Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
23119/16.1T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS GIL
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
EQUIDADE
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
Nº do Documento: RP2023032723119/16.1T8PRT.P1
Data do Acordão: 03/27/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O Tribunal da Relação não está legalmente em condições de sindicar os juízos probatórios do tribunal recorrido formulados com base em provas sujeitas à livre apreciação do julgador, formando a sua própria e autónoma convicção probatória sempre que não tem ao seu dispor todo o manancial probatório que o tribunal a quo teve para formar a sua convicção probatória, razão pela qual, nesse circunstancialismo, deve ser indeferida a reapreciação da prova sujeita à livre apreciação do tribunal.
II - Sempre que a afetação no uso do corpo pelo sinistrado envolve maior esforço no desenvolvimento da atividade profissional, tem-se considerado verificar-se dano biológico enquanto dano patrimonial a ressarcir de acordo com a equidade.
III - Os critérios vertidos na Portaria nº 377/2008, de 26 de maio, com as alterações introduzidas pela Portaria nº 679/2009, de 25 de junho têm o seu âmbito de aplicação confinado à fase extrajudicial de resolução do sinistro, não se impondo ao julgador que em processo contencioso procede, além do mais, à determinação das indemnizações por danos corporais devidas por causa de sinistro automóvel.
IV - Em ordem a imprimir uma maior objetividade na fixação dos montantes indemnizatórios no caso de dano biológico, dando execução ao imperativo de justiça e legal de uma tendencial aplicação uniforme do direito (artigo 8º, nº 3, do Código Civil), alguma jurisprudência tem-se mostrado favorável à adoção de critérios matemáticos, ainda que sempre subordinados às regras da equidade (veja-se o nº 3 do artigo 566º do Código Civil) e tendo em consideração casos análogos anteriormente decididos.
V - O Tribunal da Relação tem poderes amplos de cognição em matéria de facto e de direito, ao contrário do que sucede com o Supremo Tribunal de Justiça que apenas conhece de questões de direito, não tendo por isso base legal, em segunda instância, a orientação restritiva na sindicação do juízo de equidade de que resulta a fixação da compensação por danos não patrimoniais, devendo antes a Relação proceder à fixação autónoma da compensação devida tendo em conta todos os fatores relevantes para o efeito.
VI - A compensação por danos não patrimoniais é fixada equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil (primeira parte do nº 4, do artigo 496º do Código Civil), devendo atentar-se no disposto no artigo 8º, nº 3, do Código Civil, em ordem a uma aplicação, tanto quanto possível, uniforme do direito, assim se respeitando e realizando o princípio da igualdade.
VII - O valor da compensação média arbitrada pelo dano da perda da vida não constitui um teto máximo que não possa ou deva ser ultrapassado quando se compensam outros danos não patrimoniais a vítimas que não faleceram.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 23119/16.1T8PRT.P1

Sumário do acórdão proferido no processo nº 23119/16.1T8PRT.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:
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Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório
Em 22 de novembro de 2016, na Instância Central Cível do Porto, Comarca do Porto, com o benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, AA instaurou a presente ação declarativa sob forma comum contra A... – Companhia de Seguros, S.A. pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 285.308,00[1] e as quantias a liquidar ulteriormente e referentes a cirurgia para remoção de material de osteossíntese e correção de cicatrizes e despesas com tratamentos médicos, cirúrgicos, fisiátricos e com medicamentos que terá que realizar no futuro.
Para fundamentar as suas pretensões, a autora alegou, em síntese, que no dia 20 de agosto de 2015, por volta da 1h40, na EN ..., no cruzamento ... (11.9), junto ao ..., concelho de Gondomar, BB conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula EG-..-.., propriedade de CC, por conta e no interesse deste; AA era transportada gratuitamente no referido veículo e tinha o cinto de segurança colocado; BB conduzia o veículo no sentido ... – ... a uma velocidade superior a 90 kms. por hora e ao descrever uma curva acentuada para a esquerda, atento o seu sentido de marcha, perdeu o controlo do veículo e despistou-se indo embater com a parte lateral direita no rail de proteção sito na berma do lado direito, atento o seu sentido de marcha e, após isso, foi colidir frontalmente no muro de proteção e separação da EN ... da via férrea, imobilizando-se; em consequência das referidas colisões a autora sofreu os danos que descreve na petição inicial e cuja reparação pretende obter nestes autos; a responsabilidade civil por danos causados a terceira pessoa com o veículo de matrícula EG-..-.. estava transferida para a ré mediante contrato de seguro titulado pela apólice nº ....
Citada, a ré contestou informando que a sua firma é presentemente B..., S.A. e impugnando muita da factualidade alegada pela autora, mas assumindo a responsabilidade pelas consequências do sinistro e pugnando pela parcial procedência da ação.
Determinou-se a citação do Instituto de Solidariedade e Segurança Social, I.P. para os efeitos do disposto no nº 2 do artigo 1º do decreto-lei nº 59/89 de 22 de fevereiro.
O Instituto da Segurança Social, I.P. veio pedir o reembolso do subsídio de doença atribuído à autora em consequência do acidente objeto deste autos, no montante de € 1.177,95, pedindo ao condenação da ré ao pagamento dessa importância acrescida de juros de mora desde a notificação do pedido de reembolso até efetivo e integral pagamento.
A ré contestou o pedido de reembolso pugnando por que venha a ser julgado procedente em função da prova que vier a ser produzida.
Proferiu-se despacho saneador tabelar, fixou-se o valor da causa no montante de € 285.308,00, identificou-se o objeto do litígio, indicaram-se os factos que já se podiam considerar assentes, enunciaram-se os temas da prova e conheceu-se dos requerimentos probatórios das partes, não se designando dia para a audiência final em virtude de o processo não estar preparado para o efeito dada a necessidade de realização de prova pericial.
O Instituto de Segurança Social, I.P. veio reclamar da não inclusão dos factos atinentes ao seu pedido de reembolso nem em sede de factos assentes, nem em sede de temas da prova.
B..., S.A. reclamou contra a alínea c) dos factos assentes, pugnando pela supressão do advérbio “inopinadamente” aí vertido, sustentou a necessidade de enunciação como tema da prova dos rendimentos da autora à data do acidente e dos descontos que sobre os mesmos incidiam e ainda, caso não devam considerar-se já matéria assente, os montantes de subsídio de doença recebidos pela autora por causa do acidente.
Depois de notificada pelo tribunal para esclarecer se o montante cujo reembolso pediu se encontrava ou não pago, o Instituto de Segurança Social, I.P. veio desistir do seu pedido de reembolso, desistência que foi homologada por decisão proferida em 23 de novembro de 2017, julgou-se prejudicado o conhecimento da reclamação contra a enunciação dos temas de prova deduzida pelo Instituto de Segurança Social, I.P. e deferiu-se parcialmente a reclamação formulada por B..., S.A..
Em 07 de novembro de 2019, a autora ofereceu articulado superveniente alegando matéria relativa à sua nova situação profissional, matéria que pretende passe a integrar os temas da prova, vindo em 08 de novembro de 2019 requerer a ampliação do pedido, de modo que ao pedido inicialmente formulado acresça o montante de € 12.500,00 e juros vencidos e vincendos à taxa supletiva legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
O articulado superveniente oferecido pela autora foi liminarmente admitido.
B..., S.A. impugnou por desconhecimento a matéria vertida no articulado superveniente e na ampliação do pedido, reiterando o que alegou em sede de contestação e alegando que as sequelas que possam afetar a autora não determinam qualquer perda de rendimento.
Em 28 de outubro de 2021, após quatro relatórios intercalares e um relatório da especialidade de psiquiatria, foi junto aos autos o relatório pericial final realizado pelo Instituto Nacional de Medicina Legal.
Em 25 de novembro de 2021 admitiu-se a ampliação do pedido requerida pela autora.
Em 17 de fevereiro de 2022 a autora deduziu novo articulado superveniente, tendo a ré impugnado grande parte do contido em tal articulado e bem assim a prova documental oferecida com o mesmo.
Em 14 de março de 2022 a autora requereu a ampliação do pedido pedindo a condenação da ré ao pagamento de € 60.000,00 a título de consultas de psiquiatria e despesas medicamentosas psiquiátricas até final da sua vida e € 225,78 a título de consulta de ortopedia e sessões de fisioterapia, tudo acrescidos de juros de mora desde a citação e até efetivo e integral pagamento e ainda, a condenação da ré ao pagamento das quantias que a autora venha a suportar relativamente a consultas e tratamentos de ortopedia e nefrologia a realizar no futuro.
A ré impugnou por desconhecimento alguma da matéria alegada no requerimento da autora para ampliação do pedido formulado em 14 de março de 2022, impugnando também a prova documental oferecida para o instruir, sustentando que relativamente às despesas com as especialidades de ortopedia e de nefrologia não está em causa uma ampliação do pedido mas antes uma alteração do pedido e que os juros de mora apenas serão devidos a partir da notificação do requerimento para ampliação do pedido, concluindo pela rejeição da ampliação do pedido relativamente às despesas futuras com consulta e tratamentos de ortopedia e nefrologia e, no mais, pela sua improcedência.
Em 04 de maio de 2022 foi admitido o articulado superveniente deduzido em 17 de fevereiro de 2022, ampliando-se os temas da prova e admitiu-se a ampliação do pedido formulada em 14 de março de 2022, admitindo-se as provas oferecidas.
A audiência final realizou-se em duas sessões e em 01 de setembro de 2022 foi proferida sentença[2] que terminou com seguinte o dispositivo que na parte pertinente ao conhecimento do objeto do recurso se reproduz de seguida:
Pelo exposto, julgo a ação parcialmente provada e procedente e, em consequência, condeno a ré, B..., S.A. (anteriormente, A... – Companhia de Seguros, S.A.), a pagar à autora, AA:
a) a quantia de € 164.827,64 (cento e sessenta e quatro mil oitocentos e vinte e sete euros, e sessenta e quatro cêntimos), a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora contados desde a data de citação e até efetivo pagamento, sendo devidos à taxa legal que em cada momento vigorar, através da portaria prevista no art. 559.º do Cód. Civil;
b) a quantia de € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros contados desde a data da presente decisão (atualizadora) e até
efetivo pagamento, sendo os juros devidos à taxa legal que em cada momento vigorar, através da portaria prevista no art. 559.º do Cód. Civil;
c) o custo vitaliciamente suportado pela autora com o acompanhamento clínico por Psiquiatria, Ortopedia e Nefrologia, para reavaliação periódica das sequelas do sinistro e da necessidade de eventuais tratamentos, bem como o custo destes tratamentos, incluindo medicamentosos.
No mais, vai a ré absolvida dos pedidos.
Em 24 de outubro de 2022, inconformada com a sentença, C..., S.A. [nova firma da ré B..., S.A.] interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
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AA contra-alegou pugnando pela total improcedência do recurso.
Colhidos os vistos dos restantes membros do coletivo, cumpre agora apreciar e decidir.
2. Questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pela recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil
2.1 Da reapreciação do ponto 16, da alínea d) do ponto 20 e do ponto 29, todos dos factos provados;
2.2 Da fixação da indemnização por dano biológico;
2.3 Do dano futuro com despesas médicas;
2.4 Da indemnização pelas despesas decorrentes da assistência por terceira pessoa;
2.5 Do abatimento às indemnizações por danos patrimoniais arbitradas à autora da quantia de € 1.000,00 que a ré lhe pagou extrajudicialmente.
2.6 Da compensação por danos não patrimoniais.
3. Fundamentos
3.1 Da reapreciação do ponto 16, da alínea d) do ponto 20 e do ponto 29, todos dos factos provados
A recorrente impugna a decisão da matéria de facto relativa ao ponto 16 dos factos provados, à alínea d) do ponto 20 dos factos provados e bem assim do ponto 29 dos mesmos factos.
A recorrente funda as suas pretensões no relatório pericial junto aos autos e na prova pessoal que discrimina, localizando temporalmente as passagens que considera relevantes e transcrevendo-as.
Os pontos de facto impugnados são os seguintes:
- A autora por força da sequela referida na subalínea i) da alínea p) do ponto 11 – factos provados – [subalínea i) da alínea p) do ponto 3.2.1.11 dos factos provados[3] não consegue estar longos períodos de pé ou sentada, trabalhar ao computador, dançar, engomar roupa, aspirar a casa, correr ou andar de bicicleta (ponto 16 dos factos provados);
- Por causa do sinistro, dos tratamentos a que foi sujeita e das sequelas físicas por aquele provocadas, a autora deve manter acompanhamento clínico por Psiquiatria, Ortopedia e Nefrologia, para reavaliação periódica das sequelas e da necessidade de eventuais tratamentos (alínea d) do ponto 20 dos factos provados);
- Para fazer face aos danos referidos no ponto 16 – factos provados –[3.2.1.16], a autora necessitará do auxílio de uma terceira pessoa, na remuneração da qual terá de suportar um salário não inferior a € 5,00 por hora, cinco horas por semana, durante o resto da sua vida (ponto 29 dos factos provados).
O tribunal recorrido motivou os pontos de facto impugnados, tanto quanto é possível concluir em virtude de a motivação não ser discriminada, da forma que segue:
A decisão da matéria de facto resultou da admissão de factos por acordo – confirmada
pelos documentos juntos, tendo-se presente o disposto nos arts. 414.º do Cód. Proc. Civil e 342.º, n.º 1, do Cód. Civil – e, quanto à matéria controvertida, dos depoimentos prestados, do relatório pericial e dos documentos juntos. Quanto aos factos não provados, a decisão resultou da ausência de prova quanto aos mesmos.
Relativamente à matéria dos pontos 21 – factos provados – e 22 – factos provados –, teve-se em consideração o depoimento prestado pela testemunha DD, mãe da autora, que depôs de modo claro e coerente, sobre factos de que tinha conhecimento e nos quais teve intervenção direta. Ainda, no que concerne à necessidade de contratação de uma pessoa para realizar as tarefas domésticas mais pesadas, nomeadamente a limpeza da asa e passar a ferro, por a autora as não conseguir realizar, em virtude das dores que sentia, teve-se em consideração, designadamente, os esclarecimentos prestados por pelo perito médico EE – que admitiu a necessidade de tal auxílio, face ao estado sequelar da autora. Este depoimento foi corroborado pela testemunha FF – médico que acompanhou a autora na especialidade de cirurgia geral – que acabou por admitir poder ser necessário, face ao estado sequelar de lombalgia, o auxílio, algumas horas por semana, de terceira pessoa para tarefas de limpeza. No mesmo sentido foram os depoimentos prestados pelas testemunhas GG (que vive com a autora em união de facto, e que confirmou ter havido necessidade de contratar uma empregada durante 4/5 horas por semana, para executar as tarefas domésticas partilhadas que à autora cabiam, mas que não era capaz de realizar, pagando à mesma € 5 por hora) e DD, mãe da autora (que também confirmou tais factos). Sobre esta questão, teve-se ainda em consideração as declarações prestadas pela própria autora.
(…)
Quanto à necessidade de acompanhamento/seguimento em consultas das especialidades de psiquiatria/nefrologia, resultou claro dos esclarecimentos prestados pelos peritos médicos EE e HH (médica psiquiatra) as razões da necessidade de tal acompanhamento/vigilância.
As testemunhas GG, II e JJ (respetivamente, “unido de facto” e amigas da autora) deram conta, de forma clara, coerente e convincente, da sua perceção quanto às alterações sofridas pela demandante – na sua vida e personalidade – em consequência do acidente, depondo de forma fundamentada sobre factos presenciados (como a autora era e se comportava antes e depois do acidente; o que fazia e deixou de fazer).
Cumpre apreciar e decidir.
Uma vez que a recorrente observa os ónus que recaem sobre quem impugna a decisão da matéria de facto, procedeu-se à análise da prova documental junta aos autos pertinente para a decisão tomada pelo tribunal recorrido e bem assim para a pretendida reapreciação da decisão da matéria de facto, nomeadamente:
- o Relatório Médico oferecido pela autora como documento 6 a instruir a petição inicial, da autoria do Sr. Dr. KK e datado de 07 de junho de 2016 e no qual, além do mais, em sede de conclusões, no que respeita a ajudas técnicas permanentes, se referem “ajudas medicamentosas; vigilância e tratamentos médicos ocasionais; ajuda de terceira pessoa principalmente em certas tarefas domésticas”;
- o Relatório Médico final elaborado pelo Instituto Nacional de Medicina Legal datado de 27 de outubro de 2021, elaborado pelo Sr. Dr. EE, de que se destaca a seguinte nota no final da discussão e as conclusões, tudo com o seguinte teor:
Nota. A situação da examinada foi considerada consolidada dado, de momento, não se perspectivar a realização de mais tratamento no sentido de melhorar a sua situação clínica. Caso se venham a efectuar (por exemplo correcção da cicatriz facial), poderá ser necessária a reavaliação pericial.
De igual modo, a examinada deverá manter acompanhamento clínico por Psiquiatria, Ortopedia e eventualmente Nefrologia, para reavaliação periódica das sequelas e da necessidade de eventuais tratamentos. A periodicidade dessas consultas, e respectivos tratamentos, deverão ser determinados por especialistas das respectivas áreas.
CONCLUSÕES
- A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 28/02/2018;
- Período de Défice Funcional Temporário Total sendo assim fixável num período de 38 dias.
- Período de Défice Funcional Temporário Parcial sendo assim fixável num período 886 dias.
- Período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total sendo assim fixável num período total de 191 dias.
- Período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Parcial sendo assim fixável num período total de 733 dias.
- Quantum Doloris no grau 5/7.
- Défice Funcional Permanente da Integridade Fisico-Psíquica fixável em 26 pontos[[4]].
- As sequelas descritas são em termos de Repercussão Permanente na Atividade Profissional, são compatíveis com o exercício da actividade habitual exercida à época do acidente, bem como com a exercida à data do exame, mas implicam esforços suplementares.
- Dano Estético Permanente fixável no grau 3/7.
- Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer fixável no grau 3/7.
- Repercussão na Atividade Sexual fixável no grau 3/7.
- Ajudas técnicas permanentes: seguimento médico regular, conforme descrito em “Discussão”.
Apesar de não beneficiar da imediação de que o tribunal de primeira instância beneficia, este tribunal de recurso irá reapreciar a prova procurando formar uma convicção própria, não se limitando a uma análise crítica da convicção do tribunal a quo.
Estando em causa a valoração de meios de prova sujeitos à livre apreciação do tribunal, não obstante a formulação assertiva da alínea b) do nº 2 do artigo 639º e do nº 1 do artigo 662º, ambos do Código de Processo Civil, nunca resulta desse labor, em bom rigor, a imposição de decisão de sentido diverso da que é objeto de reapreciação, mas tão-somente a formação de uma convicção própria do tribunal de recurso motivada racionalmente e passível de ser criticada e que pode ou não coincidir com a do tribunal recorrido.
Iniciou-se a audição da prova pessoal tentando ouvir os esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito Médico Dr. EE, autor dos relatórios periciais do Instituto Nacional de Medicina Legal produzidos no âmbito destes autos, esclarecimentos que terão sido prestados via webex.
No entanto, os esclarecimentos prestados estão na sua quase totalidade inaudíveis ou impercetíveis, sendo apenas audíveis com clareza as perguntas formuladas pelos Senhores Advogados, as observações e as conclusões que cada um deles foi formulando e bem assim as intervenções da Senhora Juíza que presidiu à audiência final.
Embora esporadicamente sejam percetíveis as respostas dadas pelo Senhor Perito, essas situações são tão pontuais que não há qualquer segurança quanto ao sentido das variadas respostas que o mesmo foi dando ao longo de mais de trinta minutos de esclarecimentos.
Os relatórios periciais da autoria deste Senhor Perito e especialmente o relatório final datado de 27 de outubro de 2021 constituem meios de prova cruciais nestes autos e especialmente tendo em conta a matéria em reapreciação[5]. Daí que os esclarecimentos prestados por este Senhor Perito se revistam de particular relevo probatório, o que é bem enfatizado pela recorrente nas transcrições que faz dos esclarecimentos alegadamente prestados por ele.
No entanto, o tribunal não se pode bastar com tais transcrições, tanto mais que não tem meios de aferir da sua fidedignidade e, além disso, porque nunca qualquer transcrição é capaz de transmitir a forma como certo depoimento é produzido, não tendo por isso aptidão para facultar todos os elementos probatórios que a simples gravação áudio de um depoimento é capaz de transmitir.
Sendo a falta ou deficiência da gravação da audiência final um vício de conhecimento não oficioso, a arguir no prazo de dez dias após a disponibilização da gravação (artigo 155º, nº 4, do Código de Processo Civil), essa patologia reflete-se negativamente sobre o direito das partes impugnarem a decisão da matéria de facto com base em prova pessoal.
A deficiência na gravação dos esclarecimentos prestados na sessão da audiência final realizada em 04 de julho de 2022 pelo Sr. Perito Médico Dr. EE impede esta segunda instância de ter acesso a toda a prova pessoal que foi produzida perante o tribunal recorrido e que por ele foi valorada relevando-a para a formação da sua convicção probatória.
A fim de que este Tribunal da Relação possa formar uma autónoma convicção tem que ter acesso a toda a prova que foi produzida perante o tribunal recorrido, como resulta inequívoco do disposto no nº 1, do artigo 662º do Código de Processo Civil.
Neste circunstancialismo, porque esta instância não tem ao seu dispor todo o manancial probatório que o tribunal a quo teve para formar a sua convicção probatória e especialmente relativamente aos pontos de facto impugnados, e, porque assim é, esta instância não está legalmente em condições de sindicar os juízos probatórios do tribunal recorrido formulados com base em provas sujeitas à livre apreciação do julgador, formando a sua própria e autónoma convicção probatória, inclusivamente com base em provas ou segmentos de provas a que o tribunal recorrido ou as partes não deram relevância (veja-se a alínea b), do nº 2, do artigo 640º do Código de Processo Civil).
Por isso, em virtude deste tribunal não ter acesso a todos os elementos probatórios que foram produzidos perante o tribunal recorrido, indefere-se a reapreciação dos factos provados nº 16, nº 20, alínea d) e 29, mantendo-se intocada a decisão da matéria de facto do tribunal recorrido, improcedendo por tal razão e nessa medida a reapreciação da decisão da matéria de facto.
3.2 Fundamentos de facto exarados na sentença recorrida que dada a improcedência da reapreciação da decisão da matéria de facto se mantêm, não se divisando fundamento legal para a sua alteração oficiosa
3.2.1 Factos provados
3.2.1.1
No dia 20 de agosto de 2015, por volta da 0l hora e 40 minutos, BB conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula EG-..-.. pela EN ... (estrada exterior da circunvalação), na zona do cruzamento ... (11.9) (junto ao ...), Gondomar.
3.2.1.2
A autora era passageira no referido veículo EG-..-.., transportada gratuitamente, tendo colocado o cinto de segurança.
3.2.1.3
No local, a EN ... é composta por duas faixas de rodagem, apartadas por um separador central, permitindo uma o trânsito no sentido Gondomar/Matosinhos (estrada exterior da circunvalação) e a outra o trânsito no sentido Matosinhos/Gondomar (estrada interior da circunvalação).
3.2.1.4
Cada uma das faixas de rodagem, com cerca de 6,40 metros de largura, possui duas vias de trânsito, separadas por uma linha longitudinal descontínua, sendo o piso betuminoso, encontrando-se em bom estado de conservação.
3.2.1.5
No local, no sentido Gondomar/Matosinhos, a EN ... desenvolve-se numa curva apertada à esquerda (cerca de 90º), existindo imediatamente antes uma placa de sinalização vertical limitando a velocidade instantânea a 40 km/h.
3.2.1.6
O veículo EG-..-.. circulava no sentido Gondomar/Matosinhos, a uma velocidade superior a 90 km/hora.
3.2.1.7
Em resultado da velocidade que lhe imprimia, a condutora do veículo EG-..-.. perdeu o seu controlo.
3.2.1.8
O veículo EG-..-.. despistou-se, embateu com a parte lateral direita na guarda de proteção direita da EN... e, seguidamente, embateu frontalmente no muro junto ao viaduto desta estrada sobre a via-férrea, imobilizando-se.
3.2.1.9
A ré, enquanto seguradora, e CC, enquanto tomador, declararam acordar que a primeira assumiria o risco da ocorrência de sinistros causados pelo veículo de matrícula EG-..-.., nos termos constantes do documento intitulado apólice n.º ..., suportando a indemnização eventualmente devida a terceiros lesados.
3.2.1.10
Em resultado do sinistro referido:
a) Durante 38 dias, a autora viu totalmente condicionada a sua autonomia na realização dos atos correntes da vida diária, familiar e social, como alimentar-se e fazer a sua higiene pessoal;
b) Durante 886 dias, a autora viu parcialmente condicionada a sua autonomia na realização dos atos correntes da vida diária, familiar e social, como alimentar-se e fazer a sua higiene pessoal;
c) Durante 191 dias, a autora viu totalmente condicionada a sua autonomia na realização dos atos inerentes à sua atividade profissional;
d) Durante 733 dias, a autora viu parcialmente condicionada a sua autonomia na realização dos atos inerentes à sua atividade profissional;
e) A autora sofreu dor quantificável num grau 5, numa escala até 7 (quantum doloris);
f) A autora ficou definitivamente afetada na sua integridade física e psíquica, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais, num grau 26, numa escala até 100;
g) A autora sofreu uma afetação da sua aparência (imagem estética) num grau 3, numa escala até 7;
h) A autora sofreu uma limitação permanente na sua atividade desportiva ou de lazer num grau 3, numa escala até 7;
i) A autora sofreu uma repercussão negativa permanente na sua atividade sexual num grau 3, numa escala até 7;
j) Terá de realizar esforços suplementares no desempenho da sua atividade profissional habitual;
k) A consolidação médico-legal das lesões sofridas pela autora ocorreu em 28 de
fevereiro de 2018.
3.2.1.11
Após o sinistro, e em consequência deste ou dos tratamentos das lesões dele decorrentes, a autora:
a) em 20 de agosto de 2015, foi admitida no serviço de urgência do Hospital ...;
b) à entrada no Hospital ..., apresentava:
i) fratura das vértebras D11 e D12 (em coluna escoliótica);
ii) fratura do 9.º ao 12.º arcos costais direitos;
iii) traumatismo renal grau V à esquerda com avulsão pedicular e hematoma perirenal;
iv) laceração pancreática;
v) fístula na porção terminal do corpo do pâncreas;
vi) derrame pleural bilateral;
vii) pneumotórax diminuto esquerdo;
viii) ferimento complexo da região mentoniana;
ix) esfacelo do lábio inferior;
x) queixas álgicas dirigidas à transição dorsolombar da coluna e ao nível da articulação metacarpofalângica do 1.º dedo da mão esquerda;
c) no Hospital ...:
i) efetuou laparotomia exploradora com colocação de dreno pancreático;
ii) nefrectomia esquerda (remoção do rim);
iii) efetuou cirurgia ortopédica (colocação de parafusos pediculares);
iv) efetuou correção do esfacelo mentoniano;
v) foi-lhe colocada prótese para drenagem (fístula do pâncreas);
vi) a cirurgia com os âmbitos referidos demandou a intervenção das especialidades de Urologia, Cirurgia Geral, Ortopedia e Cirurgia Plástica (…), sendo clinicamente registada como: “Incisão mediana xifo-pubica. Disseção fina por planos. Abertura de peritoneu. Constatação de hematoma retroperitoneal esquerdo. Incisão em linha de Toldt esquerda. Rebatimento medical de colon. Constatação de rim esquerdo fragmentado e avulsão completa de peliculo. Identificação de topo de artéria e veia renal e hemóstase das mesmas. Remoção de fragmentos de rim esquerdo. Revisão de hemóstase de loca renal. Exploração de cauda de pâncreas pela Cirurgia Geral sem intervenção. Colocação de dreno multitubular com porção superior em pâncreas e inferior em loca renal. Encerramento de aponevrose e aproximação de tecido subcutâneo. Agrafos para pele”; “Fratura da coluna DL (T12) – FVP T10 – L2. Identificação do nível de fratura com amplificador de imagem. (…) Constatação de disrupção dos elementos posteriores da coluna DL com exposição de dura ao nível da fratura, do lado direito. Colocação de parafusos pediculares (D10. 11 L1 e L2 bilateral) com controlo de amplificador de imagem. Colocação de 2 barras moldadas. Lavagem com soro fisiológico. Revisão de hemóstase. Colocação de dreno aspirativo. (…)”; “Limpeza, desinfeção, desbridamento conservador e sutura de esfacelo transmural do lábio inferior”.
vii) necessitou de antibioterapia devido a infeção;
d) entre 21 de agosto de 2015 a 30 de agosto de 2015, esteve internada na Unidade Polivalente de Cuidados Intermédios da Urgência do Hospital ... e, posteriormente, no Serviço de Cirurgia Geral do mesmo hospital;
e) em 15 de setembro de 2015, teve alta do Hospital ..., mantendo dreno abdominal, prescrição de antibiótico e de paracetamol;
f) em 21 de setembro de 2015, compareceu no serviço de urgência do Hospital ..., com dores, sendo aqui ministrados analgésicos, fixado o dreno e mudado o penso de ferida cirúrgica;
g) em 29 de setembro de 2015, compareceu a consulta na Unidade de Saúde Familiar, sendo-lhe emitidos, nesta e em consultas subsequentes, certificados de incapacidade temporária pelo menos até 26 de fevereiro de 2016;
h) em 1 de novembro de 2015, compareceu no serviço de urgência do Hospital ... com dor abdominal, com irradiação lombar à direita, apresentando leucocitose e coleção líquida pancreática, sendo internada no serviço de Cirurgia Geral;
i) durante o novo internamento, realizou tratamento com antibiótico e foi efetuada drenagem da coleção líquida;
j) em 11 de novembro de 2015, teve alta hospitalar;
k) Em 28 de junho de 2016, compareceu no serviço de Gastroenterologia do Hospital ... para remoção de prótese migrada no duodeno;
l) em 12 de janeiro de 2018, efetuou remoção de cicatriz quelóide no flanco esquerdo no Hospital ...;
m) designadamente em 18 de outubro de 2015, 20 de outubro de 2015, 20 de novembro de 2015, 10 de dezembro de 2015, 18 de dezembro de 2015, 23 de dezembro de 2015, 21 de janeiro de 2016, 17 de fevereiro de 2016, 28 de março de 2016, 13 de abril de 2016, 7 de junho de 2016, 08 de 07 de 2016, 26 de 9 de 2016, 15 de janeiro de 2018, 29 de janeiro de 2018, 28 de fevereiro de 2018, 26 de março de 2018, 30 de outubro de 2018, 11 de março de 2019 e 21 de novembro de 2019, compareceu a consultas de Cirurgia Plástica, Cirurgia Geral, Ortopedia, Urologia, Psiquiatria, Fisiatria e/ou Traumatologia;
n) efetuou não menos de 20 exames complementares de diagnóstico, designadamente, ecografia, raio-X e tomografia axial computorizada.
o) apresenta permanentemente:
i) cicatriz linear do tipo cirúrgico, ligeiramente hipocrómica, com 4,5 cms., curvilínea de concavidade inferior, localizada na região mentoniana predominantemente
central e à direita, visível a 3 metros;
ii) cicatriz do tipo cirúrgico, linear, dorsolombar, hipocrómica, na linha média, medindo 22 cms.;
iii) contratura dolorosa dorsal e lombar paravertebral, mais acentuada na região dorsal, provocando alguma dificuldade nos movimentos deste segmento, nomeadamente nas rotações;
iv) cicatriz linear cirúrgica xifopúbica da linha média do abdómen com sensivelmente 23,5 cms., hipocrómica, visível a 3 metros, contornando o umbigo pelo lado esquerdo;
v) cicatriz na fossa ilíaca esquerda com 5,5 cms. por 1,5 cms., vertical, avermelhada e ligeiramente irregular, visível a 3 metros;
p) sente:
i) dor dorsolombar, agravando com as posições e esforços;
ii) dor ligeira à pressão no segmento periumbilical da cicatriz da linha média do abdómen;
iii) desconforto na palpação dos quadrantes abdominais esquerdos.
3.2.1.12
A autora já realizou a cirurgia para remoção de material de osteossíntese.
3.2.1.13
A cicatriz da autora[6] não tem indicação cirúrgica, na medida em que o resultado previsível dessa cirurgia nunca justificaria os riscos envolvidos.
3.2.1.14
A autora nasceu em .../.../1989.
3.2.1.15
Antes do acidente, a autora era uma jovem saudável com gosto pela vida, gostando de se divertir e conviver com amigos, ir à praia, dançar, correr e andar de bicicleta.
3.2.1.16
A autora por força da sequela referida na subalínea i) da alínea p) do ponto 11 – factos provados – [subalínea i) da alínea p) do ponto 3.2.1.11 dos factos provados] não consegue estar longos períodos de pé ou sentada, trabalhar ao computador, dançar, engomar roupa, aspirar a casa, correr ou andar de bicicleta.
3.2.1.17
Após o acidente, e em resultado do mesmo, a autora inibe-se de expor o seu corpo em atividades de lazer, como praticar desporto, dançar ou ir à praia, e de se descontrair e divertir com os amigos.
3.2.1.18
Devido ao acidente dos autos, a autora deixou de usar roupa mais curta e biquíni,
deixando de ir frequentemente à praia.
3.2.1.19
Devido ao acidente dos autos, a autora considera-se fisicamente fragilizada, pelo que tem medo de frequentar locais movimentados, temendo cair ou ser derrubada.
3.2.1.20
Por causa do sinistro, dos tratamentos a que foi sujeita e das sequelas físicas por aquele provocadas, a autora:
a) sente profunda tristeza e angústia, tendo sentido medo de morrer;
b) sente-se inferiorizada, destroçada, desfigurada, envergonhada, incapacitada e constrangida;
c) sente-se deprimida, isolando-se muito, não lhe apetecendo sair de casa, chora com assiduidade, sofre de insónias e tem muito receio em andar de automóvel;
d) deve manter acompanhamento clínico por Psiquiatria, Ortopedia e Nefrologia, para reavaliação periódica das sequelas e da necessidade de eventuais tratamentos.
3.2.1.21
Durante o período em que esteve condicionada a sua autonomia na realização dos atos correntes da vida diária, familiar e social, como alimentar-se e fazer a sua higiene pessoal, foram contratados os serviços de uma terceira pessoa para auxiliar a autora e executar as tarefas domésticas.
3.2.1.22
Os serviços referidos no ponto 21 – factos provados – [3.2.1.21 dos factos provados] tiveram um custo de € 3.000,00, suportado pela autora.
3.2.1.23
Na data do sinistro, a autora estava a frequentar o curso de Gestão de Empresas, para além de trabalhar a tempo parcial.
3.2.1.24
Devido ao acidente, a autora atrasou a conclusão da licenciatura, em uma época de exames.
3.2.1.25
Em 14 de dezembro de 2015, a autora concluiu a licenciatura em Gestão de Empresas.
3.2.1.26
Na data do sinistro, a autora exercia, a tempo parcial, a profissão de vendedora numa loja de pronto-a-vestir (categoria de caixeira/ajudante), auferindo o vencimento mensal líquido de cerca € 516,85 (sendo € 318,00 de vencimento base e o restante a título, designadamente, de subsídio de refeição, comissões e suplemento de trabalho noturno), podendo variar em função do número de horas de trabalho prestado.
3.2.1.27
Em resultado do sinistro, a autora deixou de auferir remunerações no valor de € 2.827,64, para além da prestação que já lhe foi paga pela Segurança Social.
3.2.1.28
A partir de maio de 2017, a autora passou a ser funcionária da sociedade comercial D..., S.A., exercendo as funções de assistente administrativa, auferindo o salário mensal líquido de € 802,11, acrescido de € 134,61 a título de subsídio de almoço.
3.2.1.29
Para fazer face aos danos referidos no ponto 16 – factos provados – [3.2.1.16][7], a autora necessitará do auxílio de uma terceira pessoa, na remuneração da qual terá de suportar um salário não inferior a € 5,00 por hora, cinco horas por semana, durante o resto da sua vida.
3.2.1.30
Em 26 de novembro de 2015, a título de indemnização, a ré entregou à autora a quantia de € 1.000,00.
3.2.1.31
O Instituto da Segurança Social concedeu à autora um subsídio de doença no valor de € 1.177,95, correspondente ao período entre 16 de setembro de 2015 e 25 de março de 2016, tendo a ré reembolsado este valor ao Instituto.
3.2.2 Factos não provados
3.2.2.1
As dores e as limitações experimentadas pela autora em resultado do sinistro vão-se acentuando com o decurso do tempo.
3.2.2.2
A autora propõe-se realizar nova cirurgia para remoção de cicatrizes.
3.2.2.3
Fruto das lesões e sequelas que sofreu em resultado do acidente, a autora não carece no futuro do auxílio de uma terceira pessoa seja para o que for.
4. Fundamentos de direito
4.1 Da fixação da indemnização por dano biológico
A recorrente, seja com base na alteração da decisão da matéria de facto por que pugnou, seja de um estrito ponto de vista jurídico critica a decisão recorrida no que respeita à fixação do montante da indemnização por dano biológico.
Na perspetiva da recorrente, no que respeita à fixação da indemnização do dano biológico, apenas têm rebate profissional os danos que na avaliação pericial foram avaliados em 4 pontos e 8 pontos, não relevando para este efeito o dano da perda do rim computado em 15 pontos e a cicatriz viciosa a que se arbitrou 1 ponto, não podendo por isso para tal efeito considerar-se os 26 pontos fixados a final considerando todos os danos sofridos pela autora, além de que não se demonstrou que os danos com rebate profissional envolvem uma perda efetiva da capacidade de ganho.
Tendo como referência um salário médio de € 825,00 em 2015, uma taxa de juro de 2% e os valores arbitrados em situações que considera mais graves do que a destes autos, a recorrente sustenta que a indemnização por dano biológico nunca poderia ir além de € 65.000,00.
O tribunal recorrido, sobre a problemática e a fixação da indemnização por dano biológico escreveu o seguinte:
A autora reclama o pagamento de uma indemnização pelo dano biológico permanente. Liquida esta indemnização (no valor de € 157.500,00) com base naquele que, supostamente, seria o seu rendimento normal nos anos vindouros, se o sinistro não tivesse tido lugar.
Estamos, pois, perante um dano futuro.
Ainda que não resulte provada qualquer específica perda definitiva da capacidade de ganho, o esforço acrescido – geral, logo, não afastado no trabalho − tem uma repercussão económica no âmbito laboral. Por exemplo, na aquisição de calçado mais confortável, na utilização de uma cadeira ergonómica ou na necessidade de condução de uma viatura com uma suspensão melhor ou com uma direção mais suave. O dano biológico constitui uma capitis deminutio relativamente a toda a dimensão humana do lesado, logo também em relação a uma das dimensões mais relevantes de qualquer pessoa adulta: a atividade laboral.
Ora, a autora ficou definitivamente afetado(a) na sua integridade física e psíquica, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais, num grau 26, numa escala até 100. Tanto basta para que se deva concluir pela perda da capacidade de ganho.
A aferição da necessidade de compensação pela perda da capacidade de ganho fundada na existência de uma incapacidade para o trabalho assenta numa perspetiva estática da atividade laboral ou, se se preferir, na existência de uma situação económica de pleno emprego, estando o lesado já inserido no mercado de trabalho (no topo da carreira com um vínculo por tempo indeterminado). Esta perspetiva não apreende a realidade dinâmica de procura de novo emprego ou de uma promoção. Como é evidente, num mercado de trabalho extremamente competitivo, os melhores empregos tenderão a ser oferecidos aos candidatos que, em abstrato, se apresentam como mais eficientes, isto é, aos candidatos que não revelam qualquer capacidade funcional diminuída.
Tem, pois, a autora direito a uma indemnização pelo dano biológico (patrimonial) sofrido. No entanto, por um lado, é perfeitamente especulativo fazer-se equivaler o esforço acrescido a uma incapacidade parcial permanente para o trabalho, decalcando-se a indemnização correspondente da indemnização devida pela perda efetiva da capacidade de obtenção de rendimentos. A liquidação desta indemnização não pode ser simplisticamente decalcada do cálculo da indemnização devida pela perda da capacidade de ganho. Aliás, em muitos casos, cumular-se-á com estoutra indemnização.
Por outro lado, haverá que ter em atenção o valor da compensação a arbitrar pelos incómodos resultantes de esforços suplementares, como danos (que são) não patrimoniais, considerando que essa compensação visa sobretudo permitir ao lesado obter meios para suavizar ou eliminar o sofrimento. A não se atentar nesta realidade, estar-se-ia, então, perante uma duplicação de vias ressarcitórias: numa via, compensação do sofrimento que será sentido no futuro; noutra via, entrega de uma indemnização para adquirir os meios a que o sofrimento não ocorra. A compensação agora arbitrada destina-se, pois, apenas a compensar o efetivo handicap da autora no fortemente concorrencial mercado de trabalho – isto é, no mercado dos “melhores trabalhos”, de acordo com as suas habilitações, que a autora tinha a legítima expetativa de integrar.
Tratando-se, como se trata, de um dano futuro, justifica-se e impõe-se o recurso à equidade (art. 566.º, n.º 3, do Cód. Civil), informada por critérios de verosimilhança e de probabilidade, considerando as balizas dadas por provadas – como as habilitações da lesada, a
natureza da atividade laboral que pode exercer, a remuneração normal dessa atividade (e o nível de tributação fiscal), a sua idade (e período normal de vida ativa) e o grau de dano biológico fixado (sobre o recurso à equidade, cfr. o Ac. do STJ de 19-09-2019 (2706/17.6T8BRG.G1.S1)).
Na posse destes critérios, é ajustado arbitrar ao(à) autor(a) uma indemnização de € 100.000,00 pelo dano biológico sofrido (dimensão patrimonial).
Cumpre apreciar e decidir.
Não obstante a figura do dano biológico ser no domínio da responsabilidade por facto ilícito, normalmente resultante de acidente de viação[8], daquelas que mais desencontros jurisprudenciais tem suscitado, a tal ponto que o nosso Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão ainda não muito distante no tempo[9], em sede de apreciação do preenchimento dos requisitos de admissibilidade do recurso de revista excecional, refere que “[a]cresce que surgiu, de há anos para cá, a figura do “dano biológico” cujas dúvidas começam na conceptualização, continuando no capítulo referente à autonomização ou não relativamente às parcelas que tradicionalmente se fixavam”, julga-se que ainda se revela de interesse prático no enquadramento de certos casos, como sucede precisamente na hipótese dos autos.
Na situação em apreço, é manifesto que a incapacidade parcial geral que afeta a autora não tem qualquer projeção negativa nos ganhos que poderá auferir[10], não envolve uma redução nos seus rendimentos, implicando antes esforços suplementares para o exercício da sua atividade profissional e também um nível de esforço maior para a realização das tarefas pessoais e familiares.
Sempre que a afetação no uso do corpo pelo sinistrado envolve maior esforço no desenvolvimento da atividade profissional, tem-se considerado verificar-se dano biológico enquanto dano patrimonial a ressarcir de acordo com a equidade[11].
Na realidade, mesmo quando está em causa o maior esforço no desenvolvimento das atividades pessoais, esse acréscimo pode ter projeção patrimonial, como aliás se verifica no caso dos autos, com o custo que tem para a lesada a contratação de alguém para a auxiliar em certas lides domésticas que envolvem um acréscimo de dor além daquele que ficou a padecer por força do sinistro.
Na verdade, o esforço acrescido traduz-se em força de trabalho aplicada para manter um certo desempenho profissional e pessoal e, sob este prisma, é passível de avaliação pecuniária[12].
Além disso, este maior esforço conduz a um maior desgaste da pessoa e a uma previsível redução das prestações profissionais e pessoais em momento anterior ao que sucederia caso não se tivessem verificado as sequelas determinantes de laboriosidade acrescida.
As sequelas que a autora apresenta, com o aumento da idade e de acordo com as regras da experiência comum, irão tendo um impacto maior na sua qualidade de vida, dada a natural redução das capacidades em geral de qualquer pessoa com o simples passar do tempo.
No entanto, o enquadramento do caso no denominado dano biológico não significa que a determinação da indemnização devida se deva realizar com aplicação da Portaria nº 377/2008, de 26 de maio, com as alterações introduzidas pela Portaria nº 679/2009, de 25 de junho. De facto, a Portaria nº 377/2008, de 26 de maio surgiu para regulamentação do nº 5, do artigo 39º, do decreto-lei nº 291/2007, de 21 de agosto. A previsão legal que se acaba de citar disciplina a proposta razoável para regularização dos sinistros que envolvam danos corporais[13], não tendo qualquer propósito uniformizador dos valores indemnizatórios por danos corporais no espaço da União Europeia. Por isso, como tem sido jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça, os critérios vertidos na aludida portaria têm o seu âmbito de aplicação confinado à fase extrajudicial de resolução do sinistro, não se impondo ao julgador que em processo contencioso procede, além do mais, à determinação das indemnizações por danos corporais devidas por causa de sinistro automóvel[14].
Em sede de dano biológico, finda a vida ativa, o fator rendimento continua a ter o seu relevo[15], desde logo porque a reforma não implica qualquer proibição de desenvolver trabalho remunerado e, claro está, serão as qualificações e a natureza do trabalho desenvolvido os fatores decisivos na determinação do valor da força de trabalho.
A determinação do montante indemnizatório devido pela perda ou afetação da capacidade de ganho é sempre uma operação melindrosa e é-o tanto mais quanto maior é o horizonte temporal a ter em conta e a maior ou menor instabilidade da situação envolvente[16].
O melindre da operação de quantificação deste dano aumenta nos casos em que em que essa afetação não tem projeção direta na remuneração do lesado, como sucede no caso dos autos, contendendo apenas com o acréscimo de esforço no desenvolvimento da atividade profissional e pessoal habitual e com o inerente desgaste que isso implica.
Em ordem a imprimir uma maior objetividade na fixação dos montantes indemnizatórios, dando execução ao imperativo de justiça e legal de uma tendencial aplicação uniforme do direito (artigo 8º, nº 3, do Código Civil), alguma jurisprudência tem-se mostrado favorável à adoção de critérios matemáticos[17], ainda que sempre subordinados às regras da equidade (veja-se o nº 3 do artigo 566º do Código Civil)[18] e tendo em consideração casos análogos anteriormente decididos.
Neste contexto, as tabelas financeiras, tal como as tabelas constantes das Portarias nº 377/2008, de 26 de maio e nº 679/2009, de 25 de junho, podem servir de indicador[19], contribuindo para reduzir o subjetivismo na determinação da indemnização a arbitrar[20].
Os princípios fundamentais adotados pelo Supremo Tribunal de Justiça nesta matéria, resumidos na citação[21] constante do acórdão de 05 de julho de 2007, no processo nº 07A1734, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Nuno Cameira, acessível no site da DGSI, são os seguintes:
1ª) A indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não auferirá e que se extingue no final do período provável de vida;
2ª) No cálculo desse capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equidade, o que implica que deve conferir-se relevo às regras da experiência e àquilo que, segundo o curso normal das coisas, é razoável;
3ª) As tabelas financeiras por vezes utilizadas para apurar a indemnização têm um mero carácter auxiliar, indicativo, não substituindo de modo algum a ponderação judicial com base na equidade;
4ª) Deve ser proporcionalmente deduzida no cômputo da indemnização a importância que o próprio lesado gastaria consigo mesmo ao longo da vida (em média, para despesas de sobrevivência, um terço dos proventos auferidos), consideração esta que somente vale no caso de morte;
5ª) Deve ponderar-se o facto de a indemnização ser paga de uma só vez, o que permitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia [22];
6ª) Deve ter-se preferencialmente em conta, mais do que a esperança média de vida activa da vítima, a esperança média de vida, uma vez que, como é óbvio, as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixa de trabalhar por virtude da reforma (em Portugal, no momento presente, a esperança média de vida dos homens já é de sensivelmente 73 anos[23], e tem tendência para aumentar; e a das mulheres chegou aos oitenta)”.
A pretensão da recorrente de que o dano biológico da autora seja computado desconsiderando as desvalorizações arbitradas a título de perda do rim e decorrente de uma cicatriz viciosa, respetivamente de 15 pontos e 1 ponto, não se nos afigura de seguir, desde logo porque tal questão não foi colocada no momento e na sede própria e que era o exame pericial médico.
Na realidade, se para o cálculo do dano biológico a responsável civil pretendia que apenas parte da desvalorização atribuída ao lesado fosse tida em conta deveria ter suscitado essa questão logo em sede instrutória aquando da produção da prova pericial e não apenas agora em sede de recurso.
A desvalorização arbitrada é global, sucessivamente ponderada e assim deve ser tomada em conta para determinar as consequências patrimoniais daí decorrentes.
No caso em apreço, afigura-se-nos que a indemnização a arbitrar a título de dano biológico, tendo em conta a afetação definitiva e parcial da autora na sua integridade física e psíquica, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais, num grau 26, numa escala até 100, compatível com o exercício da atividade profissional, mas com esforços acrescidos e com limitações na sua capacidade de utilização do corpo em geral dadas as lombalgias de que ficou a padecer, há de ser encontrada entre o máximo obtido pelo critério matemático simples correspondente à capitalização da redução patrimonial no período da esperança de vida que a lesada teria e o patamar fornecido pelas tabelas financeiras, tendo em conta a mesma esperança de vida, ou seja, varia entre € 184.121,6822 (€ 3.409,6608 x 54 anos) e € 107.143,85121 (coeficiente de 31,42361 x € 3.409,6608)[24]. Estes valores devem no seu patamar mínimo ser majorados, dado que foi aplicado um coeficiente correspondente a uma esperança de vida de cinquenta anos, quando no caso é de cinquenta e quatro anos e, por outro lado, reduzidos, tendo em conta a manutenção da capacidade laboral da lesada, a não afetação efetiva dos rendimentos auferidos pela lesada e a reparação da vertente “doméstica” deste dano[25], em ordem a, tanto quanto possível, evitar duplicações de indemnizações.
A nosso ver, no caso em apreço, as razões para a redução da indemnização que se acabam de enunciar, sobrepõem-se claramente às que justificam uma majoração.
Tudo sopesado, ponderando ainda, em termos comparativos, as indicações mais recentes que o Supremo Tribunal de Justiça vem dando sobre a matéria em casos de menor gravidade do que o caso dos autos[26] e a natural evolução que as indemnizações devem ter face à erosão do poder de compra resultante da inflação, julga-se adequada e equitativa a quantia de cem mil euros arbitrada pelo tribunal recorrido para reparar o dano em causa.
Pelo exposto, improcede esta questão recursória.
4.2 Do dano futuro com despesas médicas
A recorrente pugna pela revogação da sua condenação ao pagamento das despesas médicas e medicamentosas futuras, no pressuposto da procedência da reapreciação da decisão da matéria de facto e, assim não sucedendo, deve a condenação vincar que respeita a despesas médicas que a autora venha efetivamente a suportar e por causa do acidente.
No que respeita esta condenação, escreveu-se na decisão recorrida o seguinte:
Para tratamento do dano biológico resultante do sinistro, pode um lesado vir a necessitar vitaliciamente de ajudas medicamentosas, de cirurgias completares (por exemplo, destinadas à remoção de material de material de osteossíntese) e de tratamentos médicos regulares, designadamente em consulta de especialidade. Dispõe o n.º 2 do art. 564.º do Cód. Civil que, “na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis”. É o que ocorre com as despesas referidas.
Sobre estes danos, apenas resultou provado que, para enfrentar as sequelas provocadas pelo sinistro, a autora “deve manter acompanhamento clínico por Psiquiatria, Ortopedia e Nefrologia, para reavaliação periódica das sequelas e da necessidade de eventuais tratamentos”.
Com base em critérios de equidade, seria, porventura, possível fixar desde já uma indemnização – v.g., o valor de três consultas de especialidade por ano, durante a vida da autora. No entanto, a demandante propõe-se liquidar futuramente o dano efetivo, e não, desde já, o meramente previsível. A imediata liquidação deste dano futuro violaria, pois, o princípio dispositivo e os limites do pedido.
Cumpre apreciar e decidir.
No que respeita este dano provou-se:
- “Por causa do sinistro, dos tratamentos a que foi sujeita e das sequelas físicas por aquele provocadas, a autora:
(…)
d) deve manter acompanhamento clínico por Psiquiatria, Ortopedia e Nefrologia, para reavaliação periódica das sequelas e da necessidade de eventuais tratamentos (ponto 3.2.1.20, alínea d) dos factos provados).
Uma vez que a reapreciação da decisão da matéria de facto foi indeferida em virtude deste tribunal de recurso não ter acesso a toda a prova pessoal que foi produzida perante o tribunal recorrido, é manifesto que é infundada a pretensão da recorrente de total improcedência desta condenação.
Vejamos se são pertinentes os reparos que a recorrente faz à condenação do tribunal recorrido que, recorde-se, no que respeita este dano, foi no sentido de a ré ser condenada a pagar:
o custo vitaliciamente suportado pela autora com o acompanhamento clínico por Psiquiatria, Ortopedia e Nefrologia, para reavaliação periódica das sequelas do sinistro e da necessidade de eventuais tratamentos, bem como o custo destes tratamentos, incluindo medicamentosos.
A condenação ilíquida proferida pelo tribunal recorrido, como bem se vê, refere-se a despesas efetivas suportadas pela autora com o acompanhamento clínico nas especialidades de psiquiatria, ortopedia e nefrologia e para reavaliação das sequelas do sinistro e da necessidade de eventuais tratamentos, bem como o custo destes tratamentos, incluindo medicamentosos, sendo assim clara a conexão causal destas despesas com o sinistro objeto destes autos.
Não têm assim fundamento as críticas que a recorrente tece quanto à imprecisão do dispositivo da decisão recorrida, neste segmento.
Pelo exposto, improcede totalmente esta questão recursória.
4.3 Da indemnização por despesas futuras decorrentes da assistência por terceira pessoa
A recorrente pugna pela revogação deste segmento condenatório em função da procedência da reapreciação da decisão da matéria de facto que requereu, seja em decorrência da eliminação do ponto 29 dos factos provados, seja em consequência da alteração de redação do mesmo ponto nos termos que propõe pois que entende que o maior sacrifício a que a autora está sujeita após o acidente e por causa deste na execução de tarefas domésticas não constitui um dano patrimonial indemnizável, mas sim um dano não patrimonial, seja ainda porque a extensão do dano não é a que o tribunal recorrido deu como provada e, em todo o caso, o montante arbitrado não pode corresponder ao custo total das despesas previsíveis por não ter em conta a natureza frutífera do capital, devendo, nesta eventualidade, ser arbitrado o montante de trinta e um mil euros para indemnização de tal prejuízo.
Na decisão recorrida, a propósito da indemnização deste dano escreveu-se o seguinte:
A autora pede uma indemnização no montante de € 60.000,00 para custear a contratação de uma pessoa que auxilie na execução de tarefas domésticas mais penosas. Para fazer face ao dano biológico resultante do sinistro, pode o lesado vir a necessitar vitaliciamente da ajuda de terceiros na realização de tarefas do dia-a-dia. Dispõe o n.º 2 do art. 564.º do Cód. Civil que, “na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis”. É o que ocorre com as despesas referidas.
Sobre estes danos, resultou provado que, para fazer face aos danos referidos no ponto 16 – factos provados –, a autora necessitará do auxílio de uma terceira pessoa, na remuneração da qual terá de suportar um salário não inferior a € 5,00 por hora, cinco horas por semana, durante o resto da sua vida.
A despesa anual – considerando apenas 12 meses por ano (sem subsídios, portanto) e quatro semanas por més – é, pois, de cerca de € 1200,00. Considerando a atual esperança de vida à nascença em Portugal – 83,67 anos para o sexo feminino (Pordata/INE) – e a idade da autora, podemos aceitar que esta despesa se irá prolongar por cerca de mais 50 anos. A simples multiplicação da despesa pelo número de anos resulta num prejuízo futuro de € 60.000,00, pelo que se conclui que o valor pedido pela autora tem cobertura na lei e nos factos. É-lhe devida a indemnização de € 60.000,00.
A consideração deste valor para efeitos ressarcitórios não representa um enriquecimento sem causa, por antecipação da totalidade do capital do dano futuro, pois, em contrapartida (e para além de não terem sido considerados subsídios nem meses com mais de quatro semanas), também não é considerado o progressivo aumento do valor da despesa considerada: o progressivo aumento do salário mínimo nacional por ora. Neste momento, considerando o salário mínimo de € 705,00 e um mês com 21 dias úteis, a remuneração horária é de € 4,20.
Cumpre apreciar e decidir.
A pretensão da recorrente de revogação deste segmento da condenação com base nas alterações da decisão da matéria de facto por que pugnou improcede já que a reapreciação da decisão da matéria de facto foi indeferida.
E deve este dano ser compensado como dano não patrimonial?
Pelas razões que já foram expostas relativamente ao dano biológico, a afetação da capacidade de trabalho da lesada, no caso na execução das lides domésticas, constitui um prejuízo passível de avaliação pecuniária e, por isso, um dano patrimonial.
Na verdade, antes do acidente, a lesada executava sem limitações estas tarefas e depois do sinistro e por causa das limitações de que ficou a padecer, necessitará do auxílio de uma terceira pessoa, na remuneração da qual terá de suportar um salário não inferior a € 5,00 por hora, cinco horas por semana, durante o resto da sua vida.
Conclui-se assim que este prejuízo é um dano patrimonial e como tal deve ser reparado.
Vejamos agora se procede o argumento da recorrente de que a decisão recorrida não teve em conta a natureza frutífera do capital, constituindo por isso um enriquecimento injustificado da lesada.
A decisão recorrida, em certa medida antecipando esta crítica, referiu que o pagamento da totalidade do dano futuro não constituía um enriquecimento sem causa da lesada, em virtude de nos cálculos efetuados não terem sido considerados subsídios de férias e de Natal, de apenas terem sido consideradas quarenta e oito semanas por ano e ainda por não se ter tomado em conta o progressivo aumento da despesa.
Que dizer?
A circunstância de não terem sido tomados em conta subsídios de férias e de Natal não é uma razão pertinente pois desconhece-se em que regime os referidos serviços serão prestados.
A consideração de apenas quarenta e oito semanas no cômputo do dano é uma razão válida na medida em que em cada ano há cinquenta e duas semanas. A redução do número de semanas pode justificar-se tendo em atenção um período de um mês de férias por ano em que a casa não será usada. No entanto, há que ter em conta que pelo menos uma vez por ano, as habitações carecem de uma limpeza mais profunda, a carecer necessariamente de maior número de horas de trabalho.
Também é válida a referência ao facto de não se ter tido em conta o progressivo aumento da despesa ao longo dos anos.
No obstante a pertinência de algumas das razões aduzidas pelo tribunal recorrido para afastar um enriquecimento injustificado da lesada com o recebimento antecipado da totalidade do capital necessário para custear os gastos futuros com a assistência de terceira pessoa, afigura-se-nos mais seguro proceder ao cálculo deste dano considerando o seu custo anual previsível e com aplicação das tabelas financeiras que tomam em conta a natureza frutífera do capital ao longo do período de tempo considerado e a sua sucessiva amortização.
Tendo em conta estes pressupostos, em cada semana a lesada despenderá vinte e cinco euros, despendendo em cada ano mil e trezentos euros (€ 25,00 x 52 semanas = € 1.300,00). Multiplicando a despesa anual de mil e trezentos euros pelo coeficiente das tabelas financeiras previsto para um período de cinquenta anos[27] e que como vimos já anteriormente é de 31,42361, obtém-se o valor de € 40.850,693.
Assim, tudo sopesado, tendo em conta a indemnização já arbitrada a título de dano biológico e a natureza frutífera do capital, afigura-se-nos mais equilibrado para ressarcir este dano o montante de quarenta e um mil euros, procedendo, nesta parte, a pretensão recursória.
4.4 Do abatimento às indemnizações por danos patrimoniais arbitradas à autora da quantia de € 1.000,00 que a ré lhe pagou extrajudicialmente
A recorrente pugna por que aos valores arbitrados a título de danos patrimoniais seja abatido o valor de € 1.000,00 por si adiantado.
Cumpre apreciar e decidir.
Esta questão recursória, só faz sentido enquanto advertência a esta instância, já que, no cômputo global dos danos patrimoniais, o tribunal recorrido teve o cuidado de abater tal valor (veja-se o quadro constante da sentença recorrida quando se conheceu dos juros de mora).
Assim, tendo em conta as parcelas dos valores indemnizatórios não questionados pela recorrente, referentes a assistência pretérita com terceira pessoa, no montante de € 3.000,00 e a perdas salariais no montante de € 2.827,64, o montante de € 100.000,00, a título de dano biológico antes confirmado por este tribunal e o montante de € 41.000,00 a título de despesas futuras com assistência de terceira pessoa fixado nesta instância, constata-se que o valor global dos danos patrimoniais é de € 146.827,64 e, abatendo a este montante a importância de € 1.000,00 adiantada pela ré, o valor global dos danos patrimoniais reduz-se a € 145.827,64.
4.5 Da compensação por danos não patrimoniais
A recorrente pugna pela redução da compensação de danos não patrimoniais para o montante de quarenta mil euros referindo para o efeito e em síntese que o valor arbitrado supera o que comummente é arbitrado nos casos de dano da perda da vida, que ao contrário do que foi alegado a autora não foi submetida a sucessivas intervenções cirúrgicas, tendo a lesada retomado a sua atividade profissional em abril de 2016 e apenas teve um atraso na sua licenciatura, tendo estado internada no hospital trinta e seis dias interpolados, que a manter-se a indemnização para custear as despesas futuras com assistência de terceira pessoa as dores padecidas pela lesada serão minoradas, razão pela qual sustenta que tal compensação não deve exceder quarenta mil euros.
Na decisão recorrida, a propósito deste dano escreveu-se o seguinte:
Malgrado se poder afirmar a existência de um dano não patrimonial – como a perda de um órgão (rim), a desfiguração (mais sentida por pessoas jovens), a dor imediatamente emergente do sinistro e dos tratamentos, a dor resultante da realização de esforços ou a privação de atividades de lazer −, de acordo com o art. 496.º, n.º 1, do Cód. Civ., só são indemnizáveis os danos não patrimoniais que, “pela sua gravidade, mereçam tutela do direito”. Ou seja, a lei tem em consideração, não apenas a dignidade do direito violado, mas também o nível da agressão - ou, melhor, a dimensão do dano. Resta, pois, determinar se, no caso sub judice, a agressão ao direito de personalidade da autora merece tutela jurídica.
Em face de tudo o que ficou provado, conclui-se que a autora sofreu um dano e que este foi grave. Porém, dentro desta gravidade (intensidade), o montante da indemnização deve refletir a relativamente moderada extensão do mesmo - em face da potencial dimensão que a agressão a um direito de personalidade pode atingir.
Não é possível pôr um preço à dor; menos ainda é possível avaliar o mero comprometimento de capacidades motoras sem repercussões patrimoniais. A este respeito, devemos ter em conta o critério legal prescrito para a liquidação deste dano: o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e as demais circunstâncias do caso - designadamente, os motivos do agente, o comportamento do(a) lesado(a) e os restantes comportamentos do lesante. Com a utilização deste critério, pretende-se, no entanto, que a indemnização cumpra uma função compensatória e não, atenta a natureza do dano, ressarcitória em sentido próprio - cfr. o Ac. do TRL de 2 de dezembro de 1993, CJ, Ano XVIII, t. V, p. 172. Por outro lado, na fixação do montante devido, dever-se-ão ter em conta os valores normalmente praticados no ressarcimento deste tipo de danos; isto é, há que ter uma perspetiva de proporcionalidade ou de justiça relativa - cfr. o art. 8.º, n.º 3, do CC, bem como o Ac. do TRL de 8 de abril de 1992, CJ, Ano XVII, t. II, p. 183.
Do exposto se extrai ser ajustada a compensação pelos danos não patrimoniais sofridos
pela autora no valor de € 75.000,00 − quantia calculada (atualizada) por referência à presente
data.
Cumpre apreciar e decidir.
Antes de mais, importa sublinhar que não seguimos a orientação que se tem vindo a manifestar nalguns Tribunais da Relação, na senda do acórdão seminal do Supremo Tribunal de Justiça de 05 de novembro de 2009, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Lopes do Rego no processo nº 381-2002.S1, acessível na base de dados da DGSI e no sentido de que o controlo da decisão de fixação equitativa da compensação por danos não patrimoniais se regeria pelos mesmos parâmetros que vigoram no recurso de revista, ou seja, de que o juízo de equidade deverá, “em princípio, ser mantido, salvo se o julgador se não tiver contido dentro da margem de discricionariedade consentida pela norma que legitima o recurso à equidade – muito em particular, se o critério adoptado se afastar, de modo substancial, dos critérios que generalizadamente vêm sendo adoptados, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da adopção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados, e, em última análise, o princípio da igualdade.
Na verdade, o Tribunal da Relação tem poderes amplos de cognição em matéria de facto e de direito, ao contrário do que sucede com o Supremo Tribunal de Justiça que apenas conhece de questões de direito, não tendo por isso base legal, em segunda instância, a orientação restritiva na sindicação do juízo de equidade de que resulta a fixação da compensação por danos não patrimoniais, devendo antes a Relação proceder à fixação autónoma da compensação devida tendo em conta todos os fatores relevantes para o efeito.
A compensação por danos não patrimoniais é fixada equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil (primeira parte do nº 4, do artigo 496º do Código Civil).
Também nesta vertente deve atentar-se no disposto no artigo 8º, nº 3, do Código Civil, em ordem a uma aplicação, tanto quanto possível, uniforme do direito, assim se respeitando e realizando o princípio da igualdade.
Pela sua própria natureza, os danos não patrimoniais não são passíveis de reconstituição natural e, por outro lado, nem em rigor são indemnizáveis mas apenas compensáveis pecuniariamente.
A compensação arbitrada nestes casos não é o preço da dor ou de qualquer outro bem não patrimonial, mas sim uma satisfação concedida ao lesado para minorar o seu sofrimento, paliativo que numa sociedade que deifica o dinheiro assume naturalmente esta feição.
Importa ainda não perder de vista que apenas são compensáveis os danos não patrimoniais merecedores de tutela jurídica, estando afastados do círculo dos danos indemnizáveis os simples incómodos (artigo 496º, n.º 1, do Código Civil).
Ensina o Professor Antunes Varela[28] que a “gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias do caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada)”. Em nota de rodapé, na mesma página da obra citada, aludia o Ilustre Professor ao facto de Carbonnier considerar de todo aberrante a decisão judicial que concedeu a indemnização por danos morais pedida pelo dono duma écurie de course, com fundamento no desgosto que lhe causou a morte de um dos seus cavalos. Embora este exemplo não tenha na atualidade a pertinência que tinha num tempo em que os animais eram vistos exclusivamente como coisas[29], destituídos de sentimentos[30], aponta para que o sofrimento a compensar atinja um patamar mínimo de gravidade para que se torne merecedor da tutela do direito[31]. Existe como que uma tolerância ou adequação social de certo nível de incomodidade ou sofrimento e que constitui o preço que cada ser humano tem de pagar por viver em sociedade.
No caso em apreço, não se discute a compensabilidade dos danos não patrimoniais sofridos e a sofrer no futuro pela recorrida (recorde-se a subalínea i) da alínea p) do ponto 3.2.1.11 dos factos provados) mas apenas a medida da compensação adequada.
Não é verdade que a compensação arbitrada pelo tribunal recorrido corresponda ao valor comummente arbitrado ao dano da perda da vida, pois que na atualidade, como se informa em decisão recente do nosso mais alto tribunal[32], esse valor anda na ordem dos oitenta mil euros e com tendência para ir aumentando, paulatinamente, quanto mais não seja pelo simples efeito da inflação.
De todo o modo, o valor da compensação média arbitrada pelo dano da perda da vida não constitui um teto máximo que não possa ou deva ser ultrapassado quando se compensam danos não patrimoniais a vítimas que não faleceram. Infelizmente, a vida real vai-nos dando exemplos de situações de “sobreviventes” que envolvem um sofrimento intenso e que se mantém ao longo de toda a vida e com uma gravidade e intensidade que supera o facto instantâneo da morte de um ser humano.
No caso concreto, importa reter a seguinte factualidade provada:
Em resultado do sinistro referido:
a) Durante 38 dias, a autora viu totalmente condicionada a sua autonomia na realização dos atos correntes da vida diária, familiar e social, como alimentar-se e fazer a sua higiene pessoal;
b) Durante 886 dias, a autora viu parcialmente condicionada a sua autonomia na realização dos atos correntes da vida diária, familiar e social, como alimentar-se e fazer a sua higiene pessoal;
c) Durante 191 dias, a autora viu totalmente condicionada a sua autonomia na realização dos atos inerentes à sua atividade profissional;
d) Durante 733 dias, a autora viu parcialmente condicionada a sua autonomia na realização dos atos inerentes à sua atividade profissional;
e) A autora sofreu dor quantificável num grau 5, numa escala até 7 (quantum doloris);
f) A autora ficou definitivamente afetada na sua integridade física e psíquica, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo familiares e sociais, num grau 26, numa escala até 100;
g) A autora sofreu uma afetação da sua aparência (imagem estética) num grau 3, numa escala até 7;
h) A autora sofreu uma limitação permanente na sua atividade desportiva ou de lazer num grau 3, numa escala até 7;
i) A autora sofreu uma repercussão negativa permanente na sua atividade sexual num grau 3, numa escala até 7;
j) Terá de realizar esforços suplementares no desempenho da sua atividade profissional habitual;
k) A consolidação médico-legal das lesões sofridas pela autora ocorreu em 28 de
fevereiro de 2018 (ponto 3.2.1.10 dos factos provados).
Após o sinistro, e em consequência deste ou dos tratamentos das lesões dele decorrentes, a autora:
a) em 20 de agosto de 2015, foi admitida no serviço de urgência do Hospital ...;
b) à entrada no Hospital ..., apresentava:
i) fratura das vértebras D11 e D12 (em coluna escoliótica);
ii) fratura do 9.º ao 12.º arcos costais direitos;
iii) traumatismo renal grau V à esquerda com avulsão pedicular e hematoma perirenal;
iv) laceração pancreática;
v) fístula na porção terminal do corpo do pâncreas;
vi) derrame pleural bilateral;
vii) pneumotórax diminuto esquerdo;
viii) ferimento complexo da região mentoniana;
ix) esfacelo do lábio inferior;
x) queixas álgicas dirigidas à transição dorsolombar da coluna e ao nível da articulação metacarpofalângica do 1.º dedo da mão esquerda;
c) no Hospital ...:
i) efetuou laparotomia exploradora com colocação de dreno pancreático;
ii) nefrectomia esquerda (remoção do rim);
iii) efetuou cirurgia ortopédica (colocação de parafusos pediculares);
iv) efetuou correção do esfacelo mentoniano;
v) foi-lhe colocada prótese para drenagem (fístula do pâncreas);
vi) a cirurgia com os âmbitos referidos demandou a intervenção das especialidades de Urologia, Cirurgia Geral, Ortopedia e Cirurgia Plástica (…).
vii) necessitou de antibioterapia devido a infeção;
d) entre 21 de agosto de 2015 a 30 de agosto de 2015, esteve internada na Unidade Polivalente de Cuidados Intermédios da Urgência do Hospital ... e, posteriormente, no Serviço de Cirurgia Geral do mesmo hospital;
e) em 15 de setembro de 2015, teve alta do Hospital ..., mantendo dreno abdominal, prescrição de antibiótico e de paracetamol;
f) em 21 de setembro de 2015, compareceu no serviço de urgência do Hospital ..., com dores, sendo aqui ministrados analgésicos, fixado o dreno e mudado o penso de ferida cirúrgica;
g) em 29 de setembro de 2015, compareceu a consulta na Unidade de Saúde Familiar, sendo-lhe emitidos, nesta e em consultas subsequentes, certificados de incapacidade temporária pelo menos até 26 de fevereiro de 2016;
h) em 1 de novembro de 2015, compareceu no serviço de urgência do Hospital ... com dor abdominal, com irradiação lombar à direita, apresentando leucocitose e coleção líquida pancreática, sendo internada no serviço de Cirurgia Geral;
i) durante o novo internamento, realizou tratamento com antibiótico e foi efetuada drenagem da coleção líquida;
j) em 11 de novembro de 2015, teve alta hospitalar;
k) Em 28 de junho de 2016, compareceu no serviço de Gastrenterologia do Hospital ... para remoção de prótese migrada no duodeno;
l) em 12 de janeiro de 2018, efetuou remoção de cicatriz quelóide no flanco esquerdo no Hospital ...;
m) designadamente em 18 de outubro de 2015, 20 de outubro de 2015, 20 de novembro de 2015, 10 de dezembro de 2015, 18 de dezembro de 2015, 23 de dezembro de 2015, 21 de janeiro de 2016, 17 de fevereiro de 2016, 28 de março de 2016, 13 de abril de 2016, 7 de junho de 2016, 08 de 07 de 2016, 26 de 9 de 2016, 15 de janeiro de 2018, 29 de janeiro de 2018, 28 de fevereiro de 2018, 26 de março de 2018, 30 de outubro de 2018, 11 de março de 2019 e 21 de novembro de 2019, compareceu a consultas de Cirurgia Plástica, Cirurgia Geral, Ortopedia, Urologia, Psiquiatria, Fisiatria e/ou Traumatologia;
n) efetuou não menos de 20 exames complementares de diagnóstico, designadamente, ecografia, raio-X e tomografia axial computorizada.
o) apresenta permanentemente:
i) cicatriz linear do tipo cirúrgico, ligeiramente hipocrómica, com 4,5 cms., curvilínea de concavidade inferior, localizada na região mentoniana predominantemente
central e à direita, visível a 3 metros;
ii) cicatriz do tipo cirúrgico, linear, dorsolombar, hipocrómica, na linha média, medindo 22 cms.;
iii) contratura dolorosa dorsal e lombar paravertebral, mais acentuada na região dorsal, provocando alguma dificuldade nos movimentos deste segmento, nomeadamente nas rotações;
iv) cicatriz linear cirúrgica xifopúbica da linha média do abdómen com sensivelmente 23,5 cms., hipocrómica, visível a 3 metros, contornando o umbigo pelo lado esquerdo;
v) cicatriz na fossa ilíaca esquerda com 5,5 cms. por 1,5 cm, vertical, avermelhada e ligeiramente irregular, visível a 3 metros;
p) sente:
i) dor dorsolombar, agravando com as posições e esforços;
ii) dor ligeira à pressão no segmento periumbilical da cicatriz da linha média do abdómem;
iii) desconforto na palpação dos quadrantes abdominais esquerdos (ponto 3.2.1.11 dos factos provados).
A autora nasceu em .../.../1989 (ponto 3.2.1.14 dos factos provados).
Antes do acidente, a autora era uma jovem saudável com gosto pela vida, gostando de se divertir e conviver com amigos, ir à praia, dançar, correr e andar de bicicleta (ponto 3.2.1.15 dos factos provados).
A autora por força da sequela referida na subalínea i) da alínea p) do ponto 11 – factos provados – [subalínea i) da alínea p) do ponto 3.2.1.11 dos factos provados] não consegue estar longos períodos de pé ou sentada, trabalhar ao computador, dançar, engomar roupa, aspirar a casa, correr ou andar de bicicleta (ponto 3.2.1.16 dos factos provados).
Após o acidente, e em resultado do mesmo, a autora inibe-se de expor o seu corpo em atividades de lazer, como praticar desporto, dançar ou ir à praia, e de se descontrair e divertir com os amigos (ponto 3.2.1.17 dos factos provados).
Devido ao acidente dos autos, a autora deixou de usar roupa mais curta e biquíni,
deixando de ir frequentemente à praia (ponto 3.2.1.18 dos factos provados).
Devido ao acidente dos autos, a autora considera-se fisicamente fragilizada, pelo que tem medo de frequentar locais movimentados, temendo cair ou ser derrubada (ponto 3.2.1.19 dos factos provados).
Por causa do sinistro, dos tratamentos a que foi sujeita e das sequelas físicas por aquele provocadas, a autora:
a) sente profunda tristeza e angústia, tendo sentido medo de morrer;
b) sente-se inferiorizada, destroçada, desfigurada, envergonhada, incapacitada e constrangida;
c) sente-se deprimida, isolando-se muito, não lhe apetecendo sair de casa, chora com assiduidade, sofre de insónias e tem muito receio em andar de automóvel;
d) deve manter acompanhamento clínico por Psiquiatria, Ortopedia e Nefrologia, para reavaliação periódica das sequelas e da necessidade de eventuais tratamentos (ponto 3.2.1.20 dos factos provados).
Tendo em conta toda a factualidade que se acaba de rememorar e ainda as situações com alguma similitude objeto dos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de fevereiro de 2022, proferido no processo nº 12213/15.6T8LSB.L1.S1[33] e de 10 de fevereiro de 2022, no processo nº 2133/16.2T8CTB.C1.S1[34], ambos acessíveis no site da DGSI e que patenteiam casos que têm uma gravidade globalmente superior no que respeita ao quantum doloris e ao dano estético, não obstante a atribuição de uma pontuação de afetação da integridade físico-psíquica mais baixa do que a que foi atribuída à recorrida nestes autos; tendo ainda em conta que se é certo que o caso destes autos tem maior gravidade em termos de consequências permanentes, já que, além do mais, envolveu a perda de um órgão, como é um rim, esta afetação foi já ponderada e relevada em termos de dano biológico, afigura-se-nos mais adequada e equitativa a fixação da compensação por danos não patrimoniais no montante de cinquenta e cinco mil euros.
Pelo exposto, procede parcialmente esta questão recursória.
Em conclusão, a apelação procede parcialmente no que respeita ao dano patrimonial de despesas futuras decorrentes da assistência por terceira pessoa, que se fixou no montante de quarenta e um mil euros e quanto à compensação por danos não patrimoniais que se reduz para a quantia de cinquenta e cinco mil euros, mantendo-se no mais intocada a sentença recorrida.
As custas do recurso e da ação são da responsabilidade das partes na exata proporção do decaimento (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), mas sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia a recorrida.
5. Dispositivo
Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar parcialmente procedente por provado o recurso de apelação interposto por C..., S.A. e, em consequência, reduz-se o montante arbitrado a título de despesas futuras decorrentes da assistência por terceira pessoa, para o montante de quarenta e um mil euros, indo, em consequência, a C..., S.A. condenada a pagar a AA a quantia global de € 145.827,64 (cento e quarenta e cinco mil oitocentos e vinte e sete euros e sessenta e quatro cents), a título de danos patrimoniais e nos termos anteriormente discriminados e igualmente se reduz a compensação por danos não patrimoniais para a quantia de cinquenta e cinco mil euros, indo em consequência, a C..., S.A. condenada a pagar a AA a quantia de € 55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros), a título de compensação por danos não patrimoniais, mantendo-se, no mais, intocada a sentença recorrida.
Custas da ação e do recurso a cargo de autora e ré na exata proporção de decaimento, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso e sem prejuízo do apoio judiciário de que goza a autora.
***
O presente acórdão compõe-se de quarenta e nove páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.

Porto, 27 de março de 2023
Carlos Gil
Mendes Coelho
Joaquim Moura
_______________
[1] Sendo € 2.000,00 a título das despesas com ajuda de terceira pessoa no período compreendido entre 15 de setembro de 2015 e 15 de março de 2016 que ainda não foram reembolsados pela ré, tendo sido apenas reembolsados € 1.000,00, € 60.000,00 a título de despesas com a ajuda de terceira pessoa no futuro, € 3.308,00 a título de lucros cessantes não cobertos pela Segurança Social, € 75.000,00 a título de danos não patrimoniais e € 145.000,00 a título de perda da capacidade de ganho futuro.
[2] Notificada às partes mediante expediente eletrónico elaborado em 07 de setembro de 2022.
[3] O teor desta subalínea é o seguinte: “Após o sinistro, e em consequência deste ou dos tratamentos das lesões dele decorrentes, a autora sente dor dorsolombar, agravando com as posições e esforços.”
[4] Este valor final, produto de arredondamento por excesso de 25,679 pontos é produto dos seguintes coeficientes parcelares atribuídos: Nb0903, de acordo com avaliação por psiquiatria forense, 4 pontos; Md0902, considerando a presença de material de fixação ortopédica, queixas dolorosas locais e irradiação lombar, 8 pontos; Ua0101, perda renal unilateral, 15 pontos; Pa01101, cicatrização anómala na face com alterações sensitivas, 1 ponto.
[5] Sublinhe-se que embora relativamente à alínea d) do ponto 20 dos factos provados a recorrente assente a sua pretensão de reapreciação exclusivamente no Relatório Pericial de 27 de outubro de 2021, o Senhor Perito autor deste relatório prestou esclarecimentos sobre esta matéria, os quais contudo não têm suficiente percetibilidade para permitir uma valoração segura do alcance dos esclarecimentos prestados.
[6] A cicatriz em causa é a da região mentoniana da face da autora.
[7] Este ponto de facto não pode ser tomado na sua literalidade na medida em que, como é do conhecimento comum, a autora não precisará de auxílio de terceira pessoa para se manter longos períodos de pé ou sentada, trabalhar ao computador, dançar, correr ou andar de bicicleta, mas apenas para engomar roupa e aspirar a casa, ou seja, para a auxiliar nas denominadas lides domésticas.
[8] E com claro predomínio de lesados jovens ou de pessoas em idade ativa.
[9] Referimo-nos ao acórdão de 05 de maio de 2016, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro João Bernardo, no processo nº 2242/09.4TBBCL.G2.S1, acessível no site da DGSI.
[10] Isso mesmo sucede nas pequenas incapacidades permanentes parciais laborais resultantes de acidente de trabalho, sem que tal contenda com a atribuição de pensão por acidente de trabalho e com a manutenção do salário até então auferido.
[11] Neste sentido vejam-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, acessíveis na base de dados da DGSI: de 19 de maio de 2009, proferido no processo nº 298/06.0TBSJM.S1; de 19 de dezembro de 2015, proferido no processo nº 99/12.7TCGMR.G1.S1.
[12] Deve no entanto reconhecer-se que é muito difícil a valoração da intensidade da atividade laboral e nem todos os setores profissionais permitem uma avaliação fiável em termos de produtividade, ao menos em prazos pouco dilatados.
[13] Esse propósito é inequívoco no penúltimo parágrafo do preâmbulo da Portaria nº 377/2008, no qual se escreveu: “Por último, importa frisar que o objectivo da portaria não é a fixação definitiva de valores indemnizatórios mas, nos termos do nº 3 do artigo 39.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, o estabelecimento de um conjunto de regras e princípios que permita agilizar a apresentação de propostas razoáveis, possibilitando ainda que a autoridade de supervisão possa avaliar, com grande objectividade, a razoabilidade das propostas apresentadas.
[14] Neste sentido, vejam-se; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04 de junho de 2015, proferido no processo nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de abril de 2022, proferido no processo nº 96/18.9T8PVZ.P1.S1, ambos acessíveis no site da DGSI.
[15] O nível de rendimentos na vida ativa e consequentes descontos para a Segurança Social ou a Caixa Nacional de Aposentações reflete-se no montante da pensão de reforma, pelo que o termo da vida ativa não envolve qualquer igualdade de rendimentos entre todos os que nos mais diversos setores deixaram a vida ativa.
[16] A nosso ver, a forma mais correta de reduzir a álea envolvida nestas operações seria a de impor a fixação da indemnização sob forma de renda mensal, em vez de apenas permitir, como hoje sucede, esta modalidade de reparação do dano, fazendo-a depender da vontade do credor (artigo 567º do Código Civil). Na verdade, o lesado tanto pode viver muito menos como muito mais do que a esperança média de vida, pode ser vítima de outros factos danosos e, em sentido inverso, pode beneficiar de novos meios de tratamento que alterem a sua situação clínica e a sua incapacidade.
[17] Uma operação matemática expedita para encontrar um valor nestes casos consiste no apuramento da perda de rendimento ficcionada correspondente ao número de anos tidos em conta. No caso dos autos, anualmente, a lesada teria uma perda anual ficcionada de € 3.409,6608 (€ 936,72 – salário auferido na data da consolidação das lesões – x 14 meses= € 13.114,08; € 13.114,08 x 0,26 = € 3.409,66), correspondendo a tal valor, no período de cinquenta e quatro anos, coincidente com o termo da esperança de vida para as mulheres (83 anos) o capital de € 184.121,6822 (€ 3.409,6608 x 54 anos = € 184.121,6822). Este valor é bruto e não entra em consideração com a natureza frutífera do capital. Importa sublinhar que estes valores foram obtidos tendo em conta o rendimento líquido da lesada (veja-se o ponto 3.2.1.28 dos factos provados).
[18] Neste sentido veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de janeiro de 2023, proferido no processo nº 5986/18.6T8LRS.L1.S1, acessível no site da DGSI.
[19] Neste sentido se orientam o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de março de 2012, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Sérgio Poças, no processo nº 184/04.9TBARC.P2.S1, relativamente a uma hipótese qualificada como de dano biológico e o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21 de março de 2012, relatado pelo Sr. Juiz Desembargador Jorge Leal, no processo nº 4129/06.3TBSXL.L2-2, ambos acessíveis no site da DGSI.
[20] Aplicando as tabelas financeiras da autoria de Manuel Ferreira de Sá Ribeiro, editadas pela Universidade Católica Portuguesa, Lisboa 1981, a uma taxa de 2 % (ver página 22, terceira coluna a contar da direita), para um período temporal de 50 anos (pois é este o limite temporal máximo previsto nestas tabelas), tem-se um coeficiente de 31,42361 que multiplicado pela perda anual de € 3.409,6608, totaliza € 107.143,85121. Este valor, se estivesse em causa uma perda efetiva de rendimentos deveria ser tomado como patamar inferior da indemnização a arbitrar porque pondera já a disponibilidade imediata do capital. Além disso, como se pondera no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de abril de 2018, proferido no processo nº 196/11.6TCGMR.G2.S1 e acessível no site da DGSI, mesmo que assim não fora, na atual conjuntura de fracos rendimentos dos capitais em aplicações seguras deve até admitir-se não se justificar qualquer redução.
[21] Informa o Sr. Juiz Conselheiro Nuno Cameira que a citação é extraída do acórdão de 22 de março de 2007 de que foi relator, proferido na Revista nº 499/07, decisão a que não conseguimos aceder por via eletrónica.
[22] No momento presente, sobre esta problemática, importa ter presente a advertência contida no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de abril de 2018, proferido no processo nº 196/11.6TCGMR.G2.S1 e acessível no site da DGSI. Na atualidade, à baixa rentabilidade do capital em aplicações conservadoras associa-se uma elevada inflação e um contexto de guerra na Europa como não se vivia desde a segunda guerra mundial, já que a guerra nos balcãs teve um impacto mais limitado do que está a ter a guerra na Ucrânia.
[23] A esperança de vida para as mulheres, fazendo fé nos dados constantes da Pordata, em 2015, situava-se nos oitenta e três anos.
[24] Considerando os rendimentos líquidos, como nos parece correto, pelas razões expostas no acórdão proferido no processo nº 17/11.0TVPRT.P1, em 15 de setembro de 2014, por nós relatado e no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Setembro de 2019, proferido no processo nº 2706/17.6T8BRG.G1.S1, ambos acessíveis no site da DGSI.
[25] Referimo-nos à indemnização pelo dano futuro de assistência por terceira pessoa na execução de lides domésticas.
[26] Relevam-se para o efeito os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, todos acessíveis na base de dados da DGSI: de 10 de dezembro de 2019, proferido no processo nº 32/14.1TBMTR.G1.S1 (lesada de 21 anos, afetação permanente da integridade físico-psíquica de dezanove pontos, compatível com o exercício da profissão habitual mas a exigir esforços suplementares, com um rendimento mensal de € 900,00, sendo arbitrada indemnização do dano biológico no montante de € 90.0000,00, na vertente patrimonial); de 24 de fevereiro de 2022, proferido no processo nº 1082/19.7T8SNT.L1.S1 (lesado de trinta e quatro anos, afetação permanente da integridade físico-psíquica de nove pontos, compatível com o exercício da profissão habitual mas a exigir esforços suplementares, com um rendimento anual de € 7.798,00, tendo sido arbitrada a indemnização, a título de dano biológico, no montante de € 50.000,00), de 21 de abril de 2022, proferido no processo nº 96/18.9T8PVZ.P1.S1 (lesada de cinquenta e um anos, afetação permanente da integridade físico-psíquica de três pontos, compatível com o exercício da profissão habitual mas a exigir esforços suplementares, com um rendimento anual de € 22.000,00, tendo sido arbitrada a indemnização, a título de dano biológico, no montante de € 22.000,00).
[27] Neste caso, afigura-se correta a consideração, sem mais, deste lapso temporal já que é da experiência comum a progressiva perda de autonomia em idades mais avançadas com incapacidade de realização de certas tarefas domésticas e o ingresso em lares ou estruturas similares.
[28] In Das Obrigações em Geral, Vol I, 6ª edição, Almedina 1989, página 576.
[29] A Lei nº 8/2017, de 03 de março, alterou o Código Civil e de acordo com o disposto no artigo 201º-B deste diploma legal, os animais são seres vivos dotados de sensibilidade e objeto de proteção jurídica em virtude da sua natureza.
[30] A propósito do estatuto jurídico dos animais, numa concepção atualizada, veja-se, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Portuguesa 2014, páginas 454 a 456, anotação 5 ao artigo 202º do Código Civil.
[31] Escreve o Professor Antunes Varela, no mesmo local: “Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.”
[32] Veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de janeiro de 2023, proferido no processo nº 3437/21.8T8PNF.P1.S1, acessível no site da DGSI.
[33] Foi confirmada a atribuição de uma compensação de sessenta mil euros.
[34] Foi confirmada a atribuição de uma compensação de setenta mil euros.