Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1173/22.7T8AGD.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANTÓNIO LUÍS CARVALHÃO
Descritores: CATEGORIA PROFISSIONAL
NÚCLEO ESSENCIAL DAS FUNÇÕES
CATEGORIA INSTITUCIONALIZADA
Nº do Documento: RP202304171173/22.7T8AGD.P1
Data do Acordão: 04/17/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA.
Indicações Eventuais: 4. ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - É pacífico na jurisprudência que não se mostra necessário que o trabalhador desempenhe todas as tarefas ou funções que tipifiquem determinada categoria profissional institucionalizada para que se lhe deva reconhecer o direito à correspondente classificação, bastando que haja uma correspondência no que respeita ao núcleo essencial das funções ou tarefas predominantemente exercidas pelo trabalhador para que tal suceda.
II - Para enquadrar as funções do trabalhador numa categoria profissional prevista em instrumento de regulamentação coletiva, não é determinante a categoria que tenha sido referida em contrato de trabalho reduzido a escrito ou que conste de recibos de vencimento, ou que o trabalhador refira em publicações, importando sim enquadrar as funções concretas na categoria institucionalizada.
III - A Decisão Arbitral relativa à Associação Portuguesa das Indústrias Gráficas, de Comunicação Visual e Transformadoras do Papel (APIGRAF) e ao Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Celulose, Papel, Gráfica e Imprensa, publicada no BTE nº 40, de 29/10/2009, não prevê que um profissional altamente qualificado ingresse com «estagiário», apenas prevendo, sem carácter obrigatório, formação formal adequada ou aprendizagem resultante do exercício de outras categorias profissionais próximas, ou pela combinação de formação e exercício profissional.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Recurso de apelação n.º 1173/22.7T8AGD.P1
Origem: Comarca de Aveiro, Juízo do Trabalho de Águeda



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

RELATÓRIO
AA (Autor) instaurou contra “A..., Lda.” (Ré) a presente ação, com processo comum, pedindo a condenação da Ré:
I) a reconhecer que o contrato de trabalho sem termo do Autor se iniciou a 04 de maio de 2015 e durou ininterruptamente até 30 de maio de 2021.
II) a reconhecer a categoria profissional de Desenhador Gráfico de 3º escalão do Autor a partir de 04 de maio de 2015 e de Desenhador Gráfico de 2º escalão a partir de 01 de junho de 2019;
III) condenada a pagar-lhe a quantia global de €10.428,62 respeitantes a atualizações salariais, proporcionais de férias e de subsidio de férias referentes ao ano da cessação do contrato de trabalho, horas de formação não proporcionadas e não pagas, credito de horas não pago, de acordo com a Tabela Salarial da Decisão Arbitral em processo de arbitragem obrigatória relativa à Associação Portuguesa das Indústrias Gráficas, de Comunicação Visual e Transformadoras do Papel (APIGRAF) e ao Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Celulose, Papel, Gráfica e Imprensa, publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 40 de 29/10/2009, aplicável por força Portaria nº 213/2010 de 15 de abril de 2010, tudo acrescido de juros legais vincendos calculados desde a citação da Ré até efetivo e integral pagamento e com as legais consequências.
Fundou o seu pedido alegando, em síntese, que, depois de terminado o estágio na sociedade “B..., Unipessoal, Lda.”, foi admitido como trabalhador da Ré em 04/05/2015 como Desenhador Gráfico; nos recibos de vencimento sempre constou a categoria profissional de «Aprendiz»; em 30/03/2021 o Autor procedeu à denúncia do contrato de trabalho, cessando o mesmo efeitos em 30/05/2021; reclama o pagamento das diferenças entre o salário pago e o devido para a sua categoria profissional, proporcionais de férias e seu subsídio referentes ao ano da cessação do contrato de trabalho e crédito por formação profissional não ministrada.

Realizada «audiência de partes», frustrada a sua conciliação e notificada para poder contestar, a Ré apresentou contestação na qual alegou, em resumo, não ser devido ao Autor aquilo que reclama, devendo a ação ser julgada improcedente e a Ré absolvida do pedido.

Foi proferido a dispensar a realização de audiência prévia, sendo proferido despacho saneador no qual foi afirmada a validade e regularidade da instância, sendo dispensada a prolação de despacho identificando o objeto do litígio e enunciando os temas de prova.
Foi fixado o valor da ação em €10.428,62.

Realizada «audiência de discussão e julgamento», foi proferida sentença decidindo julgar a ação parcialmente procedente e em consequência condenar a Ré “A..., Lda.” a pagar ao Autor AA a quantia global de € 9.764,46, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a citação, até efetivo e integral pagamento, absolvendo a Ré do demais contra si peticionado.

Não se conformando com a sentença proferida, dela veio a Ré interpor recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem[1]:
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Termina dizendo dever ser concedido provimento ao recurso, devendo em consequência, a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva a Ré do pedido formulado de condenação no pagamento de diferenças salariais relativas à categoria profissional com que a Recorrente contratou o Autor e sempre o manteve contratado.

O Autor apresentou resposta, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem:
I- Está corretíssima a matéria que o Tribunal a quo deu como provada, designadamente no ponto 14 dos Factos Provados constantes da douta sentença.
II- Está corretíssima a matéria que o Tribunal a quo deu como não provada, na douta sentença, designadamente as alíneas f); g); h) e i) dos Factos Não Provados constantes da douta sentença.
III- Atenta a matéria acima indicada, dada como provada e como não provada, na douta sentença, o direito que a mesma aplicou esta em perfeita consonância com tal decisão, tendo sido perfeitamente aplicado e devendo ser mantido.
IV- Do mesmo modo deve ser mantida na sua plenitude a douta sentença, com todas as legais consequências.

Foi proferido despacho a mandar subir o recurso de apelação, imediatamente, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.

O Sr. Procurador-Geral-Adjunto, neste Tribunal da Relação, emitiu parecer (art.º 87º, nº 3 do Código de Processo do Trabalho), pronunciando-se no sentido de ser negado provimento ao recurso, referindo essencialmente o seguinte:
5.1. Impugna a Recorrente a matéria de facto dada como provada e não provada, ou seja, o ponto 14 dos Factos Provados e os factos constantes das alíneas f); g); h); i), dos factos não provados.
O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto – art.º 607º, nº 5, do CPC – e sobretudo quando a prova é testemunhal ou por declarações ou depoimento de parte.
Vistas as declarações transcritas entende-se, também, que a douta sentença em recurso fez correta apreciação dos elementos de prova de que se serviu para fixar a matéria de facto provada e não provada.
Ter uma opinião diversa sobre a apreciação da prova produzida não pode confundir-se com erro na apreciação, com erro de julgamento.
Sendo certo que a Recorrente deveria, ainda, indicar nas gravações ou transcrição, os concretos meios probatórios constantes do processo ou do registo ou gravação realizada que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, não apenas provocar um segundo julgamento.
Mas, mesmo assim, entende-se que se afigura correta a decisão.
5.2. Do mesmo modo a douta sentença em recurso faz exaustiva apreciação das questões de direito suscitadas e uma correta subsunção dos factos ao direito. Para ela se remete, evitando desnecessárias repetições.
E, assim, atentos os fundamentos de facto de e de direito nela invocados, deve a douta sentença em recurso ser confirmada.

O Recorrido apresentou resposta referindo subscrever na íntegra o parecer do Ministério Público.

Procedeu-se a exame preliminar, foram colhidos os vistos, após o que o processo foi submetido à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
*
FUNDAMENTAÇÃO
Conforme vem sendo entendimento uniforme, e como se extrai do nº 3 do art.º 635º do Código de Processo Civil (cfr. também os art.ºs 637º, nº 2, 1ª parte, 639º, nºs 1 a 3, e 635º, nº 4 do Código de Processo Civil – todos aplicáveis por força do art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho), o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação apresentada[2], sem prejuízo, naturalmente, das questões de conhecimento oficioso.
Assim, aquilo que importa apreciar e decidir neste caso[3] é saber se:
● houve erro de julgamento sobre a matéria de facto?
● o Autor não tem direito à retribuição prevista para os trabalhadores da categoria profissional de “Desenhador gráfico”?
*
Porque tem interesse para a decisão do recurso, desde já se consignam os factos dados como provados e como não provados na sentença de 1ª instância, objeto de recurso.
Quanto a factos PROVADOS, foram considerados os seguintes, que se reproduzem:
1. Por escrito intitulado “certificado”, datado de 03/08/2012, a Escola Profissional ... declarou que o Autor AA “concluiu, no ano escolar de 2011/2012 o curso profissional de técnico de desenho digital 3D, ao abrigo do Decreto-lei nº 74/2004 de 26 de março (…) e obteve o ensino secundário e certificação profissional em técnico de desenho digital 3D conferindo o nível 4 de qualificação do Quadro Nacional de Qualificações (…)” – cfr. doc. de fls. 14, que se dá por integralmente reproduzido.
2. Por escrito intitulado “medida estágios emprego”, datado de 30/04/2014, em que intervieram na qualidade de primeiro outorgante a “B... Unipessoal, Lda.” e como segundo outorgante o Autor, pelo primeiro outorgante foi declarado que “compromete-se a proporcionar ao segundo, no âmbito da Portaria nº 204-B/2013 de 18 de junho, alterada pelas Portarias nº 375/2013 de 27 de Dezembro e nº 20-A/2014 de 30 de janeiro e regulamentada pelo Despacho nº 1573-B/2014 de 30 de janeiro (…) um estágio em contexto de trabalho”;
3. Assim como que “este estágio tem lugar na Zona Industrial ... Anadia (…)”;
4. Bem como que “o segundo outorgante tem direito a:
(…)
b. Receber do primeiro outorgante em condições adequadas o estágio na área de desenhadores e técnicos afins”;
5. Pelos outorgantes foi ainda declarado que “o presente contrato tem início em 2014/05/02, terminando previsivelmente em 2015/05/01. A duração do estágio é de 12 meses, não podendo a mesma ser ultrapassada (…)” – cfr. doc. de fls. 15 e v., que se dá por integralmente reproduzido.
6. Por escrito intitulado “medida estágios emprego”, datado de 02/05/2015, pela “B... Unipessoal, Lda.” foi declarado que “certifica-se que AA (…) concluiu, nesta Entidade, um estágio em contexto real de trabalho, na Função/Área de desenhadores Técnicos Afins que decorreu de 02/05/2014 a 01/05/2015, com a duração total de 12 meses, tendo obtido o seguinte aproveitamento: Muito Bom (…)”;
7. Desse mesmo escrito consta como “descrição sucinta das atividades desenvolvidos no decurso do estágio: design gráfico, corte vinil, aplicação e decoração de corte vinil, flexografia, aplicação de transfer em vestuário, impressão digital em pequeno formato, aprofundamento de conhecimentos em programas (adobe ilustrator, adobe in design, adobe Photoshop, coreldraw), atendimento de clientes e entregas de encomendas” – cfr. doc. de fls. 16 e v., que se dá por integralmente reproduzido.
8. Tais atividades constam ainda do escrito intitulado “relatório de acompanhamento e avaliação de estagiário”, datado de 02/05/2015 – cfr. doc. de fls. 17, que se dá por integralmente reproduzido.
9. A “B... Unipessoal, Lda.” encontra-se matriculada na competente Conservatória do Registo Comercial sob a matrícula nº ..., tendo por objeto artes gráficas, prestação de serviços de tipografia, offset, litografia e design, e como gerente BB;
10. Por Ap. ... encontra-se inscrita a cessação de funções de gerência de CC.
11. A “A..., Lda.” encontra-se matriculada na competente Conservatória do Registo Comercial sob a matrícula nº ..., tendo por objeto a indústria gráfica, produção e comercialização de viseiras, divisórias, produtos em acrílico e outros artigos de plástico, artigos de proteção e segurança, e como gerente BB.
12. A “B... Unipessoal, Lda.” e a “A..., Lda.” partilhavam as instalações, os utensílios e os recursos humanos.
13. Em 04/05/2015 o Autor e a Ré acordaram por forma verbal que aquele exerceria a sua atividade sob as ordens, direção e fiscalização da Ré, recebendo, em contrapartida, uma quantia monetária.
14. No exercício dessa atividade, o Autor desenhou, com recurso a programas informáticos, símbolos, pictogramas e ilustrações de carácter técnico e didático, reuniu com clientes da Ré, recebeu instruções destes, desenhou e concretizou maquetes em diversos suportes a partir de hipóteses estudadas com clientes da Ré, distribuindo textos, fotografias e ilustrações e outros elementos gráficos de acordo com o por si estabelecido e os clientes da Ré.
15. Por escrito intitulado “contrato de trabalho por tempo indeterminado”, datado de 01/01/2017, em que intervieram na qualidade de primeiro outorgante a Ré e de segundo outorgante o Autor, foi declarado que “o primeiro outorgante admite ao seu serviço, por tempo indeterminado, o segundo outorgante, com a categoria de Aprendiz e como vencimento de 557,00 Euros (…)”;
16. Assim como que “o segundo outorgante, obriga-se a prestar serviço nas instalações que o primeiro possui na morada acima indicada, dentro das horas normais de trabalho para a atividade, na categoria de aprendiz” – cfr. doc. de fls. 18v., que se dá por integralmente reproduzido.
17. O Autor, pela atividade desempenhada por força do convénio referido em 13., recebeu da Ré, a título de vencimento-base (ilíquidos):
◦ €505,00 em 2015;
◦ €530,00 de janeiro a novembro de 2016;
◦ €565,00 em 2017;
◦ €580,00 em 2018;
◦ €600,00 em 2019;
◦ €635,00 em 2020;
◦ €665,00 de janeiro a maio de 2021;
18. O Autor, no mês de dezembro de 2016, por força da sua atividade para a Ré, recebeu €530,00 (ilíquidos)[4] a título de vencimento-base, constando embora do recibo emitido, por razões em concreto não apuradas, como pagadora, a “B... Unipessoal, Lda.”;
19. Dos recibos de vencimento emitidos pela Ré e pela “B... Unipessoal, Lda.” ao Autor nos períodos referidos em 17. e 18. consta a menção de “categoria aprendiz”;
20. O Autor, com o conhecimento da Ré, apresentava-se aos clientes desta como designer gráfico.
21. Nos anos de 2019 e 2020 o Autor constava dos seus banners de email como designer gráfico e designer, respetivamente, o que era do conhecimento da Ré;
22. Por carta registada datada de 30/03/2021, que a Ré recebeu, pelo Autor foi declarado à Ré que “eu abaixo assinado AA (…) venho através da presente carta, nos termos e para os efeitos no disposto no art.º 400º, nº 1 do Código do trabalho apresentar a V. Exas. a denúncia do meu contrato de trabalho, celebrado a 01 de maio de 2015, o qual deixará de produzir efeitos 60 dias após a receção da presente comunicação.
No que diz respeito aos dias de férias que tenho por gozar, indico-me indisponível para o gozo dos mesmos no decurso do prazo de aviso prévio acima indicado, ficando a aguardar instruções de V.ªs Exªs. nesse sentido (…)” – cfr. docs. de fls. 20 e 21, que são dados por integralmente reproduzidos.
23. Por publicação datada de 08/04/2021 a Ré declarou na rede social Facebook que oferecia “emprego – estágio profissional para Designer Gráfico
Perfil e competências:
Formação ao nível do ensino superior ou técnico profissional em Design ou área equivalente.
Domínio das ferramentas de trabalho de desenho e prototipagem de imagem e outros, como são o exemplo Photoshop, Adobe, Illustrator, Illustrator Design, Corel Draw e outro(s) software(s) similare(s) (…)
Funções a desempenhar:
Conceção e desenvolvimento e edição gráfica e materiais gráficos em diferentes formatos, edição de fotografia, execução de artes finais, preparação de ficheiros para impressão, recorte vinil, decoração de montras e viaturas, produção de materiais para plataformas digitais e redes sociais, acompanhamento de projetos nas fases pré-impressão e impressão” – cfr. doc. de fls. 21, que se dá por integralmente reproduzido.
24. A Ré apenas prestou ao Autor, a título de formação:
◦ um total de 05h00m em 28/06/2017 e 30/06/2017;
◦ 07h30m em 30/10/2017;
◦ 07h30m em 31/10/2017;
◦ 04h00m em 16/11/2017;
◦ 05h00m em 20/09/2020;
◦ 05h30m em 23/09/2020;
◦ 06h00m em 08/10/2020;
25. Os funcionários da Ré, DD e EE, constavam dos seus banners de email como designer gráfico no ano de 2019 e como designer no ano de 2020;
26. No ano de 2021 o funcionário da Ré DD constava dos seus banners de email como designer gráfico/diretor comercial;
27. O Autor, nas instalações referidas em 12., exerceu a sua atividade, além do mais, no sector da pré-impressão, com máquinas de impressão, equipamentos de corte de vinil, bordados e máquinas de impressão digital.
28. E efetuou entregas de trabalhos e mercadorias, assim como tarefas e recados solicitados pelo escritório da Ré, entre os quais deslocações ao banco, aos correios, compra de comida para animais e idas à costureira.
29. Num período em concreto não apurado, em que o Autor substituiu um colega em gozo do período de férias, quando tinha dúvidas com o software de imposição, ligava a um funcionário da Ré.
30. Em data em concreto não apurada e devido a deficiências no trabalho realizado pelo Autor para uma montra na Gafanha, o vinil impresso teve de substituído por mais do que uma vez.
31. A Ré tem cinco funcionários.
32. Do recibo de vencimento do Autor, no mês de janeiro de 2021 consta o pagamento, pela Ré, de €665,00 a título de vencimento-base, €55,42 de subsídio de férias, €55,42 de subsídio de Natal, €69,80 de subsídio de alimentação.
33. Do recibo de vencimento do Autor, no mês de abril de 2021 consta o pagamento, pela Ré, de €665,00 a título de vencimento-base, €720,42 de subsídio de férias, €55,42 de subsídio de Natal e €73,29 de subsídio de alimentação.
34. Do recibo de vencimento do Autor, no mês de maio de 2021 consta o pagamento, pela Ré, de €665,00 a título de vencimento-base, de €55,42 de subsídio de férias e €55,42 de subsídio de Natal.

E foram considerados como NÃO PROVADOS os seguintes factos, que igualmente se reproduzem:
a) A “B... Unipessoal, Lda.” e a “A..., Lda.” partilhavam a carteira de clientes;
b) Autor e Ré, aquando da celebração do convénio referido em 13., estipularam que tinha objeto o exercício da atividade de desenhador gráfico;
c) A Ré deu instruções e autorizou o Autor a apresentar-se aos clientes da primeira como desenhador gráfico e fazê-lo constar dos seus banners de email;
d) No ano de 2018 os funcionários da Ré DD e EE constavam dos seus banners de email como designer gráfico;
e) No ano de 2021 o funcionário da Ré, EE, constava dos seus banners de email como designer gráfico;
f) O Autor, antes de iniciar o convénio referido em 13., não tinha experiência no sector da impressão e desconhecia o funcionamento dos equipamentos, computadores e software utilizados pela Ré;
g) O Autor apenas levou a cabo as atividades referidas em 27. e 28. após a celebração do convénio referido em 13.;
h) O Autor não conseguiu aprender a funcionar com o software de imposição;
i) As tarefas realizadas pelo Autor foram sempre supervisionadas;
j) Em virtude do referido em 30., a Ré sofreu perdas patrimoniais de valor superior a €1.000,00;
l) O escrito referido em 15. foi elaborado pelo Autor e a pedido deste para contrair um empréstimo;
m) A Ré tem mais de cinco funcionários;
n) A Ré pagou ao Autor, nos meses de fevereiro e março de 2021, quantitativos a título de subsídio de férias e de subsídio de Natal;
o) A Ré pagou ao Autor quantitativo a título de férias referentes à atividade prestada no ano de 2021.
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Do erro no julgamento na decisão sobre matéria de facto:
Alega a Recorrente que o facto constante do ponto 14. dos factos provados deveria ter sido considerado não provado, que deveria ter ficado provado que “este foi o seu primeiro emprego”, que os artigos 43º e 44º da contestação deveriam ter ficado provados, que os factos constantes dos pontos f), g), h) e i) dos factos não provados deveriam ter sido considerados como provados.
A Recorrida defende a manutenção do decidido em 1ª instância.
Vejamos cada um dos pontos impugnados, seguindo a ordem da Recorrente.

● do ponto 14) dos factos provados:
Comecemos por recordar o seu teor, que é o seguinte:
14. No exercício dessa atividade, o Autor desenhou, com recurso a programas informáticos, símbolos, pictogramas e ilustrações de carácter técnico e didático, reuniu com clientes da Ré, recebeu instruções destes, desenhou e concretizou maquetes em diversos suportes a partir de hipóteses estudadas com clientes da Ré, distribuindo textos, fotografias e ilustrações e outros elementos gráficos de acordo com o por si estabelecido e os clientes da Ré;
O tribunal a quo fundamentou a prova do constante deste ponto 14. escrevendo o seguinte:
No que tange ao ponto 14, resultou da conjugação dos depoimentos de FF (com reflexo no documento de fls. 59), GG e HH, clientes da Ré, bem como do testemunho de DD, que conjugados entre si, nos segmentos a que responderam, estiveram entre si em harmonia e se completaram, assumindo especial relevo esta última testemunha pela espontaneidade e simplicidade espelhadas, nesta parte, no seu depoimento, seja no que se refere às tarefas levadas a cabo, seja ao software utilizado e sua natureza.
De resto, trata-se depoimentos que em nada foram abalados pelos testemunhos de II, JJ e KK, clientes da Ré, tendo em ponderação, desde logo, os serviços internos de que eles próprios dispunham ao nível da conceção, limitando a tipologia de serviços solicitados à Ré.
Por último, o Tribunal atendeu ainda às declarações do legal representante da Ré, que conferiu algum apoio ao Autor nas suas declarações.
Começa a Recorrente por alegar que “o tribunal a quo não pode atender, para efeitos da formação da sua convicção fáctica, ao teor das declarações de parte do Autor”.
Todavia, e como é natural [pois o objetivo da produção da prova é alcançar o conhecimento acerca da veracidade dos factos em causa (art.º 341º do Código Civil)], não existe na nossa ordem jurídica nenhum preceito legal que determine ser insuficiente a prova sobre determinado facto (seja ele favorável ou desfavorável à parte) que resulte do depoimento de parte não confessório, ou das declarações de parte, nada obstando a que a convicção do tribunal se forme até exclusivamente neles De resto, tal até pode ponderar em processo penal, onde vigoram outros princípios, como seja o da presunção da inocência (cfr. por exemplo acórdão do TRC de 17/05/2017, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 430/15.3PAPNI.C1)..
Ponto é que, não obstante ser a parte (com manifesto interesse num determinado desfecho do processo), o seu depoimento ou declarações se apresentem como credíveis[6] [tendo o julgador na apreciação crítica do depoimento/declarações em consideração que se trata da parte[7]].
É que, como é consabido, a generalidade das provas produzidas na audiência de julgamento está sujeita à livre apreciação do tribunal, sendo esse o caso da prova testemunhal e da prova por declarações de parte – art.º 396º do Código Civil e art.º 466º, nº 3 do Código de Processo Civil.
Com efeito, dispõe o nº 5 do art.º 607º do Código de Processo Civil que o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, ou seja, a apreciação da prova pelo juiz é pautada por regras da ciência e do raciocínio e em máximas de experiência, sendo a estas conforme, o que não se confunde com uma apreciação arbitrária (consiste numa conscienciosa ponderação dos elementos probatórios e circunstâncias que os envolvem)[8].
Às declarações de parte aplica-se o regime do depoimento de parte, com as necessárias adaptações – art.º 466º, nº 2 do Código de Processo Civil –, mas daí não resulta que as declarações de parte visem provocar a confissão, porque não visam [note-se o art.º 466º do Código de Processo Civil está inserido na Secção II do Capítulo III, relativa à «prova por declarações de parte», sendo a secção anterior a relativa à «prova por confissão das partes»].
Em suma, não é de afastar ab initio a possibilidade de valoração das declarações de qualquer das partes, mesmo que não existem outros meios de prova a corroborar as mesmas [a exigir-se sempre, em abstrato, a confirmação por outros meios de prova estar-se-iam a negar as declarações de parte como meio de prova, sujeito à livre apreciação do tribunal, como consagrado pelo legislador, desvirtuando-se o espírito do legislador ao prever a prestação dessas declarações], impondo-se sim que seja observada uma especial cautela na sua apreciação por ser, por natureza, um depoimento interessado.
Para justificar a alteração do decidido quanto a este ponto a Recorrente cita excertos dos depoimentos das testemunhas FF, GG, HH e DD, dizendo que dos depoimentos das primeiras três testemunhas não resulta provado que o Autor tenha desenhado e concretizado maquetes em diversos suportes a partir de hipóteses estudadas com clientes da Ré e de acordo com o por si estabelecido e os clientes da Ré.
O Recorrido defende a manutenção deste facto como provado, citando excertos dos depoimentos das testemunhas HH e DD, que situa na gravação.
Começa-se por dizer que, como se refere no acórdão desta Secção Social do TRP de 04/05/2022[9], a prova dum facto há de resultar da conjugação de todos os meios de prova produzidos sobre um mesmo facto, ponderando-se a coerência que exista num determinado sentido e aferindo-se esse resultado convergente em termos de razoabilidade e lógica. Se pelo contrário, existir insuficiência, contradição ou incoerência entre os meios de prova produzidos, ou mesmo se o sentido da prova produzida se apresentar como irrazoável ou ilógico, então haverá uma dúvida séria e incontornável quanto à probabilidade dos factos em causa serem certos, obstando a que se considere o facto provado.
Queremos com isto dizer que, fundamentando o tribunal a quo a prova do facto, com clareza, na conjugação dos depoimentos das testemunhas com as declarações de parte quer do legal representante da Ré quer do Autor (como consta do trecho que se transcreveu supra), não será o mero alegar que de determinadas passagens dos depoimentos das testemunhas não resulta provado que imporá[10] a alteração do decidido.
É que, se a reapreciação da matéria de facto por parte do tribunal ad quem tem que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância – pois que só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição –, não se trata de um segundo julgamento, estando em causa a reponderação do decidido em 1ª instância, donde não bastar a mera alegação de que não se concorda com a decisão proferida, exigindo-se da parte recorrente a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente foram produzidos, sem limitar porém o tribunal ad quem na apreciação.
Depois, há que dizer que o art.º 640º do Código de Processo Civil impõe à parte recorrente, na impugnação da matéria de facto, a obrigação de especificar, sob pena de rejeição, além dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa, e essa especificação dos concretos meios probatórios que impõem decisão diversa da recorrida, só se satisfaz cumprindo esta exigência: tem que, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes [nº 2, al. b)].
Ou seja, o recorrente tem que indicar as concretas passagens (das gravações) em que se funda a impugnação, pois são essas que devem ser ouvidas pelo tribunal (sem prejuízo da audição de outras relevantes).
Na verdade, é imprescindível a concretização na gravação das passagens que têm, na opinião do recorrente, a virtualidade de impor decisão diversa, pois só assim o Tribunal da Relação as pode confirmar (sem prejuízo de contextualizar, procedendo à audição da totalidade).
Quer isto dizer que, a par da indicação das passagens dos depoimentos relevantes (aquelas que impõem decisão diversa, na opinião de quem recorre), tem que ser feita a localização exata das mesmas na gravação, o que não se satisfaz com a mera indicação do início e fim da gravação do depoimento respetivo no seu todo [isso já consta da ata de julgamento – art.º 155º, nº 1 do Código de Processo Civil], mas, e ainda que a parte transcreva as passagens que em concreto impõem na sua perspetiva a alteração da decisão tomada sobre matéria de facto, devem as mesmas ser situadas na gravação (com indicação, entre o início e o fim da gravação de cada depoimento, dos minutos e segundos das passagens que são citadas, ou seja, precisando o início e o fim de cada passagem na gravação); dessa forma é dado cumprimento ao ónus de indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, ou seja, de concretizar qual ou quais os segmentos em concreto dos depoimentos que terão a virtualidade de levar, na opinião do recorrente, a decisão diversa da tomada pelo tribunal a quo sobre matéria de facto.
Tal está em consonância com objetivo da impugnação da matéria de facto: o tribunal de recurso, ainda que na apreciação da impugnação da decisão sobre matéria de facto use do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância, não realiza um segundo julgamento da matéria de facto (como se não tivesse havido já julgamento em 1ª instância), fazendo a sua apreciação tendo por referência os concretos meios probatórios indicados pelo recorrente.
Como se escreveu no acórdão do STJ de 19/02/2015[11], a especificação dos concretos meios probatórios convocados e a indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, como decorre do preceituado no nº 1 do art.º 662º do Código de Processo Civil.
Em suma, o recorrente ao discordar da apreciação feita pelo tribunal de 1ª instância sobre os factos, tem que fornecer ao tribunal ad quem os elementos que o legislador estabelece como necessários para poder ser apreciado eventual erro de julgamento, sob cominação de rejeição do recurso caso não sejam fornecidos.
Ora, in casu, sucede que a Recorrente, além de indicar o início e fim da gravação dos depoimentos das testemunhas em causa (o que se colhe da ata, como se deixou expresso supra, não sendo esse o ónus da parte recorrente), transcreve excertos indo ao longo deles, naqueles que primeiro transcreve [nos segundos nada indica], referindo entre parêntesis minutos e segundos, mas procedendo à audição no Citius Media Studio constatamos que esses minutos precisos não correspondem à localização precisa do transcrito, encontrando-se antes ou depois [ademais o depoimento da testemunha FF teve uma paragem na gravação no minuto 05:41, para junção de “cartão”, voltando a zero – e não refere a Recorrente se os minutos que indica se reportam à primeira parte ou segunda parte da gravação].
Ou seja, a Recorrente não fornece adequadamente os elementos necessários para a reapreciação pelo tribunal ad quem.
De todo o modo, da audição efetuada não se formou convicção de que este facto ficasse por demonstrar (vejam-se os excertos citados pelo Recorrido), indo-se ao encontro da convicção formada em 1ª instância, que foi fundamentada numa conjugação de meios de prova, incluindo declarações do legal representante da Ré, não se impondo a alteração pretendida.

● da prova de que “este foi o seu [do Autor] primeiro emprego”:
Sustenta a Recorrente que alegou este facto na contestação, e que tal foi referido nas declarações de parte do Autor, tendo ficado a constar da assentada lavrada em ata [a Recorrente indica o início e o fim da gravação das declarações[12], o que não satisfaz o exigido pelo legislador, como se deixou expresso supra], depreendendo-se do que alega depois, a propósito do enquadramento jurídico, entender ser relevante porque na sua perspetiva só pode ser atribuída a categoria de “desenhador gráfico” ao trabalhos que dispusesse de um currículo académico e/ou profissional de vários anos nessa área, no qual adquirisse competências suficientes para o exercício capaz das responsabilidades inerentes ao cargo.
É verdade que se verifica que este facto foi alegado no artigo 12º do articulado de contestação da Ré (reportando-se ao contrato celebrado com a sociedade Ré), e também é verdade que da assentada relativa às declarações de parte do Autor ficou a constar, entre o mais, que nos primeiros três anos não confrontou a Ré pelo facto de aparecer a menção de aprendiz nos recibos de vencimento, pelo facto de ser o seu primeiro emprego e julgar que podia aparecer como aprendiz. Em momento nenhum, contudo, lhe foi dito que era admitido como aprendiz (sublinhou-se).
Todavia, aos factos provados apenas só são levados os factos relevantes para a decisão do litígio que opõe as partes.
No caso sub judice é pacífico que à relação laboral que vigorou entre Autor e Ré se aplica, além naturalmente do Código do Trabalho, o regime da decisão arbitral em processo de arbitragem obrigatória relativa à Associação Portuguesa das Indústrias Gráficas, de Comunicação Visual e Transformadoras do Papel (APIGRAF) e ao Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Celulose, Papel, Gráfica e Imprensa, publicada no BTE nº 40, de 29/10/2009 (págs. 4452 ss).
Estando em causa saber qual a categoria profissional a atribuir ao Autor (como pressuposto de serem devidas, ou não, diferenças salariais), vendo essa Decisão Arbitral, encontramos no Anexo I a “definição das categorias profissionais”, mas não se encontra a categoria de “aprendiz”, apenas se encontrando a de “estagiário”, no item “estágio e aprendizagem”.
Acresce que não se vê que o facto de se tratar do primeiro emprego tenha relevo (se na categoria de “estagiário” há referência a início de atividade na empresa, tal já se depreende dos factos provados).
Ou seja, o facto em causa não tem relevo para a decisão da causa, tendo sido o que considerou, e bem, o tribunal a quo, pois consignou que ficou provada a matéria factual que enunciou, sendo aquela “com relevo para a respetiva decisão”, e não consignou este facto.
Sendo assim, porque não relevante, não se adita este facto aos provados.

● da prova do conteúdo dos artigos 43º e 44º da contestação:
Alega a Recorrente que o tribunal a quo não tomou posição sobre estes factos, depreendendo-se entender deverem constar entre os provados.
O teor desses artigos da contestação é:
43º A Ré é uma microempresa com apenas seis colaboradores e entre eles figura apenas um “Desenhador gráfico”, admitido no ano de 2004 já com vasta experiência nessas funções, obtida em trabalhos e empresas anteriores onde trabalhou.
44º Sendo este o único colaborador da Ré que desempenha as funções de Desenhador gráfico, cfr. doc. 4.
Sucede, desde logo, que a Recorrente indica para sustentar a alteração (que como se disse, apenas se depreende que seja a de os considerar provados) o depoimento da testemunha DD, mas indicando tão-só o início e fim da gravação do seu depoimento [de realçar que com a duração total de 55:20], o que, como já se disse, não satisfaz as exigências que o legislador impõe à parte que impugna a decisão sobre matéria de facto.
E nem se argumente que já a propósito do ponto 14. dos factos provados havia citado excertos desse depoimento, pois, a parte recorrente, deverá também (a par da indicação dos concretos pontos de facto e concretos meios probatórios) relacionar ou conectar cada facto, individualizadamente, com o concreto meio de prova que, em seu entender, sustentaria diferente decisão, designadamente, caso a discordância se fundamente em depoimentos que hajam sido gravados, identificando as testemunhas por referência a cada um dos factos que impugna.
Sendo assim, porque não observadas as exigências legais, sem necessidade de outras considerações mais desenvolvidas, não se aditam estes factos aos provados.

● do ponto f) dos factos não provados:
É este o teor deste ponto, recordemos:
f) O Autor, antes de iniciar o convénio referido em 13., não tinha experiência no sector da impressão e desconhecia o funcionamento dos equipamentos, computadores e software utilizados pela Ré;
Tratando-se de facto negativo, há que salientar que não basta a não prova do contrário para ficar provado.
Para sustentar que este ponto deveria ter ficado provado, a Recorrente indica o depoimento da testemunha DD, depreendendo-se (por se encontrar em itálico) que transcreve excerto do seu depoimento, mas sem precisar na gravação o excerto que indica, apenas indicando o início e o fim da gravação (aqui sem ir referindo entre parêntesis os minutos e segundos de localização), ficando-se sem se saber onde localizar o excerto que indica.
Deste modo, remetendo para o que acima já se deixou expresso, porque não observadas as exigências legais necessárias para a impugnação da decisão sobre matéria de facto, sem necessidade de outras considerações, não se adita este facto aos provados.

● do ponto g) dos factos não provados:
Comecemos por recordar o teor deste ponto, que é o seguinte:
g) O Autor apenas levou a cabo as atividades referidas em 27. e 28. após a celebração do convénio referido em 13.;
Para sustentar que este ponto deveria ter ficado provado, a Recorrente indica excerto das declarações de parte do Autor e, de novo, excerto do depoimento da testemunha DD, mas indicando, em relação a ambos, apenas o início e o fim da gravação[13], isto é sem cumprir o ónus de precisar na gravação os excertos que indica, ficando sem se saber onde localizar o que indica.
Refere ainda a Recorrente a carta que o Autor enviou a operar a denúncia do contrato de trabalho (reproduzida em parte no ponto 22. dos factos provados).
No entanto, o excerto que cita não impõe, por si, claramente a prova deste ponto.
Deste modo, remetendo para o que acima já se deixou expresso, sem necessidade de outras considerações, não se adita este facto aos provados.

● do ponto h) dos factos não provados:
É este o teor deste ponto, recordemos:
h) O Autor não conseguiu aprender a funcionar com o software de imposição;
Quanto a este ponto, para sustentar que deveria ter ficado provado, voltamos a ter a indicação pela Recorrente do depoimento da testemunha DD, indicando excerto do seu depoimento, mas de novo sem precisar na gravação aquilo que “transcreve”, apenas indicando o início e o fim da gravação, ficando sem se saber onde localizar o que indica.
Deste modo, remetendo para o que acima já se deixou expresso, sem necessidade de outras considerações, não se adita este facto aos provados.

● do ponto i) dos factos não provados:
Comecemos por recordar o teor deste ponto, que é o seguinte:
i) As tarefas realizadas pelo Autor foram sempre supervisionadas;
Para sustentar que este ponto deveria ter ficado provado, a Recorrente indica os depoimentos das testemunhas DD e II, indicando pequenos excertos dos seus depoimentos, mas sem precisar na gravação aquilo que “transcreve”, apenas indicando o início e o fim da gravação de ambos, ficando sem se saber onde localizar o que indica.
Indica ainda a Recorrente as declarações de parte do seu legal representante (da Ré – BB), transcrevendo o seguinte parágrafo da assentada lavrada em ata:
− o Autor desempenhou funções sob autoridade, direção e fiscalização da Ré, recorrendo, além de mais, a programas informáticos, símbolos, pictogramas, desenhando maquetas incluindo texto, que eram, após, supervisionados;
Ora, este parágrafo não impõe, por si, claramente a prova deste ponto.
Sendo assim, e remetendo para o que acima já se deixou expresso sobre os ónus a cumprir pela parte recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto, sem necessidade de adiantar outras considerações, não se adita este facto aos provados.

Em suma, a impugnação sobre a matéria de facto improcede/é rejeitada na totalidade, pelo que os factos provados a considerar para apreciação do recurso são os estabelecidos em 1ª instância, que acima se transcreveram.
*
Da categoria profissional do Autor:
Como se deixou expresso supra, é pacífico que à relação laboral que vigorou entre Autor e Ré se aplica, além naturalmente do Código do Trabalho, o regime da decisão arbitral em processo de arbitragem obrigatória relativa à Associação Portuguesa das Indústrias Gráficas, de Comunicação Visual e Transformadoras do Papel (APIGRAF) e ao Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Celulose, Papel, Gráfica e Imprensa, publicada no BTE nº 40, de 29/10/2009 (págs. 4452 ss) – que doravante referiremos como DA.
O tribunal a quo considerou que face à factualidade provada o Autor deve ser classificado como “desenhador gráfico”.
A Recorrente discorda dessa classificação, dizendo que o Autor foi por si corretamente categorizado como “aprendiz”.
Há que começar por referir que está em causa a categoria de “estagiário”, já que no DA, em vigor aquando do início da relação laboral entre as partes, como já acima se disse, não consta a categoria de “aprendiz”.
Com efeito, se no anexo III da DA, relativo à integração das categorias profissionais em níveis de qualificação, encontramos um item estagiários/aprendizes, dele constando estagiário – 1º ano; estagiário – 2º ano, sem qualquer referência a aprendiz, e no anexo I, este sim relativo à definição das categorias profissionais, não encontramos qualquer categoria de aprendiz, apenas de estagiário.
É que, note-se, prevendo a cláusula 53ª da DA a reclassificação das categorias previstas em anterior contrato coletivo, sendo os trabalhadores obrigatoriamente classificados numa das categorias previstas no anexo I, é cristalino que se impunha atribuir uma categoria constante da DA em vigor.
Não há necessidade de repetir as considerações que constam na sentença recorrida sobre em que se traduz a categoria profissional, podendo dizer-se pacífico que o empregador deve atribuir ao trabalhador uma categoria-estatuto [categoria profissional institucionalizada, ou regulada a nível legal ou pelos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, com atribuição de determinados direitos mínimos e determinada remuneração] que, em termos de classificação e integração retributiva, corresponda à categoria-função [funções que no essencial o trabalhador se obrigou a prestar por contrato de trabalho ou pelas alterações decorrentes da sua dinâmica] [14].
Tal está espelhado no acórdão desta Secção Social do TRP de 03/05/2010[15], em que se escreveu: a doutrina e a jurisprudência foram desde sempre uniformes no sentido de que deve haver correspondência entre as funções efetivamente desempenhadas pelo trabalhador, o seu estatuto profissional e o seu estatuto económico: verificando-se em concreto que o trabalhador exerce um leque de funções enquadrável numa determinada categoria prevista em instrumento coletivo de trabalho, o empregador deve atribuir-lha – também formalmente – e retribuí-lo em consonância, isto é, deve haver correspondência entre a categoria função e a normativa e a retribuição prevista para esta; daí que, se for atribuída pelo empregador uma categoria que não corresponda ao real objeto da prestação do trabalhador, tal atitude é juridicamente irrelevante, devendo o trabalhador ser reclassificado na categoria prevista no instrumento coletivo de trabalho aplicável ao sector, que corresponda às funções efetivamente desempenhadas[16].
Assim, o trabalhador deve, em princípio, exercer funções correspondentes à atividade para que foi contratado – art.º 118º, nº 1 do Código do Trabalho – tendo direito a exigir a devida reclassificação caso exerça atividade correspondente a categoria superior.
Assentamos, então, que será pela análise das funções concretamente desenvolvidas pelo Autor que se aferirá da correção da categoria profissional atribuída [como está dito nos arestos desta Secção Social do TRP de 23/06/2021 e de 12/09/2022[17], ambos subscritos pelo agora relator como 2º adjunto], sendo irrelevante a categoria atribuída pela Ré, seja em contrato de trabalho reduzido a escrito seja em recibos de vencimento [no cumprimento do dever constante nos artos 106º, nº 3, al. c) e 276º, nº 3 do Código do Trabalho].
E é também de ter presente que, como refere o acórdão do TRE de 16/01/2020[18], exercendo o trabalhador diversas atividades subsumíveis a diferentes categorias, a sua categorização deve efetuar-se atendendo ao núcleo essencial das funções por ele desempenhadas ou à atividade predominante ou, no caso de diversidade equilibrada ou indistinta, atender-se à mais favorável ao mesmo, e ainda que a categoria profissional quando institucionalizada é vinculativa para a entidade empregadora[19].
Por fim, citamos o acórdão do STJ de 27/01/2021[20], que [é] pacífico na jurisprudência, designadamente do Supremo Tribunal, não se mostrar necessário que o trabalhador desempenhe todas as tarefas ou funções que tipifiquem determinada categoria profissional institucionalizada para que se lhe deva reconhecer o direito à correspondente classificação. Basta que haja uma correspondência no que respeita ao núcleo essencial das funções ou tarefas predominantemente exercidas pelo trabalhador para que tal suceda.
Vejamos então o caso dos autos.
No anexo I da DA está definido o «estagiário» como o profissional que inicia a atividade na empresa e desempenha tarefas simples numa ou mais áreas de atividade tendo em vista o conhecimento da empresa e a aprendizagem funcional, o «operador praticante – tirocínio» como o profissional que após o período de estágio executa, em colaboração direta com os operadores ou outros profissionais, tarefas simples na sua área de atividade, e o «desenhador gráfico» como o profissional que desenha, manualmente ou recorrendo a programas informáticos, símbolos, pictogramas e ilustrações de carácter técnico e didático. Desenha e concretiza as maquetas em diferentes suportes a partir das hipóteses estudadas, distribuindo textos, fotografias, ilustrações e outros elementos gráficos de acordo com o projeto estabelecido, e concluindo a arte final para a reprodução fotográfica.
Ora, ponderando as funções que o Autor executava (cfr. designadamente o ponto 14. dos factos provados), resulta cristalino que o Autor não executava tarefas simples, donde não poder ser considerado «estagiário».
E porque, como se disse, há que atender ao núcleo essencial das funções desempenhadas pelo Autor, as funções que desempenhava ajustam-se à categoria de «desenhador gráfico», não obstando a esse enquadramento o desempenhar outras tarefas (assim, a entender-se que as tarefas referidas nos pontos 27. e 28. dos factos provados se reportam ao período posterior à celebração do contrato referido no ponto 13. dos factos provados, não obstam a esse enquadramento, sendo natural que numa empresa com 5 funcionários, como é o caso – ponto 31. dos factos provados –, se verifique alguma polivalência, mas interessa, repete-se, o núcleo essencial).
Por outro lado, o ser o «desenhador gráfico» um profissional altamente qualificado (cfr. Anexo III da DA, que prevê a integração das categorias profissionais em níveis de qualificação) não implica a impossibilidade de contratação direta para desempenhar essas tarefas, pois da cláusula 54ª da DA não se retira que o Autor tivesse que antes ser «estagiário» (nem teria sentido, diga-se, que tivesse que desempenhar tarefas simples para se qualificar), estando previsto, sim, o acesso à categoria de «desenhador gráfico», como profissional altamente qualificado, em princípio através de formação formal adequada, podendo ainda esse acesso fazer-se através da aprendizagem resultante do exercício de outras categorias profissionais próximas, ou pela combinação de formação e exercício profissional (ponto 4 da cláusula 54ª, que se sublinhou).
Ora, basta ler a definição das duas categorias profissionais – «estagiário» e «desenhador gráfico», que acima se transcreveram – para dizer que a primeira não é de modo algum uma categoria profissional próximas.
E no caso em apreço, o Autor antes de ser contratado teve formação (ponto 1. dos factos provados), tendo, antes de ser contratado pela Ré, realizado “estágio em contexto de trabalho” em empresa que partilha instalações com a Ré e da qual é gerente o gerente da Ré (pontos 2. a 12. dos factos provados), o que se enquadra na previsão da referida cláusula 54ª.
É por isso, retomando o acima referido, que é irrelevante que fosse o primeiro emprego do Autor, não exigindo a cláusula 54ª o currículo académico de vários anos de que fala a Recorrente para acesso à categoria profissional em causa.
E do já exposto resulta claro ser também irrelevante que o Autor se apresentasse como “designer gráfico” (pontos 20. e 21. dos factos provados), pois, frise-se, aquilo que importa é enquadrar as funções concretas nas categorias institucionalizadas, não atender aos nomes que as partes dão.
Em suma, o exposto leva a que improcedem todos os argumentos da Recorrente [21], confirmando-se, por isso, o decidido em 1ª instância.
*
Quanto a custas, havendo improcedência do recurso, as custas do mesmo ficam a cargo da Recorrente (art.º 527º do Código de Processo Civil).
***
DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desembargadores da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente, com taxa de justiça conforme tabela I-B anexa ao RCP (cfr. art.º 7º, nº 2 do RCP).

Valor do recurso: o da ação (art.º 12º, nº 2 do RCP).

Notifique e registe.

(texto processado e revisto pelo relator, assinado eletronicamente)


Porto, 17 de abril de 2023
António Luís Carvalhão
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
________________
[1] As transcrições efetuadas respeitam o respetivo original, salvo correção de gralhas evidentes e realces/sublinhados que no geral não se mantêm (porque interessa o texto em si), consignando-se que quanto à ortografia utilizada se adota o Novo Acordo Ortográfico.
[2] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 156 e págs. 545/546 (estas no apêndice I: “recursos no processo do trabalho”).
[3] Seguindo a ordem da precedência lógica, sendo que a solução de alguma pode prejudicar o conhecimento de outra(s) – art.ºs 608º e 663º, nº 2 do Código de Processo Civil (cfr. art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho).
[4] Retirou-se a expressão «em dezembro de 2016», porque constituía repetição.
[5] De resto, tal até pode ponderar em processo penal, onde vigoram outros princípios, como seja o da presunção da inocência (cfr. por exemplo acórdão do TRC de 17/05/2017, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 430/15.3PAPNI.C1).
[6] Vd. o acórdão desta Secção Social do TRP de 27/04/2020 (consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1740/18.3T8VNG.P1), no qual se refere que prova livre quer dizer prova apreciada pelo julgador segundo a sua experiência e a sua prudência.
[7] Tal como acontece com as testemunhas: as mesmas podem ter proximidade à parte ou interesse na causa, o que o julgador tem presente na apreciação crítica dos depoimentos, sendo por essa razão que o legislador consagra, no nº 1 do art.º 513º do Código de Processo Civil, o interrogatório preliminar a cargo do juiz – os designados costumes.
[8] Vd. Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, 2ª edição (Lisboa 1997), pág. 347.
[9] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1166/20.9T8MTS.P1.
[10] O nº 1 do art.º 662º do Código de Processo Civil refere que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa” (sublinhou-se), ou seja, não basta que os meios de prova admitam, permitam ou consintam uma decisão diversa da recorrida.
[11] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 299/05.6TBMGD.P2.S1.
[12] Reproduzindo manifesto lapso que consta da ata da sessão de julgamento de 15/09/2022, qual seja que a gravação das declarações de parte teve início pelas 11:34:16 e fim às 11:27:44, quando o fim logicamente é depois de iniciar, no caso às 12:27:44 (de resto, a gravação teve a duração, incluindo lavrar a assentada, de 53 minutos e 28 segundos, logo, iniciando às 11:34:16 findou às 11:27:44).
[13] Em relação à gravação das declarações do Autor reproduzindo manifesto lapso que consta da ata, como já se disse supra.
[14] Vd. também o acórdão do TRC de 08/06/2018, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1065/17.1T8LRA.C1.
Sobre os referidos conceitos, vd. Armando Antunes Curado, “Manual Prático de Direito do Trabalho”, 3ª ed., Quid Juris, págs. 77 e 78.
[15] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1698/08.7TTPRT.P1.
[16] Cfr. também o acórdão do STJ de 07/12/2005,consultável em www.dgsi.pt, processo nº 05S1919.
[17] Consultáveis em www.dgsi.pt, processos nº 2837/19.8T8MTS.P1 e nº 1533/21.0T8MAI.P1.
[18] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1798/18.5T8TMR.E1.
[19] Vd. o acórdão do TRG de 11/06/2015, citado na decisão recorrida, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 293/12.0TTBGC.G1.
[20] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1594/19.2T8LSB.L1.S1.
[21] É pacífico que a apreciação a fazer é da questão posta, de saber se houve erro de julgamento sobre a matéria de facto, sem que haja o dever de responder, ponto por ponto, a cada argumento que seja apresentado pela parte recorrente – vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 116.