Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2172/04.6TBVFR.P1
Nº Convencional: JTRP00043067
Relator: VIEIRA E CUNHA
Descritores: SUBSTITUIÇÃO
TESTEMUNHA
ADIAMENTO
INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHA
DOENÇA
PRAZO
Nº do Documento: RP200910202172/04.6TBVFR.P1
Data do Acordão: 10/20/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO - LIVRO 327 - FLS 07.
Área Temática: .
Sumário: I - Já na doutrina dimanada do Código de Processo Civil de 1939, e nos termos do actual art° 629° nº3 al.b) C.P.Civ., se a doença impedisse a “inquirição imediata”, a parte tinha a faculdade de substituir a testemunha ou, em alternativa, de requerer o adiamento da sua inquirição.
II - Na actualidade, o elemento sistemático também aponta para tal solução, pois que o art° 512°-A nº 1 C.P.Civ., introduzido na Reforma de 95, veio conceder às partes uma mais ampla possibilidade de aditarem ou alterarem o respectivo rol de testemunhas.
III - O prazo do art° 512°-A conta-se da data da audiência aprazada para a audição da testemunha ou daqueloutra data para que a audição haja sido adiada.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acórdão do Tribunal da Relação do Porto

Os Factos
Recurso de agravo interposto na acção com processo comum e forma ordinária nº2172/04.6TBVFR, do .º Juízo Cível da Comarca de Stª Mª da Feira.
Autora – B………., Cª de Seguros, SA.
Ré – Brisa – Auto-Estradas de Portugal, S.A.
Interveniente Principal (pelo lado passivo) – Cª de Seguros C………., S.A.

Tendo sido designada como data de julgamento nos presentes autos o dia 6/11/2006, pelas 10 horas, veio a Autora requerer o que segue ao Tribunal, em 31/10/06:
“A testemunha D………. encontra-se acamada, vítima de doença prolongada, o que a Autora tomou agora conhecimento, por se encontrar a preparar o julgamento, nomeadamente no sentido de a fazer comparecer em Juízo.”
“Ora, atenta a proximidade do dia 6 de Novembro (data designada para a realização da audiência de julgamento), não é de todo possível o restabelecimento do Sr. D………. .”
“Deste modo, requer a substituição da testemunha em causa pelo Sr. E………., com domicílio profissional na ………., …., ….-… Vila Nova de Gaia, que a Autora se compromete a apresentar em Juízo.”
Sobre tal requerimento pronunciou-se o Mmº Juiz do processo, em 3/11/06, nos seguintes termos: “Fls. 248 – Defiro (artº 629º nº3 al.b) C.P.Civ.).”
Nessa mesma data foi o referido despacho notificado às Rés.
Decorrida já a primeira sessão do julgamento da causa, na qual a Ré Brisa invocou, ao menos implicitamente, a nulidade do acto praticado pelo Mmº Juiz “a quo” (prática de acto que a lei não admite – artº 201º nº1 1ª parte C.P.Civ.), e tendo a legalidade do despacho sido reafirmada, a mesma Ré Brisa veio agora interpor recurso, por agravo, do citado despacho judicial.

Conclusão do Recurso de Agravo:
A douta decisão agravada aplicou erradamente o disposto no artº 629º nº3 C.P.Civ., porque sendo o motivo da não comparência a doença, e não tendo sido alegado impedimento definitivo, não pode haver substituição.

Por contra-alegações, a Autora sustenta o bem fundado do despacho recorrido.

O Mmº Juiz “a quo” sustentou o despacho proferido.

Factos Apurados
Encontram-se provados os factos supra resumidamente descritos e relativos ao requerimento da Autora (respectivo teor), para além do demais teor da decisão judicial impugnada.

Fundamentos
A pretensão da Agravante aponta ao questionar da aplicação “in casu” do disposto no artº 629º nº3 C.P.Civ. e da mais genérica possibilidade de substituição de testemunha, no caso concreto.
Vejamos de seguida.

Pese embora o inconformismo da Recorrente, que se respeita, não tem ela razão no recurso formulado.
Não é o impedimento definitivo de depor, por motivo de doença, que constitui condição sine qua non da substituição da testemunha.
Assim se lê também, apertis verbis, no artº 629º nº3 al.b) C.P.Civ., citado no despacho recorrido: “Se a impossibilidade for meramente temporária ou a testemunha tiver mudado de residência depois de oferecida, bem como se não tiver sido notificada, devendo tê-lo sido, ou se deixar de comparecer por outro impedimento legítimo, a parte pode substituí-la ou requerer o adiamento da inquirição pelo prazo que se afigure indispensável, nunca excedente a 30 dias”.
Di-lo igualmente a doutrina – v.g., J. Alberto dos Reis, Anotado, IV/pg. 395: se a doença impede a “inquirição imediata”, a parte tem a faculdade de substituir a testemunha ou, em alternativa, de requerer o adiamento da sua inquirição.
No mesmo sentido, A. Varela, J. M. Bezerra e S. e Nora, Manual, 1ª ed., pg. 603, nota 1, acrescentando ainda que deve dar-se conhecimento à parte contrária, quer do requerimento, quer do deferimento da substituição (antes que a testemunha deponha), a fim de que a notificada possa usar das faculdades que o princípio da audiência contraditória visa conferir-lhe (artºs 631º nº1 e 517º), algo a que também, no caso concreto, foi dado cumprimento.
Isto se escreve sem prejuízo de pessoas impossibilitadas de comparecer por doença poderem ser efectivamente ouvidas pelo tribunal, nos termos dos artºs 627º e 557º C.P.Civ.
Tais normativos, porém, não são excludentes da possibilidade de substituição aludida.
Outra não poderia também ser a interpretação do preceito, pois que o artº 512º-A nº1 C.P.Civ., introduzido na Reforma de 95, veio conceder às partes uma ampla possibilidade de aditarem ou alterarem o respectivo rol de testemunhas, designadamente até 20 dias antes da audiência final.
É certo que o facto que, nos autos, dá origem à substituição da testemunha é ulterior à citada baliza temporal – mas é precisamente por via do espírito introduzido também agora pelo disposto no artº 512º-A, que se nos encontra vedada qualquer interpretação restritiva do preceito do artº 629º nº3 al.b) C.P.Civ., que não visse na norma a consagração de uma faculdade da parte, tal como já reconhecido no direito de pregresso.
Mas, a este respeito, note-se ainda que a Autora podia ter invocado, a seu favor, o disposto no artº 512º-A C.P.Civ., ainda que em fase ulterior do processo – é que, tendo a substituição sido requerida em 31/10, para uma audiência a realizar em 6/11, a verdade é que a audiência de julgamento veio a ter uma continuação, não apenas para ouvir a testemunha que substituiu a anteriormente arrolada, como também para ouvir uma testemunha comum a Autora e Rés, continuação essa que teve lugar em 12/1/2007.
Ora, a lei, no citado artº 512º-A, refere-se à “data em que se realize a audiência de julgamento”, o que pode ocorrer até ao encerramento da audiência, tanto mais que na sentença se haverá de ter em atenção a situação existente no momento do encerramento da discussão – consoante artºs 653º nº1 e 663º nº1 C.P.Civ.
Mutatis mutandis, veja-se o discorrido no Ac.R.P. 30/10/03 Col.IV/194 e doutrina aí citada.

Resumindo a fundamentação:
I – Já na doutrina dimanada do Código de Processo Civil de 1939, e nos termos do actual artº 629º nº3 al.b) C.P.Civ., se a doença impedisse a “inquirição imediata”, a parte tinha a faculdade de substituir a testemunha ou, em alternativa, de requerer o adiamento da sua inquirição.
II – Na actualidade, o elemento sistemático também aponta para tal solução, pois que o artº 512º-A nº1 C.P.Civ., introduzido na Reforma de 95, veio conceder às partes uma mais ampla possibilidade de aditarem ou alterarem o respectivo rol de testemunhas.
III – O prazo do artº 512º-A conta-se da data da audiência aprazada para a audição da testemunha ou daqueloutra data para que a audição haja sido adiada.

Com os poderes conferidos pelo disposto no artº 202º nº1 da Constituição da República Portuguesa, acorda-se neste Tribunal da Relação:
No não provimento do agravo, confirmar o despacho recorrido.
Custas pela Agravante.

Porto, 20/X/09
José Manuel Cabrita Vieira e Cunha
Maria da Graça Pereira Marques Mira
António Guerra Banha