Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
146/12.2TTMAI-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI PENHA
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
REGULAMENTAÇÃO COLECTIVA
Nº do Documento: RP20160418146/12.2TTMAI-A.P1
Data do Acordão: 04/18/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º239, FLS.54-57)
Área Temática: .
Sumário: O recurso de revisão visa corrigir decisão transitada em julgado em face de elementos não considerados anteriormente que alterariam o sentido da decisão, mediante causas taxativamente indicadas na lei, às quais se não subsume a hipótese de a decisão não ter atendido a um instrumento de regulamentação colectiva que o recorrente vem agora invocar ser-lhe aplicável.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 146/12.2TTMAI.P1-A
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

B…, residente na Rua …, nº …, ..º Andar, Maia, litigando com apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento de compensação de patrono, intentou o presente acção declarativa de condenação, emergente de contrato de trabalho, com processo comum, contra C… – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., com sede na Rua …, nº .., …, Porto, e D… – Serviços, Restauração, Catering & Hotelaria, Lda., com sede na …, Lisboa.
Em primeira instância, foi proferida sentença decidindo julga-se a presente acção procedente e, em consequência:
I. Declara-se o autor como contratado sem termo pela primeira ré “C… – Empresa de Trabalho Temporário, S.A.” desde o dia 06 de agosto de 2011.
II. Declara-se ilícito o despedimento do autor promovido pela primeira ré em 31 de agosto de 2011.
III. Condena-se a primeira ré a:
1. reintegrar o autor nos seus quadros, com antiguidade reportada à data da sua admissão;
2. a pagar ao autor as retribuições que este teria auferido desde 20 de janeiro de 2012, aqui se incluindo férias, subsídios de férias e de Natal, até ao trânsito em julgado da presente sentença, sem prejuízo da dedução a que se reporta a alínea c) do artigo 390º do Código do Trabalho de 2009, cuja liquidação se relega para subsequente incidente de liquidação, nos termos dos artigos 609º/2 e 358º/2 do Código de Processo Civil.
IV Absolve-se a ré “D… – Serviços, Restauração, Catering, Lda.” do pedido alternativo contra si formulado.
Inconformada veio a ré C… – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., interpor recurso de apelação, tendo o autor recorrido subordinadamente.
Foi proferido acórdão datado de 9-3-2015, no qual se decidiu, “acorda-se em julgar parcialmente procedente o recurso da ré C… – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., e improcedente o recurso subordinado do autor B…, e, em consequência:
Absolve-se a ré C… – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., dos pedidos contra ela formulados.
No mais, nomeadamente na parte em que se absolveu a ré D… – Serviços, Restauração, Catering & Hotelaria, Lda., confirma-se a sentença recorrida, ainda que com diferente fundamento.
Tal acórdão transitou em julgado.
A 21-6-2015, veio o autor interpor o presente recurso de revisão, concluindo:
1) O Venerando Tribunal da Relação do Porto louvou-se no entendimento de que o período experimental era de 90 dias, pois não teve em conta o disposto na cláusula 5ª do acordo de empresa outorgado entre a D… Serviços Restauração, Catering e Hotelaria, Lda. e a FESAHT – Federação dos Sindicatos da Agricultura, Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal;
2) O Tribunal da Relação do Porto fez assim uma incorrecta apreciação da legislação aplicável, com manifesto e muito gravoso prejuízo para o Recorrente que assim se viu completamente desprotegido nos seus direitos, com grave violação do princípio da justiça material;
3) Aliás, a mera apreciação e junção aos autos deste documento (acordo de empresa) é por si só bastante e suficiente para que seja modificada a decisão em sentido favorável ao Recorrente,
O que se clama nestes termos e nos melhores de Direito, devendo ser dado provimento ao Recurso no alcance propugnado, assim se fazendo JUSTIÇA.
O recorrente juntou documento do sindicato em causa, do qual consta que foi admitido como associado em 6-8-2011.
Admitido o recurso, foram notificadas as rés para responderem, tendo apenas a ré D… – Serviços, Restauração, Catering & Hotelaria, Lda., apresentado resposta, concluindo a final:
A. Não pode o Recorrente fundamentar o seu recurso, ao abrigo do artigo 696º, al, c) do CPC, no Acordo de Empresa em questão, uma vez que não está em causa um “documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever”.
B. A superveniência do documento só deve relevar para o efeito de interposição de recurso extraordinário de revisão quando o referido documento fosse, à data em que se desenrolou o processo, desconhecido da parte, sem que esse desconhecimento lhe pudesse ser imputado.
C. Uma vez que, quer a última versão consolidada do presente Acordo de Empresa, quer as restantes, encontram-se disponíveis no sítio na internet do Boletim do Trabalho e Emprego (“BTE”), através do link http://bte.gep.msess.gov.pt/pesquisa_avancada.php, e a última versão consolidada foi publicada no BTE nº 4, de 29/0112010 e que basta clicar na opção “pesquisa avançada” pelo nome do outorgante – a D…, ora Recorrida – para verificar a existência destes documentos, caberia ao Autor, na sua Resposta à Contestação, ter invocado que era sindicalizado, para afastar a o período experimental de noventa dias invocado pela Ré na sua Contestação.
D. Não o tendo feito atempadamente, não poderá agora largar mão de um recurso extraordinário de revisão para o fazer, pelo que deve o presente recurso ser rejeitado, por legalmente inadmissível.
E. Ainda que assim não se entenda, sempre se dirá que a FESAHT, outorgante do Acordo de Empresa que o Recorrente vem agora invocar, actua em representação dos trabalhadores da D… que se encontram inscritos num dos Sindicatos participantes – cfr, artigos 2º, nº 3, al. c) e 496º do CT – e o Acordo de Empresa pela mesma outorgado só se aplica aos trabalhadores filiados num dos sindicatos que constituem a FESAHT, ou que tenham optado pela sua aplicação ao abrigo do artigo 497º do CT.
F. O Recorrente não invoca expressamente, em momento algum, ser sindicalizado à data dos factos relevantes para a presente acção e também não invoca ter optado pela aplicação do Acordo de Empresa ao abrigo do artigo 497º do CT, motivo pelo qual não logrou fundamentar a aplicação do Acordo de Empresa ao caso em apreço.
G. Perante os elementos assentes nos autos, a Recorrida tem fundadas dúvidas quanto à autenticidade do documento junto aos autos pelo Recorrente e intitulado “Ficha de Inscrição” e quanto à natureza de associado do referido sindicado por parte do Recorrente.
H. O documento em causa não é um meio idóneo para provar a filiação do Recorrente no referido Sindicato à data dos factos relevantes para a presente acção, ou seja, entre 06 de Agosto de 2011 e 04 de Novembro de 2011, por ausência de data concreta, por discrepância dos dados referentes ao e-mail e Nm do Recorrente, por indicação da ora Recorrida como Empregadora, e por não ter o Recorrente recorrido aos serviços de apoio judiciário do Sindicato.
I. Ainda que se entenda que os argumentos já expendidos não são suficientes para a rejeição do presente recurso, no que não se concede mas se avança por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que, em tal caso, e por uma questão de economia processual, deve o Sindicato ser notificado para informar os autos da data exacta de entrega da Ficha de Inscrição pelo Recorrente e da formalização da sua filiação no Sindicato, bem como para juntar cópia dos recibos emitidos na sequência do pagamento das quotas do sindicato nos anos de 2011 e 2012, com indicação dos meses a que respeitam, nos termos e para os efeitos do artigo 432º do CPC.
J. Mais deve o Recorrente juntar aos autos extractos bancários da conta identificada na ficha de inscrição junta aos autos, comprovando o desconto, através de débito directo em conta, do valor das quotas devidas mensalmente ao sindicato, relativamente aos meses de Agosto a Outubro de 2011, nos termos e para os efeitos do artigo 429º do CPC.
Importa considerar os factos supra referidos.
Relativamente à admissibilidade do recurso:
Nos termos do disposto no art. 696º do CPC, a decisão transitada em julgado só pode ser objeto de revisão quando:
a) Outra sentença transitada em julgado tenha dado como provado que a decisão resulta de crime praticado pelo juiz no exercício das suas funções;
b) Se verifique a falsidade de documento ou ato judicial, de depoimento ou das declarações de peritos ou árbitros, que possam, em qualquer dos casos, ter determinado a de- cisão a rever, não tendo a matéria sido objeto de discussão no processo em que foi proferida;
c) Se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida;
d) Se verifique nulidade ou anulabilidade de confissão, desistência ou transação em que a decisão se fundou;
e) Tendo corrido a ação e a execução à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, se mostre que faltou a citação ou que é nula a citação feita;
f) Seja inconciliável com decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português;
g) O litígio assente sobre ato simulado das partes e o tribunal não tenha feito uso do poder que lhe confere o artigo 612.o, por se não ter apercebido da fraude.
O recurso extraordinário de revisão é um expediente processual que faculta a quem tenha ficado vencido num processo anteriormente terminado, a sua reabertura, mediante a invocação de certas causas taxativamente indicadas na lei.[1]
Ou seja, este recurso tem natureza excepcional, ditada pelos princípios da segurança jurídica, da lealdade processual e do caso julgado, não se tratando de um sucedâneo das instâncias de recurso ordinário.[2] Daí que, no recurso extraordinário de revisão, sejam taxativas as causas da revisão elencadas no art. 696º do CPC. É um recurso que se delimita exclusivamente pelos fundamentos.[3]
O recorrente vem invocar a aplicação da al. c) do art. 696º do CPC para fundamentar a sua pretensão.
Prescreve tal dispositivo que será admissível a revisão, quando se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida. O documento tem de fazer prova de um facto inconciliável com a decisão a rever. Uma sentença judicial não é documento para o efeito desta alínea.[4]
Conforme salienta a recorrida D…, não se trata aqui de um documento novo mas de uma norma convencional que não terá sido considerada na decisão revidenda, a qual poderia e deveria ser conhecida, quer pelo Tribunal, quer pelo autor, caso se entendesse que a decisão do litígio sub judice à mesma se encontrava submetida.
Assim, a considerar-se que a relação laboral em causa se encontrava submetida à Convenção Colectiva de Trabalho agora invocada pelo recorrente, o erro de julgamento de que eventualmente padecesse a decisão revidenda resultaria, apenas, da não consideração das normas constantes daquele instrumento de regulamentação colectiva, circunstância que não se subsume a qualquer das causas que o art. 696º do CPC taxativamente elenca como fundamento do recurso de revisão.
Sendo assim, teria o autor que fazer uso do mecanismo de reforma do acórdão, nos termos do art. 616º, nº 2, al. a), do CPC, e não do presente recurso de revisão.
Sucede, porém, que o autor deixou passar o trânsito da decisão, pelo que não se pode agora reformar o acórdão.
Mas também não é admissível a revisão, conforme supra se referiu.
Quanto ao mérito da questão:
De todo o modo, sempre a revisão teria que improceder.
Nos termos da cláusula 5ª, nº 3, al. a), do AE celebrado entre a D… e a FESAHT,[5] o período de experiência é de 60 dias para a generalidade dos trabalhadores.
Porém, conforme se referiu na decisão em causa, alegado pelo autor no art. 15º da petição inicial, o contrato de trabalho em causa teve o seu início em 6 de Agosto de 2011, tendo o autor sido “despedido” em 4 de Outubro de 2011.
Assim, ainda considerando o aludido prazo de 60 dias, terá o despedimento do autor ocorrido dentro do período experimental, pelo que mantém plena validade a decisão proferida nos autos.
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso.
Custas pelo autor, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.

Porto, 18-4-2016
Rui Penha
Maria José Costa Pinto
António José Ramos
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[1] Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Coimbra: Almedina, 2006, págs. 367-368.
[2] Armindo Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, 2ª edição, Lisboa: Lex, 1994, págs. 300-301.
[3] Armindo Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, 2ª edição, Lisboa: Lex, 1994, pág. 303, e José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, Código de Processo Civil Anotado, volume III, 2ª edição, Coimbra: Coimbra Editora, 2008, pág. 224.
[4] José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, Código de Processo Civil Anotado, volume III, 2ª edição, Coimbra: Coimbra Editora, 2008,pág. 226.
[5] Versão revista publicada no BTE nº 4, de 29-1-2010.