Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
4058/18.8JAPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PEDRO M. MENEZES
Descritores: ASSISTENTE
LEGITIMIDADE PARA RECORRER
INTERESSE EM AGIR
FINALIDADES DA PENA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO
CONDIÇÃO DE SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO
Nº do Documento: RP202301114058/18.8JAPRT.P1
Data do Acordão: 01/11/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: CONFERÊNCIA
Decisão: NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A matéria da espécie e medida da pena aplicada – como decorre do «assento» n.º 8/99 – é essencialmente guiada por razões de interesse público, visando a realização dos fins assinalados à punição criminal (aos «fins das penas»), pelo que quanto a ela o assistente só pode recorrer se, como aí se decidiu, «demonstrar um concreto e próprio interesse em agir».
II - Este «interesse», como quer que se conceba, não pode consistir na obtenção de um meio de coação para eventual cobrança mais eficaz de uma dívida, que não integra os critérios legais para a escolha da espécie de pena a aplicar.
III - Assim, o assistente não pode, por falta de «interesse em agir», impugnar por si só sentença que condena o arguido em pena pecuniária tendo em vista a substituição desta por pena privativa da liberdade, suspensa na sua execução, subordinada ao pagamento da indemnização cível também arbitrada pelo Tribunal.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º: 4058/18.8JAPRT.P1
Origem: Juízo Local Criminal de Oliveira de Azeméis
Recorrente: «C..., S.L.» (assistente)
Referência do documento: 16482021
I
1. O presente recurso vem interposto de decisão proferida no Juízo Local Criminal de Oliveira de Azeméis que, após julgamento, condenou o arguido nos autos, «pela prática de 1 (um) crime de falsificação de documento p. e p. pelo art. 255.º al. a) e 256.º n.º 1, d) do Código Penal, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de €6,50 (seis euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz o montante de € 1300,00 (mil e trezentos euros)».
2. Nele, a recorrente, assistente nos autos, pede a substituição da pena aplicada – de multa – por pena privativa da liberdade, suspensa na sua respetiva execução, subordinada à condição de, no período que vier a ser fixado, solver-lhe o arguido o montante da indemnização que àquela foi arbitrada na decisão recorrida.
3. Este é, na parte aqui relevante, o texto da decisão recorrida, que se reproduz verbatim (a numeração dos factos provados foi por nós acrescentada):
«I. Relatório:
Nestes autos de processo comum, com intervenção do tribunal singular, por remissão para a douta acusação do Ministério Público foi pronunciado o arguido:

AA […]

imputando-lhe a prática, como autora material, na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, previsto e punido nas disposições conjugadas dos artigos 255.º, alínea a) e 256.º n.º 1 al. d) , ambos do Código Penal, nos termos da acusação de fls. 82 e ss., que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.
*
A ofendida “C..., S.L.” deduziu pedido de indemnização cível, pedindo a condenação do arguido no pagamento da quantia de 28.498,00€ pelos prejuízos patrimoniais causados e da quantia de € 5.000,00 a titulo de danos não patrimoniais, valores acrescidos de juros vincendos desde a notificação até integral pagamento.
[…]

Factos provados
Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:
1) Em data não concretamente apurada, o arguido AA, emitiu o cheque nº ..., ao portador, datado de 15/04/2018, no montante de € 28.498,00, sacado sobre a conta nº ..., do Banco 1..., agência de ..., titulada por AA, para pagamento de pagamentos do fornecimento de leitões no ano de 2017 por parte da empresa “C..., S.L.” de que BB é legal representante.
2) Em data não concretamente apurada, o arguido AA entregou o referido cheque a BB, legal representante da sociedade “C..., S.L.”.
3) No entanto, com claro intuito de não ver pago o valor do cheque e para evitar que fosse feita qualquer comunicação ao Banco de Portugal sobre a existência de cheques sem provisão, o arguido decidiu comunicar à Instituição Bancária onde tinha domiciliada a conta bancária, o extravio dos referidos cheques.
4) Assim, em 14/05/2018, o arguido outorgou um requerimento dirigido ao Banco 1..., da agência de ... em que pediu o cancelamento do cheque supra mencionado, indicando como motivo o seu extravio (cfr.fls.78).
5) Pelo que, em cumprimento de tal ordem do arguido, ao ser apresentado a pagamento por BB tal cheque foi devolvido por mandato do banco sacado, com a menção aposta no verso de “Cheque revogado p/ justa causa extravio” (cfr. fls.45-46).
6) Ao ter sido dada tal instrução ao banco sacado para a revogação da ordem de pagamento contida naquele cheque, comunicando-lhe que o mesmo se encontrava extraviado, o arguido quis e alcançou, que esse banco o devolvesse com essa indicação, obtendo o mencionado benefício, que sabia não lhe caber e causando prejuízos patrimoniais de, pelo menos, valor igual ao constante no dito título de crédito.
7) O arguido bem sabia que a razão invocada junto daquele banco era falsa, como sabia que BB era o legítimo dono e possuidor desse título de crédito.
8) Assim, bem sabia o arguido, que o conteúdo que fez constar no pedido dirigido ao Banco e que motivou a devolução do cheque, não tinha qualquer correspondência com a realidade dos factos.
9) Sabia o arguido, de igual modo, que não lhe assistia legitimidade para tal actuação e que, de tal forma lesava a fé pública inerente a tal documento, cuja natureza conhecia.
10) Tinha igualmente conhecimento que tal comunicação ao banco era juridicamente relevante, pois vinculava tal instituição de crédito a rejeitar o pagamento do cheque, com a dita causa, e assim prejudicava o beneficiário do mesmo, o que pretendeu e logrou conseguir.
11) O arguido agiu, assim, de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

Mais se provou que:
12) O Ofendido e sociedade viram o respetivo nome a ser atingido negativamente no mercado, tendo o seu representante legal sido incomodado com toda esta conduta do Arguido, sendo que não foi ressarcido dos danos.
13) A denunciante instaurou execução para obter o pagamento do cheque dos autos, acrescido dos correspondentes juros e tal crédito foi reclamado, com base no cheque dos autos, no proc. de insolvência nº 702/21.6T8OAZ, que corre termos no Juízo de Comércio de Oliveira de Azeméis, Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, que declarou a insolvência pessoal do aqui arguido e da sua esposa.
14) Com a declaração da insolvência pessoal e social do arguido, ante os créditos reclamados e ali graduados, não será a demandante ressarcida de tais valores, o que se refletiu na sua esfera,
15) O arguido continua a exercer a sua profissão de assador de leitões, na empresa que então geriu, agora em nome da neta de 22 anos, sendo que os seus rendimentos, acima do salário mínimo nacional (pensão de reforma auferido pelo arguido na Suiça - €600,00 - e rendas no valor de €150,00) estão penhorados à ordem da massa insolvente.
16) Vive em casa própria, com a esposa, que recebe de reforma por invalidez, a quantia de cerca de 300€.
17) Ao arguido não são conhecidos antecedentes criminais, conforme se infere do CRC junto aos autos a fls. 340.

Factos não provados:
[…]

Motivação da decisão de facto
Quanto aos elementos objetivos e subjetivos do tipo de ilícito, o Tribunal fundou a sua convicção com base na análise global e comparada quer dos abundantes elementos documentais analisados em sede d e audiência de julgamento, que das declarações do arguido, o qual confessou, integralmente e sem reservas, os factos de que vem acusado, e ainda reconheceu ser sua a letra das assinaturas dos documentos contantes nos autos, quer na assinatura do cheque quer no requerimento declaração que remeteu ao banco, acabando por explicar, abundantemente o modo de execução dos factos e as razões subjacentes, tudo em conformidade com a factualidade que lhe vinha imputada, demonstrando consciência e vontade da ilicitude do seu comportamento.
[…]

Enquadramento jurídico-penal
[…]

Da escolha e medida concreta da pena
Devidamente subsumida a conduta do agente, cumpre agora proceder à determinação da natureza e medida da sanção a aplicar ao arguido.
O crime de falsificação de documento que vem imputado ao arguido é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa.
O artigo 41.º, n.º 1, do Código Penal estabelece que a pena de prisão tem a duração mínima de um mês. Por sua vez, o artigo 47.º, n.º 1, do mesmo diploma legal prescreve que a pena de multa tem, em regra, o limite mínimo de 10 dias e o máximo de 360.
Assim sendo, a moldura penal abstrata do crime em apreço é de um mês a três anos de prisão ou 10 a 360 dias de multa.
Existindo dois tipos de sanção em alternativa, a primeira operação a realizar é a da escolha entre pena de prisão ou pena de multa.
Dispõe o artigo 70.º do Código Penal que, se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dará preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. De acordo com o artigo 40.º daquele diploma legal, tais finalidades consistem na tutela de bens jurídicos e na socialização do agente.
Esta orientação é a mais consentânea com o objetivo político-criminal de aplicação preferencial de medidas não privativas da liberdade e com a consideração, decorrente dessa finalidade, da prisão subsidiária como ultima ratio, atentos os efeitos criminógenos e estigmatizantes que lhes estão comprovadamente associados.
Cabe, também, realçar que na “Introdução” do Código Penal de 1982 é inequívoca esta opção pelas reações penais não detentivas, mormente nos nºs 9 e 10, onde a prisão surge como “um mal que deve reduzir-se ao mínimo necessário” e se “depositam as melhores esperanças” nas medidas não privativas da liberdade.
No caso vertente, tomando em consideração o tipo de documento em causa, o modo de execução e o resultado das condutas do arguido, temos que o grau de ilicitude se situa entre o médio e alto.
Neste caso as exigências de prevenção geral revelam-se algo elevadas, face à intensidade de violação do bem jurídico, uma vez que os documentos em causa são de grande circulação e utilização generalizada.
No plano da prevenção especial, importa referir que o arguido se encontra inserido profissionalmente, confessou os factos de forma espontânea e com relevância para a descoberta da verdade, relevado em seu favor o facto de ser primário, não descurando o tribunal os efeitos para a demandante, sendo o prejuízo considerável, e sem que o arguido tenha reparado os prejuízos ou sequer que venham a ser ressarcidos.
Assim sendo, inda assim, desde que devidamente doseada, afigura-se-nos que as necessidades de prevenção geral e especial atinentes ao caso ainda se bastam com a aplicação, ao arguido, de uma pena de multa, desde que devidamente doseada, a qual realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, pelo que o tribunal opta por este tipo de pena.
*
Para o efeito de determinação da medida concreta da pena, o julgador serve-se do critério global contido no artigo 71.º do Código Penal, atendendo à culpa do agente e às exigências de prevenção geral e especial, ponderando, ainda, todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente.
Assim, há que ter em conta, desde logo, o artigo 40.º do Código Penal, que dispõe que a aplicação de uma pena visa a proteção de bens jurídicos, no sentido de tutela da confiança da comunidade na ordem jurídico-penal e a reintegração do agente na sociedade (n.º 1), não podendo a pena ultrapassar a medida da culpa, a qual funciona como pressuposto e limite máximo daquela (n.º 2).
Naquela norma estão vertidos os princípios consagrados no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, designadamente, os princípios da necessidade da pena e da proporcionalidade ou da proibição do excesso.
Seguindo o modelo preconizado por Jorge de Figueiredo Dias, a prevenção geral positiva fornece uma “moldura de prevenção”, que tem como limite máximo a medida óptima de tutela dos bens jurídicos e como limiar mínimo o ponto abaixo do qual ficam irremediavelmente comprometidas as funções de tutela da ordem jurídica e da paz social. Dentro dessa moldura, deverão atuar as exigências de integração do agente na sociedade. Idêntica solução é proposta por Anabela Miranda Rodrigues, em “Modelo de Prevenção na Determinação da Medida Concreta da Pena”, in Revista portuguesa de Ciência Criminal, pp. 147 e ss.
As anteditas circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depõem a favor do agente ou contra ele, são as elencadas no n.º 2 do citado artigo 71.º, nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do dolo ou da negligência;
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
e) A conduta anterior ao facto e posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; e
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
No caso sub judice, vejamos o que de relevante se apurou nesta sede:
- Verifica-se que a culpa é alta pois, atuou com grave abuso da relação de confiança com o demandante, com quem estabelecia relações comerciais há vários anos
O dolo é direto e, por isso, intenso;
O arguido assumiu a prática dos factos;
O arguido não tem antecedentes criminais;
As consequências para o demandante, nos termos supra referidos, assumem relevante gravidade ante o valor em dívida e transtornos e reflexos para a saciedade em causa e bom nome no mercado, sem que o arguido tenha, até ao momento ou sequer se perspetive no futuro a reparação do dano, ante a declaração de insolvência do arguido.
Pelos motivos expendidos, reputa-se como justo e adequado condenar o arguido na pena de 200 dias de multa pelo crime de que vem acusado.
Em conformidade com o estatuído no n.º 2 do artigo 47.º do Código Penal, cada dia de multa corresponde a uma quantia entre € 5,00 e € 500,00, a fixar em função da situação económica e financeira do arguido e dos seus encargos pessoais, considerando, nomeadamente, a totalidade dos seus rendimentos próprios, a que serão deduzidos os gastos e despesas que tenha de suportar.
Neste contexto, importa realçar que a pena de multa só cumprirá a sua finalidade político criminal, se constituir um verdadeiro sacrifício para o condenado (salvaguardando-se o indispensável para garantir um nível existencial mínimo).
De relevante para este efeito, provou-se que o arguido exerce atividade profissional gerindo o negócio de leitões exercendo igual atividade áquela que sempre exerceu, no mesmo espaço, local, fornecedores e meios, conforme esclareceu, ainda que, agora, em nome da sua neta de 22 anos de idade, tendo sido declarado insolvente, dispondo apenas de quantia igual ao salário mínimo nacional, vivendo em casa própria.
Pelo exposto, julga-se justo e adequado o quantum diário de € 6,50 o que perfaz a quantia de 1.300,00 euros pelo crime de que o arguido vem acusado.

Do pedido de indemnização civil:
Nos termos do art. 129º do Código Penal a indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil.
Como se retira do requerimento do pedido de indemnização civil, apresentado pela requerente civil a causa de pedir são os danos patrimoniais pelo prejuízo causado e não patrimoniais, causados pela ofensa à honra, bom nome e imagem do Demandante
Vem assim peticionada uma indemnização por danos de natureza patrimonial, no valor de 28.498,00€ e por danos de natureza não patrimonial a quantia de 5.000,00€.
A perpetração de um ilícito criminal poderá justificar a formulação em tribunal de dois pedidos distintos: um de natureza criminal, peticionando-se a censura e condenação numa pena do autor dos factos; outro, de natureza civil, peticionando-se o ressarcimento e indemnização dos prejudicados por essa conduta.
Desse modo, “há que ter em conta que no art. 71.º do Código de Processo Penal se consagrou, como regra, o regime de adesão obrigatória, o qual é confirmado nos art.ºs. 82º e 377º, ambos do citado código e este último sobre a decisão a proferir na sentença, quanto ao pedido de indemnização civil”, como refere Maia Gonçalves, in Código de Processo Penal Anotado, 10.ª Edição, pág. 214.
A dedução do pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime em separado, perante o tribunal civil, só poderá ser feita nos casos taxativamente tipificados no art. 72.º do Código de Processo Penal.
Não obstante o pedido de indemnização civil ser formulado em processo penal e processualmente regulado por este, a indemnização por perdas e danos emergentes de um crime é regulada pela lei civil quantitativamente e nos seus pressupostos, conforme decorre do disposto no art.º 129º do Código Penal.
Assim, na fixação da indemnização devida pela prática de uma infracão criminal atende-se aos critérios estabelecidos nos art.ºs 483º e ss do Código Civil. Ora, dispõe o art.º 70º nº 1 do Código Civil que “A lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral”, integrando a personalidade moral, entre outros, os valores da liberdade, igualdade, honra e reserva de vida (cfr. Acórdão do STJ de 27/06/1995, BMJ 448º, 378).
De acordo com o disposto no art.º 483º do Código Civil, “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”.
Da análise do transcrito preceito decorre que o dever de reparação resultante de responsabilidade civil depende da existência, cumulativa, de vários pressupostos:
a) um facto voluntário do agente;
b) da ilicitude desse facto;
c) da existência de um nexo de imputação desse facto ao lesante;
d) que da prática desse facto resulte um dano;
e) e da constatação de um nexo de causalidade entre o facto praticado e o dano.
É também pacífico que a “imputação a alguém dos prejuízos sofridos por outrem, em resultado da atuação do primeiro, se baseia na existência de culpa” (cfr. Prof. Pessoa Jorge, in Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, pág. 54), como aliás resulta do artigo 483º nº 2 do Código Civil.
A gravidade do dano mede-se por um padrão objetivo, embora atendendo às particularidades de cada caso, e tudo segundo critérios de equidade (cfr A. Varela, ob. cit., pag 576; Vaz Serra, RLJ, ano 109.º, p. 115), devendo ter-se ainda em conta a comparação com situações análogas decididas em outras decisões judiciais (Acs do STJ de 2-11-76, de 23-10-79, de 22-1-80, de 13-5-86, in BMJ 261.º-236, 290.º-390, 239.º-237, 357.º-399; Ac STJ, de 25-6-2002, CJ/STJ, ano X, t. II, p. 128) e que a indemnização a arbitrar tem uma natureza mista: a de compensar esses danos e a de reprovar ou castigar, no plano civilistico, a conduta do agente (cfr A. Varela, ob. cit., p. 529 e 534; Ac STJ de 26-6-91, BMJ, 408.º, 538).
In casu”, as ações caracterizam-se pelos danos causados ao demandante pela falta de pagamento, cujo prejuízo causado, no valor de 28.498,00€, até ao dia de hoje não foi ressarcido.
Com efeito, e quanto aos danos não patrimoniais, assumem tal natureza aqueles "prejuízos" (como os incómodos e a repercussão negativa no nome e mercado da sociedade que não sendo suscetíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma compensação que uma indemnização.
Consideramos que a atuação do arguido, causou transtorno ao representante legal da demandante que por várias vezes se deslocou a Portugal, causando danos morais projetando negativamente o bom nome da sociedade no mercado, conferem um quadro factual que ponderado, se nos afigura adequada a quantia de €1.000,00 como compensação pelos danos não patrimoniais a suportar pelo demandado que os causou.
Sobre todos os valores em cujo pagamento o demandado vai condenado são devidos juros de mora contados à taxa legal desde a data da notificação até integral pagamento.

Decisão:
Nestes termos, julgando procedente por provada a pronúncia, o tribunal decide:
1. Condenar o arguido AA pela prática de 1 (um) crime de falsificação de documento p. e p. pelo art. 255.º al. a) e 256.º n.º 1, d) do Código Penal, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de €6,50 (seis euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz o montante de € 1300,00 (mil e trezentos euros);
2. Condenar o demandado/arguido a pagar à demandante cível “C..., S.L.” aquantia de 28.498,00€ (vinte e oito mil euros, quatrocentos e noventa e oito centimus) a título de indemnização por danos patrimoniais e na quantia de € 1000,00 (mil euros) a título de compensação por danos não patrimoniais, quantias acrescidas de juros de mora à taxa legal e contados desde a notificação e até integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado.
[…].»

4. A recorrente verbera a esta decisão (reproduzem-se as «conclusões» com que aquele termina o seu arrazoado):
1.ª – A pena principal de multa a que o Arguido foi condenado não realiza, salvo melhor entendimento, as finalidades da punição nem satisfaz as exigências de prevenção geral e especial.
2.ª – O tipo de documento em causa, o modo de execução e o resultado das condutas do arguido, assim como o grau elevado de ilicitude e de culpa, deverão conduzir a que seja aplicada ao arguido uma pena principal privativa de liberdade, ainda que suspensa na sua execução.
3.ª – A suspensão da execução da pena de prisão mediante a condição de pagamento da reparação à Demandante dos prejuízos sofridos assegurará não apenas o competente ressarcimento da Demandante,
4.ª – Como também só assim ficarão devida e retamente asseguradas as exigências de prevenção geral e especial, pelo que o Tribunal deverá optar por este tipo de pena.
5.ª – NESTES TERMOS, e no demais proficientemente suprido por V. Exas., deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se parcialmente a douta sentença ora recorrida, na parte em que condenou o arguido à pena principal de multa,
6.ª - substituindo-se por douta decisão que condene o arguido em pena de prisão, ainda que suspensa na sua execução, mantendo-se todo o demais (…).»

5. A isto respondeu o Ministério Público junto da 1.ª instância, insistindo pela confirmação da sentença recorrida (reproduzem-se as suas «conclusões»):
«1. A Mma. Juiz a quo, de forma bastante esclarecedora explicitou na sentença ora em crise os motivos e os fundamentos que a levaram a entender como adequada a pena de multa aplicada ao arguido.
2. Conforme bem refere a Mma. Juiz na douta sentença “Dispõe o artigo 70.º do Código Penal que, se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dará preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. De acordo com o artigo 40.º daquele diploma legal, tais finalidades consistem na tutela de bens jurídicos e na socialização do agente. (…) No plano da prevenção especial, importa referir que o arguido se encontra inserido profissionalmente, confessou os factos de forma espontânea e com relevância para a descoberta da verdade, relevado em seu favor o facto de ser primário, não descurando o tribunal os efeitos para a demandante, sendo o prejuízo considerável, e sem que o arguido tenha reparado os prejuízos ou sequer que venham a ser ressarcidos. Assim sendo, ainda assim, desde que devidamente doseada, afigura-se-nos que as necessidades de prevenção geral e especial atinentes ao caso ainda se bastam com a aplicação, ao arguido, de uma pena de multa, desde que devidamente doseada, a qual realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, pelo que o tribunal opta por este tipo de pena.”
3. Assim, atenta a gravidade dos factos, o prejuízo sofrido pela assistente, a ausência de antecedentes criminais e a confissão dos factos pelo arguido, entendemos que a Mma. Juiz, ao aplicar ao arguido a pena de multa devidamente doseada de 200 dias, fê-lo, respeitando os princípios da proporcionalidade, adequação de justiça que o caso exige, não merecendo a sua decisão, em nosso entender, qualquer reparo.»

6. Também o arguido nos autos se pronunciou sobre o recurso, defendendo a sua improcedência:
«1. O recurso apresentado pela recorrente não deve ser admitido, e deve ser rejeitado, porque a recorrente não tem interesse em agir, uma vez que não foi proferida decisão contra ela. Com efeito,
2. A recorrente/assistente apresentou o seu recurso, desacompanhada do Ministério Público, na parte respeitante à condenação penal da sentença recorrida, pondo em causa a espécie e a medida da pena aplicada, e tratando-se o crime dos autos de um crime público, e sendo a sentença condenatória do arguido, pela prática do crime objeto dos autos. Ora,
3. Nestes casos, a lei exige que a decisão penal tenha sido proferida contra o assistente, ou ele seja afetado pela decisão penal, para que ele tenha interesse em agir, e lhe assista o direito de recorrer – cfr. artigo 401º, nº 1, al. b), do C. P. Penal.
4. Existindo, nestes autos, sentença condenatória do arguido, não tinha a assistente/recorrente interesse em agir, pois que a questão da pena e da medida da pena é matéria do núcleo punitivo do Estado, cuja defesa não cabe aos particulares, e o interesse da assistente, na resposta punitiva do Estado, foi realizada no processo, com a condenação do arguido.
5. Não existindo interesse em agir da assistente, que não invocou interesse pessoal, legítimo, diferente do interesse do Estado na realização da justiça penal, não deve ser conhecido o presente recurso, na parte relativa à pena e à medida da pena. Pelo que,
6. O despacho que admitiu o recurso é nulo, por violar o disposto no artigo 401º, nº 1, al. b) do C. P. Penal.
7. Sem conceder, e porque o supra exposto constitui questão prévia à admissibilidade do presente recurso, e em resposta à motivação da recorrente, sempre se dirá que a douta sentença recorrida não merece censura e deve ser de manter. Porquanto,
8. Existiu um correto julgamento de facto e de direito.
9. A sentença recorrida está devidamente fundamentada. E,
10. Relativamente à espécie e à medida da pena, o Tribunal “a quo” teve subjacente o respeito pelos princípios definidos nos artigos 40º, 70º e 71º do C. P. Penal, e no artigo 18º, nº2 da Constituição da República Portuguesa.
11. A alteração da pena, sufragada pela recorrente, de multa pela pena de prisão, suspensa na sua execução, na condição do arguido satisfazer o crédito da assistente, arbitrada na sentença, na parte cível, na motivação do seu recurso, para além de ser ilegítima, nos termos expostos supra, vem justificada em qualificações diferentes das conclusões a que chegou o julgador, e é justificada com factos que não foram dados como provados, e estão descontextualizados dos factos, objeto do julgamento crime, nestes autos. E, por isso,
12. Esse pedido de alteração da pena não tem justificação legal nem fundamento, face aos factos dados como provados, para além de ofender o princípio da livre apreciação da prova do julgador, e atentar contra os princípios definidos nos artigos 40º, 70º e 71º do C. P. Penal.
13. E, ainda, ofender o princípio consagrado no artigo 18º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa. Para além de que,
14. A alteração da pena, e da medida da pena, peticionada pela assistente, face aos factos dados como provados, ofende o princípio da razoabilidade, consagrado no artigo 51º, nº 2 do C. Penal. Pois que,
15. Resulta dos factos dados como provados, admitidos e não impugnados, que o arguido, ora recorrido, não dispõe de capacidade para proceder à reparação da indemnização arbitrada à recorrente. E, por isso,
16. O Tribunal nunca poderia impor ao arguido, como pretende a recorrente, o dever de indemnizar, como condição da suspensão da execução da pena de prisão, não sendo viável a possibilidade de cumprimento desse dever. Para além disso, e ainda,
17. Seria inadmissível, e até seria atentatório do princípio da unidade do ordenamento jurídico, que a assistente conseguisse, por via de sentença penal, privilégios de natureza civil, designadamente o privilégio de obter, por via da coação, de sentença penal, preferência na satisfação de crédito civil sobre o arguido, alterando as regras de graduação e satisfação de créditos sobre o arguido, já definidos noutras sentenças, já transitadas em julgado, em processos judiciais de que a assistente também é parte.
[...]»

7. O Ministério Público junto deste Tribunal pronuncia-se nos termos a seguir reproduzidos:
«O arguido na sua resposta levanta como questão prévia a falta de legitimidade da assistente para a interposição do recurso.
A legitimidade do assistente para interpor recurso em caso de sentença condenatória, desacompanhado do MP, estando em causa a espécie e a medida da pena, tem sido objecto de controvérsia.
Sobre esta controvérsia o Supremo Tribunal de Justiça veio a tomar posição, em 30-10-1997, através de acórdão uniformizador de jurisprudência nos seguintes termos:
“O assistente não tem legitimidade para recorrer, desacompanhado do Ministério Público, relativamente à espécie e medida da pena aplicada, salvo quando demonstrar um concreto e próprio interesse em agir”.
A querela não acabou com a publicação do acórdão.
Sobre a mesma matéria o STJ, proferiu o acórdão uniformizador de jurisprudência Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 2/2020, publicado no Diário da República n.º 61/2020, Série I de 2020-03-26, em que se decidiu:
O assistente, ainda que desacompanhado do Ministério Público, pode recorrer para que a suspensão da execução da pena de prisão em que o arguido foi condenado fique condicionada ao pagamento, dentro de certo prazo, da indemnização que lhe foi arbitrada.
O aqui decido não tem aplicação ao caso dos autos.
Na verdade, a assistente com o seu recurso pretende acautelar o seu direito à indemnização, visando condicionar a suspensão da execução da eventual pena impor ao arguido ao dever de pagamento da quantia fixada, em certo prazo.
Com o seu recurso pretende a assistente a agravação (alteração) da pena de multa para a pena de prisão, embora suspensa na sua execução.
A realização dos fins das penas é de interesse público, não é uma pretensão que se identifique com o interesse da vítima, do ofendido, ou do assistente, daí o carácter público do ius puniendi.
Cremos assim que a pretensão da recorrente, agravação da pena de multa para pena de prisão, não é susceptivel de demonstrar um concreto e próprio interesse em agir.
Assim, nesta parte, propendemos para acompanhar o respondido pelo arguido, ou seja, que o recurso poderá ser rejeitado, por falta de interesse em agir da assistente.
No mais acompanhamos a bem elaborada resposta do Ministério Público.
Pelo exposto, somos do parecer que o recurso deve ser rejeitado por falta de interesse em agir da assistente, ou ser julgado improcedente como defendem o Ministério Público e o arguido.»

8. A este «Parecer» respondeu o arguido reiterando a sua posição e acompanhando a posição do Ministério Público junto destas Relação.
9. Cumpridos os legais trâmites importa decidir.
II
10. 1. O presente recurso não é admissível, por falta de interesse em agir da recorrente.

11. a) A questão de saber se o assistente pode recorrer (no exercício de uma faculdade que a lei diretamente lhe confere: vd. o artigo 69.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal), autonomamente (e exclusivamente), quanto «à espécie e medida da pena aplicada», suscita, há muito, dúvidas entre os nossos Tribunais Superiores, mostrando-se – digamo-lo assim – decidida, desde a publicação do assento n.º 8/99, de 30/10/1997 (publicado, após várias vicissitudes para aqui irrelevantes, no Diário da República, I Série-A, n.º 185, de 10/08/1999, págs. 5192 e segs.), no sentido de que tal só é admissível se ele «demonstrar um concreto e próprio interesse em agir».
12. Tal «interesse» foi encontrado, no caso que redundou no subsequente «assento» n.º 5/2011, de 09/02/2011 (publicado no Diário da República, I Série, n.º 50, de 11/03/2011, págs. 1410 e segs.), num recurso «da decisão de não pronúncia, em instrução requerida pelo arguido, e da sentença absolutória, mesmo não havendo recurso do Ministério Público», ainda que o assistente não tenha «deduzi[do] acusação autónoma nem aderi[do] à acusação pública».
13. Ponderou-se, no aresto em referência – estabelecendo mais nitidamente a distinção entre legitimidade para recorrer e interesse em recorrer, que o «assento» anterior parecera confundir – que «para o assistente poder recorrer, não há que fazer-lhe outras exigências para além das que o artigo 401.º, n.º 1, alínea b), comporta: que a decisão seja relativa a um crime pelo qual se constituiu assistente (legitimidade) e seja contra ele proferida (interesse em agir)»; e por isso, em casos como o em questão no processo, «o inconformismo do assistente, manifestado na interposição do recurso, à luz do que se disse, serve ainda o interesse público da definição do melhor direito para o caso, tenha ou não recorrido o Ministério Público»
14. Prosseguindo na via aberta por esta decisão, o mesmo Alto Tribunal tirou, em 13/02/2020, novo «assento» (que recebeu o n.º 2/2020, e foi publicado no Diário da República, I Série, n.º 61, de 26/03/2020), onde concluiu que «[o] assistente, ainda que desacompanhado do Ministério Público, pode recorrer para que a suspensão da execução da pena de prisão em que o arguido foi condenado fique condicionada ao pagamento, dentro de certo prazo, da indemnização que lhe foi arbitrada».
15. Considerou-se, para tanto, que:
«Esse interesse [em agir] existe no caso do acórdão recorrido, perante a pretensão autónoma dos assistentes (diversa de qualquer agravação da pena ou de alteração da qualificação jurídico-penal), relacionada com a reparação do prejuízo por eles sofridos com a prática do crime e cuja condição da suspensão não deixa de estar associada às finalidades preventivas da pena, de forma a melhor defender os interesses patrimoniais lesados.»

(interpolação e sublinhados nossos).

16. b) A disciplina consagrada no último dos indicados «assentos» não tem aplicação direta ao caso dos autos, porquanto, como se referiu já, a decisão recorrida, aquando da realização do juízo imposto pelo artigo 70.º do Código Penal, optou pela aplicação, ao arguido, de uma pena pecuniária, afastando, no caso, a aplicação de uma pena privativa da liberdade.
17. É precisamente contra essa opção que a recorrente aqui se insurge, só que não propriamente para contribuir para a realização/melhoria do Direito, mas antes porque – como se retira da leitura das suas alegações – pretende que a imposição da pena no âmbito destes autos satisfaça os seus interesses (estritamente particulares) de cobrança efetiva da quantia que o arguido no processo lhe é devedor.
18. Dito de outro modo, o «erro» que a recorrente realmente identifica na decisão recorrida não é o de que a 1.ª instância tenha aplicado mal o Direito, mas antes o de que, na sua aplicação, não tomou em consideração o seu interesse em obter um meio de coação mais eficaz para se fazer ressarcir dos prejuízos que a conduta do arguido no processo lhe causou.
19. Ora, a matéria da espécie e medida da pena aplicada – como, no fundo, decidiu o assento n.º 8/99 (e os «assentos» subsequentes não puseram em questão, ainda se foram limitando o alcance da disciplina que aí se consagrou, tal como se retira, por último, do dictum constante do «assento» n.º 2/2020, citado supra, que ressalva, de forma expressa, os casos de «agravação da pena») – é essencialmente guiada por razões de interesse público, visando a realização dos fins assinalados à punição criminal (aos «fins das penas»), pois que só assim se pode entender que, quanto a ela, o assistente só possa recorrer se, como aí se decidiu, «demonstrar um concreto e próprio interesse em agir» (sublinhados obviamente nossos).
20. Este «interesse», como quer que se conceba, não pode consistir na obtenção de um meio de coação para eventual cobrança mais eficaz de uma dívida; isso não é imposto, de forma inexorável, pela necessidade de proteção de bens jurídicos, de ressocialização do condenado ou, mesmo, de proteção dos interesses da vítima em processo criminal, e muito menos se coaduna com o papel subordinado que o assistente ocupa no processo penal.
21. Na fixação da pena, o Tribunal a quo, ponderando o critério legalmente previsto, concluiu que a pena pecuniária era suficiente para alcançar as finalidades da punição (entre as quais, repete-se, não se encontra a necessidade de assegurar o pagamento, à assistente e aqui recorrente, da dívida que o arguido tem para com ela); o Ministério Público, a quem cabe representar a comunidade, conformou-se com tal decisão (ao ponto de a defender perante este Tribunal).
22. Assim, se a posição da assistente nesta matéria conflitua com a posição a este respeito assumida pelo Ministério Público, aquela só poderia recorrer demonstrando ser titular de um interesse próprio, atendível, a defender; de outro modo, como também se assinala no «assento» n.º 8/99, «se o assistente não demonstrar um real e verdadeiro interesse, um seu pedido de agravação da pena (em termos de espécie ou de medida) tem um cunho, ou, pelo menos, aparenta tê-lo, de regresso à vindicta privada» (sublinhado nosso).

23. c) No caso dos autos, como se viu, a assistente não demonstra ter – para além da prossecução dos seus interesses particulares de natureza cível, que são insuscetíveis de serem tomados em consideração na operação de determinação da espécie da pena a impor no âmbito deste processo – qualquer interesse concreto e próprio atendível que permita dizer que a decisão recorrida foi proferida contra si (e, portanto, que em relação a ela tem necessidade de – leia-se, interesse em – recorrer); tal significa, assim, que falta, à assistente nos autos, «interesse em agir».
24. Tal deveria ter implicado, como é bom de ver, a rejeição do presente recurso, por falta dos necessários pressupostos.
25. Não vinculando, porém, o despacho de admissão do recurso proferido pela 1.ª instância, este Tribunal (artigo 414.º, n.º 3, do Código de Processo Penal), nada obsta a que proceda esta Relação à rejeição do recurso interposto pela assistente, o que, consequentemente, se decidirá (artigos 400.º, n.º 2, a contrario, 414.º, n.º 2, 417.º, n.º 6, alínea b), 420.º, alínea b), todos do Código de Processo Penal), ficando assim prejudicado o conhecimento da pretensão por ela aqui formulada.

26. 2. Decaindo integralmente no seu recurso, tem a assistente de suportar as respetivas custas (artigo 515.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal).
27. Considerando, nos termos previstos no artigo 8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais, a tramitação processual ocorrida (incluindo fase de instrução e o presente recurso), afigura-se adequado fixar em 3 Unidades de Conta a taxa de justiça devida.
III
28. Pelo exposto, acordam os da 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto em rejeitar o recurso interposto pela assistente nos autos.
29. Custas pela assistente (artigo 515.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal).

Porto, 11 de janeiro de 2023.
(acórdão assinado digitalmente)
Pedro M. Menezes
Donas Botto
Paula Guerreiro