Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3671/12.1TJVNF-B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOSÉ MANUEL DE ARAÚJO BARROS
Descritores: COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA
INVENTÁRIO
Nº do Documento: RP201406263671/12.1TJVNF-B.P1
Data do Acordão: 06/26/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: É da competência dos cartórios notariais o inventário em consequência de separação de bens, requerida após penhora dos bens comuns do casal
Reclamações:
Decisão Texto Integral: 3ª SECÇÃO – Processo nº 3671/12.1TJVNF-B.P1
Juízos de Competência Cível de Vila Nova de Famalicão - 4º Juízo

SUMÁRIO
(artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil)
É da competência dos cartórios notariais o inventário em consequência de separação de bens, requerida após penhora dos bens comuns do casal

Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto
I
RELATÓRIO
B… veio requerer inventário para separação da sua meação, por apenso a execução promovida contra seu marido, C…, na qual foram penhorados bens comuns do casal.
Tal requerimento mereceu o seguinte despacho
Estamos na presença de uma acção de inventário para separação de meações.
No entanto, a competência, em razão da matéria, para apreciar estas acções não pertence aos tribunais comuns, antes pertence aos notários (vide artigos 3º e 81º da Lei nº 23/2013, de 5/3).
Assim, verifica-se, aqui, a excepção dilatória da incompetência absoluta, por infracção de regra de competência em razão da matéria, a qual, sendo de conhecimento oficioso, determina, neste caso, o indeferimento liminar da petição inicial (vide artigos 96º, al. a), 97º, nº 1, e 99º, n º 1, todos do CPC).
Pelo exposto, decide-se indeferir liminarmente a presente acção.
Custas pelo requerente.
Inconformada, interpôs a requerente recurso, o qual foi admitido como de apelação, com subida imediata e nos próprios autos, sendo o seu efeito meramente devolutivo.
Transcrevem-se as conclusões das suas alegações de recurso
1ª- O legislador de 2013 (Lei nº 23/2013, de 5 de Março) não pretendeu afastar dos tribunais o caso específico de “inventário para separação de meações”;
2ª- Decisão que manteve (Lei nº 41/2013, de 26 de Junho) quando aprovou o novo Código de Processo Civil, ao estatuir que o processo de inventário para separação de meações corre por apenso ao processo de execução (artigo 740º, nº 2, do CPC);
3ª- Na matéria dos autos continua a pertencer aos tribunais a competência para a apreciar e decidir.
Não houve contra-alegações.
Foram colhidos os vistos legais.
II
FUNDAMENTAÇÃO
Sustenta a recorrente que, não obstante no artigo 3º do Regime Jurídico do Processo de Inventário, aprovado pela Lei nº 23/2013, de 5 de Março, se ter consagrado que a regra da competência dos cartórios notariais para o processamento dos inventários, continua a pertencer aos tribunais a competência para a apreciar e decidir o inventário para separação de meações requerido na sequência da penhora de bens comuns do casal, nos termos dos artigos 740º do Código de Processo Civil e 81º do referido diploma.
Em um primeiro momento, argumenta com o teor daquele artigo 740º. Quer no nº 1, onde se dá a entender que o requerimento da separação é no processo executivo, no qual o cônjuge do executado é citado para “requerer” ou “juntar certidão”. Quer no nº 2, onde se dá sequência a tal entendimento, referindo-se que “apensado o requerimento de separação ou junta a certidão”.
Em reforço do que mais anota que, no artigo 5º da Portaria nº 278/2013, de 26 de Agosto, que regulamenta o Regime Jurídico do Processo de Inventário, o formulário electrónico disponibilizado no sistema informático de tramitação do processo de inventário, no campo relativo ao “fim do inventário” apenas contempla as hipóteses “partilha de bens por herança”, “partilha por separação, divórcio, declaração de nulidade ou anulação de casamento” e “relacionar os bens objecto da sucessão”.
Analisemos aquele primeiro argumento.
O artigo 740º corresponde a parte do artigo 825º do anterior código de processo. E, do seu teor, poder-se-ia efectivamente depreender que o inventário corresse por apenso à execução.
Acontece que tal alusão é manifestamente insuficiente para contrariar a ausência de qualquer razão válida para que a tramitação desse inventário não corra perante o notário. Já que o seu processamento e as questões que nele se suscitam em nada diferem de qualquer inventário para separação de meações, em consequência de separação, de divórcio ou de declaração de nulidade ou anulação do casamento. Daí, aliás, a expressa remissão do nº 1 do artigo 81º do RJPI, que regula o processo de separação de bens em casos especiais, nomeadamente da requerida na sequência da penhora de bens comuns, para o artigo 79º, que contem o regime do inventário consequente à separação, divórcio, declaração de nulidade ou anulação.
Com o que se rebate o argumento que a recorrente vem arguir em segundo lugar. Neste caso, o formulário a utilizar será o relativo à partilha nos casos do artigo 79º.
E é completamente vazio e redundante o paralelo que a recorrente pretende estabelecer com a solução encontrada para a execução de tornas, em que o credor pode pedir que se proceda no mesmo processo à venda dos bens adjudicados ao devedor, nos termos da previsão do artigo 62º, nº 3, do RJPI. Na verdade, não é da constatação de que há excepções (e, para que exista uma excepção, basta existir uma regra) que se vai concluir que no presente caso estamos perante uma excepção.
Aqui chegados, ficaremos com a certeza de que o legislador se não terá enganado quando, no artigo 81º referido, alude expressamente à competência do notário para o processo de inventário, no caso especial de separação requerida na sequência de penhora de bens comuns do casal ou por força de insolvência. Efectivamente, após descrever as especificidades do regime, nas alíneas a), b) e c) do nº 1, refere no nº 2, por referência à alínea c) do nº 1, que «se julgar atendível a reclamação, o notário ordena a avaliação dos bens que lhe pareçam mal avaliados».
Aliás, nenhum sentido colheria que a remissão do nº 1 artigo 81º para o artigo 79º se restringisse ao regime processual, que não também à entidade competente para a tramitação do processo.
III
DISPOSITIVO
Na improcedência do recurso, mantém-se a decisão recorrida
Custas pela recorrente – artigo 527º do Código de Processo Civil.

Notifique.

Porto, 26 de Junho de 2014
José Manuel de Araújo Barros
Pedro Martins
Judite Pires