Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0456404
Nº Convencional: JTRP00037860
Relator: SANTOS CARVALHO
Descritores: VENDA DE COISA DEFEITUOSA
RESPONSABILIDADE
INCÊNDIO
AUTOMÓVEL
Nº do Documento: RP200503070456404
Data do Acordão: 03/07/2005
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA.
Área Temática: .
Sumário: I- Quem prestou garantia de bom funcionamento de um veículo automóvel terá de substituí-lo se, durante o termo, este vier a incendiar-se quando estacionado.
II- Compete-lhe, no sentido de ficar isento, fazer prova de se não tratar de desconformidade com o contrato reportada à data da entrega da viatura, mesmo por factos anteriores à vigência do DL 67/2003.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Em Conferência, no Tribunal da Relação do Porto:

I- Introdução:

(a) O A. não se conformou com a absolvição do pedido: ser condenada a R. B............... a substituir o automóvel Saxo 1.5D, ..-..-OS, por outro de idêntica capacidade e características, porquanto, por avaria eléctrica, ocorrida no prazo de garantia, ficou destruído em incêndio decorrente.

(b) Da sentença recorrida:

(1)- ...quanto ao direito de substituição da coisa vendida basta o comprador fazer a prova do seu mau funcionamento no período de duração da garantia;
(2)- ... a demonstração do defeito padecido tem de ser feita pelo comprador [Art. 342/1 CC e, secundando o ponto de vista, ROMANO MARTINEZ (1994, 356/7) As Referências Bibliográficas são inseridas na última nota de rodapé do texto];.
(3)- ...mas poderia também ser convocado in casu o regime jurídico da responsabilidade objectiva do produtor [Vd. DL 383/89.06.11, transposição da Directiva 85/374/CEE, do Conselho, 89.07.25];
(4)- ...de que um dos pressupostos é a existência do defeito no produto, correndo também o onus probandi pelo lesado [Neste sentido, cit. Ac STJ, 96.03.05, CJ (1996), t I/ 119; Ac RC 01.03.06, CJ (2001) t II/16; Ac RP 01.03.06 (2001) T II/166; e JOÃO CALVÃO da SILVA (2001,187];
(5)- ... contudo, o A. não logrou demonstrar a existência de qualquer defeito no produto [Vd. art. 913/1 CC e art.s 3 a, 4/1 e 5/1, Lei 24/96,31.07; art. 4/1, DL 383/89,06.11: um produto é defeituoso quando não oferece a segurança com que legitimamente se pode contar, tendo em atenção todas as circunstâncias, designadamente a sua apresentação, a utilização que dele razoavelmente pode ser feita, e o momento da sua entrada em circulação] tal circunstância determina necessariamente a improcedência da acção [Cfr. Ac RC 97.04.08, CJ (1997), t II/38: tendo um automóvel, estacionado numa garagem ardido sem se fazer prova da causa do incêndio, improcede a acção de indemnização pelos danos sofridos].

II- Matéria Assente:

(1) Em 00.01.05, o Ape. adquiriu no Stand C..................., Lda, o veículo Citroen Saxo 1.5D, ..-..-OS, em estado de novo;
(2) O preço do referido veículo foi de Pte 3 093 000$00;
(3) Para pagamento o A. celebrou um contrato de financiamento para aquisição a crédito com Banque PSA Finance;
(4) Em 00.12.12, 23h00, o Ape. estacionou o veículo OS na via pública, junto à sua residência;
(5) Pelas 01.00h do dia seguinte, o veículo OS ardeu, tendo ficado apenas com a sua estrutura exterior, sem reparação possível, vendido depois para a sucata pelo preço de PT 40 000$00;
(6) Com o veículo arderam também todos os documentos do mesmo;
(7) Segundo os BBVV. Peso da Régua, a causa do sinistro foi desconhecida: quando chegaram ao local já estava o interior da viatura a arder com grandes labaredas, os vidros e as portas fechadas, sem vestígios de que alguém tivesse posto fogo no veículo, tudo indicando que se tratava de algum problema da própria viatura;
(8) Foi aberto inquérito criminal pelo fogo, mas arquivado;
(9) Em 00.12.15 o Ape. comunicou a Stand C..............., Lda, o que tinha acontecido com o veículo em causa, tendo o estabelecimento remetido o caso para o Concessionário B............ em ........., D.................. Lda, o qual por sua vez o aconselhou a expor a situação ao importador oficial da marca, a Apa.;
(10) O Delegado técnico da Ape. E......................., teve conhecimento do sinistro referido no dia 00.12.13: a direcção pós-venda da Apa. abriu um dossiê a ele respeitante no dia 00.12.18;
(11) Após variada correspondência trocada, e depois de uma vistoria ao veículo, o Ape. foi informado pela Apa. de não terem sido detectados quaisquer indícios de deficiência do automóvel que pudessem ter estado na origem do incidente.
(12) Na data da aquisição do veículo OS foi dada pela Apa., garantia de bom funcionamento pelo prazo de um ano após a compra;
(13) O Ape., desde que adquiriu o veículo OS sempre efectuou as revisões mecânicas aconselhadas pelo fabricante;
(14) E reclamou de avaria nos travões do automóvel junto do agente da Apa., tendo os serviços deste verificado a existência de uma fuga de óleo no sistema: procedeu à reparação da avaria, mediante a substituição de um tubo cortado na roda traseira esquerda;
(15) Entretanto, o leitor de CD montado na viatura do Ape. não era acessório de origem da marca B..........., nem foi adquirido ou montado pela Apa., ou por qualquer terceiro autorizado por esta;
(16) Todavia, o Ape. foi alertado pelo vendedor, no momento da compra do OS para a circunstância de dever utilizar unicamente acessórios e peças de origem ou devidamente homologadas pela B.............;
(17) Na viatura em causa, foi substituído o auto rádio de origem por um auto rádio da marca Sony;
(18) A substituição referida aqui foi realizada na via pública;
(19) E a Apa. só tomou conhecimento destas duas circunstâncias no decurso da audiência de julgamento.

III- Cls/Alegações:

(a) Conforme resulta da matéria de facto dada como provada o Ape. adquiriu o veículo automóvel em questão em 00.01.05, no estado de novo e com garantia de bom funcionamento pelo prazo de um ano.
(b) Ora, no decurso da audiência ficou provado que esse veículo comprado pelo Ape. revelou circunstâncias de mau funcionamento;
(c) Contudo, no caso em apreço, o tribunal recorrido entendeu que se aplicava o regime do art. 913 CC.
(d) Neste sentido justamente, entende o recorrente que segundo o art. 921/1 CC [Art. 921/1 CC: se o vendedor estiver obrigado por convenção das partes ou por força dos usos, a garantir o bom funcionamento da coisa vendida, cabe-lhe repará-la ou substitui-la quando a substituição for necessária e a coisa tiver natureza fungível, independentemente de culpa sua ou de erro do comprador], havendo garantia, ao comprador apenas compete provar o mau funcionamento da coisa;
(e) Assim, de acordo com o escopo da garantia de bom funcionamento o Ape. não tinha necessidade de alegar e provar a causa especifica desse mau funcionamento e a sua existência à data de entrega;
(f) Portanto, a decisão recorrida deveria ter concluído pela verificação dos pressupostos de que dependem os direitos do comprador da coisa defeituosa: este direito de reparação e de substituição por parte do Ape. existe independentemente da culpa do vendedor;
(g) A decisão recorrida está, pois, em contradição com o direito à qualidade dos bens ou serviços enumerados no art. 3, Lei 24/96 (Lei de Defesa do Consumidor), para além de ter mal aplicado os art. 913 e 921 CC e 4. da referida Lei: deve ser revogada e substituída por outra em que Automóveis B............... seja condenado segundo o pedido.

IV- Contra-alegações: não houve.

V- Recurso, julgado nos termos do art. 705:

(1) Pretende o recorrente que seja tida como avaria aquilo que parece ser à primeira vista em boa verdade o resultado de uma avaria suposta, i.é, o raciocínio fundador do recurso, no limite, será este: se o automóvel ardeu, foi por avaria necessária; logo, provado foi o essencial para fazer desencadear o mecanismo da substituição automaticamente garantida.
(2) E no seu âmbito e alcance é de considerar válido este entendimento, até mesmo numa modalidade de certo modo unitária: o incêndio em si admitido como avaria que deve ser incluída no campo operativo do conceito legal, i.e., se um produto é defeituoso quando não oferece a segurança com que legitimamente se pode contar, tendo em atenção todas as circunstâncias, designadamente a sua apresentação, a utilização que dele razoavelmente pode ser feita, e o momento da sua entrada em circulação, com estas especificações e circunstâncias, sempre é naturalmente de esperar que os automóveis novos não ardam; logo, estamos perante um produto avariado.
(3) Por conseguinte, seria à R. que competia fazer a prova de não ter havido avaria, de o incêndio corresponder a acto humano ou caso fortuito: uma prova, porém, com este perfil verdadeiramente não foi produzida.
(4) Ora, segundo a directiva constitucional do art. 60/1 em que é atribuído aos consumidores um direito à qualidade dos bens consumidos, à protecção da segurança e à reparação de danos, parece-nos compatível com este especifico programa normativo fundamental o modo de ver acima proposto tanto pelo recorrente como na versão ainda mais expandida de (2).
(5) Essa mesma que acaba por poder ser coordenada com a norma da Lei 24/96, 31.06, a qual a propósito do direito à qualidade dos bens, aptos a satisfazer os fins a que se destinam e a produzir os efeitos que se lhes atribuem..., adequado[s] às legitimas expectativas do consumidor, estabelece ao fornecedor a obrigação legal de dar garantia por período nunca inferior a um ano [Art.4/1.2 Lei 24/96.31.06].
(6) Aliás, tal norma também radica na directiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 99.05.25, relativa a certos aspectos da venda de bens de consumo e das garantias a elas relativas onde, a propósito de qualquer bem móvel corpóreo apenas se diz presumirem-se conformes ao contrato acaso apresentem o desempenho habitual dos bens do mesmo tipo.
(7) Em suma, o critério legal da avaliação da qualidade do bem, a que o consumidor tem direito [Art.60/1 CRP; art.3 Lei] 24/96, 31.06, reside na aptidão deste para satisfazer os fins a que se destina e produzir os efeitos que se lhe atribuem; ora, o incêndio do automóvel, visto desta perspectiva negativa, delimita em si mesmo também uma avaria: não é efeito que se lhe atribua segundo o senso comum.
(8) Assim sendo, provada a avaria, desencadeia-se automaticamente a garantia, art. 921/1 CC, posto que a parte contrária não provou excepcionalidade: a circunstância da colocação e montagem extravagante do rádio japonês, não pode ser tida de relevo, neste sentido, visto que o automóvel não foi comercializado com um aparelho de origem, admitida portanto a compatibilidade, não obstante a conveniência comercial do extra. Enfim, mais uma vez segundo o senso comum, o desempenho esperável do automóvel inclui a incrustação de qualquer auto rádio, nestas circunstâncias: não há cesura que possa fazer distrair a legalidade [Legalidade, no sentido epistemológico geral] de um incidente causal.
(9) Tem pois razão o recorrente, pelo que a sentença de 1.ª instância vai revogada e substituída por este despacho, segundo o qual a R. passa a ser condenada no pedido de substituição do automóvel em causa.

VI- Reclamação da R., nos termos do art. 700/3 CPC:

(1) …
(2) …
(3) …
(4) … [As conclusões omitidas dizem respeito apenas à circunstância de ter ocorrido despacho singular, não pertinentes em face da automaticidade da Reclamação para a Conferência].
(5) O A. não logrou provar qualquer defeito da coisa vendida e que mereceu garantia de bom funcionamento por parte da R.;
(6) Antes pelo contrário, decorre do julgamento de 1ª instância que houve alterações na coisa vendida realizadas pelo A. de modo descuidado e não profissional, em zona de especial melindre como é o caso da rede eléctrica da viatura;
(7) E é jurisprudência unânime caber ao A. o ónus da prova do invocado defeito, na acção em que se pede ressarcimento com fundamento em compra e venda de coisa defeituosa [Citou Ac. RP, 00.11.16 (rel. Telles de Menezes), www.dgsi.pt, doc. JTRP 00030517; Ac. RP, 00.09.28 (rel. Leonel Serôdio), www.dgsi.pt, doc. JTRP 00029573; Ac. RP, 00.01.27 (rel. Moreira Alves), www.dgsi.pt, doc. JTRP 00029911];
(8) De qualquer modo, o pedido não pode proceder por manifesta caducidade do direito de acção, conforme foi alegado oportunamente pela recorrida[Da Contestação:
…………………..
1.-…a viatura… foi adquirida pelo A. em 00.01.05… que a recebeu de imediato…;
2.-…
3.-…o sinistro em causa… ocorreu em 00.12.13;
4.- O A. apresentou uma reclamação junto da R. através de carta… recebida a 01.01.26;
5.- …a acção judicial deu entrada na Secretaria após 01.09.17;
6.- A R. foi citada em 01.09.19;
.....................
10. …a denúncia do defeito deveria ter sido realizada até 30 dias depois do conhecimento e dentro dos… 12 meses após a entrega da coisa…, devendo a acção ser apresentada no prazo de… 6 meses;
11. É manifesto que os referidos prazos de garantia e de caducidade do direito de acção estão ultrapassados…;
.....................
13. [Por outro lado,] a acção cujo pedido seja o pagamento de uma indemnização [com base na garantia] encontra-se incluída na previsão [dos arts. 917 e 921 CC];
14. …aplica-se o prazo de 6 meses previstos para a acção de anulação de compra e venda de coisa defeituosa, Ac. STJ, 94.01.12 (rel.Cons. Pais de Sousa), CJ/STJ, 1994-I-34 e Ac. STJ, 84.01.19, BMJ 333/433.
15. Neste sentido também Romano Martinez (1994, 412);
…………...
18. …também está caduco o prazo de garantia de 1 ano do art. 4 da Lei 24/96, 31.07 (LDC);
19. Por estas razões, invoca aqui a R., Automóveis B........, SA, as excepções peremptórias de caducidade do direito à garantia do bom funcionamento da coisa e à presente acção: deverá ser absolvida do pedido];
(9) Foi feita uma interpretação e aplicação ilegal, infringidos… os arts. 342, 917 e 921 CC;
(10) Deve ser proferido acórdão que mantenha a decisão de 1ª instância.

VII - Resposta:

(1) Nos termos do art. 921 CC, incumbe ao comprador da coisa defeituosa o ónus alegar e provar o mau funcionamento dela, no período da duração da garantia;
(2) E a grande questão que se pretendia ver esclarecida através deste recurso era a de saber se o incêndio, alegado e provado pelo A., constitui ou não densidade do conceito: resumia-se a saber se um veículo que incendeia funciona ou não funciona;
(3) Na verdade, aquela garantia é algo mais do que os direitos conferidos ao comprador pelo art. 913 CC [Vd. Ac. RP, 04.02.19 (rel. Fernando Simões), www.dgsi.pt, doc. JTRP 00036732: a garantia de bom funcionamento tem o significado e os efeitos de uma obrigação de resultado, na medida em que, durante a sua vigência, o vendedor assegura o regular funcionamento da coisa vendida; por isso, dessa garantia resulta uma presunção ilidível de que o vício ou defeito, que a coisa venha a revelar após a entrega, já existia nessa data, circunstância que tem importantes reflexos na questão do ónus da prova: para o exercício dos direitos cobertos pela garantia, o comprador apenas terá de alegar e provar o mau funcionamento da coisa, durante o prazo de garantia, sem necessidade de alegar e provar a específica causa do mau funcionamento e a sua existência à data da entrega; e ao vendedor, para se ilibar da responsabilidade, incumbirá alegar e provar que a causa do mau funcionamento é posterior à entrega, imputável ao comprador, a terceiro ou devida a caso fortuito; aquela garantia é algo mais do que os direitos conferidos ao comprador pelo art. 913 CC.]: ao comprador basta fazer a prova do mau funcionamento da coisa no período de duração da garantia, sem necessidade de identificar ou individualizar a causa concreta impeditiva do resultado prometido [Vd. CALVÃO DA SILVA (2001, 64): o vendedor assegura por certo período…; este facto, o facto de o vendedor assumir a garantia de um resultado, tem importância no domínio do ónus probandi: ao comprador basta fazer a prova do mau funcionamento da coisa no período de duração da garantia, sem necessidade de identificar ou individualizar a causa concreta impeditiva do resultado prometido….];
(4) Deste modo, estando provado que o veículo se incendiou, consequentemente está provada a avaria ou o mau funcionamento do mesmo, pressuposto mais do que suficiente para julgar procedente o pedido de substituição: não merece qualquer acolhimento a tese da recorrida.

VIII - Cumpre apreciar:

1. António Menezes Cordeiro (2002) filiou a autonomia normativa do direito do consumo no impulso renovador do direito civil que o ideal da Revolução Francesa trouxe na divisa Liberdade, Igualdade, Fraternidade: filiou-a nesta última palavra de ordem precisamente. Outros pontos de vista incluem os direitos dos consumidores no universo dos direitos humanos (Deutsch, 1995, 538 ss). E na verdade, a protecção jurídica dos consumidores é tema jus cultural recorrente [Vd. FERREIRA DE ALMEIDA (1982, 11 ss); id. (1985, 11 ss); CALVÃO DA SILVA (1990, 38 ss); PEGADO LIZ (1999, 63 ss)], o consumidor encarado sobretudo como parte mais fraca da relação contratual (Oliveira, 2002, 23 ss), criados, por isso, diversos instrumentos legais tendentes a conferir-lhe um campo amplo de protecção.

Na década de 70, e a partir daí persistentemente, a Comunidade Europeia tinha tomado já diversas medidas tendentes a uma política de protecção e informação dos consumidores: sucederam-se diversas directivas comunitárias de protecção mínima, tendentes a uniformizar as legislações dos Estados-membros [Vd. Resolução do Conselho de 14.04.1975, in JOCE, C 092, 25.04.1975); Resolução do Conselho de 19.05.1981, in JOCE C 133, 03.06.1981; Plano de Acção Trienal para a Política de Protecção dos Consumidores, publicado pela Comissão em 1990.
Vd.: http://europa.eu.int/scadplus/leg/pt/lvd/132000.html [legislação comunitária de protecção dos consumidores]]

No Direito português tem-se assistido entretanto a uma variação de normas legais tendentes a acautelar o direito dos consumidores: a Lei Constitucional, a Lei da Defesa do Consumidor[A Lei 24/96, de 31 de Julho (LDC) veio revogar a Lei 29/81, de 22 de Agosto, Lei-quadro de defesa do consumidor, que surgiu em cumprimento das exigências das normas constitucionais (vide art. 60 CRP); os arts.4 e 12 da LDC foram alterados pelo Decreto-Lei 67/2003, 08 de Abril. Nos arts.3 e seguintes da LDC são reconhecidos ao consumidor certos direitos: direito à qualidade dos bens e serviços, à protecção da saúde e da segurança física, à formação e à educação para o consumo, à informação para o consumo, à protecção dos interesses económicos, à prevenção e à reparação dos danos patrimoniais ou não patrimoniais, à protecção jurídica e a uma justiça acessível e pronta e à participação, por via representativa, na definição legal ou administrativa dos seus direitos e interesses] e diversa legislação avulsa [Arts. 52, 60, 81.h. e 99.e CRP; Lei 24/96, de 31.07 (que revogou a Lei 29/81, de 22.08), com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 67/2003, de 08 de Abril. DL 446/85, de 25.11, alterado pelos DL 220/95, de 31.08 e 249/99, de 7/7 (cláusulas contratuais gerais); DL 272/87, de 03.07, alterado pelo DL 243/95, de 13/09 (vendas ao domicílio e por correspondência); DL 383/89, de 06.11 (responsabilidade do produtor), alterado pelo DL 131/2001, de 24.04; DL 138/90, de 26.04, alterado pelo DL 162/99, de 13.05 (preços); DL 330/90, de 23.10, alterado pelo DL 275/98, de 09.09 (Código da Publicidade); DL 359/91, de 21.09 (crédito ao consumo); DL 311/95, de 20.11, alterado pelo DL 16/2000, de 29.02 (segurança geral dos produtos); Lei 83/95, de 31.08 (participação procedimental e acção popular); Lei 23/96, de 26.07 (serviços públicos essenciais); DL 230/96, de 29.11 (gratuitidade do fornecimento ao consumidor da facturação detalhada do serviço público de telefone); DL 209/97, de 13.08 (viagens, férias e circuitos organizados); Lei 6/99, de 27.01 (publicidade domiciliária, por telefone e por telecópia); DL 146/99, de 04.05 (sistema de registo voluntário de procedimentos de resolução extrajudicial de conflitos de consumo); DL 180/99, de 22.05 (direito real de habitação periódica); DL 195/99, de 08.06 (regime aplicável às cauções nos contratos de fornecimento de serviços públicos essenciais); DL 67/2003, 08 de Abril (certos aspectos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas)] marcam esta tendência, onde o emprego generalizado de contratos de adesão inscreve severos riscos para o consumidor. Riscos pressentidos e valorizados de há muito pela doutrina (Galvão Teles, 1965, 407/8).

Revisitaremos a bibliografia sobre a problemática da protecção dos consumidores em particular quanto à aquisição de um bem com defeito. A União Europeia, por exemplo, conta actualmente mais de 370 milhões de consumidores, e as principais dificuldades encontradas pelos consumidores europeus, tanto como a principal fonte de conflitos com os fornecedores estão relacionadas com a não conformidade dos bens com o contrato, circunstância assumida, p.ex. no Considerando (6) da Directiva 1999/44/CE, de 25.05: a mais importante incursão imperativa das instâncias comunitárias no direito contratual interno dos Estados-Membros, constituindo-se… [n]um importante impulso para a harmonização do direito civil dos países da União (Mota Pinto, 2000, 201).

Serão enfrentadas, antes de tudo, as seguintes questões: (i) quais os direitos de um comprador/consumidor que adquire um bem com defeito? (ii) quais os prazos legais disponíveis para ele os fazer valer? (iii) que procedimentos específicos deverá adoptar para ver satisfeita a pretensão; (iv) quem responsável perante si?

2. Segue: consumidor - não há uma perfeita uniformidade do conceito quer na doutrina (Pegado Liz, 1999, 201) quer na legislação existente, ou a nível nacional (onde a ordem jurídica é das poucas que consagra uma definição legal de consumidor) ou a nível comunitário (Almeida, 2001, 27/9).

Vejamos: nos termos do art. 2/1 LDC, para o qual o art. 1/1 DL 67/2003 remete, considera-se consumidor todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional [Na Lei 29/81, de 22.08, consumidor: aquele a quem sejam fornecidos bens ou serviços destinados ao seu uso privado por pessoa singular ou colectiva que exerça com carácter profissional, uma actividade económica. No DL 359/91, de 21.09, alterado pelo DL 101/2000, de 02.06, relativo ao contrato de crédito ao consumo, consumidor: pessoa singular que age com objectivos alheios à sua actividade comercial ou profissional.]. Para efeitos do art. 1/2.a. da Directiva 99/44, por consumidor entende-se qualquer pessoa singular que, nos contratos abrangidos [por ela] actue com objectivos alheios à sua actividade comercial ou profissional [No mesmo sentido vai o art. 2/2 da Directiva 97/7/CE ao definir consumidor como qualquer pessoa singular que actue com fins que não pertençam ao âmbito da sua actividade profissional e as Directivas 85/577/CEE, de 20.12 (contratos negociados fora dos estabelecimentos comerciais), 87/102/CEE (aproximação das disposições legais, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros em matéria de crédito ao consumo), modificada pela 90/88/CEE, de 22.02, 93/13/CEE, de 5.04 (cláusulas abusivas), 97/7/CE, de 20.05 (contratos à distância), 98/6/CE, de 16.02 (preços) e 2000/31, de 08.06 (comércio electrónico)]

Calvão da Silva (1990, 58) separa o conceito de consumidor em sentido lato - quem adquire, possui ou utiliza um bem ou serviço, quer para uso pessoal ou privado, quer para uso profissional - do consumidor em sentido restrito - aquele que adquire, possui ou utiliza um bem ou um serviço para uso privado (pessoal, familiar ou doméstico), de modo a satisfazer as necessidades próprias e do agregado. Parece poder inferir-se que dos diplomas referidos se retira o conceito de consumidor em sentido restrito.

E este modo de ver foi convocado tanto a Directivas comunitárias [Vd. Directivas 85/577/CEE de 20.12.1985 (contratos negociados fora dos estabelecimentos comerciais); 87/102/CEE, de 22.12 (crédito ao consumo); 93/13/CEE de 05.04 (cláusulas abusivas nos contratos celebrados com consumidores); 94/47/CEE, de 26.10 (time sharing); 97/7/CE, de 30.06 (contratos celebrados à distância)], como a recentes diplomas nacionais [Vd. p.ex. DL nº359/91, 21.09 (alt. DL 101/2000, 02.06): consumidor é pessoa singular que age com objectivos alheios à sua actividade comercial ou profissional; DL 143/2001, de 26 de Abril: consumidor é qualquer pessoa singular que actue com fins que não pertençam ao âmbito da sua actividade profissional. Pelo contrário, nos ordenamentos jurídicos da Espanha, do Reino Unido, do Brasil e da Bélgica, a noção de consumidor abrange tanto as pessoas colectivas como as pessoas singulares.]: parte fraca, sim, o consumidor singular e menos preparada tecnicamente, portanto, numa relação de consumo. Terá de destinar os bens a uso não profissional ou estar a agir fora do exercício da sua actividade profissional. [Vd. quanto ao profissional, agindo fora do exercício da sua profissão que adquire um bem de consumo para uso privado, CALVÃO DA SILVA (1990,62). Cfr. art. 464/1 do CSC: não são consideradas comerciais as compras de quaisquer coisas móveis destinadas ao uso ou consumo do comprador ou da sua família, e as revendas que porventura desses objectos se venham a fazer. No mesmo sentido, o art. 2.a da Convenção de Viena de 1980: exclui as vendas de mercadorias para uso pessoal, familiar ou doméstico, a menos que o vendedor, em qualquer momento anterior à conclusão ou aquando da conclusão do contrato, não soubesse nem devesse saber que as mercadorias eram compradas para tal uso].


Para se saber disso, haverá antes de mais de se descer ao caso concreto de forma a não ficar subvertida a ratio legal - protecção da parte fraca, leiga, profana, débil economicamente ou menos preparada tecnicamente de uma relação de consumo firmada com um contraente profissional (Calvão da Silva, 1990, 60/4) [Em determinadas circunstâncias pode verificar-se uma sobreposição do âmbito de aplicação da Directiva e da Convenção de Viena das Nações Unidas sobre o Contrato de Compra e Venda Internacional de Mercadorias: foi adoptada para constituir o direito uniforme da venda internacional entre profissionais, em Viena, 80.04.11. na Conferência diplomática participaram 59 Estados; entrou em vigor em 81.01.01 e foi ratificada por 40 países, incluindo Portugal (vd. www.un.or.at/uncitral). Para a comparação dos dois regimes, vd. KRUISINGA, S.A (2001, 177 ss)].

Ainda assim, tenha-se em conta que o conceito de consumidor recobrou uma significativa alteração perante o que dispunha a Lei 29/81: considerava consumidor todo aquele a quem fossem fornecidos bens ou serviços destinados ao uso privado [Art. 2, Lei 29/81, de 22.08]. Nos termos da LDC, basta que seja um uso não profissional (Almeida, 2001, 10/1).

3. A contraparte do consumidor é, nos termos do art. 2/1 LDC, para onde também remete o DL 67/2003 [Art. 1/1 D.L 67/2003], quem quer que exerça com carácter profissional uma actividade económica que vise a obtenção dos réditos de mercado. Poderá ser tanto uma pessoa singular como uma pessoa colectiva numa ampla acepção de agente ou actor jurídico. Na verdade, embora a revogada Lei 29/81 especificasse, como hoje não acontece, que a contraparte do consumidor poderia ser uma pessoa singular ou colectiva, a noção de fornecedor da LDC actual ainda deve ser tida no mesmo sentido: o âmbito de protecção conferido aos consumidores tem naturalmente em conta que grande parte das transacções de mercadorias é realizada, hoje em dia, pelas empresas.

Assinale-se, de passo, que esta contraparte (pessoa singular ou colectiva) deverá exercer com carácter profissional uma dada actividade económica (Duarte, 1999, 667), i.é, produção de bens oferecidos contra retribuição, habitual, estável e duradoura (Ascensão, 1994, 225).

Em suma: considera-se que a pessoa que vende um dado bem ou que presta um determinado serviço com regularidade, ainda que não seja a sua actividade principal, se encontra numa posição de supremacia em relação ao consumidor; por este motivo, deve este último ser protegido através do reforço da sua posição jurídica.

Por conseguinte:
- consumidor - qualquer pessoa a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados em parte a uso não profissional;
- vendedor - pessoa singular ou colectiva que actue no âmbito da sua actividade profissional (permanente ou eventual), ficando excluída qualquer venda alheia a esta mesma actividade [Vd. no mesmo sentido, Directiva 98/6/CE, de 16.02.1998 (preços)];
- os diplomas considerados aplicar-se-ão, unicamente, aos contratos celebrados entre um consumidor e um vendedor profissional, encontrando-se, deste modo, excluídas quaisquer vendas feitas entre consumidores, entre vendedores profissionais ou por um consumidor a um vendedor profissional [O Livro Verde sobre as garantias de bens de consumo e os serviços pós-venda propunha limitar o âmbito de aplicação da Directiva 99/44 pelo critério objectivista, i.é, sem que interviesse a qualidade das partes envolvidas: enquanto o Parlamento Europeu sufragou claramente este ponto de vista (vd. Resolução de0 6.05.1994, JOCE nº C 205, de 25.07.1994), a Comissão acabou por optar pelo critério subjectivista]

4. Segundo a LDC, o regime aplica-se aos bens móveis novos, entre outros. E, no caso da Directiva 99/44, parece ter o legislador comunitário optado claramente pelos bens móveis corpóreos.

Mais: a LDC trata dos contratos de fornecimentos de bens e de prestação de serviços ou da transmissão de quaisquer direitos, não trata de aleatórios contratos de compra e venda ou de prestação de serviços, apenas dos contratos de consumo, ou seja, daqueles que envolvem actos de consumo, que vinculam o consumidor a um profissional (produtor, fabricante, empresa de publicidade, instituição de crédito…) (Calvão da Silva, 2001, 112/3). Quanto à Directiva 99/44, e ao DL 67/2003, são de regime aplicável ao contrato de compra e venda, contrato paradigmático do comércio mundial (Menezes Leitão, 2002, 272) [Mas não só. Com efeito, nos termos do art. 1/4, os contratos de fornecimento de bens de consumo a fabricar ou a produzir são equiparados aos contratos de compra e venda (Romano Martinez, 2001, 155 ss). Por outro lado, a qualquer prestação de serviço acessória da compra e venda também é aplicável o regime da Directiva, nos termos do art. 2/5. Do mesmo modo, o Decreto-Lei 67/2003 é aplicável tanto à venda de bens de consumo, como aos contratos de fornecimento de bens de consumo a fabricar ou a produzir, à locação de bens de consumo e à prestação de serviços acessória da compra e venda: uma das inovações deste diploma está na aplicação do regime que instituiu à locação de bens não conformes com o contrato.]

5. Defeito, vício, encontra-se intimamente relacionado com descontinuidades materiais, com anomalias físicas do próprio bem [Porventura noutro plano, um ónus oculto pode configurar um vício de direito]. Antes da entrada em vigor do DL 67/2003, lidos os arts. 4/1 e 12/1 LDC, e sem mais qualquer explícito auxílio interpretativo provindo da lei, o regime dizia-nos que em caso de defeito, o consumidor obtinha o benefício da reparação do bem fornecido, enquanto os bens e serviços destinados ao consumo deviam ser aptos a satisfazer os fins a que se destinassem e a produzir os efeitos que se lhes atribuíssem, segundo as normas legalmente estabelecidas, ou na falta delas, de modo adequado às legítimas expectativas do consumidor (Calvão da Silva, 2001, 117) [As disposições que regulam a compra e venda de coisas defeituosas, art.s 913 a 922 CC, não se tematizam no conceito de falta de conformidade com o contrato, nem instituem um sistema de presunção de conformidade do bem com esse mesmo contrato: o art. 913 CC convoca antes a existência de um vício ou a falta de qualidades da coisa.]

Esta solução legal era dificultosa e vaga; a doutrina considerava essencial que fossem introduzidas na ordem jurídica portuguesa normas que permitissem determinar, com propriedade, o que entender verdadeiramente por defeito (Mota Pinto, 2000, 224). E surgiram alterações importantes com o DL 67/2003: o art. 4 da LDC foi simplificado [Art. 4/1 [2, 3 e 4 eliminados] LDC: os bens e serviços destinados ao consumo devem ser aptos a satisfazer os fins a que se destinam e a produzir os efeitos que se lhes atribuem, segundo as normas legalmente estabelecidas ou, na falta delas, de modo adequado às legítimas expectativas do consumidor.]; ao mesmo tempo, o art. 12 inovou decidido, convocando à problemática a indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos e a responsabilidade objectiva do produtor.

O caminho da análise tem de fazer-se, daqui em diante, chamando ainda à colação o disposto no art. 913 do Código Civil. Bem apto: (i) não sofre de vício que o desvalorize; (ii) não sofre de vício que impeça a realização de um fim destinado; (iii) tem as qualidades asseguradas pelo fornecedor; (iv) qualidades essas necessárias à realização do fim assegurado, ao desempenho ou performance atribuídos aos bens do mesmo tipo (de acordo com o contrato ou o fim específico nele previsto), ou à função normal das coisas da mesma categoria (Romano Martinez, 1994, 166).

Mais além, as expectativas do consumidor/comprador, no entanto, serão as de um consumidor médio, colocado na posição do destinatário real [Art. 236 CC.] e que, segundo os ditames da boa fé [Art. 239 CC], possa razoavelmente esperá-las, consideradas as cláusulas e demais condições do contrato celebrado (Calvão da Silva, 2001, 118).

Contudo, deparamo-nos ainda na LDC com uma noção de defeito demasiado indefinida. Já o art. 4 do DL 383/89 nos diz, pelo contrário, que um produto defeituoso é aquele que não oferece a segurança com que legitimamente se pode contar tendo em atenção todas as circunstâncias, designadamente a sua apresentação, a utilização que dele razoavelmente possa ser feita e o momento da sua entrada em circulação. Defeito, acaba, pelo menos aqui, por coincidir de certa maneira com falta de segurança, divergindo já do enquadramento do art. 913 CC (Romano Martinez, 1994, 69/0).

Por seu turno, a Directiva 99/44 [Vd. Considerando (7); vd. tb. art. 35/1 da Convenção de Viena: o vendedor deve entregar mercadorias que, pela sua quantidade, qualidade e tipo correspondam às previstas no contrato e que estejam acondicionadas ou embaladas na forma estabelecida pelo contrato; art. 36/1: prevê a responsabilidade do vendedor pela falta de conformidade existente no momento da transferência do risco para o comprador. Uma obrigação de conformidade ao contrato já se encontrava prevista na Lei uniforme sobre a compra e venda internacional de mercadorias (arts.18 e 19), aprovada pela Convenção da Haia de 1964, ratificada por Portugal. O critério conformidade do bem com o contrato está estabelecido também na Directiva 93/13/CEE (cláusulas abusivas), anexo, alínea m).] adoptou o paradigma da conformidade com o contrato [Vd. FERREIRA DE ALMEIDA, (1992, 640/1): o valor de conformidade afere-se por uma adequação “ponto por ponto”: nos negócios jurídicos que sejam fonte de obrigações genéricas, pela inclusão na classe referida; nos negócios jurídicos que definem o objecto em alternativa, pela correspondência com um dos seus termos; nos negócios jurídicos que especifiquem singularmente o objecto, sejam ou não obrigacionais, por uma verificação identificadora; e, em qualquer hipótese, pela existência no referente de todas as qualidades apositivas, incluindo as funcionais e as gradativas, tal como são mencionadas no texto negocial, composto em conexão com todas as suas implicações intertextuais, tido como base comum às diferentes tradições jurídicas nacionais: pôs de lado o critério de conformidade em face das expectativas legítimas do consumidor, acolhido no Livro Verde sobre as Garantias dos Bens de Consumo e os Serviços Pós-Venda, severamente criticado pelas associações de profissionais, e abandonado pouco depois [Vd. Parecer do Comité Económico e Social sobre o Livro Verde…, JOCE, nº C 295, de 22.10.1994, nº3.9].

De qualquer modo, e muito embora o texto final da Directiva tenha centrado no contrato a ideia de conformidade, não afastou liminarmente as legítimas expectativas dos consumidores: o bem apresentará as qualidades e o desempenho habituais dos bens do mesmo tipo e que o consumidor possa razoavelmente esperar [Art. 2/2.d da Directiva].

Pode, todavia, ter-se por seguro que o art. 2/1 contém o critério-chave da Directiva: os direitos e obrigações dos diversos sujeitos intervenientes acabam por emergir no caso de se verificar a não conformidade do bem com o contrato (Tenreiro, al., 2000, 13).

A adopção deste critério da não conformidade com o contrato, pelo legislador comunitário, estrutura afinal um conceito mais amplo e abrangente, arredando as dúvidas de vício, falta de qualidade [Vd. art. 913/1 CC: o legislador português equipara os tratamentos de vício e de falta de qualidade. Vd. FERREIRA DE ALMEIDA, (1992, 647/9):… o vício provoca a deterioração (art. 918), exclui ou reduz o valor da coisa (arts. 1208 e 913), impede a realização do fim a que a coisa geralmente se destina (arts. 913º e 1032º); a falta de qualidade é um juízo que se afere pelo que foi assegurado pelo vendedor ou pelo locador (arts. 913 e 1032), equivalendo, na regulação do contrato de empreitada, à desconformidade com o que foi convencionado (art. 1208), é uma omissão que acarreta disfuncionalidade; tendencialmente, vício é uma desconformidade com os padrões comuns naquele tipo de bens e com as finalidades normais exigíveis em qualquer negócio, enquanto a falta de qualidade se determina por comparação com os padrões concretos e com os fins especiais constantes do texto daquele negócio.] ou mero defeito [Vd., art. 12/1 LDC, na versão anterior à entrada em vigor do DL67/2003; vd. FERREIRA DE ALMEIDA, (id. id): defeito é …qualquer desconformidade que não afecte a identidade; não existe uma definição legal de defeito, mas o Código Civil remete repetitivamente para duas outras noções cujo âmbito cumulado equivale a defeito: vício e falta de qualidade.]: o resultado prático traduz-se numa mais intensa protecção do comprador: enquanto o regime tradicional se resumia na máxima caveat emptor (o comprador que se acautele), o regime baseado no cumprimento em conformidade com o contrato caracteriza-se pela máxima inversa: caveat venditor (o vendedor, sim, que se acautele).

É tempo de assinalar aqui que da Directiva não resultava a necessidade de transpor a adopção do paradigma da falta de conformidade Antes impôs que os direitos conferidos ao consumidor, adquirente de um bem com defeito, vício ou falta de qualidade, fossem definidos em termos substancialmente equivalentes (Mota Pinto, 2000, 231; id. 2001, 197/8).

Não obstante, o legislador nacional optou por introduzi-lo expressivamente, nos termos do art. 2/1 do DL 67/2003: o vendedor tem o dever de entregar ao consumidor bens que sejam conformes com o contrato de compra e venda. E, logo no preâmbulo deste diploma, referiu que a adopção do critério de conformidade com o contrato era, então, uma das principais inovações legislativas, no que foi de certo modo acompanhado pela doutrina (Menezes Leitão, 2002, 276).

Segue-se, porém, que da análise de vários preceitos do DL 67/2003, se verifica não existir sequer no diploma uma grande harmonia de conceitos. Na verdade, coisas defeituosas, defeitos [Art. 6/1: … pode o consumidor que tenha adquirido coisa defeituosa optar por exigir do produtor, à escolha deste, a sua reparação ou substituição; art. 6/1.a.c: O produtor pode opor-se ao exercício dos direitos pelo consumidor verificando-se qualquer dos seguintes factos: a) resultar o defeito exclusivamente de declarações do vendedor sobre a coisa e sua utilização, ou de má utilização; …c) poder considerar-se …que o defeito não existia no momento em que colocou a coisa em circulação; art. 7/3: O demandado pode afastar o direito de regresso provando que o defeito não existia quando entregou a coisa ou, se o defeito for posterior à entrega, que não foi causado por si; art. 9/1: A declaração pela qual o vendedor, o fabricante ou qualquer intermediário promete reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar-se de qualquer modo da coisa defeituosa…], e falta de conformidade do bem com o contrato são utilizados indistintamente, sem rigor sistemático.

Admita-se, entretanto, não ser verdadeiramente inovador o tema da conformidade com o contrato. Com efeito, se pensarmos no regime de cumprimento pontual dos contratos [Arts. 406 e 763 CC] ou da entrega da coisa [Arts. 879.b e 882 CC], o ponto de vista da conformidade, por assim dizer, encontra-se-lhes subjacente (Ferreira de Almeida, 1992, 635 ss). Um contrato deve ser cumprido ponto por ponto, em conformidade com o estipulado: pacta sunt servanda; o vendedor tem a obrigação de entregar a coisa, isenta quer de vícios jurídicos [Arts. 905 ss. CC], quer de vícios materiais [Arts. 913 ss. CC]; e a propósito da locação, o art. 1043/1 CC estabelece, depois, que o locatário deve restituir a coisa no estado em que a recebeu, em conformidade com os fins do contrato; ainda no mesmo diploma, o art. 1208 assevera que o empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado. Enfim, o Código Comercial, no art. 469, dispõe acerca da conformidade do bem à amostra ou à qualidade convencionada.

Anotemos, então, a síntese particularmente bem conseguida de Calvão da Silva (1990, 189) - um produto defeituoso é aquele que é impróprio para o uso concreto a que é destinado contratualmente - função negocial concreta programada pelas partes - ou para a função normal das coisas da mesma categoria se do contrato não resultar o fim a que se destina.

Por conseguinte, o defeito deixou de ser visto apenas como uma patologia que afecta a funcionalidade do bem. E apresenta-se-nos ainda mais distendido, se considerarmos o art. 2/5 da Directiva: a falta de conformidade resultante de uma má instalação do bem de consumo levada a cabo pelo vendedor, ou sob a responsabilidade deste, ou ainda pelo consumidor que instalou esse bem de acordo com as instruções de montagem, é assimilada de igual modo à falta de conformidade do bem com o contrato (Pelet, 2000, 44). Ficam ultrapassadas as dificuldades derivadas da terminologia e do regime da compra e venda de coisas defeituosas [Quanto à controvérsia dogmática, vd. VAZ SERRA (1971, 253 ss); BAPTISTA MACHADO (1972, 5 ss); CARNEIRO DA FRADA (1989, 461 ss); PINTO MONTEIRO e PAULO MOTA PINTO (1993, 259 ss); PAULO MOTA PINTO (2001, 195-218), ROMANO MARTINEZ (1994, 35 ss); TEIXEIRA DE SOUSA, (1998, 567 ss): defende este autor a distinção do regime das coisas defeituosas do cumprimento defeituoso na compra e venda; FERREIRA DE ALMEIDA (1992, 640)].

6. O legislador comunitário introduziu uma presunção ilidível de conformidade, no art. 2/2 da Directiva que se inspira em larga medida no disposto no art. 35 da Convenção de Viena de 1980, pretendendo assim aligeirar o ónus da prova que recai sobre o vendedor relativamente ao cumprimento da obrigação prevista (Menezes Leitão, 2002, 277).

Presumem-se, pois, coincidentes ao contrato os bens que sejam (i) conformes com a descrição que deles é feita pelo vendedor e possuam as qualidades do bem que o vendedor tenha apresentado ao consumidor como amostra ou modelo; (ii) adequados ao uso específico para o qual o consumidor os destine e do qual tenha informado o vendedor quando celebrou o contrato, mas que o vendedor em causa tenha aceite; (iii) adequados às utilizações habitualmente dadas aos bens do mesmo tipo; (iv) que apresentem as qualidades e o desempenho habituais dos bens do mesmo tipo, razoavelmente esperável pelo consumidor, atendendo à natureza do bem e, eventualmente, às declarações públicas sobre as suas características concretas feitas pelo vendedor, pelo produtor ou pelo seu representante, nomeadamente na publicidade ou na rotulagem.

Estes quatro critérios são cumulativos: basta a não verificação de um para que o bem não seja conforme com o contrato [Vd. considerando (8) Directiva - os elementos que constituem a presunção são cumulativos.]; não podem ser afastados por acordo das partes, inderrogáveis as normas, irrenunciáveis os direitos [Vd. considerando (22) e art. 7 Directiva; tb. art. 16 LDC.]. Mas, já entra no âmbito da liberdade contratual negociar um bem que, à partida, não corresponda a um, ou mais, dos critérios previstos no art. 2/2 da Directiva: a presunção ilidível de conformidade não restringe o princípio da liberdade contratual das partes [Considerando (8) da Directiva].

Contrariamente, o Código Civil não se baseia, na disciplina da venda de coisa defeituosa, em qualquer presunção de conformidade do bem com o contrato: é inovador o art. 2/2 DL 67/2003, onde se presume também que os bens de consumo não são conformes com o contrato pela mesma ordem de razões da Directiva.

Ora, a segunda ordem de critérios, como vimos, relaciona-se com a adequação do bem ao uso específico para o qual o consumidor o tenha destinado, aceite pelo vendedor no momento da celebração do contrato. E exige-se ainda, como terceira ordem de critérios, que o bem seja adequado às utilizações habitualmente dadas aos bens do mesmo tipo, numa consagração objectiva de defeito]. Como é natural: a habitualidade deve ser estimada segundo o modelo do consumidor-padrão, colocado em certas e determinadas circunstâncias de mercado (Menezes Leitão, 2002-280).

Poder-se-á, assim, concluir, sem dúvidas, que o bem deverá apresentar as qualidades e desempenho habituais de um bem do mesmo tipo, e que essas qualidades e desempenho habituais serão as legitimamente esperadas pelo consumidor, tendo em conta a natureza do bem e as declarações públicas, nomeadamente na publicidade e rotulagem, sobre as suas características concretas, feitas pelo vendedor, produtor ou seu representante [Não se trata de um representante em sentido jurídico, mas antes de um representante económico, vd. CALVÃO DA SILVA, (2001, 242). Vd. FERREIRA DE ALMEIDA, (2001a, 114): verdadeiramente inovador (e de grande alcance) é o reconhecimento legislativo da relevância contratual da rotulagem e da publicidade; neste ponto, mais do que em nenhum outro, se vislumbra a adequação do regime jurídico ao moderno circuito e perfil da distribuição de bens de consumo, que, por via de embalagem, da rotulagem e da publicidade, envolvem fortemente personagens intervenientes a montante do vendedor final. A introdução da responsabilidade do vendedor pelas declarações publicitárias realizadas pelo produtor ou pelo seu representante é também muito inovadora para grande parte das ordens jurídicas. No que diz respeito às declarações publicitárias, o nosso direito afigura-se suficiente. Com efeito, o art. 7/5 LDC estabelece que as informações concretas e objectivas contidas nas mensagens publicitárias de determinado bem, serviço ou direito se consideram integradas no conteúdo dos contratos que se venham a celebrar após a sua emissão, tendo-se por não escritas as cláusulas contratuais em contrário.].
(Calvão da Silva, 2001, 148).

7. A LDC não estabelecia qualquer regra específica quanto ao prazo do acerto da falta de conformidade. Até à entrada em vigor do DL 67/2003, era necessário recorrer, por isso mesmo, às regras gerais do Código Civil, tendo em conta que a transmissão da propriedade das coisas opera solo consensu, e que, em princípio, o risco de perecimento ou deterioração da coisa, por causa não imputável ao alienante, corre por conta do adquirente [Art. 796/1 CC. Havendo ainda assim lugar ao envio da coisa para local diferente do cumprimento, a transferência do risco opera-se com a entrega ao transportador ou expedidor, art. 797 CC].

As regras de distribuição do risco eram, pois, muito desfavoráveis ao consumidor (Ferreira de Almeida, 1982, 130), mas tudo se alterou quando o art. 4/2 LDC foi revogado e o art. 3/2 DL 67/2003 passou a dispor: as faltas de conformidade manifestadas num prazo de dois anos… a contar da data de entrega de coisa móvel corpórea… presumem-se existentes já na data da entrega, salvo quando forem incompatíveis com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade com o contrato.

Estabeleceu também o DL 67/2003, de acordo com a Directiva 99/44 [Arts. 3/1 e 2/1 da Directiva], que o vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue [Art. 3/1, DL 67/2003.].

Na verdade, a Directiva afastou as regras sobre a transferência do risco previstas tanto na Convenção de Viena de 1980 [Art. 36/1, Convenção de Viena], como nos ordenamentos da generalidade dos Estados-Membros [Em França, por exemplo, a transferência de propriedade e do risco ocorrem, para as coisas especificadas, no momento da conclusão do contrato, e para as coisas genéricas no momento da determinação do bem. Levanta-se, porventura, aqui um obstáculo de monta: as matérias respeitantes à propriedade permanecem da estrita competência de cada Estado-membro (Art. III-425, Tratado Constitucional) ou seja, de modo algum o legislador comunitário pode alterar essas mesmas regras que agregam, neste caso, o subsistema de distribuição do risco. É claro que houve, seguramente, uma preocupação de alterar as regras sobre a transferência do risco como forma de proteger os consumidores, mas o Considerando (14), ao prever não serem obrigados os Estados-membros a alterar o regime geral do risco, o qual se manterá em vigor, e naturalmente para todos os contratos não abrangidos pela Directiva, desloca do tema de um risco inerente à propriedade os problemas que dizem respeito afinal a uma expansão ou, dito de outro modo, a um enfoque polarizador mais amplo do princípio obrigacional da pontualidade do cumprimento dos contratos (Mota Pinto, 2001, 250/1). Procedendo a uma delimitação diferente e mais radical do problema, CALVÃO DA SILVA (2001, 152/3): não existe qualquer contradição entre o considerando (14) e o art. 3º, nº1 da Directiva, porque diferentes os problemas a que se reportam; com efeito, uma coisa é a responsabilidade do vendedor pelos vícios ou defeitos da coisa existentes no momento da sua entrega ao consumidor - cumprimento imperfeito da obrigação de entrega por falta de conformidade jurídica ou material… outra coisa bem diferente é a impossibilidade do cumprimento da obrigação de entrega conforme, pontual, em todos os termos devidos, em virtude do perecimento ou deterioração da coisa por caso fortuito ou força maior…; o diferimento da transferência do risco de perecimento da coisa por força maior ou caso fortuito para o momento da entrega do bem - colocação à disposição ou recepção efectiva… - ao consumidor profissional poderá constituir opção política livre e soberana do legislador português, não uma imposição da Directiva]. Por exemplo, no caso português, à semelhança de outros, a coisa, segundo o Direito civil, deve ser entregue no estado em que se encontra ao tempo da venda [Art. 882/1 CC], quer o seja logo no momento da celebração do contrato [Art. 914 CC] ou posteriormente [Art. 918 CC.]. A transferência da propriedade dá-se, em geral, na data do contrato, e com ela ocorre a transferência do risco [Esta regra acaba, igualmente, por contrariar o estabelecido no art. 918 CC (defeitos supervenientes)].

Mas a apreciação da falta de conformidade do bem no momento em que é entregue ao comprador não significa que esta falta de conformidade seja manifesta e tenha sido apreendida logo ali (Tenreiro al, 2000, 17). É que a introdução da já referida presunção de anterioridade do defeito, inovadora para algumas ordens jurídicas, como a portuguesa, pretendeu tornar mais simples o onus probandi do consumidor: no prazo que lhe é conferido, o consumidor/comprador apenas terá de mostrar o defeito do bem adquirido, não lhe competindo provar que já existia no momento da compra [Todavia, se à primeira vista a inversão do ónus da prova da anterioridade do defeito parece proteger, de forma lapidar, o consumidor, também é verdade que sofre algumas limitações. Antes de mais, o consumidor só poderá lançar mão da presunção de anterioridade no tempo legal seguinte à entrega do bem. Passado esse prazo, o ónus da prova incumbir-lhe-á por inteiro. Por outro lado, a presunção de anterioridade não poderá ser utilizada se for incompatível com a natureza do bem (p.ex., bem de deterioração rápida) ou com as características da falta de conformidade (p.ex., quando o defeito provém de uma má utilização do consumidor, de sabotagem, de acção de terceiro…). Exige-se, depois, na aquisição de um certo bem que o consumidor proceda com a diligência devida na supervisão e controlo de eventuais faltas de conformidade do produto (na Convenção de Viena de 1980, o comprador tem um verdadeiro ónus de examinar ou mandar examinar a coisa). Deste modo, sempre que o consumidor não possa razoavelmente ignorar a falta de conformidade, porque os defeitos são aparentes ou visíveis, o vendedor não pode vir a ser responsabilizado: trata-se aqui, não de uma falta de conformidade, mas de uma irresponsabilização do vendedor pelo defeito da coisa].

8. Segundo o sistema da anterior versão do art. 12/1 LDC, o consumidor a quem fosse fornecida coisa com defeito, podia exigir, independentemente de culpa do fornecedor do bem, a reparação, substituição, redução do preço ou a resolução do contrato. Seguia a teoria do cumprimento ou do dever de prestação, localizada a responsabilidade do vendedor no cumprimento imperfeito, e posto de parte, deste modo, o hibridismo das soluções do Código Civil (Calvão da Silva, 2001, 49/56).

A este mesmo respeito, o art. 4/1 DL 67/2003 estabelece que, em caso de falta de conformidade, o consumidor tem direito (i) a que a integralidade do bem seja reposta, por meio de reparação ou de substituição; (ii) à redução adequada do preço; (iii) no limite, à resolução do contrato [A Convenção de Viena de 1980 institui direitos idênticos do adquirente, mas legislações como as da Alemanha, França, Itália, Inglaterra e Luxemburgo, apenas reconhecem as modalidades de rescisão do contrato e de redução do preço: são inovadoras as soluções da Directiva, onde certas matérias foram deixadas de fora - formação e efeitos da compra e venda; reparação dos prejuízos causados ao comprador/consumidor pela falta de conformidade do bem; bens onerados; serviços pós-venda. Anotar-se-á entretanto, que, neste domínio, a não hierarquização dos direitos conferidos ao adquirente acaba por ser mais protectora do consumidor: é-lhe dada a possibilidade de escolher, indistintamente, entre um ou outro direito previsto na lei. Aliás, alguns autores consideravam a hierarquização, proposta contudo na Directiva quer complexa, quer inoportuna (Pelet,2000,55) Em sentido contrário, MENEZES LEITÃO (2002, 288): esta hierarquização ... parece ... lógica, já que o princípio do aproveitamento dos negócios jurídicos deve impor a prevalência das soluções que conduzem à integral execução do negócio sobre soluções que implicam uma sua ineficácia total ou parcial. A anterior redacção do art. 12/1 LDC, não previa expressamente qualquer hierarquia entre os quatro direitos conferidos, contrariamente ao previsto na lei para o regime da empreitada, onde a hierarquização dos direitos é feita expressamente, arts. 1221 e 1222 CC: esses direitos eram conferidos ao consumidor em concorrência electiva, ou seja, o consumidor podia escolher indistintamente qualquer um deles (o consumidor pode exigir…). Mas, nos termos da Directiva 99/44, o consumidor não poderia escolher livremente entre os direitos. Pelo contrário, existia uma clara hierarquia entre os quatro direitos atribuídos ao consumidor/comprador. Primeiro que tudo, o consumidor deveria solicitar a reparação ou a substituição do bem. E apenas preenchidas determinadas condições, lançava mão dos instrumentos da redução do preço ou rescisão contratual. Com efeito, o art. 3/3 da Directiva referia que o consumidor tinha, em primeiro lugar, direito à reparação ou substituição do bem. Depois, o art. 3/5 do mesmo diploma estipulava que o consumidor poderia exigir a redução adequada do preço ou a rescisão do contrato, no caso de não ter direito à reparação ou à substituição do bem. A Directiva acabava, assim, por conferir uma maior importância à manutenção do contrato, ao favor negotii. Todavia, nos termos da Directiva, a hierarquia existente entre os quatro direitos poderia sofrer alguma moderação: era permitido às partes convencionar, por exemplo, que no caso de falta de conformidade do bem com o contrato, fosse reduzido o seu preço. Por outro lado, o vendedor podia propor ao comprador qualquer outro tipo de reparação, por exemplo, a oferta de outro bem, nos termos do considerando (12) da Directiva 99/44. De outro ponto de vista, na doutrina nacional, e até à entrada em vigor do DL 67/2003, entendeu-se que a concorrência electiva das pretensões reconhecidas ao comprador pela LDC não era um absoluto, podendo e devendo sofrer atenuações. A escolha devia ser, antes de mais, conforme ao princípio da boa fé, e não cair no puro arbítrio do comprador, sem de algum modo ter em conta os legítimos interesses do vendedor (Calvão da Silva, 2001, 80/1 e 120). Aliás, entendia-se que o comportamento do consumidor se devia pautar, sempre, pela boa fé, princípio incontornável, acolhido naturalmente na LDC, art.9/1]. Estas são as garantias legais, por contraposição às garantias voluntárias ou comerciais, que as veremos.
No estado actual da legislação, portanto, e em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que seja reposto, sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato [Art. 4/1 DL 67/2003]. E, o consumidor pode exercer qualquer destes direitos, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito nos termos gerais [Art. 4/5 DL 67/2003. Nos termos da Directiva (contrariamente à nova solução portuguesa), a reparação encontrava-se condicionada tanto pela sua própria possibilidade, como pela não desproporção em relação à substituição. Parece, assim, que o direito nacional é, neste particular, mais favorável do que a solução prevista na Directiva. Mas nos termos do art. 914 CC, o comprador tem o direito de exigir do vendedor a reparação da coisa ou, se for necessário e esta tiver natureza fungível, a substituição dela … Logo, a substituição só tem lugar se for necessária e se a coisa tiver natureza fungível. Nestes termos, a Directiva afigurava-se mais protectora do consumidor/comprador do que o regime previsto no Código Civil.]: não foi transposta, como vimos, a hierarquização prevista na Directiva [A Directiva previa uma excepção à regra, baseada tb. no princípio geral da boa fé, ou seja, o consumidor não podia lançar mão de um dos direitos em detrimento do outro se a solução fosse desproporcionada, se implicasse para o vendedor custos que, em comparação com a outra solução, não fossem razoáveis tendo em conta (i) o valor que o bem teria se não existisse falta de conformidade, (ii) a importância da falta de conformidade e (iii) a possibilidade de a solução alternativa ser concretizada sem grave inconveniente para o consumidor; ou se a solução fosse impossível. Vd. art. 3/3 da Directiva: dúvidas surgiram sobre a impossibilidade, se material ou jurídica, se temporária ou se definitiva. TENREIRO, al. (2000-23) preconizaram uma interpretação restritiva: unicamente nos casos em que fosse impossível materialmente proceder à substituição ou reparação do bem. A Directiva, referia ainda, no considerando (11), que a desproporção devia ser determinada objectivamente. Este critério, no entanto, não fornecia limites aos restantes direitos do consumidor, nomeadamente à redução do preço ou à rescisão do contrato. Nos termos do CC, o vendedor deixa de ter a obrigação de reparar ou substituir o bem se desconhecia sem culpa o vício ou a falta de qualidade que a coisa padece: o regime da Directiva é, ainda assim, bastante mais protector do consumidor.]

9. Então, no caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito à reparação ou substituição desse mesmo bem [Vd. art. 46/2 Convenção de Viena de 1980: a substituição da coisa é mais restritiva]. E embora a anterior versão da LDC não apresentasse mais qualquer inciso a respeito destes dois direitos, pelo contrário, o DL 67/2003 trata com certo pormenor a matéria [Vd. art.2/1 f. Directiva: define, reparação como reposição do bem de consumo em conformidade com o contrato de compra e venda.]: dispõe, por exemplo, que o exercício dos direitos de reparação ou substituição para além de ocorrer sem encargos do consumidor, serão esses objectivos concretizados num prazo razoável, e sem grave inconveniente para ele, tendo em conta a natureza do bem e o fim a que o destina, conceitos estes aferíveis no caso concreto, onde a apreciação pertinente se rege, na ausência de critérios legais, pelas diferenças uma a uma.

10. Faremos, agora uma referência ao disposto no art. 8/1 Directiva 99/44, regime naturalmente suposto na transposição através do DL 67/2003: o exercício dos direitos resultantes da presente directiva não prejudica o exercício de outros direitos que o consumidor possa invocar ao abrigo de outras disposições nacionais relativas à responsabilidade contratual ou extracontratual.

A Directiva tinha a pretensão de cumular responsabilidades, ou seja a sua intenção não era a de excluir ou limitar os direitos que já tivessem sido atribuídos por lei ao consumidor. Assim, aos direitos e garantias constantes da Directiva 99/44 acrescem quaisquer outros que o consumidor tenha, ao abrigo de disposições nacionais [Esta solução não é inovadora entre nós: veja-se o art. 13 Directiva 85/374 - a presente… não prejudica os direitos que o lesado pode invocar nos termos do direito da responsabilidade contratual ou extracontratual ou nos termos de um regime especial de responsabilidade que exista no momento da notificação da… directiva; veja-se, também, o disposto no art. 13 DL 383/89, de 06.11, com as alterações do DL 131/2001, de 24.04 - o presente diploma não afasta a responsabilidade decorrente de outras disposições legais].

A este respeito, CALVÃO DA SILVA (1990, 463/4) ensina: desta forma se procura melhorar a situação da vítima, que pode invocar o regime que lhe for mais favorável. São três, assim, as vias para a responsabilização do produtor: 1) a garantia e a responsabilidade contratual; 2) a responsabilidade extracontratual subjectiva; 3) a responsabilidade objectiva decorrente do DL nº383/89. Estas três vias, que podem dar suporte a uma acção de responsabilidade por produtos defeituosos contra o produtor, existem lado a lado e, onde se cruzarem ou entrecruzarem, as pretensões da vítima estarão em concorrência cumulativa e não só electiva. E refere ainda que esta solução é incontroversa pois é através dela, através deste correr em conjunto (cum currere) para uma só e mesma meta ou resultado único - a reparação máxima do dano no caso concreto, prevalecendo-se a vítima das disposições mais favoráveis dos sistemas de responsabilidades concorrentes - que se favorece e potencia a ratio do não sacrifício do direito comum pelo novo direito especial, a saber, a ratio de não regressão mas do reforço na protecção ao consumidor, à vítima em geral.

Nestes termos, a problemática do concurso entre a obligatio ex contractu e a obligatio ex delicto, nomeadamente a regra non cumul das responsabilidades contratual e extracontractual, tem tendência a ser afastada deste domínio (Romano Martinez, 1994-70) [Acerca do problema do concurso da responsabilidade contratual e extracontratual, veja-se JAIME DE GOUVEIA (1933, 215 ss); VAZ SERRA (1959, 208 ss); ALMEIDA COSTA (1991, 436 ss.) e ROMANO MARTINEZ (1994, 245 ss).
Relativamente ao concurso entre as disposições gerais e especiais da responsabilidade contratual, vd. ROMANO MARTINEZ, (1994, 271 ss)]

Assim, através deste conceito, os direitos que o consumidor gozava anteriormente não sofrem qualquer limitação e, consequentemente, a protecção conferida aos consumidores não sofre diminuição alguma.

11. A versão anterior da LDC atribuía os quatro direitos do consumidor, independentemente de culpa do fornecedor do bem: poderia pensar-se em responsabilidade objectiva do fornecedor. Contudo: a responsabilidade objectiva é uma excepção à regra geral da responsabilidade subjectiva [Art.s 483/1, 798 CC], enquanto a redacção legal não significa, desde logo, que a LDC dispensasse, em qualquer caso, a culpa do fornecedor [No art. 12/4, não se fazia qualquer referência à expressão independentemente de culpa, convocada tanto ao nº1 como ao nº5 do preceito.]. Sob prudência, na antiga versão da LDC, o consumidor apenas teria direito à indemnização no caso de o vendedor ter agido com culpa (Calvão da Silva, 2001, 121). E, incumbiria ao fornecedor provar que o cumprimento defeituoso da obrigação não procedia de culpa sua [Art. 799 CC.].

Com a entrada em vigor do DL 67/2003, por maioria de razão, mantém-se este entendimento. Veja-se aliás que o diploma revogou o art. 12/1 LDC, preceito através do qual justamente o consumidor podia exigir qualquer um dos direitos, independentemente de culpa do fornecedor do bem [Vd. contudo art. 12/2 LDC: o produtor é responsável, independentemente de culpa, pelos danos causados por defeitos de produtos que coloque no mercado, nos termos da lei: corresponde ao art. 12/5 da versão anterior: reforça a interpretação defendida.]

12. Vejamos por fim: é prática corrente, em relação a determinadas categorias de bens, que os vendedores e os produtores ofereçam garantias contra um defeito manifestado dentro de certo prazo [Vd. Considerando (21) da Directiva 99/44. Corresponde à chamada garantia de bom funcionamento, prevista no art. 921 CC e no art. 4/2 LDC, versão anterior. Cfr. ainda as garantias contratuais previstas nos art.s 36/2 e 39/1 Convenção de Viena.]: trata-se de uma garantia de bom funcionamento do produto [O anteprojecto da Directiva 99/44 previa que as garantias deviam colocar o beneficiário numa posição mais favorável do que a conferida pelo regime da garantia legal e pelo regime estabelecido nas legislações nacionais. Previa-se, ainda, que a garantia assumisse a forma de um contrato entre o garante e o beneficiário da garantia, com a vantagem de lhe ser claramente aplicável o regime das cláusulas contratuais gerais. Assim, o beneficiário da garantia seria o comprador inicial e os posteriores compradores do bem. Por outro lado, dispunha-se ainda que as condições de garantia deviam poder ser consultadas antes da aquisição do bem. Quanto às declarações publicitárias realizadas pelo garante, ou sob a sua responsabilidade, as mesmas integravam o conteúdo da garantia prestada.
Por seu lado, a proposta de directiva limitava-se a prever que a garantia oferecida vincula juridicamente a pessoa que a oferece nas condições estabelecidas no documento de garantia e na publicidade correspondente e deve colocar o beneficiário numa posição mais favorável do que a conferida pelo regime da garantia legal. Dizia-se, ainda, que a garantia deve constar de um documento escrito, o qual deve poder ser consultado antes da compra. Deste documento constam os elementos necessários à sua aplicação, nomeadamente a duração e extensão territorial da garantia, bem como o nome e o endereço do garante.
Quanto ao Parlamento Europeu propôs, em primeira leitura, que constasse da garantia o nome e endereço da pessoa a contactar e o procedimento a seguir para tornar a garantia efectiva. E, estabeleceu-se que a garantia deve conter informações acerca dos direitos legais conferidos ao consumidor, direitos esses que não podem vir a ser afectados pela garantia. Pretendia, ainda, que se especificasse que uma garantia parcial (sobre partes específicas do produto) deveria indicar expressamente essa restrição, sob pena de não produzir efeitos.]. Por contraposição às garantias legais do consumidor, analisadas, temos aqui as chamadas garantias comerciais ou garantias voluntárias [Art. 9 DL 67/2003]. E dispunha o art. 4/2 da LDC que, sem prejuízo do estabelecimento de prazos mais favoráveis por convenção das partes ou pelos usos, o fornecedor de bens móveis, não consumíveis, estava obrigado a garantir o seu bom estado e o seu bom funcionamento por período nunca inferior a um ano [Vd. art. 4/3 LDC, versão anterior. A obrigação de garantia do bom estado e bom funcionamento dos bens, prevista na LDC, apresenta algumas diferenças com o regime previsto no CC. Vd., a este respeito, PAULO DUARTE (1999, 654/5)].

Deste modo, sobre o fornecedor de bens recaía uma obrigação de garantir o seu bom estado e o seu bom funcionamento, o que abrangia tanto as máquinas como qualquer outro bem (Duarte, 1999, 653).

Por seu turno, a Directiva 99/44 apresentou uma definição de garantia, bem como alguns preceitos reguladores do funcionamento da mesma: nos termos do art. 1/2.e, por garantia entendia-se qualquer compromisso assumido por um vendedor ou um produtor [Vd. art. 1/2.d Directiva: por produtor entendia-se o fabricante de um bem de consumo, o importador do bem de consumo no território da Comunidade ou qualquer outra pessoa que se apresente como produtor através da indicação do seu nome, marca ou outro sinal identificativo no produto] perante o consumidor, sem encargos adicionais para este, de reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar-se de qualquer modo de um bem de consumo, no caso de este não corresponder às condições enumeradas na declaração de garantia ou na respectiva publicidade.

Dispôs depois o art. 6/1 da Directiva: as garantias vinculam juridicamente as pessoas que as oferecem, nas condições constantes da declaração de garantia e da publicidade correspondentes. E devem ainda declarar que o consumidor goza dos direitos previstos na legislação nacional aplicável em matéria de compra e venda de bens de consumo e especificar que esses direitos não são afectados pela garantia e estabelecer, em linguagem clara e concisa, o conteúdo da garantia e os elementos necessários à sua aplicação, nomeadamente a duração e a extensão territorial dela, bem como o nome e o endereço da pessoa que oferece a garantia [Art. 6/2 Directiva].

Em suma: a Directiva não impôs aos vendedores ou produtores a obrigação de conceder garantia [Contrariamente ao que sucede nalguns países onde existe a obrigação de conferir uma garantia de bom estado e bom funcionamento do bem. Era o caso da anterior versão do art. 4/1 da LDC e do art. 11/2 da Ley general para la defensa de los consumidores y usuarios espanhola, no qual se prevêem os elementos que deverão constar da garantia. O nº3 do mesmo art. prevê os direitos que integram a garantia como conteúdo mínimo, incluindo a reparação totalmente gratuita ou, se necessário, a substituição do bem ou a devolução do preço.].
Apenas estatuiu que quem oferecesse a garantia a ela ficaria vinculado, nas condições constantes da declaração de garantia e da publicidade correspondentes. Esta disposição acabava por estabelecer um elo entre o garante e o consumidor, sem no entanto qualificar juridicamente a relação existente. Ora, muitas vezes sucedia e sucede na prática é o consumidor adquirir um bem a um dado estabelecimento, mas a garantia comercial ser prestada através da marca do produto, e pelo produtor. Justamente por este motivo foi muito discutido o perfil da relação jurídica existente entre o consumidor e o garante, terceiro relativamente à compra e venda [Veja-se o princípio do efeito relativo ou inter alios acta. O anteprojecto de directiva qualificava a relação entre o garante e o consumidor como um contrato, o que permitia a aplicação das regras sobre cláusulas abusivas, previsto na Directiva 93/13/CEE. Contudo, este regime das cláusulas contratuais gerais não é afastado das garantias prestadas. No mesmo sentido, Tenreiro, als. (2000, 31)].

Com a entrada em vigor do DL 67/2003, foram introduzidas algumas alterações que recolocaram todo este problema na nossa ordem jurídica. Desde logo, este diploma revogou os preceitos da LDC que tratavam das garantias comerciais [Art. 4/2.3.4 LDC: revogados.]
E o art. 9 dispõe actualmente sobre o que chama garantias voluntárias: a declaração pela qual o vendedor, o fabricante ou qualquer intermediário promete reembolsar o preço pago, substituir, reparar ou ocupar-se de qualquer modo de coisa defeituosa vincula o seu autor nas condições constantes dela e da correspondente publicidade. Veja-se que esta disposição é em muito semelhante à do art. 6/1, Directiva 99/44. Tal declaração de garantia deve ser entregue ao consumidor por escrito ou em qualquer outro suporte duradouro a que aquele tenha acesso [Art. 9/2, DL 67/2003. Quanto às menções que deverão constar da garantia são semelhantes às indicadas na Directiva. Vd. art. 9/3, DL 67/2003: a garantia, que deve ser redigida de forma clara e concisa na língua portuguesa, conterá as seguintes menções: al. a) declaração de que o consumidor goza dos direitos previstos no presente diploma e de que tais direitos não são afectados pela garantia; b) condições para atribuição dos benefícios previstos; c) benefícios que a garantia atribui ao consumidor; d) duração e âmbito espacial da garantia; e) firma ou nome e endereço postal, ou, se for o caso, electrónico, do autor da garantia que pode ser utilizado para o exercício desta.].

Chegados a este ponto, o que dizer dos preceitos da Directiva e do DL 67/2003, em comparação com o que estava previsto no regime da antiga versão da LDC? Quais os preceitos mais favoráveis ao consumidor?

Desde logo, a Directiva, no art. 3/1, limitava a responsabilidade do vendedor à falta de conformidade existente no momento da entrega dos bens, estabelecendo o art. 5/3 uma presunção de desconformidade vigente no seis meses subsequentes, ou seja, apenas decorridos esses seis meses, o onus probandi da anterioridade do defeito (anterioridade à data da entrega) e da desconformidade do bem com o contrato, caberia, pelo contrário, ao consumidor.

Entretanto, nos termos da LDC [Art. 4/2.3.4 LDC: revogados, DL 67/2003], o consumidor dispunha de um ano de garantia, para os bens móveis não consumíveis, sem ter qualquer necessidade de provar a anterioridade à entrega da desconformidade do bem. Por conseguinte, até à entrada em vigor do DL 67/2003, a LDC era claramente mais favorável e protectora dos interesses dos consumidores.

Actualmente, porém, o vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem a este é entregue, sendo que essa mesma falta de conformidade se presume existente já nessa data, se se manifestar no prazo de dois anos no caso de coisa móvel corpórea.

13. O consumidor não dispõe dos seus direitos para sempre: segundo a antiga versão do art. 12/2 LDC, e para o caso de bens móveis, tinha o dever de comunicar o defeito ao fornecedor, no prazo de 30 dias a contar do conhecimento, e dentro de um ano após a entrega do bem [Vd. art. 4/2 LDC, versão anterior: o prazo excessivamente reduzido de seis meses (art. 916/2 CC) acabava por ser duplicado]. Os direitos de reparação ou substituição do bem, de redução do preço ou resolução do contrato caducavam, findo qualquer destes prazos ou decorridos seis meses sobre a denúncia, sem resposta [Ar. 12/3 LDC, versão anterior].

O decurso do prazo de um ano após o contrato ou a falta de denúncia tempestiva pelo consumidor ou a passagem de seis meses sem resposta conduzia, portanto, à perda dos direitos do consumidor, mas competia ao vendedor provar em juízo que todo o tempo tinha expirado ou que a comunicação não tinha sido realizada tempestivamente [Art. 343/2 CC]. No caso de a denúncia ter sido levada a cabo, a acção destinada a fazer valer os direitos do consumidor tinha de ser intentada no prazo de 6 meses, e uma vez mais a prova da caducidade da acção deveria ser produzida pelo vendedor [Arts.333/2 e 303 CC. O art. 12/3 apenas fazia referência à caducidade dos direitos previstos no nº1 do mesmo preceito, contudo, no caso da indemnização, tratando-se de um direito secundário, que era conferido ao consumidor quando o fornecedor tivesse agido com culpa, o regime seria naturalmente o mesmo. E é certo que o art. 12/4 insistia: …sem prejuízo do disposto no número anterior; ou seja, prevenia a caducidade desse direito também (Calvão da Silva, 2001, 123/4)].

Na Directiva, por seu turno, estes prazos foram, na versão final, fixados segundo uma tipologia tripartida não totalmente coincidente com os prazos do direito interno. Antes de mais, estabeleceu um prazo de dois anos, período durante o qual o consumidor poderia exercer os seus direitos [Art. 5/1 Directiva], um prazo de direito material prevenindo que o vendedor apenas seria responsável no caso de a falta de conformidade se manifestar nesse período de dois anos a contar da entrega do bem.

Deste modo, a Directiva exigia dois requisitos, a saber: (i) existência da falta de conformidade do bem com o contrato logo no momento da entrega do mesmo ao consumidor/comprador; (ii) falta de conformidade manifestada no prazo de dois anos após a entrega; e dois requisitos que implicam para o comprador, passados os primeiros 6 meses da presunção de desconformidade coeva da entrega: (iii) a prova da falta de conformidade; (iiii) a prova da existência, ainda que potencial, do defeito já na data da entrega do bem; (iiiii) a prova da revelação ou manifestação do defeito de conformidade dentro de dois anos após a entrega (Calvão da Silva, 2001, 160/1).

Previa ainda a Directiva, na circunstância de os Estados-Membros condicionarem o tempo do exercício dos direitos dos consumidores, a marcação de um prazo de caducidade não inferior a dois anos a contar, nas hipóteses de substituição, sempre da data da entrega do bem [Art. 5/1, in fine da Directiva].

Para terminar, e devido à pressão realizada por alguns Estados-membros, a Directiva conferiu-lhes a possibilidade de determinarem a inclusão de um prazo de denúncia da falta de conformidade do bem com o contrato, que não poderia ser, no entanto, inferior a dois meses contados da data em que se tivesse revelado [O dever de comunicação já existia em certos Estados-Membros: Dinamarca, Suécia, Itália, Luxemburgo e Portugal. No mesmo sentido, vide art. 39/1 Convenção de Viena. O direito português previa, no entanto, um prazo de denúncia menor (anterior versão do art. 12/2 LDC e art.s 916/2, 1220 e 1224/1 CC)]. Não impunha um prazo de denúncia, permitia apenas que o mesmo fosse adoptado pelos diversos Estados-membros [Vd. Considerando (19) da Directiva. Acerca dos prazos previstos pela Convenção de Viena de 1980 VICENTE (2001, 139-140). Em abono da adopção de um prazo de denúncia, já foi avançado o argumento de favorecer soluções não contenciosas, amigáveis (Pelet, 2002, 53)].

Ora, perante a solução portuguesa de conferir ao consumidor o ónus de denunciar o defeito, demonstra-se congruente manter a obrigatoriedade dessa denúncia num certo prazo, como é, aliás, razoável, no sentido de evitar o protelamento ilimitado do exercício dos direitos do consumidor: caber-lhe-á de boa fé comunicar ao vendedor a falta de conformidade do bem adquirido [Em sentido contrário, Perera, als. (2002, 135), e Grynbaum (2000, 8)]. No que respeita, porém, ao direito português até então vigente, a solução significava uma alteração para o dobro, pelo menos, do prazo considerado para a denúncia [Vc. Considerando (19) da Directiva. Além das alterações à LDC, teria sido conveniente harmonizar os restantes prazos de denúncia, tais como os previstos nos arts. 916/2 e 1220 CC.].


Em todo este domínio, por fim, o DL 67/2003, actualmente em vigor, dispõe, no art. 5/1, que o comprador pode exercer os direitos que lhe são conferidos, quando a falta de conformidade se manifestar dentro de um prazo de dois anos, acaso se trate de coisa móvel. Na outra vertente, o referido diploma legal estabelece, concorde, que nessas circunstâncias o consumidor deve denunciar ao vendedor a falta de conformidade num prazo de dois meses e reclamar judicialmente, em caso de inêxito, nos seis meses subsequentes. Os prazos estabelecidos pelo DL 67/2003 são prazos de caducidade [Art. 5/4 DL 67/2003].

14. Ora bem! como ensinou Galvão Telles, as normas jurídicas são também mortais, podem sofrer modificações durante a sua existência e, chegado o momento, deixam de estar lá: o legislador, porque estimou desadequada a regulamentação, intervém em ordem a determinar o termo de vigência da norma antiga ou a substitui-la por lei nova.

E é assim que as leis deixam em regra de vigorar por revogação, nomeadamente quando se verifica uma incompatibilidade temporal entre o seu próprio regime e o que se encontra consagrado de seguida, predominante a lei nova, quanto mais não seja por representar uma manifestação mais recente da vontade do legislador. E de todo, se for caso de lei geral contra lei geral, como é no caso vertente.

Deixados outros problemas, teremos aqui de enfrentar, no contexto da aplicação das leis no tempo, a questão do conflito sucessivo: em princípio, uma lei vigora enquanto não for substituída por outra e aplica-se a todos os casos do seu condicionalismo, não podendo aplicar-se às situações anteriores ao começo de vigência, perante as quais não vigorava o imperativo nelas contido.

Diz-nos, por isso mesmo, o art. 12 CC que a lei só dispõe para o futuro. Contudo, uma coisa é dizer que uma lei só se aplica para o futuro e outra é aceitar que pode prolongar eficácia para além do respectivo termo. É o caso do problema da irretroactividade das leis ou conflito de leis, i.é, de saber que lei é aplicável a uma situação criada à sombra de uma lei anterior, situação que ainda persiste quando a lei nova surge, estabelecendo para ela regime diferente.

Por conseguinte, se uma situação ainda existir quando a lei nova começa a vigorar, devemos interrogarmo-nos sobre quais os efeitos da situação em causa que continuam a ser regulados pela lei antiga, e quais os que passam, desde logo, a ser regulamentados pela lei nova.

O já citado art. 12 CC, para além do preceito geral aludido, estabeleceu três regras fundamentais: (i) ressalva dos efeitos já produzidos; (ii) salvaguarda dos factos passados; (iii) retroactividade da lei reguladora da substância. Com efeito, no que aqui mais nos importa, quando a lei dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhe deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações jurídicas já constituídas que subsistam à data da sua entrada em vigor, ou seja, em caso de situações jurídicas de execução duradoura deve aplicar-se a lei nova que a seu respeito venha a ser criada, desde que a situação se mantenha.

No caso vertente verificam-se aspectos tanto de aplicação da lei antiga como da lei nova. Assim, devendo ser considerados factos passados o incêndio, a denúncia e a reclamação em juízo, aplicar-se-lhe-á a lei antiga. Pelo contrário, a lei nova é aplicável ao ónus da prova, já que a caracterização do defeito como desconformidade com o contrato, provem, em todo o caso, da LDC, na versão inicial.

E segundo esta perspectiva, parece muito claro que um automóvel ardido não é bem conforme ao contrato, trata-se, portanto, de artigo comercial com defeito originário, no caso concreto, sob garantia voluntária de um ano: procederá o pedido se os prazos de caducidade da denúncia e da reclamação litigiosa tiverem sido cumpridos.

15. Mas para contarmos esses prazos, haverá de estudar qual é a relevância, aqui, do efeito directo da legislação comunitária ou da aplicabilidade directa das normas comunitárias que vimos poderem estar em jogo.

O efeito directo das directivas, nas relações entre particulares, segundo a jurisprudência do TJCE, depende da clareza, precisão e incondicionalidade das suas normas (basicamente não deixar às instâncias nacionais margem para preenchimento do conteúdo normativo). No que toca à horizontalidade desse efeito (entre particulares), têm de ser destacados 3 passos: (i) a obrigatoriedade dos tribunais nacionais interpretarem o direito nacional à luz do texto e da finalidade das directivas; (ii) um ulterior recuo, porque a concessão de direitos e obrigações aos particulares é uma competência que a Comunidade apenas pode exercer através do seu poder de produzir regulamentos; (iii) um mais recente avanço, no sentido de atribuir, sob certas condições, a uma directiva efeito directo materialmente horizontal.

Numa síntese particularmente conseguida de um autor: as disposições do direito comunitário - todas elas, independentemente da sua fonte (originária ou derivada), da sua natureza e do seu nível hierárquico - a partir do momento em que entram em vigor na ordem comunitária inserem-se automaticamente, de pleno direito, na ordem jurídica interna dos Estados-membros, passando consequentemente a fazer parte, em posição de primazia do complexo jurídico (corpus juris) que todos os órgãos do Estado ficam obrigados a acatar; tais disposições, desde que sejam normas de direito positivo, incondicionais e precisas…atingem todos os sujeitos de direito comunitário (públicos e privados), na respectiva esfera jurídica, habilitando-os a invocá-las perante os tribunais nacionais sempre que nisso tenham interesse legítimo.

Ora bem! A directiva 1999/44CE, 25.05 estava já em vigor, mas não transposta, mal ocorreu o incêndio e contém normas justamente com as características acima apontadas: fixa os dois anos do prazo de direito material para a garantia de substituição do automóvel desconforme ao contrato e sessenta dias para a denúncia.

Fixando o diploma comunitário que num determinado prazo se presume a desconformidade coeva à entrega, de qualquer modo, ainda que não se aceitasse a posição antecedente quanto à aplicabilidade da lei nova no campo do ónus da prova, é certo que o sistema da aplicabilidade directa da Directiva na modalidade de obrigatoriedade da interpretação do Direito nacional vigente e não uniformizado de acordo com o Direito comunitário, verteria no prazo de 1 ano da LDC a inversão crítica.

16. Por conseguinte, já não será o regime para que faz apelo a Reclamante a poder aplicar-se a este caso de litígio entre um consumidor, adquirente, e um profissional, conferindo garantia ao automóvel que aquele tomou de outrem, ainda assim autorizado a endossá-la [Automóveis B.........., muito embora chegue a argumentar não ter o vendedor a qualidade de seu representante, nunca negou a validade da garantia.], mas o regime integrado da LCD e da Directiva, e nos aspectos do ónus da prova no horizonte do DL 67/2003: no caso em espécie, considerado o prazo de dois anos após a entrega como limite da substituição do bem adquirido, inverso o desígnio probatório da posteridade sem culpa ou devida a caso fortuito, e tendo em conta que, na verdade, a denúncia, segundo a prova, foi quase imediatamente veiculada à R., muito antes dos dois meses, enquanto os outros prazos, nomeadamente o da propositura da acção, estavam e permaneceram de pé entre o incêndio e a entrada em Juízo [01.09.17 foi o primeiro dia útil após as férias grandes desse ano e o prazo de 6 meses terminou em 01.07.25: tem, neste caso, de ser aplicado o disposto], não podem deixar de confirmar o despacho reclamado, assumido, por isso mesmo neste acórdão [Ref. Bibl.
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IX. Custas: sem custas, por se tratar de acto necessário ao recurso.

Porto, 05.03.07
António Augusto Pinto dos Santos Carvalho
Baltazar Marques Peixoto
António José Pinto da Fonseca Ramos