, a petição inicial só fica inutilizada “quando esta, nos seus aspectos formais e substanciais, for de todo desajustada ao tipo processual que deva ser seguido”, havendo então que concretizar qual é esse desajustamento ou esse vício[11]. No despacho impugnado, foi decretada a nulidade de todo o processo, por verificação de erro na forma do processo escolhida pelo requerente e por impossibilidade do seu aproveitamento, dado se ter entendido que lhe corresponde a forma de processo especial prevista no art.º 1055.º do CPC[12] e que “o pedido de suspensão não pode ser exercido sem o pedido prévio ou simultâneo da destituição”, os quais “deduzidos em simultâneo devem ser formulados na mesma peça”. Além disso, foi ali entendido, ainda, que “nunca poderia ser instaurada como procedimento cautelar comum como dependência de acção principal de anulação de deliberação social, quando naquela se pretende a suspensão do 2º requerido das funções de administrador da requerida sociedade e nesta se pretende a anulação de deliberação social.” Contra este entendimento, insurge-se o apelante, sustentando que não é caso de aplicação da forma especial prevista no citado art.º 1055.º, porque não pretende a destituição judicial, visto que já fora deliberada a destituição com justa causa, e realçando que, na acção principal, não pediu a anulação dessa deliberação, mas de uma outra que o destituiu, a si próprio, do cargo de administrador, bem como pediu que fosse declarada a aprovação da deliberação de destituição do ora requerido das funções de administrador da sociedade aqui requerida. E cremos que tem razão. Vejamos. O mencionado art.º 1055.º dispõe: “1- “O interessado que pretenda a destituição judicial de titulares de órgãos sociais, (...), nos casos em que a lei o admite, indicará no requerimento os factos que justificam o pedido. 2 - Se for requerida a suspensão do cargo, o juiz decide imediatamente o pedido de suspensão, após a realização das diligências necessárias. …” Sob a epígrafe de “suspensão ou destituição de titulares de órgãos sociais”, este artigo está inserido na Secção II do capítulo XIV, intitulados, respectivamente, “nomeação e destituição de titulares de órgãos sociais” e “exercício de direitos sociais” do título XV que prevê os “processos de jurisdição voluntária”, do livro V que regula os “processos especiais” do Código de Processo Civil. Quer pela sua inserção sistemática, quer pela sua previsão normativa, constata-se que o aludido art.º 1055.º apenas regula os procedimentos nele previstos e não qualquer outro. Nele estão previstos, tão somente, os procedimentos de destituição judicial e de suspensão, também judicial, de titulares de órgãos sociais. No n.º 1, configura um processo principal e definitivo de destituição. No n.º 2, prevê uma providência cautelar inominada de suspensão, enxertada no processo principal. Em ambos os procedimentos devem ser proferidas decisões autónomas e independentes entre si[13], apreciando o pedido de suspensão, cautelarmente, após a realização das diligências necessárias, e decretando-a, se for caso disso; e apreciando o pedido de destituição, pretensão principal e definitiva do requerente, após citação do requerido e observância das demais formalidades previstas no n.º 3, decretando-a ou não consoante o fundamento invocado. Neste artigo não está contemplada a suspensão de funções operada por deliberação da sociedade, tomada ao abrigo do disposto no art.º 403.º, n.º 1, do CSC[14], como, alegadamente, sucede no presente caso. A deliberação social é o acto da sociedade pelo qual, através dos seus órgãos competentes, ela exprime uma declaração de vontade destinada à produção de certos efeitos jurídicos. Tendo manifestado a sua vontade, através do órgão competente, de destituição do requerido, não é necessária a destituição judicial. Aliás, esta não foi pedida. E, não o tendo sido, jamais poderia ser usada a providência cautelar inominada de suspensão prevista no n.º 2 do citado art.º 1055.º, a qual, como se disse, só tem lugar enxertada no processo principal de destituição judicial. Logo, o presente procedimento cautelar não pode cair sob a alçada daquele normativo. Atentos os pedidos nele formulados, e só eles interessam, coadjuvados com a causa de pedir vazada no requerimento inicial, o meio adequado para os dirimir apenas pode ser o escolhido pelo requerente, ou seja, o procedimento cautelar comum. Não obsta a tanto o pedido formulado na acção principal, sendo que nesta também foi pedido, para além da anulação da deliberação na parte que respeita à destituição do requerente, para aqui irrelevante, que se declare que fora aprovada a deliberação de destituição do requerido das funções de administrador da ali ré, aqui requerida. Daqui decorre que o requerente não pretende a destituição do requerido, mas tão só a declaração de que ela já existe, por ter sido tomada pelo órgão competente. Tal como foi configurado o procedimento cautelar, também não é caso de suspensão de deliberação social, como sustentaram ambos os requeridos na oposição que deduziram e continua a defender a requerida nas contra-alegações que apresentou, pela simples razão de que não se verificam os pressupostos previstos no art.º 380.º do CPC, desde logo, porque o requerente não pediu a suspensão da execução da deliberação. Ao invés, formulou o pedido de suspensão de funções do requerido, o que pressupõe a validade e cumprimento dessa mesma deliberação. Consequentemente, não há que falar em caducidade do procedimento, muito menos em ineptidão por contradição entre o pedido e a causa de pedir, como faz a recorrida, pois que estas questões não foram apreciadas pelo tribunal recorrido, nada têm a ver com o conhecimento do objecto do recurso interposto, não é caso de ampliação do âmbito do mesmo e porque os recursos visam apenas modificar decisões e não criá-las sobre matéria nova, sob pena de preterição de jurisdição (art.ºs 627.º, n.º 1, 635.º, n.º 4 e 636.º, n.º 2, todos do CPC). Refira-se, ainda, que o procedimento cautelar comum tem um âmbito residual, tanto no plano das regras processuais como no da definição das providências que nele se podem integrar, correspondendo à forma processual adequada aos pedidos cautelares que não se enquadram nos procedimentos especificados previstos nos art.ºs 380.º a 409.º do CPC ou em legislação avulsa. É o que resulta do no n.º 3 do art.º 362.º do CPC, ao dispor “não são aplicáveis as providências referidas no n.º 1 quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas na secção seguinte”. Esta subsidiariedade afere-se, sobretudo, pelo risco de lesão especialmente prevenido por cada uma das providências específicas, mais do que em razão do direito ameaçado, sendo, por isso, necessário invocar a existência de uma situação de perigo de lesão que não se insira no âmbito de uma providência específica. A subsidiariedade pressupõe que nenhuma providência nominada seja abstractamente aplicável e não que a providência aplicável em abstracto deixe de o ser por motivos respeitantes ao caso concreto[15]. Assim, atendendo à situação de perigo abstractamente prevista, não havendo um procedimento cautelar específico para a medida pretendida, é de aplicar o procedimento cautelar comum, cujos requisitos serão apreciados, em momento oportuno, que não este. Como tal foi configurado pelo requerente e assim deve prosseguir, sem necessidade de recorrer a qualquer adequação formal. Procede, por conseguinte, a apelação, pelo que a decisão impugnada não pode manter-se. Sumariando nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC: 1. A suspensão prevista no n.º 2 do art.º 1055.º do CPC é uma providência cautelar inominada enxertada no processo principal de destituição, originando ambas decisões autónomas e pressupondo a apreciação judicial. 2. Tendo sido deliberada a destituição de administrador pelo órgão social competente e pretendendo-se a suspensão imediata das suas funções, o meio processual adequado para satisfazer esta pretensão é o procedimento cautelar comum. III. Decisão Pelo exposto, julga-se a apelação procedente e revoga-se a decisão recorrida, determinando-se que o procedimento cautelar requerido prossiga os seus termos, legalmente previstos. * Custas pelos apelados.* Porto, 10 de Fevereiro de 2015Fernando Samões Vieira e Cunha Maria Eiró ____________ [1] Deve ter querido escrever 1.ª. [2] Já que na decisão recorrida não foram dados como provados quaisquer factos. [3] Para mais explicitações sobre o seu alcance, com exemplos, ver José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in Código de Processo Civil Anotado, volume 1.º, 3.ª edição, págs. 377 e 378. [4] No acórdão de 7/5/2013, processo n.º 5857/11.7TBMTS-E.P2, disponível em www.dgsi.pt. [5] Cfr. acórdãos deste Tribunal e Secção de 12/6/2012, processo n.º 198/12.5TVPRT.P1, disponível em www.dgsi.pt e de 13/11/2012, processo n.º 332/10.0TBVLP-A.P1 em que interviemos como 2.º adjunto. [6] Vg. José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, in Código de Processo Civil anotado, volume 1.º, 2.ª edição, pág. 367 e jurisprudência e doutrina aí citadas, posição que mantém o primeiro e Isabel Alexandre na 3.ª edição da mesma obra, pág. 377. [7] In “Notas ao Código de Processo Civil”, vol. I, págs. 398 e 399. [8] In “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. I, pág. 247. [9] A que corresponde o art.º 265.º-A do anterior CPC, introduzido pela revisão de 1995-96, segundo o qual “Quando a tramitação processual prevista na lei não se adequar às especificidades da causa, deve o juiz oficiosamente, ouvidas as partes, determinar a prática dos actos que melhor se ajustem ao fim do processo, bem como as necessárias adaptações”. [10] Citado por Lebre de Freitas e outra, na última obra citada, pág. 376, donde foi extraído este extracto, tendo como fonte a obra ali indicada “O novo princípio da adequação formal, na obra colectiva Aspectos do novo processo civil”, Lisboa, Lex, 1997, pág. 48. [11] Cfr. acórdão do STJ de 28/10/1993, proferido no processo n.º 084286, cujo sumário está disponível em www.dgsi.pt e o já citado acórdão desta Relação de 12/6/2012. [12] Escreveu-se ali, por várias vezes, “1055.º-B”, certamente por lapso de escrita, resultante da adaptação de anterior texto, onde constava o art.º 1048.º-B do CPC de 1961, ao qual corresponde aquele, sem alterações. [13] Cfr. acórdãos da RP de 28/5/2009, processo n.º 781/06.8TYVNG.P1 e da RC de 19/6/2013 - 220/12.5TBPBL-B.C1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt, nos sítios de cada um desses tribunais. [14] Segundo o qual “Qualquer membro do conselho de administração pode ser destituído por deliberação da assembleia geral, em qualquer momento”. [15] Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, 3.º vol., 4.ª edição, pág. 70, citando Miguel Teixeira de Sousa. |