Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1106/12.9YYPRT-B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ALBERTO RUÇO
Descritores: NULIDADE DE SENTENÇA
LIVRANÇA EM BRANCO
PACTO DE PREENCHIMENTO
SOCIEDADE
AVAL
RESPONSABILIDADE DO AVALISTA
PROTESTO
ERRO SOBRE OS MOTIVOS
RELAÇÕES IMEDIATAS
Nº do Documento: RP201506291106/12.9YYPRT-B.P1
Data do Acordão: 06/29/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – A nulidade de sentença que consiste em os fundamento estarem em oposição com a decisão, nos termos do disposto na alínea c), do n.º 1, do artigo 615.º do Código de Processo Civil, é um vício de natureza processual que consiste num erro lógico patenteado pelo raciocínio exposto na sentença, ou seja, só há nulidade de sentença quando o dispositivo da sentença está em contradição com as premissas antes adoptadas pelo juiz (com as premissas que o juiz efectivamente adoptou e não com as premissas que ele poderia ter adoptado, mas não adoptou).
II – Se à data da assinatura de uma livrança em branco, aparelhada com pacto de preenchimento, só era exigível uma assinatura por parte da gerência para obrigar a sociedade, é irrelevante a exigência estatutária, posterior, de duas assinaturas, na altura em que a livrança foi preenchida.
III – O beneficiário da livrança não carece de proceder ao protesto para demandar o avalista da sociedade subscritora, principalmente quando o avalista é representante legal da subscritora da livrança e não podia ignorar a falta de pagamento da livrança por parte da sociedade que representa.
IV – O erro vício (n.º 1 do artigo 252.º do Código Civil) tem de se referir a uma representação da realidade passada ou contemporânea em relação ao momento da conclusão do negócio e é necessário que as partes quando contrataram tenham («houverem», diz a lei) reconhecido por acordo (coincidência entre as partes quanto à representação e valoração da mesma realidade) que o motivo A, B, ou C era causal para levar uma das partes ou ambas a contratar nos termos em que o fizeram.
V – Em regra, o avalista apenas poderá invocar, perante o credor, o pagamento por parte do devedor seu avalizado. Ressalvam-se os casos em que o avalista, nessa qualidade, intervém no contrato que dá origem à livrança, do qual resultou a dívida cambiária avalizada, pois, nesta parte, o avalista não é terceiro, mas sim parte nesse contrato.
Se desse contrato resultarem relações jurídicas que lhe tenham concedido direitos ou deveres, estamos no domínio das relações imediatas, pois não há aqui interposição de outras pessoas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Tribunal da Relação do Porto – 5.ª secção.
Recurso de Apelação.
Processo n.º 1106/12.9YYPRT-B do Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Instância Central – 1.ª Secção de Execução – J5.
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Juiz relator – Alberto Augusto Vicente Ruço.
1.º Juiz-adjunto……Joaquim Manuel de Almeida Correia Pinto.
2.º Juiz-adjunto…….Ana Paula Pereira de Amorim.
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Sumário:
I – A nulidade de sentença que consiste em os fundamento estarem em oposição com a decisão, nos termos do disposto na alínea c), do n.º 1, do artigo 615.º do Código de Processo Civil, é um vício de natureza processual que consiste num erro lógico patenteado pelo raciocínio exposto na sentença, ou seja, só há nulidade de sentença quando o dispositivo da sentença está em contradição com as premissas antes adoptadas pelo juiz (com as premissas que o juiz efectivamente adoptou e não com as premissas que ele poderia ter adoptado, mas não adoptou).
II – Se à data da assinatura de uma livrança em branco, aparelhada com pacto de preenchimento, só era exigível uma assinatura por parte da gerência para obrigar a sociedade, é irrelevante a exigência estatutária, posterior, de duas assinaturas, na altura em que a livrança foi preenchida.
III – O beneficiário da livrança não carece de proceder ao protesto para demandar o avalista da sociedade subscritora, principalmente quando o avalista é representante legal da subscritora da livrança e não podia ignorar a falta de pagamento da livrança por parte da sociedade que representa.
IV – O erro vício (n.º 1 do artigo 252.º do Código Civil) tem de se referir a uma representação da realidade passada ou contemporânea em relação ao momento da conclusão do negócio e é necessário que as partes quando contrataram tenham («houverem», diz a lei) reconhecido por acordo (coincidência entre as partes quanto à representação e valoração da mesma realidade) que o motivo A, B, ou C era causal para levar uma das partes ou ambas a contratar nos termos em que o fizeram.
V – Em regra, o avalista apenas poderá invocar, perante o credor, o pagamento por parte do devedor seu avalizado. Ressalvam-se os casos em que o avalista, nessa qualidade, intervém no contrato que dá origem à livrança, do qual resultou a dívida cambiária avalizada, pois, nesta parte, o avalista não é terceiro, mas sim parte nesse contrato.
Se desse contrato resultarem relações jurídicas que lhe tenham concedido direitos ou deveres, estamos no domínio das relações imediatas, pois não há aqui interposição de outras pessoas.
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Recorrente/Executado………B…, residente em Rua …, n.º … º Esq., ….-… Porto.
Recorrido/Exequente………..C…, S.A., com sede em …, n.º .., ….-… Porto.
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I. Relatório
a) O presente recurso vem interposto da sentença que julgou improcedente a oposição que o executado, agora recorrente, deduziu contra a execução que o C…, SA, lhe move, com o fim de obter dele o pagamento da quantia de 1.551.312,23 EUR e juros.
A responsabilidade do recorrente resulta de um aval prestado à empresa D…, S.A., inserido em livrança assinada em branco, que ficou na posse do banco exequente, após ter sido celebrado um pacto para o respectivo preenchimento, também assinado pelo executado, o qual integrou um contrato de empréstimo de 5.500.000,00 EUR, feito àquela empresa pelo exequente, da qual o executado era, à data, administrador.
b) As conclusões do recurso são as seguintes:
«QUANTO À FALTA DE PROTESTO DAS LIVRANÇAS
1. Por decisão proferida em 22/05/2013, entendeu o Tribunal à Quo que o protesto não é um pressuposto do portador da letra (ou da livrança) contra o seu avalista.
2. A tese da desnecessidade de protesto no domínio da L.U.L.L. para efeitos de accionamento do avalista do aceitante (como os ora Recorrentes) baseia-se numa interpretação do art. 32 – I da L.U.L.L. injustificada.
3. A justificação dessa interpretação do art. 32-I baseia-se na acessoriedade obrigacional da garantia do aval e considera que a matéria dos pressupostos está sob o império dessa acessoriedade.
4. No entanto, isso é o mesmo que dizer que a obrigação do avalista depende dos pressupostos da obrigação avalizada, mas no sentido de que estes condicionam a sua validade e eficácia e o artº 32º-II contraria aquele resultado da interpretação do art. 32-I de acordo com a ideia de acessoriedade obrigacional.
5. Acresce ainda que nos termos do aludido artigo só resulta que ele contem uma norma sobre o conteúdo da obrigação do avalista, dizendo COMO este responde e não QUANDO este responde.
6. Esta matéria dos pressupostos ou condições da responsabilidade dos subscritores de letra de câmbio – que existe quando não há recusa de pagamento pontual do título por quem está nele indicado para pagar – está regulada quanto a todos eles (incluindo o aceitante) no Capítulo VII, artºs 43 e sgs (mas conferir também o art. 28 –II).
7. A pretensa especialidade do art. 33-I, relativamente ao art. 53-I, foi simplesmente afirmada e não demonstrada e só é compreensível partindo do pressuposto não demonstrado de que o art. 32 regula especificamente a matéria dos pressupostos do aval no sentido já criticado acima.
8. Quanto ao argumento de que a L.U.L.L. não revela claramente o propósito de romper com a tradição, basta confrontar os art. 336, parágrafo único, e art. 314 § 5 do Código Comercial, para ver as profundas diferenças entre o direito uniforme e o direito anterior. O argumento histórico é, neste caso, pouco significativo, tanto mais que o facto de não ter passado para o texto do art. 53º uma referência expressa ao avalista que existia nos seus antecedentes também pode ser interpretado no sentido de que não quis tomar posição ou quis mesmo consagrar a tese contrária.
9. Também o argumento do art. 43º é de pouco significado, já porque o instituto do protesto tem primazia sobre o dos avisos, já porque bem pode percorrer-se o caminho inverso ao da doutrina e jurisprudência e interpretar-se o art. 45º no sentido de que o aceitante deve avisar o seu avalista sob pena de poder responder perante ele.
10. Bem mais significativo, é o facto de que os partidários da tese da desnecessidade do protesto face ao avalista do aceitante se vêem obrigados a corrigir, não só a interpretação do art. 53-I, mas também a dos art. 43.º, 46.º, etc.
11. E, dentro deste campo dos argumentos formais, é importante anotar-se o seguinte: se se entende que no art. 53º se omitiu uma referência ao avalista do aceitante porque escusada em face do art. 32-I, que regularia especialmente a matéria dos pressupostos da responsabilidade do avalista, o mesmo deverá suceder quanto a todos os demais avalistas, uma vez que não pode admitir-se dispor o art. 32-I apenas sobre o avalista do aceitante (quem seriam, então, “ou outros co obrigados” a que se refere o art. 53.º).
12. Finalmente, no seguimento da interpretação dada ao art. 32-I, resultaria que os avalistas do sacador e dos endossantes seriam como estes obrigados de regresso enquanto que o avalista do aceitante seria obrigado direto, obrigado perante o portador independentemente de este apresentar ou não a letra a letra a pagamento ao aceitante; mas esta consequência lógica do pensamento da doutrina e jurisprudência subjacente à tese da desnecessidade do protesto face a este avalista é contra legem e este facto revela que ela é insustentável.
13. A lei faz uma distinção clara entre, por um lado, a obrigação do aceitante da ordem de pagamento nela contida de a pagar no vencimento, decorrente do seu acto de aceite (art. 28-I), que coexiste com a garantia desse pagamento assumida voluntariamente pelos avalistas (art. 30-I) e decorrente do saque e dos seus endossos, e, por outro lado, a responsabilidade de todos os subscritores, incluindo o aceitante, pela recusa de pagamento (que pressupõe a apresentação pontual da letra pelo portador ou sacado para a pagar).
14. Não havendo recusa de pagamento porque o portador nem sequer cumpriu o ónus de apresentar a pagamento a quem estava indicado no título para o fazer, do título só resulta a obrigação do aceitante. Os garantes do pagamento não são obrigados a cumprir a obrigação do aceitante em vez dele e, mesmo que assim fosse no caso do avalista do aceitante (dentro da teoria do aval-garantia da obrigação avalizada), essa sua obrigação dependeria da recusa de pagamento do obrigado principal. Só estaria, então, em causa saber se essa recusa deverá admitir, em princípio, como único meio de prova contra o avalista do aceitante o protesto ou não.
15. Quanto ao argumento de que o credor não precisa de provar a não satisfação do seu crédito garantido por fiança pelo devedor principal, é de notar que, por um lado, o direito de acção do credor contra o fiador pode ter como pressuposto o não pagamento pontual imputável ao devedor principal, e, por outro, sendo esse o caso, o fiador deve, pelo menos, poder provar que esse pressuposto não se deu.
Cabendo em princípio ao portador da letra apresentá-la – no tempo do vencimento ao sacado (aceitante), no local de pagamento (o domicílio deste), para que a pague – e dado o disposto nos artºs 33 sgs – o invocado paralelismo com a fiança só existiria na hipótese acabada de considerar.
16. Ora, relativamente ao avalista do aceitante:
A/ Para além de se querer fazer crer que o portador tem sempre contra ele um direito independentemente daquele pressuposto material,
B/ Nega-se-lhe a própria possibilidade de opor ao portador que ele não cumpriu o ónus de apresentar a letra a pagamento no tempo em que ela era pagável,
C/ Nega-se-lhe, quanto ao ónus de prova de recusa de pagamento, razões de segurança que o legislador considerou ponderosas relativamente ao demais garantes (e que também deviam valer para ele).
17. De qualquer forma, este argumento só seria de considerar dentro dos quadros da concepção do “aval/fiança”, hoje, pelo menos formalmente, abandonada e incompatível com a L.U.L.L..
18. Ou seja, e em síntese a doutrina e jurisprudência dominantes não só não observaram as regras gerais de interpretação das leis ao determinar o sentido dos preceitos da L.U., como também não demonstraram que o art. 53-I devesse ser corrigido em resultado da sua conjugação com o art. 32-I, porque dá a esta disposição um sentido amplíssimo que não cabe nos seus termos, sem qualquer justificação para o fazer ou fazendo-o com base num conceito de acessoriedade impróprio mesmo nos quadros da concepção do “aval/fiança”.
19. Como salientou e salienta a doutrina contrária o avalista do aceitante é, como os demais, um garante do pagamento da letra (art. 30-I), responsável como eles no caso de este ser recusado, nos termos dos art. 43 e ss, sendo o art. 53-I um corolário desta concepção do aval resultante da L.U.L.L.
20. Há assim que defender que: O aval constitui uma garantia do pagamento pontual da letra por quem está no título para o fazer. O portador da letra aceite e não protestada (não tendo sido o protesto dispensado) não é detentor de qualquer direito contra o avalista do aceitante, porque a responsabilidade deste não se constituiu. E, o que se refere para a letra vale com valor acrescido para a livrança.
21. A livrança consubstancia uma promessa de pagamento de determinada quantia, numa determinada época e lugar de pagamento. O avalista garante voluntariamente com a sua assinatura o mesmo resultado que o obrigado inicial (sacado, subscritor, cuja garantia é um efeito necessário do saque ou subscrição), e que os endossantes (cuja garantia é um efeito natural do endosso) legalmente garantem e que o sacado ou subscritor “promete” com o seu aceite: garante o pagamento pontual da letra ou da livrança.
22. Um confronto do art. 30-I com os art. 9 e 15, por um lado, e com os artigos dos quais se retira a “a noção de pagamento da letra” não pode deixar dúvidas quanto a isto (acresce que o art. 32-II afasta a outra hipótese interpretativa que seria a de considerar o avalista como garante do cumprimento da própria obrigação do avalizado) e, porque garante esse pagamento fundado na confiança que lhe inspira a assinatura daquele por quem dá o seu aval, a operação avalizada é a medida máxima da sua garantia e, dentro dos seus limites, o crédito natural (cfr art. art. 30-I) de medida desta (implícito no art. 32-I).
23. E também são destinatários e beneficiários da sua garantia os destinatários da operação avalizada (implícito no art. 32-I).
24. Do teor da letra ou livrança, quando chega ao tempo em que é pagável, pode, assim, resultar, além da ordem ou promessa de pagamento subscrita pelo sacador (ou aceitante) e da correspondente garantia deste de que ela será cumprida nos termos em que está titulada (artº 9º), o aceite dessa ordem pelo seu destinatário (art. 21 e sgs), e a correspondente obrigação de a acatar nos termos em que está titulada e aceite (art. 28-I, cfr art. 26º), um ou vários endossos e as correspondentes garantias dos endossantes de que a ordem (ou promessa) de pagamento constante do título será cumprida nos seus termos e, finalmente, as garantias desse cumprimento em termos correspondentes aos da operação avalizada, direta e voluntariamente constituídas pelos avalistas.
25. Sendo o título efetivamente pago, o resultado cuja produção o sacado ou subscritor “prometera” com o seu aceite, e o sacador, endossantes e avalistas garantiram, confirma-se e a letra “morre”. Mas pode dar-se o caso de o título não ser apresentado pelo portador ao pagamento do sacado ou do subscritor (no caso da livrança) no tempo e no lugar em que ela é pagável. Neste caso o seu pagamento não ocorre mas também não é recusado. O portador (cfr art. 42º) continua titular de um documento contendo um direito de crédito (pela importância no título mencionada e no titulo aceite) sobre o aceitante (ou aceitantes) – art. 28-I (cfr art. 55 e sgs)- ou sobre quem, não tendo eficazmente aceitado ou subscrito o título assumiu, apesar disso, com uma sua declaração de aceite, a obrigação de a pagar (art. 26-II e cfr art. 29º). As garantias porém – que eram garantias de que o título seria pago no tempo de vencimento à apresentação do título – extinguiram-se.
26. Mas, quem garante que o título é pagável no tempo e lugar do pagamento por quem está nela indicado para pagar à simples apresentação do título, torna-se responsável perante o portador (e demais beneficiários da sua garantia), pelo não pagamento que ocorra dentro desse circunstancialismo, isto é, pela recusa de pagamento que eventualmente se verifique – desde que o portador faça “comprovar” pontualmente por protesto essa recusa (art. 43 e sgs).
27. E o próprio sacado ou subscritor que, tendo aceite a ordem ou promessa de pagamento constante da letra ou da livrança (respetivamente), se recusou a cumpri-la (isto é, não pagou o título que lhe foi apresentado no tempo e no lugar em que era pagável) é igualmente responsável por essa recusa (art. 28-II; cfr 43 e sgs) – sem ter o portador que provar contra si, por protesto, o não pagamento, uma vez que, pela natureza das coisas ele já sabe que não o fez.
28. O título está, então, definitivamente não pago, isto é, o cumprimento da ordem de pagamento dele constante deixou de ser possível (cfr art. 1 – 3 a 5, 28-II, 43 e sgs, 48 da L.U.) O título protestado é, então, representativo de uma relação obrigacional de regresso, que abrange todos os responsáveis pelo não pagamento ocorrido, nos termos dos art. 47 e sgs.
29. Consequentemente com o que acaba de expor-se, o art. 53-I dispõe que o portador da letra não protestada apenas tem direito de acção contra o aceitante (nos termos da sua obrigação de pagar (cfr 28 –I) ou nos termos da sua responsabilidade pelo não pagamento (cfr. Art. 28-II, art. 43 e sgs) – que é quem estava incumbido de pagar e aceitará essa incumbência – mas não contra os garantes do seu pagamento, contra quem ela não tem (legalmente) meio de provar que a recusa se deu.
30. O avalista do aceitante está na mesma posição dos demais garantes do pagamento da letra ou livrança. Ele garantiu como os outros ao portador que o título lhe seria pago no tempo e no lugar do pagamento pelo sacado, subscritor ou aceitante, à simples apresentação do título e, portanto, assumiu a responsabilidade por uma eventual recusa desse pagamento. Mas tal responsabilidade não se constitui pela simples ocorrência desse facto: é necessário ainda que o portador possa prová-la pelo meio de prova admitido na L.U. – o protesto.
31. A questão dos pressupostos cambiários gerais da responsabilidade do avalista está regulada na lei uniforme fora do capítulo relativo ao aval. Só uma vez verificado que o avalista pode ser em geral responsável pelo não pagamento do título é que tem interesse ver se ele é efetivamente responsável (art. 32-II) e qual a medida ou conteúdo da sua responsabilidade (art. 32-I). A questão do protesto surge no primeiro momento, isto é, logicamente antes de se analisar a relação que existe entre o aval e a operação avalizada à luz das disposições dos art. 30º e sgs.
32. Temos, assim, que o avalista do aceitante, como qualquer outro garante pelo título só responde pela falta de pagamento do mesmo pelo sacado, subscritor ou aceitante (isto é, pela falta de cumprimento por este da ordem ou promessa de pagamento aceite dela constante) que ocorre quando ela é apresentada a este para o efeito na época de pagamento; e desde que tal facto se comprove por protesto.
33. Ao decidir como decidiu, violou o Tribunal recorrido, por erro de interpretação e ou aplicação as disposições aplicáveis ao caso, designadamente os arts. da LULL acima invocados, com especial incidência no art. 32º e 53º, do que decorre dever ser revogada a decisão que considerou improcedente a falta de protesto e ser substituída por outra que declare a inexistência da dívida pretensamente titulada e a inexigibilidade do título por falta de protesto.
34. Acresce que o entendimento referido viola os princípios da igualdade e da proporcionalidade, consagrados nos arts. 13º, 18º nº 2 e 202º, nº 2 da CRP, pois nenhuma razão existe para discriminar negativamente o avalista do subscritor de uma livrança dos avalistas dos outros co-obrigados e, mesmo, desses outros co-obrigados.
QUANTO À NÃO REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA PRELIMINAR (DECISÃO ESTA PROFERIDA POR DESPACHO DE 22.05.2013)
35. Entendeu o Tribunal a quo não ver “qualquer utilidade na realização da audiência preliminar, pelo que se decide dispensá-la”
36. A audiência preliminar introduzida pela reforma do C.P.C. é um verdadeiro espaço de eleição de funcionamento do princípio da cooperação que o legislador afixou na norma do artº 266º, pois aí poderá o tribunal tentar a conciliação, solicitar todos os esclarecimentos, sugerir todos os aperfeiçoamentos, receber e provocar toda a discussão dos diversos aspectos jurídicos relevantes, sanear a causa e seleccionar a matéria de facto interessante, já assente ou a submeter a audiência final ou mesmo a julgar-se habilitado a decidir de mérito, numa óptica de debate leal, exaustivo e permanente - Cfr. Pereira Baptista, Reforma do P. C. - Princípios Fundamentais, 1997, p. 76.
37. A importância da audiência preliminar, leva a que, em sede de processo ordinário, a sua realização seja a regra:
38. Todavia, a oposição à execução, após a contestação, segue, sem mais articulados, os termos do processo sumário de declaração, conforme resulta do nº 2 do art. 817 do CPC. Logo, a audiência preliminar só se realizará «quando a complexidade da causa ou a necessidade de atuar o princípio do contraditório o determinem» - nº 1 do art. 787 do CPC.
39. Ora, no presente caso a causa é manifestamente complexa. Nos termos do Acórdão da Relação de Lisboa de 21.10.2010, (in dgsi), não é possível dispensar a realização da audiência preliminar, porquanto a apreciação da causa não reveste manifesta simplicidade.
40. O conceito de simplicidade (qualidade do que é fácil de resolver, do que não é complicado, não complexo) é um conceito a preencher, caso a caso, pois resulta de variadas circunstâncias.
41. Desde logo, e segundo o próprio critério legal (art. 705º do CPC), por haver uma solução jurisprudencial uniforme e reiterada; mas também porque pela sua própria natureza a questão não suscita a intervenção de significativo arsenal argumentativo ou de complexa ponderação para a generalidade das pessoas medianamente qualificadas; ou, numa perspetiva contrária, por existir mais do que uma solução de direito, dependendo as mesmas dos possíveis e vários silogismos judiciários de quem julga.
42. No presente caso não é possível dispensar a realização da audiência preliminar, porquanto a sua apreciação não reveste manifesta simplicidade.
43. A complexidade existente resulta patente da quantidade de documentos juntos e da densa relação contratual espelhada entre a Exequente, o Opoente, o outro Executado e a D…, S.A.
44. A complexidade da causa impunha a realização da audiência preliminar e a sua omissão poderá influir no exame ou decisão da causa.
45. A decisão de dispensa a audiência preliminar viola, por erro de interpretação, os artigos 817º nº 2 e 787 .º do C.P.C., impondo-se a sua revogação e substituição por outro que ordene a realização da audiência preliminar.
QUANTO À MÁTERIA DE FACTO ASSENTE E Á BASE INSTRUTÓRIA
46. Por despacho de 22/05/2013, foi dado como assente que “Em 22/12/2011, a Exequente remeteu ao executado/opoente a carta de fls 341, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, comunicando-lhe o preenchimento da livrança pelo valor de €1.551.312,23, com vencimento fixado para o dia 28/12/2011. (Alínea AO da Matéria Assente- Facto 40 da Fundamentação)”
47. Junto à cópia da Contestação da qual o Recorrente foi notificado não constava qualquer carta enviada pelo Exequente ao Executado mas unicamente um aviso de receção em que o destinatário consta com sendo o Executado e a morada de devolução é a do C…, não estando tal aviso de receção carimbado pelos correios, não tendo qualquer código de barras, nem estando assinado no destino (é um aviso de recepção novo, que nas condições em que se encontra nada prova quanto ao envio ou recepção de qualquer carta.)
48. Ora, perante a Alínea AO da Matéria Assente o Exequente reclamou da inclusão desta matéria nos Factos Assentes porquanto o documento do qual havia sido notificada não era bastante para fazer prova.
49. Subsidiariamente, requereu que caso houvesse qualquer outro documento fosse do mesmo notificado sob pena de nulidade da notificação da Contestação.
50. Tal reclamação foi indeferida, entendendo o Douto Tribunal a Quo que o Recorrente não reclamou previamente de qualquer falta e se tivesse feito uma análise do documento em causa já poderia ter detetado que ao mesmo faltava uma folha.
51. Ora, nos termos do artigo nº 219 nº 3 do C.P.C. as partes tem direito a serem notificadas do conteúdo integral das peças que lhes são dirigidas, sem terem de fazer uma análise das mesmas tendo vista apurar se falta alguma coisa.
52. Os documentos anexos à Oposição foram juntos aos Autos em papel e não eletronicamente pelo que, ao extrair cópias é possível e desculpável que algo tenha falhado.
53. No entanto, não é admissível, nem desculpável, que tendo o Recorrente detetado aquando da seleção da matéria assente que está a ser dada como assente matéria com base em documento do qual não foi notificado, não seja esta falta suprida notificando-o dos documentos em falta.
54. O Recorrente requereu que lhe fosse notificado o documento de fls 341 referido na alínea AO da Matéria Assente, na eventualidade de este corresponder a outro documento que não o aviso de recepção.
55. O Tribunal A Quo não se pronunciou expressamente quanto a este requerimento, como devia (o que consubstancia nulidade por omissão de pronuncia), não tendo no entanto ordenado qualquer notificação.
56. Não tendo a notificação da contestação sido acompanhada de cópia integral de todos os documentos e não tendo tal falta sido suprida, permitindo ao Recorrente impugnar o documento, está tal notificação ferida de nulidade.
57. O direito de defesa do Recorrente - e, por isso, o aludido princípio do contraditório - só será cabalmente satisfeito, caso disponha de todos os elementos juntos pela contraparte, em termos de sobre eles se poder pronunciar, mesmo que toda a factualidade que se alega e se quer provar conste do mesmo articulado de forma detalhada ou minuciosa.
58. O princípio do contraditório só é plenamente observado desde que o Recorrente possa dispor, não só da contestação mas de todos os elementos que com esta sejam juntos.
59. No caso presente tal falta notificação influiu no exame e decisão da causa, porquanto deu dado azo a fixação de matéria provada sem que o Recorrente tivesse sido notificado e se pudesse pronunciar quanto ao documento dado como provado.
60. Estamos perante uma violação do direito de defesa consagrado no art. 20º da CRP e nulidade processual, nos termos do art. 195º do CPC, que expressamente se invoca.
61. Não era exigível ao Recorrente detetar a falta de tal documento, até porque o Exequente faz referência a um documento nº 5 e há um documento nº 5 junto.
62. Ora, o Ac. da RE de 28.09.2006 no processo 1083/05-2, in www.dgsi.pt. estabelece que “havendo dúvida razoável sobre a regularidade da citação, é sempre preferível mandar repetir o acto, de modo a garantir um julgamento equitativo do litígio.”
63. É assim admitido como meio de prova, e valorado no sentido de fazer prova de factos alegados pelo Exequente, um documento que não foi notificado ao Recorrente e sobre o qual este não se pode pronunciar.
64. A decisão de indeferir a reclamação apresentada, admitindo como meio de prova e valorando no sentido de fazer prova de factos alegados pelo Exequente um documento sobre o qual este não se pode pronunciar, viola o princípio do contraditório previsto no artigo 3º nº 3 do C.P.C., impondo-se a sua revogação e substituição por outra que não admita tal meio de prova, com as consequentes alterações na Selecção da Matéria de Facto, sendo dada como não provada a matéria da alínea AO) dos Factos Assentes – Ponto 40 da Fundamentação.
65. Acresce que não tendo a notificação da Contestação sido acompanhada de todos os documentos anexos à mesma é a mesma nula, bem como todos os atos posteriores à mesma. Um entendimento diverso configura uma violação do princípio do contraditório previsto, para além do mais no artº 3 nº 3 do C.P.C., dos direitos de defesa do Exequente e do artigo nº 219, nº 3 do C.P.C.
66. É inconstitucional a interpretação conferida aos artigos 3º nº 3 e 219 nº 3 do C.P.C, que permita considerar como meio de prova documento que não acompanhou a notificação da Contestação e recuse a notificação do mesmo ao Executado mesmo depois deste invocar não ter do mesmo conhecimento, por violação do direito à tutela jurisdicional efetiva previsto no art. 20º da C.R.P.
QUANTO À IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
67. Nos termos do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, que corresponde ao antigo artigo 685.º-B do anterior diploma adjectivo, impende sobre o recorrente que pretenda impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto individualizar os pontos que considera incorrectamente julgados, e os meios probatórios, constantes do processo, que determinariam a resposta, em sentido diverso, aos pontos questionados.
68. Assim, o Recorrente entende que os concretos pontos de facto incorrectamente julgados (art. 640.º, n.º 1, al a) do CPC) são os factos constantes da resposta aos quesitos 6,10, 11, 12, 20 a 31, 38, 48 a 51, 57 a 61, 64 e 65.
69. Os concretos meios de prova que impõe decisão diversa (art. 640.º, n.º 1, al. b) do CPC) são os seguintes:
a) Prova Testemunhal: E…, F…, G…, H…, I…, J…
b) Prova Documental: Documento nº 55 junto à Oposição (doc. de fls. 622) Documento nº 66 junto à Oposição (doc. de fls. 212); Documento nº 1 junto à Contestação do C…, Documento nº 49 junto à Oposição
70. Entende o Recorrente que sobre as questões impugnadas deve ser proferida a seguinte decisão (art. 640.º,n.º 1, al. c) do CPC)
Quesitos 6, 11, 12, 20 a 29, 38, 48 a 51, 57 a 61, 64, 64: Provados - Quesito 10: Provado apenas que na decorrência da declaração de insolvência da D…, após o accionamento da livrança e posteriormente à validação dos créditos reclamados no processo de insolvência, executado/opoente solicitou à Dra. H…, do departamento de economia, que efectuasse o levantamento das suas responsabilidades pessoais na qualidade de garante da empresa.
- Quesito 30: Pelo menos no que diz respeito ao terceiro contrato de instrumentos financeiros a D… encontrava-se numa posição de total subjugação perante a Exequente
- Quesito 31: Pelo menos no que diz respeito ao terceiro contrato de instrumentos financeiros a D… via-se obrigada a aceitar o que lhe era proposto (e a fazer o que lhe mandavam) de modo a manter a sobrevivência
DA FUNDAMENTAÇÃO / ENQUADRAMENTO JURÍDICO
71. Conjuntamente com a fundamentação da alteração da matéria de facto são tratadas as diversas questões objecto de controvérsia e o seu enquadramento jurídico, tanto mais em face Tribunal A Quo referir (em nota de rodapé nº 5) que na análise de algumas das questões é seguida muito de perto e por vezes reproduzida na íntegra as considerações desenvolvidas na apreciação crítica das provas aquando das respostas sobre a matéria de facto, acrescentando-lhe reflexões jurídicas julgadas pertinentes
(I) O grau de envolvimento do executado/opoente B… na contratação do financiamento bancário da D… junto do C… e o seu conhecimento do que foi contratado
72. Na apreciação desta questão, e com base na matéria dada como provada, conclui o Digno Tribunal a Quo que o contrato de crédito denominado RLS nº …….., na sua versão inicial (18/02/2009) foi concluído através de negociação directa do executado/opoente com a exequente.
73. Ora, tal conclusão não decorre de qualquer ponto da Fundamentação e está até em contradição com a matéria dada como provada, nomeadamente os pontos 43 a 45 da Fundamentação.
74. Estamos, nesta medida perante uma nulidade, porquanto o fundamento está em oposição com a decisão, estando, por isso, a sentença ferida de nulidade, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, o que se invoca.
(II) a alegada impossibilidade de negociação das condições dos contratos e a falta de comunicação e de explicação do respectivo clausulado (III) o alegado desconhecimento e falta de percepção do executado/opoente da integralidade da relação com o C…, dos prejuízos repetidos e reiterados a que a D… se encontrava sujeita, da relação de total subjugação existente, do incumprimento de instruções dadas, tudo configurando uma verdadeira “extorsão”, que o levaria a não prestar qualquer aval, tendo incorrido em erro sobre o objecto, termos e condições do negócio aquando da celebração dos contratos, erro que afectou decisivamente a vontade de contratar, o que era do conhecimento da exequente ou, pelo menos, não poderia ignorar
75. Para fundamentar a sua posição jurídica quanto a estas questões (e outras) o Tribunal a Quo teve, em grande medida, em consideração o testemunho do Sr. Dr. I…, não tendo tido, em momento algum, em consideração, na apreciação de tal depoimento, o depoimento do Engº J…, a 13 de Junho de 2014, que referiu a existência de um mau certo decorrente do Dr. I… ter sido questionado sobre estas questões que levou a que, após a aprovação do Plano de Insolvência este tivesse abandonado a empresa.
76. Entende o Tribunal que a negociação dos contratos não passa tanto pela comunicação e explicação formal de cada uma das cláusulas, mas antes pela análise das condições que cada uma das partes considera essenciais, designadamente prazo, taxa de juro, planos de amortização, garantias e uma ou outra cláusula considerada necessária.
77. Tal não pode merecer a concordância do Executado. A complexidade técnica destes contratos e das cláusulas constantes dos mesmos (cláusulas estas, na sua maioria das vezes, impostas e não negociáveis) impõe que estas sejam explicadas não se podendo anuir em que seja aceitável que a análise dos contratos de financiamento seja efectuada a partir de uma ficha técnica contendo os elementos ditos essenciais.
78. Da prova produzida resulta que efectivamente o Executado não conhecia a integralidade da relação com o C…, nomeadamente a contratação dos contratos de empréstimo, incumprimento do acordado e das instruções dadas no âmbito do contrato de empréstimo garantido pela livrança aqui em causa, o débito indevido de juros nas contas correntes caucionadas, bem como as questões relativas aos contratos de swap e outros instrumentos financeiros.
79. Os Quesitos que dizem respeito a esta questão são os quesitos 6, 10, 57 a 61, 64 e 65, tendo os Quesitos 6, 64 e 65 sido dados como não provados e tendo sido dada resposta restritiva aos Quesitos 10 e 57 a 61 (respectivamente ponto 47 e ponto 72 da Fundamentação da Sentença)
80. Relativamente ao Quesito 10 foi dado como provado o que consta do ponto 47 da Fundamentação: Na decorrência da declaração de insolvência da D…, o executado/opoente solicitou à Dra. H…, do departamento de economia, que efectuasse o levantamento das suas responsabilidades pessoais na qualidade de garante da empresa.
81. Relativamente aos Quesitos 57 a 61 foi dado como provado o que consta do ponto 72 da Fundamentação: O executado/opoente só tomou conhecimento das aludidas divergências depois de ter sido entregue o levantamento referido na resposta ao Quesito 10º.
82. No âmbito do enquadramento jurídico da sentença (na análise da II e III questões aqui em causa) vem o Digno Tribunal a Quo definir temporalmente a altura em que executado/opoente solicitou à Dra. H… que efectuasse o levantamento das suas responsabilidades pessoais – a data da insolvência da D…: 16 de Maio de 2011. Ora, se dúvidas existiam quanto ao acerto da resposta dada a este Quesito elas dissipam-se com esta definição temporal.
83. Em lado algum do seu depoimento a testemunha H… refere ter feito tal levantamento em Maio de 2011. A Dra. H… refere que fez um levantamento posteriormente à insolvência, na sequência de accionamento de uma livrança do C… (cabendo fazer notar que o Oponente foi citado para tal accionamento só a 10.04.2012). A testemunha refere expressamente que tal levantamento não se encontrava feito aquando da verificação dos reclamados e só foi feito posteriormente, numa fase de maior acalmia.
84. A testemunha G… confirma tal enquadramento temporal, referindo que o levantamento foi feito aquando do presente processo (já após a verificação dos créditos reclamados na insolvência) e que o Opoente ficou surpreendido com o nível de responsabilização, referindo ainda que a análise feita foi extremamente complexa.
85. Impõe-se assim que seja dada resposta diversa ao quesito número 10 aqui em causa, nos seguintes termos: Provado apenas que na decorrência da declaração de insolvência da D…, após o accionamento da livrança e posteriormente à validação dos créditos reclamados no processo de insolvência, executado/opoente solicitou à Dra. H…, do departamento de economia, que efectuasse o levantamento das suas responsabilidades pessoais na qualidade de garante da empresa.
86. Quanto a esta matéria do incumprimento do acordado e das instruções dadas no âmbito do contrato de empréstimo garantido pela livrança aqui em causa cabe ainda ter presente o testemunho de H…, que refere que o Opoente não tinha qualquer percepção que os pagamentos da K… e retenção de 22,5% no contrato de factoring não tinham sido imputados ao pagamento do empréstimo (porquanto não acompanhava o detalhe das contas bancárias) e ficou surpreendido e até indignado com esta situação, nunca tendo autorizado as alterações à forma de imputação dos montantes. Referiu ainda que se tais imputações tivessem sido feitas de acordo com o previsto e instruções dadas ao C… o valor em dívida referente a este empréstimo, à data da insolvência, seria de cerca de €220.000,00.
87. Impõe-se assim que seja dada resposta positiva aos quesitos 6, 57, 58 e 59, dando os mesmos como provados
88. Em face do depoimento testemunhal já referido bem como depoimento de J… e G… deveriam os quesitos 60 e 61 ter sido dados como provados.
89. A testemunha G… refere que se o Opoente tivesse conhecimento dos débitos indevidos e incumprimento de instruções não teria permitido a manutenção desta situação, nem continuaria a assinar contratos de empréstimo e avales.
90. A testemunha J… refere que, caso o Opoente tivesse tido conhecimento da imputação dos pagamentos da K… e retenção de 22,5% do contrato de factoring ao pagamento de despesas correntes, ao invés do pagamento do empréstimo ficaria muito desagradado com esta situação e não mostraria disponível para fazer avalizações. Refere ainda que os contratos de swap, sendo um jogo financeiro, não se enquadram no perfil do Recorrente.
91. Resulta provado que o Executado não tinha conhecimento da não imputação dos rendimentos da obra da K… e dos 22,5% retidos no factoring aos pagamento do empréstimo, nem tinha conhecimento do débito indevido de juros, nem tão pouco da extensão dos prejuízos resultantes dos instrumentos financeiros (como adiante se analisará). Resulta provado que, caso tivesse de tal conhecimento não teria o Executado permitido que a situação se mantivesse, nem tão pouco teria concedido em avalizar os empréstimos do C…. O Executado actuou com a sua vontade viciado por erro com base em falta de conhecimento.
92. Entende a douta sentença aqui objecto de recurso que a anulabilidade daí decorrente não é invocável porquanto aquando da instauração da oposição já há muito tinha expirado o prazo previsto no artigo 287 nº 3 do C.C.
93. Assim não é desde logo porque tal prazo não se poderá começar a contar da data da insolvência (16 de Maio de 2011): da produzida e acima transcrita resulta que o conhecimento do executado advêm de um levantamento feito pelo Dra H… subsequentemente ao accionamento dos avalistas, o que não ocorreu em 16/05/2011. Ou seja, tal levantamento foi já feito em sede de preparação de defesa no presente processo.
94. Acresce que, tendo o Executado sido citado em 4 de Abril de 2012, intentou pedido de apoio judiciário que suspendeu o prazo de defesa até nomeação de patrono, o que ocorreu a 18 de Fevereiro de 2013, tendo necessariamente que se entender que o prazo previsto no artigo 287 nº 3 esteve suspenso durante esse período. Entendimento diverso configura errada interpretação do artigo 24 nº 4 do Lei 34/2004.
95. Entender que o prazo para apresentação da oposição se encontra suspenso mas que o prazo subjacente à defesa apresentar (o do artigo 287 nº 3 C.C.) continua a correr configura a inviabilização pratica da suspensão prevista no artº 24º nº 4 da Lei 34/2004
96. Sendo inconstitucional a interpretação conferida aos artigo 287 nº 3 CC e 24 nº 4 da Lei 34/2204 que considere que estando o prazo judicial interrompido nos termos do n.º 4 do art. 24º da referida Lei continua a correr o prazo previsto no artigo 287 nº 3 CC, por violação do direito ao acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva previstos no art. 20º da C.R.P.
97. Não existem verdades absolutas, e todo o conhecimento é incompleto e imperfeito pelo que todo aquele sobre o qual impende o ónus da prova deverá criar na convicção do julgador o reconhecimento de suficiente probabilidade da existência da verdade invocada.
98. É este entendimento que subjaz à estatuição do Princípio da livre apreciação da prova, e que confere ao Juiz a faculdade, diria até o ónus ou mesmo a obrigação, de recorrer às regras da experiência, e da sua vivência, na apreciação da prova produzida e na formação da sua convicção acerca da verdade.
99. É manifestamente difícil fazer a prova de que a exequente sabia que D… não tinha total consciência dos custos e prejuízos a que se encontrava sujeita e também conhecia ou pelo menos não ignorava que o executado/opoente não contrataria naquelas condições se soubesse o real estado das coisas (Quesitos 64 e 65);
100. Da provada produzida nos autos resulta suficiente probabilidade da verdade invocada, devendo tais quesitos serem dados como provados:
a)Qual é a probabilidade de um Banco desconhecer que debitou a mais um valor de € 17.616, 93 decorrente da aplicação de um spread de 9% em vez dos 6% e 6,875% contratualizados (ponto 68 da Fundamentação – Resposta ao Quesito 53 da Base Instrutória)?
b)E de desconhecer que foi debitado indevidamente um valor de 64.442,96€ decorrente da aplicação de um spread de 9% em vez de 6% e 6,875% contratualizados (ponto 71 da Fundamentação – Resposta ao Quesito 56 da Base Instrutória)?
c)Adicionalmente, na análise desta questão cabe ter presente a desproporção permanente nos ganhos que podia ter a Exequente versus os que podiam caber à D… na celebração dos contratos de instrumentos financeiros, desproporção esta constante dos pontos 10 e 19 da Fundamentação
d) Relativamente ao Contrato de Swap celebrado a 13 de Outubro de 2010 a posição de força é tão extremada que a relativamente ao primeiro período de contagem (que se inicia a 13 de Outubro) não há tão pouco risco para o C… dado que é estabelecido que a D… pagaria uma taxa de juro fixa de 1,850% e o C… pagaria Euribor a 3 meses, que nessa data era no valor 0,985% tal como se pode constatar na terceira página do documento nº 49 junto à Oposição e tal como foi destrinçado no testemunho da testemunha F…
101. Resulta do bom senso que o C… conhecia, ou pelo menos não ignorava, que o aqui Opoente não contrataria com ela nas condições em que o fez se tivessem sabido do real estado das coisas: o C… sabia que estava a debitar indevidamente juros à D… e que estava a impor uma situação de força à D… e sabia também que a D… não tinha consciência desses prejuízos.
102. Tanto os Opoente, como a D…, incorreram em erro sobre o objeto, termos e condições do negócio aquando da celebração dos contratos., erro esse que afetou decisivamente a vontade de contratar.
103. O C… conhecia, ou pelo menos não devia ignorar a essencialidade para a D… e para o Oponente do elemento sobre que incidiu o erro.
104. O C… sabia que a D… não tinha total consciência dos custos e prejuízos a que se encontrava sujeita, e sabia que esta não contraria com o mesmo caso tivesse tal consciência e, por maioria de razão conhecia ou pelo menos não ignorava que o Oponente não contrataria naquelas condições se soubesse o real estado das coisas.
105. Existindo, por conseguinte, motivo para a anulação dos negócios celebrados entre o C… e a D… nos termos do 247º e 251º do Código Civil, bem como para a a anulação das avalizações dai decorrentes.
106. Ao decidir em sentido diverso, baseada numa errada apreciada da matéria de facto, viola a decisão recorrida os artigos 247º e 251º do Código Civil, impondo-se a sua revogação e substituição por outra que considere verificado o vicio de vontade tanto nos contratos celebrados entre a D… e o C… como nas suas subsequentes avalizações, com a consequente total procedência das Oposições.
107. Acresce que a consideração de o prazo do 287 nº 3 do CC já expirou decorre duma errada valoração da matéria de facto, impondo-se a revogação desta decisão e a substituição por outra que considere que tal prazo ainda não decorreu.
108. Entender que o prazo para apresentação da oposição se encontra suspenso mas que o prazo subjacente à defesa apresentar (o do artigo 287 nº 3) continua a correr configura a inviabilização pratica da suspensão prevista no artº 24º nº 4 da Lei 34/2004
109. Sendo inconstitucional a interpretação conferida aos artigo 287 nº 3 CC e 24 nº 4 da Lei 34/2204 que considere que estando o prazo judicial interrompido nos termos do n.º 4 do art. 24º da referida Lei continua a correr o prazo previsto no artigo 287 nº 3 CC, por violação do direito ao acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva previstos no art. 20º da C.R.P.
(IV) As circunstâncias em que os contratos de swap e outros instrumentos financeiros foram celebrados entre a D… e o C… e a dificuldade em percepcionar as consequências dessa contratação
110. Entende o Digno Tribunal a Quo que problemática relacionada com os contratos de swap foi abusivamente introduzida nestes autos pelo executado/opoente, sem que os mesmos tenham um qualquer conexão com o contrato no âmbito do qual foi subscrita e avalizada a livrança dada a execução.
111. No entendimento do Douto Tribunal só seria admissível discutir os contratos de swap no âmbito dos presentes autos caso estes se destinassem especificamente a cobrir o risco da taxa de juro do contrato no âmbito do qual foi subscrita a livrança.
112. Olvida a douta sentença em apreço que estamos perante relações imediatas (entre Exequente e Executado). A maioria da jurisprudência considera que o avalista pode opor ao portador as mesmas “objeções” relativas ao pagamento do título que ao subscritor é lícito invocar.
113. O avalista pode apor quaisquer exceções do seu avalizado ao portador.
114. Dado que na presente execução se está no domínio das relações imediatas (entre Exequente e Executados), pode ser posta em causa a relação fundamental ou subjacente à execução (art. 17º aplicável ao caso dos autos, por força do disposto no art. 77, ambos da LULL).
115. A relação fundamental ou subjacente à execução não se restringe ao contrato de mútuo no âmbito do qual foi emitida a livrança.
116. Não há qualquer motivo para fazer tal restrição tanto mais em face dos instrumentos financeiros terem sido contratados por causa da concessão de financiamento bancário. Ainda que se entenda que a contratação dos instrumentos financeiros não era apresentados como uma condição mas como um colateral que facilitava a concessão do financiamento bancário (no que se não concede), mesmo assim deverá a problemática do swap ser analisada nesta sede porquanto estamos perante uma defesa que a avalizada D… poderia opor ao C….
117. Esta questão é especialmente relevante em face dos prejuízos que provocou à avalizada e que pela sua dimensão não podem ser ignorados, prejuízos estes dados como provados nos pontos 51, 52, 53, 45, 55 e 56 da Fundamentação e que se computam num valor total de 885.262,74€!
118. Note-se que não obstante os contratos de mutuo e de instrumentos financeiros não se encontrarem juridicamente ligados, encontravam-se factualmente ligados, como decorre do testemunho da testemunha I…, que refere que a assinatura dos mesmos “era uma necessidade, era uma imposição”, referindo ainda que, no seu entendimento não havia na empresa capacidade para avaliar os riscos dos mesmos.
119. De acordo com o testemunho de I… os contratos de instrumentos financeiros foram assinados porque tal se revelava necessário com vista à obtenção do necessário financiamento. A su1... A D… tinha uma grande dependência perante o C…, referindo a testemunha F… que o C… era o maior Banco para a empresa com 20% da quota de financiamento.
121. A testemunha I… (4 de Julho de 2014, refere que a empresa “a partir de determinada altura mais do que negociar com os bancos tinha que pedir ajuda aos bancos.”
122. Sendo certo que a partir do momento que o segundo contrato de instrumentos financeiros começou a dar avultados prejuízos o Opoente passou a ter consciência do mesmo, certo é também que só tomou percepção do real impacto financeiro dos mesmos com o levantamento que foi feito e lhe foi dado conhecimento pela Dra H…, como é expresso no testemunho de G…, que refere “ele tomou conhecimento quando chegou o processo às mãos e os valores que tinha estava responsabilizado”, antes tendo noção que havia dificuldades com swaps mas não com a dimensão que se veio a revelar.
123. Assim, e no que diz respeito à extemporaneidade da invocação destes prejuízos pelo Exequente aplica-se integralmente o que já acima referido nos pontos (II) e (III) quanto ao decurso do prazo previsto no 287 nº 3 do C.C.
124. Da prova produzida resulta que o Executada é pessoalmente avesso a operações bancárias de risco, como decorre do testemunho da testemunha G… e J….
125. Devem assim ser dado como provado que:
- Com especial relevância tomou percepção da existência e real impacto financeiro de contratos de SWAP de taxa de juro, contratos Opção CAP de taxa de juro e Contrato de Opções COLLAR de taxa de juros celebrados com a exequente (Quesito 11)
- A D…, não tinha qualquer interesse, nem conhecimentos, para entrar no negócio dos SWAPS e outros instrumentos financeiros (Quesito 20)
- O executado/opoente é pessoalmente avesso a este tipo de operações bancárias de risco, por ter percepção que não tem características pessoais nem conhecimentos técnicos para tal. (Quesito 21)
- Na D…, empresa do sector da construção, nenhum dos Administradores nem dos quadros técnicos dispunha do saber para aferir do risco destas operações (Quesito 22)
- No entanto, num claro processo de “cross-selling”, foi deixado claro que o apoio da exequente à executada estava dependente destas contratações. (Quesito 23)
- O C… bem sabia do procedimento duvidoso e posição de força na contratação dos diversos contratos de Swap (Opção de Collar e Opção de Cap), bem como das consequências desastrosas de tais operações para a D…? (Quesito 24)
- Não havia na D… capacidade para entender e prever as consequências dos contratos que lhe foram dados a assinar (Quesito 25)
- Mas ainda que os mesmos fossem cabalmente entendidos, a D… não podia negar-se a assiná-los (Quesito 26)
- Estava “entre a espada e a parede”, como o C… bem sabia (Quesito 27)
- A D… não se encontrava em posição negocial para poder discutir as condições do contrato (Quesito 28)
- E muito menos se pode pôr a possibilidade de não contratar? (Quesito 29)
- Pelo menos no que diz respeito ao terceiro contrato de instrumentos financeiros a D… encontrava-se numa posição de total subjugação perante a Exequente (Quesito 30)
– Pelo menos no que diz respeito ao terceiro contrato de instrumentos financeiros a D… via-se obrigada a aceitar o que lhe era proposto (e a fazer o que lhe mandavam) de modo a manter a sobrevivência (Quesito 31)
- Os contratos de swap (e outros instrumentos financeiros) foram “vendidos” à D… em troca do financiamento de que esta necessitava, sendo que a D… não os procurou, nem deles necessitava (Quesito 38)
126. A problemática dos contratos de swap deverá ser tida em conta na avaliação do erro da formação da vontade acima já referido pois também, por este motivo a vontade do Executado se encontrava viciada.
127. Acresce que, do enquadramento em que o contrato de mútuo em causa nos presentes autos foi assinado decorre a nulidade dos mesmos.
128. A validade do presente contrato terá sempre de ser apreciada conjuntamente com a validade dos contratos de swap e outros instrumentos financeiros invocados e juntos aos autos.
129. Os Contratos de Swap e outros instrumentos financeiros eram contratos de adesão a cláusulas pré-determinadas sem qualquer possibilidade de negociação, pois, nos termos do Ponto 75 da Fundamentação os contratos de swap foram apresentados pela exequente à D… como um “produto pronto”sem possibilidade de negociação.
130. Configura assim um contrato de adesão, estando preenchidas as características que os definem: a pré-disposição, a unilateralidade e a rigidez.
131. As cláusulas dos contratos de swap mesmos não foram devidamente explicitadas e esclarecidas, como se impunha, tal como resulta do ponto 76 da Fundamentação: no decurso das respectivas negociações havidas com a exequente, só as condições essenciais dos contratos de mútuo e de swap e outros instrumentos financeiros foram analisadas pelo director financeiro da D…, Dr. I….
132. O depoimento da testemunha I… decorre que relativamente aos contratos de swap era só explicada a mecânica dos mesmos e não as cláusulas.
133. De acordo com Helder M. Mourato na Tese de Mestrado intitulada “O Contrato de Swap de Taxa de Juro”, neste tipo de contratos “os intermediários financeiros têm não só o dever de informar, como também o dever de se informar”. O Banco “tem de informar devidamente o cliente dos riscos que um contrato desta natureza implica, mas tem também de se assegurar (por exemplo, através de questionários) que o cliente compreende exactamente os termos do contrato.”
134. O Exequente não cumpriu com os seus deveres de informação, violando ao deveres impostos pela Comissão de Mercado dos Valores Mobiliários (vulgo CMVM), nomeadamente os constantes dos artigos 304º, 312, 314 e 317.
135. A D… aceitou os produtos financeiro propostos sem alcançar, precisamente por essa razão, os gravíssimos riscos a que se expunha.
136. A vontade da D… ao aderir aos instrumentos financeiros (para os quais foi empurrada) encontrava-se viciada.
137. Tal torna o negócio inválido (concretamente, em virtude de erro sobre o objecto do negócio, nos termos do artigo 251º do Código Civil).
138. Os contratos de swap e outros instrumentos financeiros tinham um carácter leonino, face ao desequilíbrio dos “interesses” em jogo que os mesmos apresentam.
139. O swap de taxa de juro é uma permuta financeira, mas ainda assim uma permuta”, devendo haver um certo equilíbrio dos interesses em jogo, que nos casos apresentados não existe: quando a D… ganha, ganha pouco, quando perde, perde muito.
140. Todo o exposto vai contra os princípios da boa fé, bons costumes e fim social da regulamentação legal dos contratos como aqueles que são invocados (para além do mais, dl 446/85 e art. 227 cc), verificando-se um desequilíbrio das recíprocas prestações e obrigações, que atenta clamorosamente contra a boa fé e bons costumes.
141. O clausulado viola o disposto no regime jurídico das cláusulas contratuais gerais (dl 446/85), designadamente nos arts. 5, 6, 18 e 19, sendo, portanto, nulo e devendo considerar-se excluído do contratado (arts. 12 e 8 do mesmo diploma), o que aqui se deixa alegado para todos os efeitos legais.
142. Assim e em resumo:
- a obrigação causal ou subjacente ao título dado à execução (contrato de mútuo) é nula;
- o título de crédito que garante tal obrigação é igualmente nulo e de nenhum efeito nas relações imediatas (como é o caso).
Termos em que, a Exequente sempre teria de ser considerada como possuidora "abusiva" e ilegítima de tal documento.
143. Incorre em erro a sentença do Digno Tribunal a Quo, por errada selecção e apreciação da matéria de facto, ao considerar que a problemática relacionada com os contratos de swap foi abusivamente introduzida nestes autos pelo Exequente, pelo que deve tal decisão ser revogada e substituída por outro que, reapreciando (parcialmente) a matéria de facto tenha em consideração esta matéria na apreciação do vício da vontade e nulidade dos contratos de swap e contrato de mútuo em face do enquadramento em que foi contratado, designadamente violando o clausulado dos contratos de swap o disposto no regime jurídico das cláusulas contratuais gerais (DL 446/85), por desequilíbrio das recíprocas prestações e obrigações, que atenta clamorosamente contra a boa fé e bons costumes, bem como por violação dos deveres legais de informação previstos não só no DL 446/85 como no Código de Valores Mobiliários.
144. Deve assim a obrigação causal ou subjacente ao título dado à execução (contrato de mútuo) ser considerada nula e o título de crédito que garante tal obrigação igualmente nulo e de nenhum efeito nas relações imediatas (como é o caso). Termos em que a Exequente sempre terá de ser considerada como possuidora "abusiva" e ilegítima de tal documento.
(V) A falta de imputação dos rendimentos pagos pela empresa K… para abatimento do financiamento nos termos constantes da instrução irrevogável.
145. Quanto a esta questão foi dada como provada a matéria constante dos pontos 57 a 63 da Fundamentação da sentença (correspondente aos Quesitos 39º, 40º, 41º, 42º, 43º, 44º, 45, (pontos 57 a 63 da Fundamentação da sentença), ou seja foi dado como provado que:
- Como condição da celebração do contrato de crédito RLS nº …….. foram consignados ao pagamento do referido financiamento as quantias pagas à D… pela K… ao abrigo do contrato de subempreitada “…”
- Nos termos de tal condição, foi dada instrução irrevogável à K… para proceder aos pagamentos da referida subempreitada na conta de depósitos nº ……….
- E, de igual modo, foi dada instrução irrevogável à exequente para utilizar tais montante para o pagamento do referido contrato de financiamento.
- Tendo, a 23 de Março de 2009, sido feito um pagamento pela K… no montante de 204.892,13€.
- O qual foi utilizado, de acordo com as instruções dadas, para proceder a uma amortização extraordinária do referido financiamento.
- No entanto, aquando do pagamento subsequente, no valor de €381.522,72, apesar de tal montante ter sido depositado na conta de D.O. indicada, não foi cumprida a instrução irrevogável e o empréstimo não foi amortizado.
- Não foi feita qualquer amortização extraordinária no referido montante, ou montante inferior, tendo-lhe sido dado destino diverso.
146. Em face disto, não se consegue compreender como pode o Quesito 48 ter sido dado como não provado. Resulta das mais elementares regras da matemática que “caso o montante de € 381.522,72, supra referido, tivesse sido imputado ao empréstimo, conforme instruções dadas, o montante do capital em dívida não seria de € 1.405.965,06, mas antes de €1.024.442,34”.
147. Poder-se-ia, quanto muito levantar dúvidas quanto ao acerto do montante de €1.405.965,06 (no que se não concede e se admite por mero efeito de raciocínio) mas nunca de poderá duvidar que, caso o valor de € 381.522,72, supra referido, tivesse sido imputado ao empréstimo, conforme instruções dadas, o valor do empréstimo seria menor na mesma medida.
148. O quesito 48º terá obrigatoriamente de ser dado como provado, bem como o quesito 50º na medida em que se reporta aos €381.522,72.
149. Questão diversa é a apreciação feita em sede de sentença quanto a se instrução irrevogável constante do documento de fls 623/624, datada de 18/02/2009, impunha ou apenas permitia a utilização dos pagamentos efectuados pela K…, referentes ao contrato de subempreitada “…”, exclusivamente para liquidação do empréstimo de 5.500.000,00.
150. A sentença adere ao entendimento manifestado em audiência de julgamento pela testemunha F… no sentido de que a instrução apenas permite, não impõe isto não obstante tal testemunha não ter sido indicada a matéria dos quesitos 48º e 50º
151. Tal entendimento está errado.
152. Na cláusula 12 do contrato de empréstimo (doc nº 1 junto à Contestação do C…) garantido pela livrança aqui em discussão são elencadas as garantias: livrança, carta compromisso e contrato de consignação de rendimentos.
153. A leitura da instrução de fls 623/624 tem de ser feita compaginada com a restante matéria dada como provada, outra prova documental existente e a restante prova testemunhal produzida em audiência de julgamento.
154. O documento nº 55 junto à Oposição é uma instrução irrevogável dada pela D… à K… para creditar na conta de depósitos à ordem nº ……… todos os pagamentos devidos referentes ao contrato de subempreitada “…”. De tal instrução consta expressamente que a mesma é “dada também no interesse do C…”. Dai se entende que a instrução não é dada no interesse exclusivo do C… mas também dos restantes interessados, D… e avalistas.
155. O digno Tribunal a Quo fundamentou a resposta dada aos Quesitos (despacho de 21.07.2014) no depoimento de diversas testemunhas, entre elas E…, seleccionando no que aqui releva a seguinte matéria: “O valor da obra … foi “dada” ao C… para amortização do financiamento de € 5.500.000,00. Tudo o que viesse da K… era para dar ao C…. Houve um cheque de 204 mil euros que foi enviado à D… e a depoente fez um depósito dessa quantia e telefonou ao C… para informar disso e para ser feito o abatimento. O valor desse cheque foi amortizado. Posteriormente fez o mesmo procedimento quanto a outro cheque de 381 mil euros, mas não controlou se a amortização foi feita. Mais tarde verificou que essa amortização tinha sido efectuada”
156. No seu depoimento a testemunha E… refere expressamente que deu indicações telefónicas ao gerente de conta do C… para imputar o pagamento feito pela K… no valor de € 381.522,72 ao empréstimo aqui em causa
“I…: Pronto, e a Srª fez o depósito desse cheque?
E…: E telefonei para dizer que fiz o depósito de 204 mil, para eles irem amortizar aos empréstimos.
I…: Isto aconteceu mais alguma vez?
E…: Aconteceu ao 2º cheque, que também por lapso a K… mandou 381 mil euros. Voltei a ligar, fui eu que fiz o depósito, também outra vez no C… e telefonei a dizer que era para amortizar o empréstimo; a partir daí Sr. Dr., também era coisa gerida por Lisboa.”
157. No testemunho da testemunha E… o Tribunal deu relevo ao facto de esta ter telefonado ao C… a dar indicações para que fosse feito o abatimento de 204 mil euros e posteriormente 381 mil euros ao financiamento de 5.500.000,00 mas não tirou quaisquer consequências do incumprimento desta ordem.
158. De acordo com o testemunho da testemunha F… a consignação de rendimentos decorrente da subempreitada … foi uma condição para a celebração do contrato RLS …….., tendo sido uma instrução irrevogável à empresa K… para proceder aos pagamentos na conta D.O. ………. No entanto, o banco não estava obrigado a utilizar os pagamentos para amortização do financiamento.
Seria utilizado para o serviço da dívida. No entanto, no decurso do seu depoimento a testemunha é incapaz de explicar a razão de ser do valor de 204 mil euros ter sido utilizado para fazer uma amortização extraordinária (Ponto 61 da matéria assente – resposta ao quesito 43), pondo a possibilidade de tal resultar de uma instrução da D….
159. Ora, a ser necessária uma instrução específica para tal (no que se não concede mas se admite por mero efeito de raciocínio) ela existiu tanto para os 204 mil euros como para os 381 mil euros, tendo sido a instrução dada telefonicamente pela testemunha E…, instrução esta que foi cumprida num dos casos mas não no outro.
160. Impõe-se assim em face da prova existente nos autos e duma análise crítica e conjunta da mesma que seja dado como provado que o montante de € 381.522,72 deveria ter sido imputado ao empréstimo conforme instruções dadas não só em documento de fls 623/624 como também pela testemunha E…, havendo um incumprimento da exequente C… e consequentemente impondo-se uma redução no capital subjacente à quantia em dívida à data da insolvência (€1.405.965,06), subjacente à quantia exequenda, na mesma medida.
(VI) A não afectação da percentagem retida no âmbito dos contratos de factoring para amortização dos empréstimos nos termos solicitados
161. Quanto a esta questão foram dados como provados os seguintes pontos 27, 28, 30 a 33 da fundamentação da sentença.
162. Não foram, no entanto dados como provados, como deveriam ter sido, os quesitos 49, 50 e 51.
163. Relativamente ao Quesito 49, aplica-se, mutatis mutandis, o raciocínio feito acima quanto ao Quesito 48. Do registo dos movimentos da conta mercado nº ………… (a referida conta margem) documentados a fls 213 a 224, e dados como provados no ponto 33 da fundamentação resulta que para aí foi retido um valor de € 1.096.337,45, que não foi utilizado para pagar quer o empréstimo de €5.5000.000,00, quer o empréstimo de €2.000.000,00.
164. Sendo certo que tal resulta de tais documentos, resulta ainda do testemunho das testemunhas G… e H… a 17/06/2014.
165. Ambas as testemunhas confirmaram a validade do quadro comparativo de montantes consignados e retidos, bem como dos valores efetivamente imputados à amortização do(s) empréstimo(s), constante do artigo 221 da Oposição, que permite constatar que, se as instruções dadas e acordadas tivessem sido cumpridas, o montante em dívida do empréstimo aqui em garantia seria substancialmente inferior.
166. Resulta assim matematicamente provado que caso tivessem sido cumpridas as instruções dadas quanto à imputação dos valores retidos na conta margem e à amortização dos empréstimos identificados (considerando-se uma imputação proporcional ao valor inicial dos mesmos), do saldo da conta margem de €1.096.337,45 (daí libertado para fins diversos), o valor de € 803.980,79 (proporção imputável ao empréstimo de €5.500.000,00), teria sido imputado à amortização do empréstimo garantido, devendo ser dado como provado o Quesito 49, bem como o Quesito 50º na parte em que se reporta aos €803.980,79.
167. Entende a douta sentença aqui objecto de recurso que o C… estava legitimado para imputar os montantes retidos para a amortização do empréstimo aqui em causa para a satisfação de outras obrigações bancárias da D…. Faz tal entendimento com base em carta de fls 631/632 remetida pela D… ao C… dado que aí se refere que “esse Banco pode, mas não fica obrigado a, ….”.
168. A interpretação feita da referida carta (que se refere à retenção de 10%) bem como considerar a mesma extensiva à retenção de 22,5% não pode merecer o acordo do Recorrente.
169. Antes do mais cabe atentar no teor da carta de 20 de Agosto que estabelece não só a obrigatoriedade/possibilidade de utilizar os montantes retidos para pagamento (ainda que antecipado) das obrigações da D… resultantes da conta empréstimo de € 5.500.000,00 aqui em causa como, em alternativa, a retenção de tais montantes a título de caução das mesmas responsabilidades.
170. O valor de 10% retido destina-se ao pagamento ou caucionamento do contrato de empréstimo de € 5.500.000,00. Ainda que se entenda que o Banco não estava obrigado a utilizar os montantes retidos efectuar o pagamento do empréstimo de € 5.500.000,00, (no que se não concede) certo é que o fez.
171. Entende a douta sentença que a alteração ao contrato de factoring nº ….., efectuada em 23/02/2010, bem como o teor da carta datada de 12/07/2010, não afastaram a aplicação genérica do compromisso assumido pela D… através da carta datada de 20/08/2009, pelo que o Banco exequente poderia mas não ficava obrigado a utilizar os montantes retidos para amortização do empréstimo aqui em causa. Tal entendimento não tem qualquer sustentação desde logo porque na referida carta não é feita qualquer referência (ou linkagem) ao compromisso constante da carta 20/08/2009, não obstante serem feitas referências a outros documentos: o contrato de factoring de 14/12/2004 e a instrução de 23/02/2010.
172. A carta de 12 de Julho de 2010 é absolutamente autónoma relativamente à carta de 20/08/2009, não configura qualquer compromisso genérico, nem tal resulta da prova produzida. Ainda que assim, não se entendesse, no que se não concede, sempre deveriam os montantes ser utilizados para caução das responsabilidades referidas na carta de 12 de Julho de 2010.
173. Do testemunho da testemunha F… resulta que o Banco poderia autorizar que os 22,5% retidos na conta margem fosse utilizados com outro fim que não o pagamento dos contratos de empréstimo referidos na carta de 12 de Julho de 2010, desde que a D… o solicitasse, não podendo no entanto testemunhar se a empresa o solicitou ou não.
A contrario sensu, se a empresa não o solicitasse, as instruções a cumprir seria a que se encontram na carta de 12 de Julho de 2010.
174. De acordo com o testemunho de F… as instruções quanto à imputação dos 22,5% retidos são as constantes na carta de 12 de Julho de 2010. A imputação só pode ser diversa se a empresa deu instruções contrárias às que constam na referida carta, instruções estas que não constam dos autos e que a testemunha do C… não sabe sequer dizer se existiram.
175. Resulta assim provado o quesito 51 - Ao libertar os montantes existentes na conta margem para fins diversos do pagamento do empréstimo garantido pela livrança aqui em causa, bem como para o pagamento do empréstimo de 2.000.000,00 (também garantido por livrança avalizada), a exequente permitia o pagamento de outras obrigações (não avalizadas), nomeadamente descobertos na Conta de Depósitos à Ordem, em manifesto e claro prejuízo dos avalistas que se mantinham obrigados pelo aval.
176. Impõe-se assim em face da prova existente nos autos e duma análise crítica e conjunta da mesma que seja dado como provado que o montante de € 803.980,79 deveria ter sido imputado ao empréstimo conforme instruções dadas em documento de fls 212 (documento 66 junto à Oposição), instruções estas que não foram contrariadas, havendo um incumprimento da Exequente C… e consequentemente impondo-se uma redução no capital subjacente à quantia em dívida à data da insolvência (€1.405.965,06), na mesma medida.
(VII) A aplicação indevida de um spread de 9% nos contratos de conta corrente caucionada no período compreendido entre maio de 2009 e janeiro de 2010.
177. A sentença dá como provado que efectivamente, e em virtude da aplicação de um spread de 9%, foram debitados indevidamente juros no valor de 82.059,89 € (ponto 68 e 71 da Fundamentação).
178. No entanto, e tal como na questão dos contratos de swap, entende que tal não releva para os autos. Aqui se reitera o já referido nessa sede.
179. Estamos perante relações imediatas (entre Exequente e Executado). A maioria da jurisprudência considera que o avalista pode opor ao portador as mesmas “objeções” relativas ao pagamento do título que ao subscritor é lícito invocar.
180. O avalista pode apor quaisquer exceções do seu avalizado ao portador.
181. Dado que na presente execução se está no domínio das relações imediatas (entre Exequente e Executados), pode ser posta em causa a relação fundamental ou subjacente à execução (art. 17º aplicável ao caso dos autos, por força do disposto no art. 77, ambos da LULL).
182. A relação fundamental ou subjacente à execução não se restringe ao contrato de mútuo no âmbito do qual foi emitida a livrança.
183. Termos em que deve a presente decisão ser revogada, por errada interpretação do artº 17º da LULL, e substituída por outra que considere uma redução da dívida exequenda correspondente ao débito indevido de juros nas contas correntes caucionadas no valor de 82.059,89 €.
(IX) A eventual relevância no âmbito dos presentes destes autos de aprovação e homologação do plano de insolvência tendo em vista a recuperação da D…
184. Entende o Digno Tribunal a Quo que esta questão é irrelevante porquanto os avalistas não poderão opor ao credor a aprovação de plano de insolvência no âmbito do respectivo processo.
185. A este propósito cabe ter presente Nótula sobre o artigo 217.º, n.º 4, do CIRE (o direito de o credor agir contra o avalista no contexto do plano de insolvência), in Estudos Dedicados ao Professor Doutor Luís A. Carvalho Fernandes, Vol. I. pags. 376 e segs, direito e justiça, da autoria da Sra. Dra. Catarina Serra, “Alguma jurisprudência tem entendido que, face à autonomia da obrigação do aval (pois o avalista não se obriga perante o avalizado, mas sim perante titular da letra ou livrança), o credor não pode executar o aval. Não obstante as obrigações serem reguladas num plano de insolvência (moratórias, prazos de cumprimento, suspensão das obrigações, etc) tal não é invocável pelos respectivos avalistas para obstarem pagamento ou deduzirem oposição à execução.
Em suma, defendem que o plano de insolvência só se aplica à sociedade insolvente que está impossibilitada de cumprir as suas obrigações podendo ser peticionada a dívida aos avalistas que não estão insolventes, nem se encontram impossibilitados de cumprir as obrigações assumidas (parecendo caminhar, neste sentido, entre outros, o Ac. do STJ, proferido em 26.02.2013, no âmbito do processo 597/11.0TBSSB-A.I.I,S1”… “A aprovação de um plano de insolvência, com moratória para pagamento da dívida, de que beneficia a sociedade subscritora da livrança, não é invocável pelos avalistas contra quem foi instaurada a execução para seu pagamento…”
Entendemos que tal interpretação não se mostra equitativa pois, desde que os títulos não tenham saído das mãos do sacador primitivo, o avalista pode opor e socorrer-se das excepções que poderia opor o avalizado, Logo, o facto de as obrigações se encontrarem regularizadas no âmbito de um plano, não podem ser exigidas de forma diversa aos avalistas – até porque nem existe incumprimento.
É verdade que a obrigação do avalista se mantêm, mesmo no caso da obrigação que garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma.
Todavia, no caso concreto e com a aprovação e homologação do plano nasce uma nova dívida suportada num novo título, como novos valores e prazos (a grande maioria das vezes com a anuência do próprio credor – instituição financeira).
Assim, no âmbito do plano de insolvência ou de pagamentos o credor e o subscritor do título regulam a dívida existente de forma diversa renegociando contrato de crédito, alterando garantias, concedendo perdões, alargando prazos de pagamento etc. A aprovação do plano de insolvência e a sua homologação por sentença, pode alterar o prazo de cumprimento da obrigação podendo até suceder que não se operou uma novação permanecendo a obrigação como constituída inicialmente.
Não faz sentido permitir que, ao mesmo tempo e fazendo tábua rasa dessa negociação e declaração de vontades, venho o credor executar o avalista pela totalidade da dívida, de forma diferente de que aprovou no plano de insolvência. O título que contratualiza e serve de base à dívida desapareceu passando a existir outro título, o plano de insolvência homologado por sentença, que vai afectar o avalista. Não parece ser de aceitar que, com base no título primitivo, o credor vá executar o avalista obtendo o ressarcimento do seu crédito por dois lados e de forma diferente (prazos, garantias, juros etc). Tal situação não é aceitável sendo contrária aos princípios gerais e fundamentais do nosso direito e vigentes na ordem jurídica comunitária.
Não podemos deixar de entender que tal alteração se repercute necessariamente na relação processual estabelecida entre o credor/exequente e o avalista sendo fundamento válido de oposição no processo executivo instaurado contra este (a quem cabe, no âmbito do processo executivo, invocar a existência de causa superveniente conexa com a modificação da obrigação tornando-a inexigível por ainda não ter decorrido o prazo de seu incumprimento nos termos do disposto no artigo 814º, º 1 alínea e) do Código do Processo Civil.
Como entendeu o Ac. do STJ, de 04.12.2007, proc. nº 07B4176: “A extinção é susceptível de derivar de novação objectiva, de perdão ou de remissão, caso em que se extinguem as garantias prestadas por terceiro, designadamente o penhor, a hipoteca, a fiança e o aval; e a modificação envolve a manutenção do direito de crédito e da correspondente obrigação, implicando a afectação das garantias prestadas por terceiros na medida dessa modificação.
Sobre a matéria, ver também o Ac. da Relação de Guimarães datado de 24.02.2012, proc. nº 1248/10.5TBBCL-A.G2: “…No entanto, a aprovação do plano de insolvência, no qual esse crédito foi aprovado e qualificado como crédito privilegiado, devendo ser pago na íntegra no prazo de 8 anos, alterando o prazo de cumprimento da obrigação, do que beneficia o avalista, torna inexigível a obrigação exequenda, por causa, devendo ser julgada extinta a instância executiva….” E o Acórdão da Relação do Porto de 12.02.96 (Guimarães Dias), sumariado em dgsi.pt: “I – A modificação dos créditos obtida por acordo em assembleia definitiva de credores, efectuada em processo especial de recuperação de empresa não constitui novação, porquanto o crédito primitivo não se extingue, por substituição de novo crédito. II – A modificação de créditos aproveita aos terceiros garantes, na medida dessa modificação. III – A dívida avalizada só é exigível quando estiver vencida. IV – Procedem os embargos deduzidos em execução com fundamento em violação do disposto nos artigos 63º, parte final, do Código das Falências e 802º do Código de Processo Civil”
186. Tal como se encontra referido no Ponto 38 da Fundamentação “no âmbito do processo de insolvência nº 1277/11.1 TJVNF, que correu seus termos pelo 5º Juízo Cível de Vila Nova de Famalicão, foi apresentado o plano de insolvência constante de fls 268 a 295, o qual foi homologado por sentença proferida em 05/01/2012, nos termos documentados a fls. 296 a 298, o que tudo aqui se dá por integralmente reproduzido (alínea AM) dos factos assentes”
187. Nos termos do plano de insolvência dado como reproduzido, sendo o crédito do C… um crédito comum, o montante aprovado seria pago em 50%, sem juros, em dez anos, com dois de carência.
188. O plano de insolvência aprovado não poderá deixar de ser considerado relevante nos presentes autos, desde logo porque o Exequente vem executar o Oponente por um montante que irá em 50% receber da D….
189. Mas ainda com maior relevo deverá ser considerado que temos aqui uma novação objectiva da dívida extinguindo-se as garantias prestadas por terceiro, designadamente o aval; o que se alega.
Acresce que,
190. Por requerimento junto a 15 de Julho de 2014 (ref 17387398), o Opoente informou que os autos que, em Dezembro de 2013 – não havendo qualquer incumprimento do plano de pagamentos previsto no Plano de Insolvência; e não se verificando nenhuma das condições previstas no artigo 218º do CIRE – a D… requereu Processo Especial de Revitalização que se encontra a correr termos no 2º Juízo Cível de Vila Nova de Famalicão sob o nº 3380/13.4TJVNF, tendo sido nomeado administrador judicial provisório o Sr Dr L…, por despacho de 26/12/2013.
191. O Plano de Recuperação foi aprovado por 70,288% de votos a favor, como se comprova por requerimento junto aos autos do PER pelo Sr. Administrador Judicial de Provisório, e junto aos presentes autos conjuntamente com requerimento de 15 de Julho de 2014.
192. Nos termos da alínea d) do Ponto 4.2 do Plano de Recuperação aprovado “as garantias pessoais prestadas aos credores bancários mantém-se e apenas poderão ser acionadas em caso de incumprimento total ou parcial do plano.
Eventuais processos judiciais intentados contra os garantes pessoais cessam pela via de homologação e trânsito em julgado do presente plano” (vide plano Plano de Recuperação anexo ao Requerimento junto aos autos a 15 de Julho de 2014)
193. Ora, caso se entenda que o aval prestado pelo Opoente se mantêm, por não ter havido novação da dívida com a aprovação do Plano de Insolvência (no que se não concede e se admite por mero efeito de raciocínio) será este exactamente o caso aqui em presença.
194. Consequentemente, perante tal disposição do plano deverá o processo judicial aqui em presença cessar pela via da homologação do plano.
195. Ora, por despacho proferido em audiência de julgamento de 15 de Julho de 2014, entendeu o Tribunal a Quo indeferir o requerido nos seguintes termos: “Sem cuidar agora de saber se o plano de recuperação aprovado no âmbito do PER poderá repercutir-se na esfera jurídica dos terceiros garantes, entendemos qua a sua aprovação só produzirá os seus efeitos depois de homologado por sentença judicial, pelo que, nesta altura, nada obsta ao prosseguimento dos presentes autos.”
196. Vem o Recorrente impugnar judicialmente tal decisão interlocutória, porquanto estamos perante uma causa prejudicial ao prosseguimento dos presentes autos impondo-se a suspensão da instância até decisão de homologação (ou recusa de homologação), transitada em julgado do Processo Especial de Revitalização a correr no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Instância Central de Vila Nova de Famalicão, 2 Secção de Comércio - J2, o que se requer.
197. Isto sem prejuízo de se considerar que a presente decisão ser revogada, por errada interpretação do artigo 217 nº 4 do CIRE, e substituída por outra que considere que em virtude da aprovação e homologação de Plano de Insolvência houve uma novação objectiva da dívida extinguindo-se as garantias prestadas por terceiro, designadamente o aval.
198. Subsidiariamente, e caso assim não se entenda, sempre deverá a presente decisão ser revogada, por errada interpretação do artigo 217 nº 4 do CIRE, e substituída por outra que considere que o Exequente não pode receber do Opoente o montante de 50% que irá receber da D… em virtude do Plano de Insolvência aprovado e homologado.
(X) A necessidade de duas assinaturas para obrigar a D… na data da emissão da livrança e a pretendida liberação do Executado/Opoente
199. Tal como é referido na douta sentença aqui objecto de recurso resulta da inscrição inserta na certidão permanente de fls 794. a 805, que após a alteração ao contrato de sociedade registada em 2010/04/09, a D… passou a obrigar se pela intervenção de dois administradores, de um administrador e de um mandatário, ou de dois mandatários. Essa alteração foi comunicada a todos os bancos, incluindo o C…, tendo sido alterada a respectiva ficha de assinaturas.
200. Entende a douta sentença aqui objecto de recurso que daí não decorre a invalidade do título, o que não pode merecer o acordo do Opoente.
201. A existência de uma só assinatura na livrança (o que não se afigura bastante para vincular a sociedade) configura vício de forma: para a Exequente basta olhar para o título para constatar que o mesmo padece de vício, vício esse criado por sua responsabilidade, e que aqui se invoca.
202. Tal vício de forma era do conhecimento do C… - tenhamos presente que estamos aqui perante relações “imediatas” não tendo o título entrado em circulação.
203. Estamos perante um vício que se reporta às condições externas do título, à sua aparência formal.
204. Sendo a obrigação garantida nula por vício de forma não se mantêm a obrigação do avalista.
205. A decisão que indefere a alegada invalidade do título por vício formal e, consequentemente não desobriga o avalista, em virtude do referido título ter aposta a assinatura de um só administrador, o que não obrigava a sociedade e era do conhecimento do Exequente viola, por erro de interpretação, o artigo 32 da LULL, impondo-se a sua revogação e substituição por outra que declare a existência de vício de forma e consequentemente desobrigue o avalista por nulidade da avalização.
206. Mesmo que se admita (no que se não concede) que o título não é nulo, sempre se terá de entender que o comportamento da Exequente leva à liberação do Avalista.
207. Ao preencher a livrança, entregue em branco, com a data de 18/09/2010, a Exequente fez com que a D… não ficasse obrigada pela mesma. A Exequente sabia que a partir de Março de 2010 a assinatura de um só administrador não era bastante para obrigar a D…. A Exequente deveria ter pedido, nessa data, substituição das livranças que detinha ou ter tido tal alteração em conta no preenchimento da livrança.
208. O fiador que paga a dívida ao credor, subroga-se nas dívidas deste perante o afiançado (art° 644 c. civil); trata-se de uma sub-rogação legal (art° 592 c. civil).
209. Por seu lado, o artigo 32 da L.U., que regula as relações entre o avalista e o devedor principal, dispõe que se o dador do aval paga a letra (ou livrança) fica sub-rogado nos direitos dela emergentes contra a pessoa a favor de quem foi dado o aval e contra os obrigados para com esta, em virtude da letra ou livrança.
210. O avalista que paga tem acção cambiária contra o avalizado e os que respondem perante este, implicando o exercício de um direito autónomo e literal como legítimo portador do título.
211. Ou seja, pagando pelo signatário garantido, o avalista, ao mesmo tempo que adquire o direito que tinha contra o avalizado, o portador ou a pessoa a quem pagou, fica investido nos próprios direitos cambiários que o garantido tinha, dada a sua posição na letra ou na livrança.
212. O que se passa então se o avalista não poder ficar sub-rogado nos direitos do credor perante a sociedade avalizada em virtude de comportamento do credor?
213. O artigo 32 da LULL nada dispõe quanto a isto. Entende o Recorrente que o facto de tal situação não estar expressamente prevista na LULL não poderá resultar em que à mesma não seja dada relevância jurídica, sob pena de se vir a considerar que o pensamento do legislador é amoral ou mesmo imoral, no que se não acredita.
214. Estaremos perante uma lacuna a ser preenchida pela aplicação analógica do regime da fiança. O art° 653 do C. Civil refere que os fiadores, ainda que solidários, ficam desonerados da obrigação que contraíram, na medida em que, por facto positivo ou negativo do credor, não puderem ficar sub-rogados nos direitos que a este competem.
215. Este preceito prevê a extinção de direitos do fiador/avalista (o ora opoente), sobre o devedor principal (D…) por culpa do credor, e não já a possibilidade prática de realização do respectivo direito de cobrança do crédito correspondente à sub-rogação.
216. Ainda que advenha uma situação de impossibilidade de efetivação do crédito por diminuição do património do devedor, nem por isso deixa de ocorrer a subrogação, não podendo é o aqui Opoente valer-se dela.
217. No presente caso, face ao antes exposto (não tendo a Exequente preenchido correctamente a livrança dada à execução) impossibilitou e impossibilita que o Opoente pudesse (possa) exercer os direitos decorrentes da legal subrogação, independentemente da existência ou não de bens daquela sociedade.
218. O que tudo importa a sua liberação como avalista. Donde a inexistência do invocado crédito do “C…” sobre o Opoente.
219. A decisão que indefere a invocada liberação do avalista por o Exequente em virtude de este com o seu comportamento ter inviabilizado que o Opoente exerça os direitos decorrentes da legal sub-rogação viola, por erro de interpretação, o artigo 32 da LULL e os artigos 627 e ss do C.C., impondo-se a sua revogação e substituição por outra que declare a liberação do Opoente.
(XIV) A invocada compensação por alegadamente ao longo de todo o relacionamento da devedora principal D… com o exequente, terem sido pagos indevidamente diversos montantes ao C…, sobremaneira os € 885.262,74€ relativos aos contratos de swap e outros instrumentos financeiros referidos, bem como os juros indevidamente debitados relativos às contas correntes caucionadas no valor de € 82.059,89
220. Entende o Tribunal a Quo que não estão verificados os pressupostos legalmente exigidos para o exercício da compensação por considerar que “para poder operar a compensação no âmbito da oposição à execução, o alegado crédito dever estar previamente reconhecido, não sendo o apenso de oposição à execução o meio processualmente adequado para o efeito.”
221. A este propósito afigura-se pertinente Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13.11.2008 que não só determina qual o alcance da expressão «crédito exigível judicialmente», constante da alínea a) do nº 1 do artigo 847º CC, como também determina que não existe qualquer especificidade que impeça a dedução da compensação em sede de oposição à execução.
222. Quanto ao alcance desta expressão é esclarecedora a lição de Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Almedina, vol. II, 7ª edição, pg. 204, «Diz-se judicialmente exigível a obrigação que, não sendo voluntariamente cumprida, dá direito à acção de cumprimento, e à execução do património do devedor (art. 817º) - requisito que não se verifica nas obrigações naturais (art. 402º), por uma razão, nem nas obrigações sob condição ou a termo, quando a condição ainda não se tenha verificado ou o prazo ainda não se tenha vencido, por outra.
Esta a razão legal por que o declarante não pode livrar-se de uma obrigação civil, invocando como compensação um crédito natural sobre o credor ou um crédito (civil) ainda não vencido.»
223. Esta solução é corroborada pelos trabalhos preparatórios do Código Civil, da responsabilidade de Vaz Serra, publicados no BMJ 31º/13e ss., maxime 54 e ss., e 64 e ss. Na doutrina refiram-se ainda Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, AAFDL; 1999, II vol., pg. 222, Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Almedina, vol. II, 5ª edição, pg. 202-3.
224. O acórdão do STJ, de 06.07.06, Sousa Peixoto, www.dgsi.pt.jstj, proc. 06S1067, refere que «esse requisito [exigibilidade judicial] nada tem a ver com um prévio reconhecimento judicial ou extrajudicial do crédito. A exigibilidade em questão significa outra coisa: diz respeito à possibilidade de o compensante poder impor à outra parte a realização coactiva do seu crédito». A doutrina deste acórdão foi acolhida pelo acórdão da Relação de Guimarães, de 08.09.11, Maria Luísa Ramos, www.dgsi.pt.jrg, proc. 723/08. No mesmo sentido, refiram-se ainda os acórdãos do STJ, de 08.02.14, Pereira da Silva, www.dgsi.pt.jstj, proc. 07B4401, e da Relação de Coimbra, de 08.03.10, CJ, 08, II, 173, Fernandes do Vale.
225. Com o acórdão da Relação do Porto, de 07.05.09, Henrique Araújo, CJ, 07, III, 172, podemos dizer, em síntese, que «importa clarificar que a exigibilidade judicial do crédito (imposta pelo artigo 847º, nº 1) e o reconhecimento judicial do mesmo para efeitos do funcionamento do mecanismo da compensação, são realidades distintas: a primeira é requisito da declaração de compensação; a segunda é condição da sua eficácia».
226. A tese que é defendida na decisão recorrida esvaziaria por completo o alcance do instituto da compensação e negaria a sua própria essência.
227. A circunstância de o contra crédito do executado ser impugnado pelo exequente não pode, por si só, inviabilizar a dedução de compensação em sede de oposição. Ao argumento de que «qualquer crédito seria bom para compensação» pode-se contrapor que, então, também bastaria qualquer impugnação para inviabilizar a compensação.
228. E se a admissibilidade da compensação quando o contra crédito seja impugnado é susceptível de potenciar uma maior demora na satisfação do direito do exequente, não podemos esquecer o direito de defesa do executado.
229. Com efeito, nos termos do artigo 816º CPC, não se baseando a execução em sentença, como é o caso dos autos, além dos fundamentos de oposição especificados no artigo 814º, na parte em que sejam aplicáveis, podem ser alegados quaisquer outros que seria lícito deduzir como defesa no processo declarativo.
230. A tal não obsta a circunstância de o título que suporta a execução ser um título de crédito, uma vez que estamos no âmbito das relações imediatas (artigo 17º LULL). E não se vislumbra qualquer obstáculo, designadamente de natureza processual, que obste a que a compensação seja deduzida nos autos de oposição e aí se discuta a existência, validade e exigibilidade do crédito.
231. No mesmo sentido vai Acórdão da Relação de Lisboa de 08.07.2010 (in dgsi) ao estabelecer que por “crédito exigível judicialmente” deve entender-se todo o crédito que possa ser reclamado em tribunal, seja em ação declarativa, seja em ação executiva.
232. A decisão de julgar improcedente a exceção perentória da compensação, viola, por erro de interpretação, o artigo 847ºdo C.C., impondo-se a sua revogação e substituição por outro que admita a exceção.
233. Sendo inconstitucional a interpretação conferida aos artigos 847º C.C que considere que o Avalista não pode invocar a compensação de crédito não previamente reconhecido feita pelo Devedor Principal, ou, na eventualidade de este não exercer tal direito de conteúdo patrimonial de se sub-rogar ao mesmo, quando deste é credora (como é caso), por violação do direito à tutela jurisdicional efetiva previsto no art. 20º da C.R.P. e o princípio da igualdade perante a lei previsto no artº 13º da C.R.P.
Nestes termos e nos melhores de Direito que Vªs. Exªs. muito doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, serem revogadas as doutas decisões recorridas, sendo substituídas por outra que contemple as conclusões acima aludidas…»
c) O Banco recorrido contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão sob recurso.
Finalizou as contra-alegações do seguinte modo:
«O Tribunal a quo fez uma adequada apreciação da prova produzida nos presentes Autos, bem como uma correta aplicação do direito a tais factos, inexistindo qualquer motivo – de facto ou de direito – que deva determinar a alteração da decisão proferida pelo tribunal a quo.
B. Adicionalmente, não se verificaram ao longo deste processo quaisquer irregularidades que, pela sua natureza ou efeitos, possam configurar nulidades processuais.
C. O recurso interposto pelo Executado/Recorrente carece assim de fundamento, consistindo em alegações sem qualquer substrato factual ou legal que não poderão conduzir a uma alteração da decisão proferida em primeira instância, que deverá ser mantida nos seus exatos termos.
D. Deve ser integralmente mantida a tramitação processual adotada nestes Autos, não existindo qualquer fundamento que permita conduzir a uma anulação de processado nos Autos, nomeadamente por não se verificarem quaisquer das nulidades processuais invocadas.
E. São também infundadas as inconstitucionalidades invocadas na alegação apresentada pelo Recorrente, que deverão ter-se por não verificadas.
F. Ao abrigo do disposto no artigo 53º da LULL, o portador de uma letra perde “os seus direitos de ação contra os endossantes, contra o sacador e contra os outros coobrigados, à excepção do aceitante” se deixar passar o prazo “para (…) fazer o protesto (…) por falta de pagamento”.
G. São aplicáveis às livranças as disposições respeitantes às letras (artigo 77.º da LULL).
H. Como resultou provado dos presentes Autos e consta da matéria assente, o Recorrente deu o seu aval à livrança exequenda, nos termos do artigo 31.º da LULL.
I. Em virtude desse facto, o avalista da livrança é responsável pelo pagamento daquela, da mesma forma que a respetiva subscritora D… (artigo 32.º da LULL).
J. E o subscritor de uma livrança é responsável da mesma forma que o aceitante de uma letra (artigo 78.º da LULL), ou seja, está obrigado a pagá-la na data do seu vencimento (artigo 28º da mesma lei).
K. O avalista é responsável da mesma forma que o subscritor da livrança e este último é, por sua vez, responsável da mesma forma que o aceitante de uma letra.
L. É entendimento pacífico e corrente da doutrina e da jurisprudência no sentido de que, para acionar o avalista do aceitante ou, no caso de livrança, o avalista do subscritor, não é necessário proceder ao protesto, uma vez que o avalista se vincula da mesma forma que o aceitante.
M. A omissão de protesto por falta de pagamento não tira ao portador de uma livrança a possibilidade de proceder contra o avalista do respetivo subscritor por meio de ação cambiária direta, como aquela que sem dúvida lhe assiste contra o próprio subscritor.
N. Porque o dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele “afiançada”, nos termos do artigo 32.º 1.º §, da LULL, não se torna necessário o protesto por falta de pagamento para responsabilizar o avalista do subscritor da livrança, pela singela razão de que tal protesto é também dispensável para responsabilizar o próprio aceitante ou subscritor.
O. Ao não proceder ao protesto da livrança em apreço, o Recorrido/Exequente não perdeu os seus direitos de ação contra o Recorrente, na qualidade de avalista.
P. Por essa razão, deverá a este respeito manter-se a sentença recorrida nos seus precisos termos.
Q. Como resulta do artigo 217.º, n.º 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, “as providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afectam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os condevedores ou os terceiros garantes da obrigação”.
R. No caso em apreço, a aprovação e homologação de um plano de recuperação na Insolvência da D… não afetou os direitos da insolvente contra os co-obrigados cambiários, nem, no que para o caso releva, a posição da Recorrente.
S. Em todo o caso e como resulta do alegado pela Recorrente e dos documentos juntos aos Autos, esta apresentou-se a Processo Especial de Revitalização, que correu termos no Tribunal de Vila Nova de Famalicão, com fundamento na sua incapacidade em cumprir o Plano de Recuperação.
T. Tal alegação equivale, naturalmente, a um incumprimento do plano de insolvência, com as consequências previstas no artigo 218.º do CIRE,
U. Pois tendo a D… confessado a sua incapacidade para cumprir as obrigações constantes do plano de recuperação, a ponto de apresentar um PER, a moratória e o perdão constantes do plano de insolvência ficaram necessariamente sem efeito (artigo 218.º do CIRE).
V. A isto acresce o facto de, apesar de o plano ter sido efetivamente aprovado no PER, a sua homologação ter sido recusada por sentença proferida pela juiz que presidiu ao PER.
W. Tal despacho ainda não transitou em julgado, por ter sido objeto de recurso, estando pendente de apreciação no Tribunal da Relação do Porto (em virtude de o Tribunal da Relação de Guimarães se ter julgado incompetente para julgar o mesmo).
X. Assim, na presente data, o plano de insolvência foi incumprido, sendo que o plano de recuperação no contexto do PER não mereceu a homologação do Tribunal.
Y. Em qualquer caso, este plano sempre estaria sujeito às regras previstas no citado artigo 217.º, n.º 4, do CIRE, o que determina a manutenção das obrigações dos co-obrigados e dos direitos do Recorrido contra tais obrigados, entre os quais o Recorrente, nos precisos termos em que tal existia.
Z. Por essa razão, tem que improceder a alegação do Recorrente, devendo manter-se a decisão recorrida nos seus precisos termos.
AA. Adicionalmente e pelas razões antes aduzidas, deverá também ser mantida nos seus exatos termos a decisão proferida em audiência realizada em 15.07.2014,
BB. Isto porque a decisão relativa ao PER nunca será, em virtude da aplicação do disposto no artigo 217.º, n.º 4, do CIRE, apta a produzir qualquer efeito sobre a dívida do recorrente perante o Recorrido, nem afetar a sua posição devedora, CC. Não constituindo aquele processo especial de revitalização causa pre-judicial destes Autos de oposição à execução, não devendo, por isso, ter efeitos quanto à tramitação dos mesmos,
DD. Nomeadamente a ponto de determinar a suspensão dos mesmos.
EE. Assim, também por esta razão esteve bem o tribunal na decisão tomada naquela audiência, que deverá ser mantida nos seus exatos termos.
FF. Como resulta do Código de Processo Civil, na versão em vigor à data em que a decisão sobre esta matéria foi tomada pelo juiz a quo, a audiência preliminar poderia ser dispensada pelo juiz (artigo 508.º-B do CPC na versão vigente à data a que se reporta a alegada omissão processual).
GG. Tal decisão era da competência do juiz a quo, a quem a lei processual atribuía poderes para decidir sobre a pertinência da realização, ou não, desta diligência.
HH. No caso em apreço entendeu o juiz a quo, no exercício do poder de conformação processual que lhe é legalmente conferido, que a realização desta diligência era dispensável.
II. Não existem no caso motivos que permitam pôr em causa tal decisão, nem foram invocadas circunstâncias de facto ou de direito que permitam atacar esta decisão.
JJ. Em face dos motivos antes invocados, deverá ser mantida a decisão de dispensa da realização da audiência preliminar, bem como todo o processado subsequente a tal decisão.
KK. A matéria vertida no ponto AO dos factos assentes corresponde ao conteúdo do documento junto aos Autos a fls. 341.
LL. Trata-se de documento não impugnado pela Recorrente, que esteve junto aos Autos desde a apresentação da contestação.
MM. Por essa razão, esteve bem o Tribunal ao levar à matéria assente este facto.
NN. O Recorrente teve conhecimento do teor do documento aquando da notificação que lhe foi feita da contestação apresentada pelo Recorrido.
OO. Mesmo que se aceitasse – facto que não se aceita – que tal documento não foi integralmente notificado ao Recorrente, sempre deveria ter sido atempadamente suscitada nos Autos a questão, o que não sucedeu.
PP. E mesmo que houvesse sido atempadamente suscitada, estando o documento nos Autos e correspondendo efetivamente a uma comunicação enviada pelo Recorrido ao Recorrente, tal não alteraria a verdade dos factos, sendo por isso insuscetível de influir no exame e decisão da causa.
QQ. Nessa medida, mesma que tivesse falhado – por um qualquer motivo que não se aceita – a notificação deste documento na íntegra ao Recorrente, tal não alteraria os factos em discussão nos Autos, cuja autenticidade se manteria, pelo que tal omissão nunca configuraria uma nulidade processual, por falta de verificação dos pressupostos legais.
RR. Termos pelos quais deverá dar-se por não verificada a invocada nulidade processual.
SS. A sentença proferida nos presentes Autos está devidamente fundamentada, quer de facto quer de direito, não se verificando qualquer irregularidade que possa conduzir à sua nulidade.
TT. Nomeadamente não se verifica qualquer contradição ou oposição entre a decisão e a sua fundamentação, nomeadamente que seja suscetível de configurar nulidade processual, que não se verifica.
UU. Também neste ponto deve, assim, improceder a alegação da recorrente.
VV. As alegações do Recorrente a respeito da modificabilidade da decisão do tribunal a quo sobre a matéria de facto são integralmente infundadas, não existindo nos Autos qualquer elemento probatório que deva determinar a alteração do sentido da resposta dada.
WW. Assim e por essa razão, deve a resposta aos quesitos a seguir enunciados ser mantida nos seus exatos termos.
XX. A resposta aos pontos 6 e 10 da matéria de facto deve ser mantida.
YY. Com efeito, não foi trazida aos Autos qualquer matéria que fosse valorada pelo Tribunal a quo por forma a impor uma resposta a estes pontos da matéria em sentido diverso do apresentado.
ZZ. Resulta do depoimento nomeadamente da testemunha F… (sessão de 10.07.2014, 4m:50s), não existe qualquer razão para que o Recorrente B… não estivesse informado das responsabilidades da empresa, da qual era a segunda figura e da qual – como resultou provado dos Autos – era administrador e acionista, tendo o pelouro da área financeira (depoimento desta mesma testemunha, na sessão de 10.07.2014, minuto 5 e ss).
AAA. Concretamente no que respeita ao contrato em causa nos Autos, resultou que o Recorrente conhecia os termos deste contrato e que, nessa medida, não podia ter constituído surpresa para o executado/Recorrente o nível das suas responsabilidades perante o Recorrido (depoimento desta mesma testemunha, na sessão de 10.07.2014, minuto 16 e 17).
BBB. Também o mesmo se aplica ao quesito 11.º, no que concerne às operações de SWAP, que o Recorrente tinha plena capacidade para compreender (depoimento desta mesma testemunha, na sessão de 10.07.2014, minuto 27, minuto 31 e minuto 43, e depoimento do Senhor Dr. I…, na sessão de 4.07.2014), CCC. No que respeita aos quesitos 57 a 61, deve a resposta do Tribunal a quo ser mantida, por tudo o que se referiu, nomeadamente pelo facto de as operações em apreço serem do conhecimento do recorrente, que tinha capacidade para as compreender,
DDD. Sendo que também não se demonstrou que o Recorrente tivesse conhecimento que estas operações eram desconhecidos para o Recorrente, como se alegava nos ponto 64 e 65.
EEE. Acresce que, como resulta do depoimento do Senhor Dr. I… (sessão de 04.07.2014 ao minuto 44), não havia o hábito de submeter estes contratos ao departamento jurídico da D…, questão que se revela altamente incompatível com a alegação de não compreensão dos mesmos por parte do executado.
FFF. Assim, deverá a resposta a todos estes quesitos ser mantida.
GGG. Como resulta do depoimento das diversas testemunhas ouvidas nos presentes Autos, o envolvimento da D… com o Recorrido C… era muito relevante, sendo o Banco número um da empresa (depoimento desta mesma testemunha, na sessão de 10.07.2014, minuto 35, 50 segundos).
HHH. Por essa razão, os factos alegados pelo Recorrente na sua alegação não têm aderência à realidade, pelo que deverão ser mantidos.
III. No que concerne à matéria em discussão nos pontos 20 a 31, certo é que o juízo constante da sentença está correto e em conformidade com a prova produzida nos Autos.
JJJ. Em concreto, a temática em apreciação nestes pontos prende-se com a contratualização dos contratos de SWAP.
KKK. Da prova produzida nos Autos – nomeadamente o depoimento da testemunha M… na sessão de 10.07.2014 (minuto 33 e seguintes) – resulta claro que os contratos de swap foram uma operação financeira autónoma que a empresa decidiu fazer.
LLL. Referiu que “são contratos autónomos”, que nada têm a ver com os financiamentos contratados.
MMM. Que foram uma operação que a D… “tinha uma negociação em aberto com outra instituição” para a celebração destes contratos.
NNN. Aditou ainda (minuto 36 da mesma sessão) que “a D… era uma empresa com uma dimensão muito relevante” … “com capacidade negocial para dizer que sim ou que não”.
OOO. Nesse sentido, resultou da prova produzida que estes contratos foram celebrados pela D… como uma corrente operação bancária, “um contrato que faz sentido a empresa fazer” (depoimento desta mesma testemunha, na sessão de 10.07.2014, minuto 37).
PPP. Pela prova produzida, deverá a resposta aos referidos quesitos ser mantida integralmente.
QQQ. No que respeita aos pontos em apreço, não resultou provado nos autos qualquer matéria que permita ao tribunal concluir em sentido diverso do constante da sentença proferido pelo juiz a quo.
RRR. Com efeito, não resultou demonstrada qualquer diferença retida na conta margem que devesse ter sido imputada ao montante em dívida pelo Recorrente ao recorrido.
SSS. Nomeadamente, não se demonstrou existirem instruções a que o Banco Recorrido estivesse adstrito que determinassem a afetação de verbas ao pagamento da dívida em discussão dos Autos.
TTT. Não foi feita prova nos autos que demonstre a errada imputação dos montantes referidos na alegação do Recorrente.
UUU. Acresce que, como ficou demonstrado nos Autos, os montantes utilizados das mencionadas contas foi feito em benefício e segundo as instruções da empresa.
VVV. Por essa razão, deverão improceder as conclusões do recorrente, devendo manter-se o sentido da resposta aos mencionados quesitos 48 a 51.
Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deverá ser julgado totalmente improcedente o presente recurso e mantida a sentença recorrida…»
II. Objecto do recurso
De acordo com a sequência lógica das matérias, cumpre começar pelas questões processuais, prosseguindo depois com as questões relativas à matéria de facto e, por fim, resolvidas estas, com as atinentes ao mérito da causa.
Tendo em consideração que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (artigos 639.º, n.º 1, e 635.º, n.º 4, ambos do Código de Processo Civil), as questões colocadas no recurso são as seguintes:
1 - A primeira questão a tratar consiste na alegada nulidade de sentença invocada nas conclusões n.º 72, 73 e 74, «…porquanto o fundamento está em oposição com a decisão, estando, por isso, a sentença ferida de nulidade, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil…».
2 – Em segundo lugar, a impugnação da decisão interlocutória relativa aos efeitos do PER (decisão tomada na audiência de 15.07.2014).
3 – Em terceiro lugar, analisar-se-á a questão relativa à não realização de audiência preliminar (decisão esta proferida por despacho de 22.05.2013).
4 – Em quarto lugar, cumpre analisar a questão relativa ao facto declarado provado na base instrutória sob a al. AO) da «Matéria Assente», a que corresponde o «Facto 40 da Fundamentação», com este teor:
«Em 22/12/2011, a Exequente remeteu ao executado/opoente a carta de fls. 341, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, comunicando-lhe o preenchimento da livrança pelo valor de €1.551.312,23, com vencimento fixado para o dia 28/12/2011».
Cumpre verificar se a carta de fls. 341 não foi remetida ao Opoente juntamente com a notificação da contestação e respectivos documentos e, em caso afirmativo, quais as consequências da falta de notificação, designadamente se ocorreu alguma nulidade processual, caso se conclua que ocorreu falta notificação e que tal omissão influiu no exame e decisão da causa, porquanto terá ocasionado a fixação de matéria provada sem que o Recorrente tivesse sido notificado para, querendo, se pronunciar quanto ao documento dado como provado.
5 – Após estas questões de natureza processual, apreciar-se-á a matéria de facto impugnada, isto é, a relativa aos quesitos 6,10, 11, 12, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 38, 48, 49, 50, 51, 57, 58, 59, 60, 61, 64 e 65.
6 – No que respeita à vertente jurídica, coloca-se em primeiro lugar a questão da necessidade ou desnecessidade de duas assinaturas para obrigar a empresa D….
7 – Depois, a relevância ou irrelevância da falta de protesto da livrança.
8 – De seguida, os eventuais efeitos na dívida, se os houver, da aprovação e homologação do plano de insolvência relativo à D….
9 – A questão seguinte consiste em verificar se ocorreu erro-vício na mente do executado no que respeita à vontade de conceder o aval.
10 – Por último, cumpre verificar se é imputável ao Banco exequente algum comportamento que haja implicado a não amortização parcial do empréstimo que originou a letra e, sendo a resposta positiva, se o executado pode ser desresponsabilizado pelo pagamento de tais quantias.
Cumprindo aqui apreciar as seguintes questões:
(I) Pagamentos feitos pela empresa K… à D….
(II) Instruções dadas pela D… ao Banco Exequente acerca do contrato de factoring existente entre ambos, nos termos das quais ficariam retidos, primeiro 10% e mais tarde 22,5% das quantias devidas à D…, para efeitos de amortização de responsabilidades desta para com o Banco exequente.
(III) Circunstâncias em que os contratos de swap e outros instrumentos financeiros foram celebrados entre a D… e o C… e a dificuldade em percepcionar, por parte do executado, as consequências dessa contratação.
(IV) A aplicação indevida de um spread de 9% nos contratos de conta corrente caucionada no período compreendido entre Maio de 2009 e Janeiro de 2010.
(V) Compensação entre os pagamentos feitos ao Banco exequente, designadamente 885.262,74 EUR relativos aos contratos de swap e outros instrumentos financeiros, bem como os juros indevidamente debitados relativos às contas correntes caucionadas no valor de 82.059,89 EUR.
III. Fundamentação
a) 1 - A primeira questão a tratar consiste na alegada nulidade de sentença invocada nas conclusões n.º 72, 73 e 74, nestes termos: «…porquanto o fundamento está em oposição com a decisão, estando, por isso, a sentença ferida de nulidade, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil…»
O recorrente sustenta que «72. Na apreciação desta questão, e com base na matéria dada como provada, conclui o Digno Tribunal a Quo que o contrato de crédito denominado RLS nº …….., na sua versão inicial (18/02/2009) foi concluído através de negociação directa do executado/opoente com a exequente.
73. Ora, tal conclusão não decorre de qualquer ponto da Fundamentação e está até em contradição com a matéria dada como provada, nomeadamente os pontos 43 a 45 da Fundamentação».
Não tem razão.
A nulidade de sentença é um vício de natureza processual que consiste num erro lógico patenteado pelo raciocínio exposto na sentença, ou seja, há nulidade de sentença quando o dispositivo da sentença está em contradição com as premissas antes adoptadas pelo juiz (com as premissas que o juiz efectivamente adoptou e não com as premissas que ele poderia ter adoptado).
Como referiu o Prof. Alberto dos Reis, «Quando os fundamentos estão em oposição com a decisão, a sentença enferma de vício lógico que a compromete. A lei quer que o juiz justifique a sua decisão. Como pode considerar-se justificada uma decisão que colide com os fundamentos em que ostensivamente se apoia?» e acrescenta, «Há contradição entre os fundamentos e a decisão quando «…os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto» [1].
Repetindo, esta nulidade ocorre quando o juiz conduz a argumentação que consta da fundamentação jurídica da sentença num certo sentido e, depois, no dispositivo da sentença, tira uma conclusão inesperada, isto é, contraditória com a argumentação anterior.
É nisto que consiste a contradição apontada nesta norma.
Ora, tal contradição não ocorre no caso dos autos.
Com efeito, se um leitor hipotético fizer o exercício de ocultar o dispositivo da sentença e ler de seguida apenas a respectiva fundamentação, se esse leitor tivesse de escrever a decisão após ter lido a fundamentação, concluiria no mesmo sentido que consta do dispositivo da sentença sob recurso, isto é, a conclusão (decisão) da sentença é a esperada face às premissas que o juiz fez constar da fundamentação.
Quando a parte discorda da fundamentação indicada na sentença, por exemplo, devido a eventual errada aplicação do direito aos factos, tal discordância insere-se na questão jurídica de fundo, de mérito, mas não respeita a matéria de natureza processual, como é o caso das nulidades de sentença.
Improcede, por conseguinte, a invocada nulidade de sentença.
b) Cumpre agora analisar a questão relativa à não realização de audiência preliminar.
É improcedente a pretensão do executado.
A lei dispunha, à data, no artigo 508º-B (Dispensa da audiência preliminar) do Código de Processo Civil, o seguinte:
«1. O juiz pode dispensar a audiência preliminar, quando:
a) Destinando-se à fixação da base instrutória, a simplicidade da causa o justifique;
b) A sua realização tivesse como fim facultar a discussão de excepções dilatórias já debatidas nos articulados ou do mérito da causa, nos casos em que a sua apreciação revista manifesta simplicidade.
2. Não havendo lugar à realização de audiência preliminar, se a acção tiver sido contestada e houver de prosseguir, o juiz, no despacho saneador, seleccionará a matéria de facto, mesmo por remissão para os articulados, podendo as partes apresentar as respectivas reclamações no início da audiência final».
Foi entendido em 1.ª instância que a causa não era complexa e por isso foi dispensada a audiência preliminar.
Não se mostra pela análise dos autos que a realização da audiência preliminar fosse um acto processual necessário.
E a prova reside no facto da sua omissão não ter gerado qualquer situação processual susceptível de influir no exame ou na decisão da causa, para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 195.º do Código de Processo Civil (anterior n.º 1 do artigo 201.º do Código de Processo Civil).
Por conseguinte, improcede a invocação desta nulidade.
c) Passando à questão relativa ao facto declarado provado na base instrutória sob a al. AO) da «Matéria Assente», a que corresponde o «Facto 40 da Fundamentação», com este teor:
«Em 22/12/2011, a Exequente remeteu ao executado/opoente a carta de fls. 341, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, comunicando-lhe o preenchimento da livrança pelo valor de €1.551.312,23, com vencimento fixado para o dia 28/12/2011».
O recorrente alega que aquando da notificação da contestação não foi notificado da carta de fls. 341.
Coloca-se, porém, uma questão preliminar relativamente a esta matéria que é a seguinte:
Não está provado nos autos que o executado não recebeu a referida folha.
É certo que a Exma. Sra. advogada do executado afirma que não lhe foi remetida cópia dessa folha, mas no processo, seja quem for que alegue um facto, há-de fazer prova do mesmo, salvo se houver consenso no processo acerca do mesmo.
Ora, no respectivo requerimento, o recorrente não indicou qualquer prova, pelo que a alegação de tal facto só por si não implica que o facto tenha tido existência histórica.
No entanto, cumpre ainda referir que esta questão não assume relevância nos autos.
Com efeito, se for excluído dos autos o facto da al. AO) da «Matéria Assente», verifica-se que tal facto não se mostra necessário à tomada de qualquer decisão.
Aliás, o executado na oposição que deduz não invoca como defesa, a ausência de comunicação prévia da intenção do banco exequente proceder ao preenchimento da livrança pelo valor de 1.551.312,23 EUR, com vencimento fixado para o dia 28 de Dezembro de 2011.
Improcede, pelo exposto, esta pretensão do executado.
d) Passando agora à impugnação da matéria de facto.
Como se referiu, a impugnação respeita aos quesitos 6,10, 11, 12, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 38, 48, 49, 50, 51, 57, 58, 59, 60, 61, 64 e 65.
Seguindo a metodologia utilizada pelo recorrente, e transcrevendo a sua alegação, vejamos os quesitos que se referem ao conhecimento que o Executado teria ou não teria acerca do endividamento da empresa D…, quer no que respeita a quantias, quer a prazos de vencimento.
Os quesitos pertinentes são estes:
Quesito 6: «Sendo por isso com surpresa que o executado/opoente foi confrontado com inúmeros problemas aquando da declaração de insolvência da D…?».
Este quesito omite os factos a que se refere e, por isso, não é susceptível de ser respondido positivamente.
Por outro lado, o quesito 6.º reporta-se à data da declaração de insolvência da D… que ocorreu em 2011.
Por isso, estamos perante afirmações que, a corresponderem à realidade, seriam incapazes de ter contribuído para o alegado erro-vício que levou o executado a conceder o aval à empresa D… em 18 de Fevereiro de 2009.
Por isso, a análise desta matéria sempre constituiria acto processual inútil, o qual não deve ser praticado, como prescreve o artigo 130.º do Código de Processo Civil.
Por ambas as razões não se analisa a impugnação relativamente a este quesito que foi declarado «não provado».
Quesito 10: «Foi com manifesta dificuldade (não obstante ter – a pedido – assinado documentação) que o executado/opoente veio a tomar conhecimento da evolução e meandros da relação existente com a exequente?».
A resposta foi provado «que na decorrência da declaração de insolvência da D…, o executado/opoente solicitou à Dra. H…, do departamento de economia, que efectuasse o levantamento das suas responsabilidades pessoais na qualidade de garante da empresa».
O recorrente pretende que se declare provado que «na decorrência da declaração de insolvência da D…, após o accionamento da livrança e posteriormente à validação dos créditos reclamados no processo de insolvência, executado/opoente solicitou à Dra. H…, do departamento de economia, que efectuasse o levantamento das suas responsabilidades pessoais na qualidade de garante da empresa»
Não se encontram razões para alterar a resposta dada. Por outro lado, a resposta pretendida não produziria qualquer alteração ao nível da decisão a proferir.
Por isso, mantém-se a resposta dada.
Quesito 57: «De tudo isto, só teve o executado/opoente percepção e real conhecimento após a declaração de insolvência da D…, na decorrência de interpelação a que foi sujeito e que excedia largamente a que expectava?».
Quesito 58: «O executado/opoente não estava cabalmente informado da situação contratual existente com a exequente?».
Quesito 59: «E só uma análise cuidada permitiu detectar os débitos indevidos de juros nas Contas Correntes Caucionadas e o incumprimento do acordado e das instruções dadas no âmbito do contrato de empréstimo garantido pela livrança aqui em causa?».
A resposta dada foi esta:
«quesitos 57º a 61º: Provado apenas que o executado/opoente só tomou conhecimento das aludidas divergências depois de lhe ter sido entregue o levantamento referido na resposta ao quesito 10º».
Deve manter-se esta resposta aos quesitos 57, 58 e 59, pelas seguintes razões:
Apesar das declarações em sentido oposto das testemunhas H… (minuto 39:33 e 57:04), verifica-se que a responsabilidade assumida pelo executado através do aval é elevada e, por ser elevada, não é credível que o mesmo não procurasse saber da situação financeira da empresa em relação ao Banco exequente e se a dívida por si avalisada estava a ser amortizada.
E não se afigura credível esta ignorância alegada pelo recorrente porque, além da dívida ser elevada e poder-lhe ser exigida, o oponente era administrador e accionista e havia na empresa funcionários a quem ele podia dar ordens e que podiam fazer tal trabalho, não necessitando o próprio de o executar com as suas próprias mãos.
Por isso, embora não se afirme que o executado «sabia», também não se pode afirmar que «não sabia» e daí que as respostas permaneçam negativas (não provado).
Quesito 11: «Com especial relevância tomou percepção da existência e real impacto financeiro de contratos de SWAP de taxa de juro, contratos Opção CAP de taxa de juro e Contrato de Opções COLLAR de taxa de juro celebrados com a exequente?».
A resposta foi «não provado».
O Recorrente pretende que a resposta seja «provado».
Valem aqui as mesmas razões acabadas de indicar ao quesito 59. Pelas mesmas razões este quesito não pode ser declarado «provado».
Repete-se: o executado era administrador e accionista da empresa e tinha assumido responsabilidades pessoais de pelo menos 5.500.000,00 EUR, pelo que não faz sentido que andasse alheado da vida financeira da empresa.
Por isso, não é pelo facto de alguma prova testemunhal afirmar o que consta do quesito que tal realidade passa, sem mais, a existir.
Com efeito, as declarações das testemunhas não são os factos, podem apenas estar ou não estar de acordo com eles.
Mantém-se, por isso, a resposta negativa.
Quesito 60 e quesito 61: «A ter conhecimento desta situação, nunca o executado/opoente teria permitido que a mesma se mantivesse?» e «E muito menos teria avalizado este e outros empréstimos concedidos pela exequente à D…?».
Resposta foi esta:
«quesitos 57º a 61º: Provado apenas que o executado/opoente só tomou conhecimento das aludidas divergências depois de lhe ter sido entregue o levantamento referido na resposta ao quesito 10º».
A resposta deve continuar a ser negativa pelas seguintes razões:
Cumpre começar por referir que não se percebe a que realidade concreta se referem as perguntas.
Se se referem ao conhecimento que o executado teve da situação económica da empresa, verifica-se que os quesitos 57.º a 59.º se reportam à data da declaração da insolvência ou mesmo a data posterior a esta.
Mas, se é este o caso, então tem de referir-se que não há nexo de causalidade entre a prestação do aval e o conhecimento que o arguido alega ter tido apenas na altura da declaração de insolvência e depois dela, acerca da situação financeira negativa da empresa, que superava as suas expectativas.
A situação económica negativa existente e verificada, segundo alega o executado, na altura da declaração de insolvência, não podia ter tido influência sobre a vontade de avalisar a livrança.
Com efeito, a prestação do aval ocorreu em 18 de Fevereiro de 2009.
Trata-se de uma impossibilidade física.
Se a pergunta se refere à situação que existia antes da prestação do aval, então verifica-se que não se sabe que situação era essa, em que consistia a situação negativa?
Dada esta ambiguidade, não é possível o juiz formar uma convicção no sentido de responder provado aos quesitos.
Em segundo lugar, o executado era administrador e accionista da D… que mostra que era alguém que representava legalmente a empresa e tinha condições de facto para estar a par da situação económica da mesma.
É caso para dizer que se porventura não estava ao corrente da situação económica, tinha todas as condições para poder estar.
Aliás, a empresa, como resulta do depoimento das testemunhas referidas nas alegações de recurso, tinha funcionários que lidavam com a contabilidade e com os aspectos financeiros da empresa, pelo que é de presumir que existia alguma organização que permitia saber, a qualquer momento, as dívidas que existiam e prazos de vencimento, os créditos, ou o dinheiro que havia na empresa.
Ora, afigura-se que uma pessoa com este estatuto não avalisaria uma letra de 5.500.000,00 EUR sem conhecer a situação da empresa.
Não podia, por exemplo, deixar de se interrogar acerca da razão por que a empresa carecia de uma tal quantia; por que razão ele teria de ser avalista e não outra pessoa; o que sucederia se não avalisasse a livrança e o que poderia acontecer se a dívida não fosse liquidada no seu vencimento, etc.
Estas questões não podiam deixar de ser colocadas e de ser respondidas pelo executado a si mesmo antes de avançar para o aval.
Mormente sabendo-se que em Janeiro de 2007 o passivo da empresa perante o Banco exequente era superior a 22 milhões de euros! [(facto provado do n.º 13)].
Um tal passivo não podia ser desconhecido e era seguramente causa de preocupação por parte do executado e dos restantes administradores e funcionários responsáveis pela área financeira.
Por conseguinte, a própria situação factual excluiu que o executado pudesse ser uma pessoa alheada da realidade financeira da empresa.
Ou seja, não é possível, em regra, ser accionista e administrador de uma sociedade nesta situação, avalisar uma livrança de 5.500.000,00 EUR e, ao mesmo tempo, fazer tudo isto sem procurar saber qual era a situação financeira da empresa.
Daí que quando se pergunta no quesito 65 se o Banco exequente «também conhecia ou pelo menos não ignorava que o executado/opoente não contrataria naquelas condições se soubesse o real estado das coisas», não se possa formar uma convicção em sentido positivo quanto a este quesito, pois como poderiam os representantes do Banco conceber que o executado, sendo accionista e administrador da sociedade, ignorasse a situação económica da D…?
Em terceiro lugar, coloca-se a questão: o executado ignorava em 18 de Fevereiro de 2009 (data relevante para a ocorrência do erro), exactamente o quê?
Com efeito, utiliza-se o verbo «ignorar», mas não se predica de nada em concreto.
Ora, não estando definida a situação financeira concreta existente em 18 de Fevereiro de 2009, não se pode formar a convicção sobre se o executado teria ou não teria avalizado este empréstimo se conhecesse a situação.
Mas que situação? Não se sabe.
Por conseguinte, a resposta não pode deixar de ser negativa.
Resta apenas dizer que o depoimento da testemunha H…, a referir que o executado lhe solicitou o levantamento da sua responsabilidade, se reporta a uma data muito posterior a 18 de Fevereiro de 2009 e nada nos diz ao certo sobre os conhecimentos que o executado tinha relativamente à situação da empresa quando avalisou a livrança.
Da mesma forma, quanto a testemunha G… refere que caso o executado tivesse tido conhecimento da evolução da relação da empresa D… com o Banco Exequente, não teria avalisado as letras (01:51:33), tal afirmação além de ser uma opinião subjectiva, é feita acerca de factos posteriores a 18 de Fevereiro de 2009.
Ora, se houve erro susceptível de viciar a vontade de avalisar só releva se tiver sido anterior ou contemporâneo em relação à data da declaração do aval.
Da mesma forma, em relação ao referido pela testemunha J… quanto aos contratos de swap, como relevantes para efeitos de outorga do aval.
Com efeito, como resulta do facto provado n.º 51, «O primeiro contrato de swap celebrado (que foi cumprido até à data do seu termo – 15 de Abril de 2008) representou para a D… um prejuízo de € 3.419,38».
Por sua vez, «52 - O segundo contrato de swap (que se previa durar até 15 de fevereiro 2012 mas que veio a ser substituído em 15 de outubro de 2010 pelo 3º contrato de swap) verificou-se igualmente desastroso, tendo provocado um prejuízo de 459.775,29 EUR.
Por fim, «53 - O terceiro contrato de swap (que se previa durar até 25 de fevereiro de 2015 mas que veio a ser cancelado antecipadamente em 31 de maio de 2011) verificou-se também altamente penalizante, tendo provocado um prejuízo de € 63.068,07».
Acresce que «54 - Aquando da insolvência da D… (a 16 de maio de 2011) a exequente considerou que o contrato de swap tinha sido antecipadamente cancelado»
«55 - E que, em consequência, lhe cabia, a esse título, um montante de 359.000,00»
«56 - Que debitou em conta sem qualquer notificação prévia…».
Estes factos mostram que as dificuldades relevantes surgidas com os contratos de swap são posteriores à data da concessão do aval, pelo que estes contratos não viciaram a vontade do executado conceder o aval.
Resulta também dos «factos provados» n.º 67 e 68, que os juros indevidamente cobrados foram-no no período entre Maio de 2009 e Janeiro de 2010, data posterior à outorga do aval, pelo que esta situação também não podia ter influído negativa ou positivamente sobre a vontade do executado conceber o aval à D….
O mesmo vale para a consignação de rendimentos a favor do empréstimo avalizado.
O incumprimento de tal consignação é posterior ao aval, como não podia deixar de ser, pelo que tal facto nunca poderia ter exercido qualquer influência sobre a vontade de prestar ou não prestar o aval.
Por conseguinte, a resposta ao quesito 61.º deve continuar negativa.
A mesma resposta vale para o quesito 60, pois não é um facto adquirido nos autos que o executado desconhecesse a situações financeiras relatadas e que caso as tivesse conhecido as teria evitado.
Para se adquirir a convicção de que o executado teria evitado essas situações, este teria de mostrar com que meios e de que modo teria posto cobro a essas situações, o que não fez.
Decide-se, por conseguinte, manter ambas as respostas negativas.
Quesito 64 e quesito 65: «A exequente sabia que a D… não tinha total consciência dos custos e prejuízos a que se encontrava sujeita?» e «E também conhecia ou pelo menos não ignorava que o executado/opoente não contrataria naquelas condições se soubesse o real estado das coisas?»
Não é possível de modo algum, movendo-nos dentro da realidade, responder «provado» a estes quesitos como pretende o executado.
Em primeiro lugar, cumpre referir que estamos perante factos de natureza mental, ou seja, face ao conhecimento por parte de um sujeito (representantes do Banco) de factos localizados na mente de outro sujeito (executado).
Surgem aqui dificuldades acrescidas, no campo da prova, quanto a tais factos.
Com efeito, pode não ser fácil ou ser mesmo impossível, oferecer uma demonstração externa, verificável intersubjectivamente, de factos que se confinam à mente de um agente.
Não se logra isso através de depoimentos testemunhais que afirmam pura e simplesmente tal facto, dizendo que sim, que o Banco (seus representantes) «conhecia ou pelo menos não ignorava que o executado/opoente não contrataria naquelas condições se soubesse o real estado das coisas»
Tais factos, de natureza mental, têm de ser demonstrados através de factos indiciários, eventualmente provados por testemunhas, no todo ou em parte, dos quais se deduza, segundo as regras da experiência, o facto mental em causa.
Ora, não fazendo o Banco exequente parte dos órgãos de administração da D…, como é que o Banco poderia saber qual a real situação financeira desta empresa?
Como poderia ter acesso às contas desta?
Se o próprio executado alega que desconhecia tal situação financeira, como seria possível que os representantes do banco a conhecessem?
Não se afigura, pois, possível formar a convicção no sentido do banco exequente «conhecer ou pelo menos não ignorar que o executado/opoente não contrataria naquelas condições se soubesse o real estado das coisas».
Aliás, qual era o «estado real das coisas» conhecido do banco em 18 de Fevereiro de 2009, quando foi prestado o aval?
Não é possível responder.
Aliás, a matéria destes dois quesitos, dada a natureza mental dos factos em causa, é de elevada dificuldade probatória, porventura só possível com a aquisição de factos objectivos de elevado valor indiciário.
Quesito 12.º: «Aquando da celebração do contrato de empréstimo referido em H) dos factos assentes, o envolvimento e mesmo a dependência da D… com a exequente era muito grande?».
A resposta dada pelo tribunal a este quesito englobou também a resposta dada aos quesitos 13 e 14 e foi a seguinte: «quesitos 12.º a 14.º: Provado apenas que aquando da celebração do contrato de empréstimo referido em H) dos factos assentes, o endividamento da D… para com a exequente era de cerca de 18 milhões de euros, correspondendo 15 milhões ao empréstimo referido em H) dos factos assentes e o valor remanescente ao saldo de duas contas correntes caucionadas.
O recorrente pretende que a resposta seja «provado».
Não tem razão.
Aliás, o quesito nem devia ter sido formulado por ser uma afirmação de cariz factual, é certo, mas genérica.
Como afirmação genérica não contém qualquer facto, pois um facto é sempre um «pedaço de espaço-tempo», algo com fronteiras, que está situado num certo lugar e num certo momento.
Não estamos, por isso, tal como é afirmado, perante uma afirmação acerca de algo que possa ter tido existência na realidade.
Bem se vê que a afirmação «envolvimento e dependência muito grandes» será uma conclusão acerca de uma dada realidade concreta, que terá ou não existido, mas não se sabe qual é e, se não se sabe qual é, não se pode responder «provado», como pretende o recorrente.
Por isso, é irrelevante que as testemunhas tenham deposto e afirmem que efectivamente a D… tinha um «envolvimento e dependência muito grandes» com o banco exequente.
O aspecto relevante é o que consta da resposta que foi dada e que indica o montante do endividamento.
Mantém-se, por isso, a resposta dada.
Quesito 20: «A D…, não tinha qualquer interesse, nem conhecimentos, para entrar no negócio dos SWAPS e outros instrumentos financeiros?».
Quesito 21: «E o executado/opoente é pessoalmente avesso a este tipo de operações bancária de risco, por ter percepção que não tem características pessoais nem conhecimentos técnicos para tal?».
Quesito 22: «Na D…, empresa do sector da construção, nenhum dos Administradores nem dos quadros técnicos dispunha do saber para aferir do risco destas operações?».
A resposta a estes quesitos, a qual englobou outros, foi a seguinte:
«quesitos 20º a 31º: Provado apenas que a celebração dos contratos de swap foi sugerida pela exequente, não existindo na D… quem estivesse em condições de fazer a projeção da evolução futura das taxas de juro».
O recorrente pretende que as respostas sejam positivas com base, designadamente, no depoimento das testemunhas J… (minuto 55:00/56:00) quando referiu que os contratos de swap eram um jogo e que esse tipo de negócio não estava de acordo com o perfil do executado; ou I…, quando refere que a D… não tinha capacidade para avaliar os riscos inerentes aos contratos de swap (minuto 01:09:50).
A prova testemunhal produzida é insuficiente e dificilmente se poderiam declarar tais quesitos como provados com base em prova testemunhal que se limite a referir directamente os factos em questão, porque tais factos, sendo do foro interno do agente, não são constatáveis, antes se revelam ou manifestam, se for o caso, através de factos probatórios indiciários.
Acresce, por exemplo, quanto aos contratos de swap, que a empresa não era propriamente uma iniciante neste tipo de contratos, pois resulta do facto provado n.º 10 que, em 4 de Abril de 2005, a empresa outorgou o primeiro contrato de swap, o qual durou até 15 de Abril de 2008, tendo causado à empresa um prejuízo de €3.419,38 euros (ver facto provado n.º 51).
Por conseguinte, não é possível formar a convicção, por não ser verosímil, que o executado, como administrador e accionista e avalista de uma livrança de 5.500.000,00 EUR, não tivesse conhecimento da mecânica de funcionamento dos contratos de swap celebrados e do risco que estes envolviam para qualquer das partes.
A testemunha I… referiu que o Banco exequente explicava aos representantes ou funcionários da D…, a mecânica dos contratos de swap (01.23.00).
É uma realidade diversa do mecanismo de funcionamento dos contratos se swap, o domínio de saberes necessários à previsão ou projecção, com algum acerto, de cenários futuros sobre a evolução de taxas de juros.
Neste aspecto o executado careceria de tal competência, como carecia ele e a generalidade das pessoas, mesmo economistas, por ser praticamente impossível ter conhecimento, e conhecimento actualizado, de todas as variáveis da economia a nível regional ou global.
Porém, o executado sabia que não possuía tal conhecimento e sabia que havia riscos, pois o primeiro contrato de swap tinha dado prejuízo.
Sabia, por isso, que o risco de perdas, tal como as hipóteses de ganhos, faziam parte da natureza dos contratos de swap e, por isso, sabia que a empresa estava a assumir riscos que, a concretizarem-se, poderiam revelar-se muito elevados.
E, por isso, se o executado anuiu ou não se opôs à celebração de outros contratos de swap, após o termo do primeiro, que tinha gerado prejuízo, então não é possível concluir que o executado era pessoalmente avesso a este tipo de operações bancárias de risco.
Deve, por isso manter-se a resposta que foi dada.
Quesitos 23.º: «No entanto, num claro processo de “cross-selling”, foi deixado claro que o apoio da exequente à executada estava dependente destas contratações?».
O recorrente pretende que a resposta seja provado.
Deve manter-se a resposta.
Tal pode ter ocorrido, mas não há prova de que o banco exequente tivesse colocado como condição necessária para o financiamento a outorga dos contratos de swap.
Quesito 24.º: «O C… bem sabia do procedimento duvidoso e posição de força na contratação dos diversos contratos de Swap (Opção de Collar e Opção de Cap), bem como das consequências desastrosas de tais operações para a D…?».
O recorrente pretende que a resposta seja provado.
Deve manter-se a resposta.
Mais uma vez estamos perante um quesito composto por conceitos demasiado extensos e que, por isso, comportam imensas hipóteses factuais no seu âmbito.
Com efeito, o que é ou como se traduzem em factos as expressões «procedimento duvidoso», «posição de força na contratação» e «consequências desastrosas»?
Não se demonstrou nos autos que à época da celebração dos contratos de swap, alguém soubesse a que resultados conduziriam no futuro e, por isso, se iriam existir «consequências desastrosas».
Isso dependia do futuro que era, como é sempre, incerto.
Também não se demonstrou que o banco exequente tivesse conhecimentos que lhe permitissem prever com razoável exactidão os acontecimentos futuros.
Aliás, o primeiro contrato de swap, embora tenha gerado prejuízo, não se revelou demasiado penalizador.
Seria de presumir que os restantes contratos manteriam a mesma tendência, salvo se já houvesse factos no horizonte susceptíveis de advertir para outra situação.
Manter-se-á, por conseguinte, o quesito.
Quesito 25.º: «Não havia na D… capacidade para entender e prever as consequências dos contratos que lhe foram dados a assinar?».
A requerente pretende que esta questão seja dada uma resposta afirmativa.
Não tem razão.
Aliás, o conteúdo do quesito contém alguma ambiguidade dada a sua falta de concretização.
Prever que consequências futuras?
Prever se o futuro iria ser favorável à empresa D… ou ao banco exequente?
Prever em termos quantitativos os ganhos e perdas?
Se é isto, claro está que não havia na empresa, nem no banco, alguém com capacidade para fazer tais previsões com alta probabilidade de acerto.
Aliás, duvida-se seriamente que tais previsões sejam possíveis, salvo por partes daqueles, se existirem, que tenham poder para alterar a seu gosto as variáveis financeiros a nível regional ou mundial.
Não será isto que é perguntado no quesito.
Por conseguinte, perguntar-se-á no quesito acerca das consequências gerais ligadas ao modo como o contrato funcionava, ao risco assumido em função da variação futura, para mais ou para menos, das taxas de juro.
Ora, estas consequências dos contratos de swap eram do conhecimento dos representantes da D…, pois até já tinham celebrado um contrato deste tipo em 2005.
Por isso, podiam prever quais seriam os ganhos e as perdas, simulando diversas taxas de juros.
Quesito 26: «Mas ainda que os mesmos fossem cabalmente entendidos, a D… não podia negar-se a assiná-los?».
Quesito 27: Estava “entre a espada e a parede”, como o C… bem sabia?».
Quesito 28: A D… não se encontrava em posição negocial para poder discutir as condições do contrato?».
Quesito 29: E muito menos se pode pôr a possibilidade de não contratar?».
Quesito 30: A D… encontrava-se já numa posição de total subjugação perante a exequente?».
Quesito 31: A D… via-se obrigada a aceitar o que lhe era proposto (e a fazer o que lhe mandavam) de modo a manter a sobrevivência?».
O recorrente pretende que estes quesitos tenham resposta afirmativa.
Deve manter-se a resposta negativa apesar das testemunha I… ter referido, por exemplo, que a celebração dos contratos swap era uma imposição do banco (01:08:00).
Ora, ainda que tais contratos tivessem sido uma exigência do banco, sob pena deste não emprestar dinheiro (o que não resulta provado), sempre a empresa D… podia ter recusado tais contratos de swap, sendo esta uma opção possível à data, e negociado com outras entidades financeiras.
Por isso, esta alegada obrigatoriedade da D… celebrar os contratos de swap também se fica a dever ao facto de ela pretender continuar a laborar.
Mas é um facto que podia não ter celebrado os contratos de swap. Se obteria ou não financiamento, caso não os celebrasse, não pode ser concluído, mas se uma empresa tem dívidas e não tem crédito deve apresentar-se à insolvência e se não o faz e em vez disso contrai mais dívida, não se pode dizer que o credor a obrigou, pois ela mesma podia ter optado pela insolvência em vez de aumentar o passivo.
Quesito 38: «Os contratos de swap (e outros instrumentos financeiros) foram “vendidos” à D… em troca do financiamento de que esta necessitava, sendo que a D… não os procurou, nem deles necessitava?».
O recorrente pretende que a resposta seja «provado».
Deve manter-se a resposta já dada no sentido de que tais contratos foram sugeridos pelo exequente.
É certo que as testemunhas indicadas pelo executado farão uma leitura diversa dos acontecimentos daquela que os funcionários do banco exequente farão.
Com já se disse, a testemunha I…, referiu que tais contratos tinham sido uma imposição do banco exequente, mas a testemunha F… referiu que estes contratos tiveram autonomia em relação aos contratos de financiamento e que a empresa D… tinha diligências no sentido de celebrar tais contratos de swap com outra instituição («são contratos desligados … cobrem a dívida da empresa junto de qualquer banco », minuto 33:57; «..em nada remetem para o contrato, são contratos autónomos…são operações distintas», minuto 34:25; «não houve imposição, tanto quanto sei o cliente tinha até uma negociação em aberto com outra instituição…insistimos que não fechasse com a outra, uma vez que havia um grande envolvimento connosco….éramos o primeiro banco em termos de apoio à D…», minuto 35:55).
E efectivamente verifica-se que quando foi celebrado o contrato avalizado não foi celebrado qualquer contrato de swap.
Como resulta dos factos provados 10 a 24, o contrato de swap em vigor à data do empréstimo avalisado pelo executado data de 16 de Abril de 2007, o qual foi substituído por outro em 13 de Outubro de 2010.
Estes factos corroboram o que foi dito pela testemunha F… no sentido de haver autonomia entre os contratos de swap e de financiamento e concretamente com o empréstimo aqui em causa.
Por conseguinte, na ausência de elementos de prova mais objectivos, como troca de correspondência entre as partes reveladora das respectivas posições, deve manter-se o quesito.
Quesito 48: «Caso o montante de €381.522,72, supra referido, tivesse sido imputado ao empréstimo, conforme instruções dadas, o montante do capital em dívida não seria de €1.405.954,06, mas antes de € 1.024.442,34?».
O Recorrente pretende que a resposta seja provado.
Assiste-lhe razão, pois, de acordo com a resposta ao quesito 39, tal quantia estava consignada ao pagamento do empréstimo avalisado e se o pagamento de 381.522,72 EUR tivesse sido efectuado essa dívida tinha diminuído em conformidade.
Será aditado este facto com o n.º 62/A.
Quesito 49: «Caso tivessem sido cumpridas as instruções dadas quanto à imputação dos valores retidos na conta margem e à amortização dos empréstimos identificados (considerando-se uma imputação proporcional ao valor inicial dos mesmos), do saldo da conta margem de € 1.096.337,45 (indevidamente daí libertado para fins diversos), o valor de € 803.980,79 (proporção imputável ao empréstimo de €5.500.000,00), teria igualmente sido imputado à amortização do empréstimo garantido?».
A resposta foi não provado.
O recorrente pretende que este quesito seja considerado provado.
Trata-se de matéria hipotética que não suscita dúvidas, isto é, se tais valores tivessem sido utilizados para a referida amortização a dívida em causa, esta teria sofrido uma redução correspondente.
Esta matéria será acrescentada sob o n.º 64/A.
Quesito 50: «E consequentemente, o capital em dívida à data da insolvência não seria de €1.405.964,55, mas antes de €220.461,55 (€1.405.965,06€- €381.522,72 - €803.980,79)?».
A recorrente pretende que este quesito seja declarado provado.
Assiste-lhe razão.
Trata-se de uma mera hipótese («se») contabilística em relação à dívida.
Será acrescentado um facto com o n.º 64/B.
Quesito 51: «Ao libertar os montantes existentes na conta margem para fins diversos do pagamento do empréstimo garantido pela livrança aqui em causa, bem como para o pagamento do empréstimo de 2.000.000,00 (também garantido por livrança avalizada), a exequente permitia o pagamento de outras obrigações (não avalizadas), nomeadamente descobertos na Conta de Depósitos à Ordem, em manifesto e claro prejuízo dos avalistas que se mantinham obrigados pelo aval?».
A resposta a este quesito foi esta: «Ao libertar os montantes existentes na conta margem para fins diversos, a exequente permitiu o pagamento de outras obrigações da D…, nomeadamente descobertos na Conta de Depósitos à Ordem».
Não se vê razão substancial para alterar a resposta dada.
e) Matéria de facto provada
1 - A exequente, C…, SA, intentou contra os executados, B… e M…, a acção executiva de que estes autos são apenso, dando à execução a livrança apresentada com o requerimento executivo, da qual se encontra cópia digitalizada no histórico electrónico do processo, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, contendo, para além do mais, os seguintes dizeres:
Livrança n.º ………………
- Importância - 1.551.312,23 EUR;
- Local e data de emissão – Porto - 2010/09/18;
- Vencimento – 2011/12/28;
- Contrato de Crédito RLS n.º ……..;
- Subscritora – D…, SA, com a aposição de uma assinatura e o carimbo daquela sociedade no local respectivo;
- Avalistas – No verso da livrança encontram-se duas assinaturas atribuídas a M… e B…, precedidas da frase “Bom para aval ao subscritor”.
2 - A referida livrança foi subscrita e avalizada, em branco, para garantia do cumprimento das obrigações decorrentes da celebração do contrato de crédito denominado RLS n.º …….., constante do documento de fls. 322 a 329, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
3 - Em conformidade com o teor do referido contrato de crédito, em 18/02/2009, a exequente concedeu à D…, uma facilidade de crédito, sob a forma de empréstimo, no montante de 5.500.000,00 EUR, da qual esta se confessou devedora, pelo prazo de 365 dias, «destinado a regularização de responsabilidades sob a forma de CLS n.º ……..», funcionando esse empréstimo através da conta empréstimo nº ……… e creditado na conta D.O. com o n.º ………, constituindo o extracto da conta documento bastante para prova da dívida e da sua movimentação.
4 - Ainda de acordo com o clausulado do mencionado contrato de crédito, o aludido empréstimo foi utilizado integralmente e de uma só vez, com data-valor de 18/02/2009, devendo o capital e juros ser reembolsado em prestações sucessivas e postecipadas, nos termos constantes do Anexo I ao aludido contrato, vencendo-se a última prestação em 18/02/2010.
5 - Resulta ainda do aludido contrato de crédito que para garantia das obrigações emergentes do mesmo foi entregue uma livrança subscrita pela D… e avalizada por B… e M…, “ficando o Banco expressamente autorizado, através de qualquer um dos seus funcionários, a preenchê-la designadamente no que se refere à data de vencimento, ao local de pagamento e aos valores, até ao limite das responsabilidades emergentes deste contrato (capital e juros) e assumidas (…) perante o Banco, acrescido de todos e quaisquer encargos com a selagem, caso se verifique o incumprimento (…) de qualquer das obrigações que lhe competem e que aqui são referidas”.
6 - Em 17/06/2010, o referido contrato de crédito RLS n.º …….., foi alterado nos termos constantes do documento de fls. 330 a 332, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, consignando-se que o montante em dívida ascendia a 2.505.479,57 EUR, devendo o capital e juros ser reembolsado em prestações sucessivas e postecipadas, nos termos constantes do Anexo I ao mesmo documento, vencendo-se a última prestação em 18/11/2011.
7 - Em 18/09/2010, o referido contrato de crédito RLS n.º …….., foi novamente alterado nos termos constantes do documento de fls. 333 a 335, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, consignando-se que o montante em dívida ascendia a 2.505.479,57 EUR, devendo o capital e juros ser reembolsado em prestações sucessivas e postecipadas, nos termos constantes do Anexo I ao mesmo documento, vencendo-se a última prestação em 31/10/2011.
8 - A exequente celebrou com a D… o contrato de empréstimo constante do documento de fls. 336 a 340, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, o qual foi igualmente subscrito pelo executado/opoente na qualidade de avalista.
9 - Em conformidade com o teor deste último contrato, em 16/12/2004, a exequente concedeu à executada um empréstimo no montante de 15.000.000,00 EUR, pelo prazo de 48 meses, destinado a apoio de tesouraria e consolidação do passivo financeiro no Banco, designadamente a liquidação das seguintes responsabilidades: empréstimo n.º …….., no montante de €1.285.076,05; empréstimo n.º …….., no montante de 1.933.333,35 EUR, e uma livrança a vencer-se em 31/12/2004, no montante de 7.800.000,00 EUR.
10 - Em 4/04/2005, a exequente celebrou com a D… um contrato de SWAP e um contrato de CAP de taxa de juro, documentados a fls. 95 a 105 e 106 a 116, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
Ambos os contratos tinham 15 de Abril de 2005 como data de início e 15 de abril de 2008 como data de vencimento e o montante nominal de 7.500.000,00 EUR. Nos termos do Contrato de SWAP, a D… pagaria trimestralmente uma taxa de juro fixa de 2,74% sobre o montante nominal de 7.500.000,00 EUR e o C… pagaria sobre o mesmo montante taxa Euribor a 3 meses. Nos termos do Contrato de OPÇÃO CAP a taxa do CAP foi fixada em 3%, sendo a D… o Vendedor do CAP e o C… o comprador, tendo a taxa de juro de referência fixada sido Euribor a 3 meses. Assim, trimestralmente, a Taxa de Referência era comparada com a taxa do CAP e, caso a taxa de juro de referência fosse fixada por um valor superior à taxa da CAP, o diferencial da taxa seria pago ao C… pela D…. Se, ao invés, a taxa de juro de referência fosse fixada por um valor igual, ou inferior, à taxa do CAP, a opção não seria exercida e o C… nada teria a pagar à D…. Assim, da celebração conjunta destes contratos resulta que o ganho máximo que a D… poderia ter seria de 0,26% sobre o montante de 7.500.000,00 EUR, e a perda máxima poderia ser de 2,74%.
11 - Em conformidade com a definição constante do site do C1…: “O Cap é um instrumento financeiro de cobertura do risco de taxa de juro, destinado a financiamentos indexados a uma taxa de juro variável, que permite ao seu comprador, mediante o pagamento de um Prémio, fixar o limite superior de flutuação do indexante que se quer cobrir - Taxa de Referência -, fixando o seu custo de financiamento máximo. Simultaneamente, a Empresa compradora do Cap poderá beneficiar das descidas que vierem a ocorrer na Taxa de Referência, abaixo da taxa garantida pelo Cap, ao longo da vida da operação. Em cada uma das datas de fixação da Taxa de Referência, p. ex. Euribor, o nível desta taxa será comparado com a taxa do Cap:
• se a Taxa de Referência for superior à taxa do Cap, a opção é exercida, pelo que o Banco, na data de pagamento dos juros, pagará à Empresa o diferencial entre estas duas taxas. Este diferencial é calculado pelo Banco do seguinte modo: Montante * (Taxa de Referência - taxa do Cap) * (Nº dias do Período de Juros / 360)
• se a Taxa de Referência for igual ou inferior à taxa do Cap, a opção não é exercida, pelo que, para o período em causa, o Cap não é accionado e a Empresa beneficia da descida das taxas de juro. Consoante o tipo de risco a cobrir, a Empresa pode assumir uma posição compradora ou vendedora no Cap.”.
12 - A exequente remeteu à D… as comunicações de fls. 117 a 135, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
13 - Em Janeiro de 2007, o endividamento da D… perante o C… era no montante de 22.345.177,00 EUR, correspondendo 5.000.000,00 EUR a uma livrança, 13.611.917,00 EUR a empréstimos, 3.491.585,00 EUR ao saldo de duas contas correntes caucionadas e 241.674,00 EUR a factoring.
14 - A D… necessitava de continuar a ser financiada pelo C… tendo, em 23 de Maio de 2007, celebrado com a exequente um contrato de mútuo no montante de 66.500,00 EUR, nos termos documentados a fls. 136 a 138, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
15 - E, em 18 de junho de 2007, celebrou um novo contrato de mútuo no valor de 2.000.000,00 EUR, nos termos documentados a fls. 139 a 141, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
16 - Em 16 de Abril de 2007, foram celebrados entre a D… e o C… um Contrato de SWAP de taxa de juro e um Contrato de Opções COLLAR de taxa de juro documentados a fls. 142 a 159, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido. Ambos os contratos tinham 15 de Maio de 2007 como data de início e 15 de Fevereiro de 2012 como data de vencimento e o montante nominal de 5.000.000,00 EUR. Nos termos do Contrato de SWAP a D… pagaria trimestralmente uma taxa de juro, sobre o montante nominal de 5.000.000,00 EUR:
- de 4,18% nos períodos em que a Euribor a 3 meses se fixe abaixo de 4,50%;
- ou Euribor a 3 meses – 0,25% de Spread nos períodos em que a Euribor a 3 meses se fixe igual ou acima de 4,5%;
E o C… pagaria sobre o mesmo montante taxa Euribor a 3 meses.
O contrato de Opção COLLAR, associado a operação de SWAP, pretendia limitar o risco do C… na operação de SWAP, limitando o valor máximo que este poderia ter de vir a pagar.
17 - De acordo com a definição constante do site do C2…:
“O Collar é um instrumento financeiro de gestão de risco de taxa de juro que resulta da combinação de duas opções - Cap e Floor - ambas com as mesmas características, em termos de Montante, Taxa de Referência e Prazo, sendo que uma das opções é comprada e outra é vendida ao Banco. O Collar, sendo um produto que se destina à gestão do risco de taxa de juro de uma qualquer operação indexada a uma taxa variável - financiamento ou aplicação – com roll-over periódicos, por prazos iguais e sucessivos a posição da Empresa na compra ou venda do Cap e do Floor vai depender da operação subjacente cujo risco se pretende cobrir. Se a operação subjacente for um financiamento indexado a uma taxa de juro variável, a Empresa compra um Collar, ou seja, compra de um Cap e da venda um Floor ao Banco, ficando protegida contra a subida das taxas de juro, acima da taxa do Cap, mas beneficia da descida das taxas até ao nível do Floor (…) “A compra de um Collar consiste na combinação da compra de um Cap com a venda de um Floor, ambos com as mesmas características em termos de Montante, Taxa de Referência e Prazo.
Esta estrutura permite à Empresa estabelecer um limite máximo - via taxa do Cap - e um limite mínimo - via taxa do Floor - de flutuação da Taxa de Referência do financiamento que se pretende cobrir, ao longo da vida da operação. Se o Prémio a pagar pela compra do Cap for igual ao Prémio a receber pela venda do Floor, o custo de cobertura para a Empresa é nulo e estamos perante um Collar de Custo-Zero. Em cada uma das datas de fixação da Taxa de Referência, p-ex. Euribor, o nível desta taxa será comparado com a taxa do Cap e do Floor:
• se a Taxa de Referência for superior à taxa do Cap, a opção Cap é exercida, pelo que o Banco, na data de pagamento dos juros, pagará à Empresa o diferencial entre estas duas taxas. O custo de máximo de financiamento está garantido na taxa do Cap, uma vez que a Empresa, apesar de pagar no financiamento juros a uma taxa mais alta, recebe do Banco o diferencial que lhe permite repor o custo de financiamento no nível máximo garantido;
• se a Taxa de Referência se situar no intervalo entre a taxa do Cap e a taxa do Floor, nem o Cap nem o Floor serão exercidos, pelo que não ocorrerá qualquer troca de diferencial de taxas;
• se a Taxa de Referência for inferior à taxa do Floor, a opção Floor é exercida, pelo que a Empresa, na data de pagamento de juros, pagará ao Banco o diferencial entre estas duas taxas. O custo de mínimo de financiamento está garantido na taxa do Floor, uma vez que a Empresa, apesar de pagar no financiamento juros a uma taxa mais baixa, paga ao Banco o diferencial que lhe permite repor o custo de financiamento no nível mínimo garantido; A nossa Sala de Mercados está em condições de apresentar cotações para estruturas mais complexas que resultam da combinação de Opções de Taxa de Juro, nomeadamente com o recurso a Knock-in e/ou Knock-out.”.
18 - Nos termos do Contrato de OPÇÕES COLLAR a D… era a Compradora do CAP e o C… o Comprador do FLOOR, tendo sido fixada uma taxa do FLOOR em 4,150% e um nível de “knock-in” do FLOOR de 3,250% (ou seja, caso no dia de referência a Euribor a 3 meses seja maior ou igual ao nível do knock-in do FLOOR, é automaticamente activada a venda do Floor do Cliente ao seu preço de exercício para esse período apenas) e foi fixada uma taxa do CAP em 4,200% e um nível de “knock-out” do CAP de 4,500% (ou seja, caso no dia de referência a Euribor a 3 meses seja maior ou igual ao nível do knock-out do CAP, é automaticamente desactivada a Compra do Cap do Cliente para esse período apenas).
19 - Da celebração conjunta destes contratos resulta que o ganho máximo que a D… poderia ter seria de 0,62% sobre o montante de 5.000.000,00 EUR, e a perda máxima poderia ser de 3,25%.
20 - A exequente remeteu à D… as comunicações de fls. 160 a 180, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzidos.
21 - Dada a insustentabilidade da situação, a D… negociou com o C… o cancelamento destas operações e a contratação de uma nova operação de Step Up Swap, nos termos documentados a fls. 181 a 183, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
22 - O cancelamento destas operações originou débitos na conta corrente da D… no valor total de 499.000,00 EUR, sendo o custo de cancelamento da operação de Swap de 248.000,00 EUR e o da operação de Collar de 251.000,00 EUR. Tal montante seria creditado na conta da D… com a contratação de nova Operação de Step Up Swap. Em tal Operação, contratada a 13 de Outubro de 2010, com data de início de 15 de Outubro de 2010, o valor nominal passou de 5.000.000,00 EUR para 10.000.000,00 EUR e o contrato vencer-se-ia a 16 de Fevereiro de 2015 (cfr. documentos de fls. 184 a 187, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido).
23 - Com esta reestruturação, o C… “perdoou” à D… os custos de cancelamento mas vinculou-a a uma operação de SWAP com o dobro do valor nominal e por três anos adicionais.
24 - Nos termos do Contrato de Swap celebrado a 13 de Outubro de 2010 a D… pagaria trimestralmente um taxa de juro fixa, sobre 10.000.000,00 EUR de:
- 1,850% da data de início (inclusive) a 15 de Fevereiro de 2011 (exclusive)
- 2,500% de 15 de Fevereiro de 2011 (inclusive) a 15 de Fevereiro de 2012 (exclusive)
- 2,950% de 15 de Fevereiro de 2012 (inclusive) a 15 de Fevereiro de 2013 (exclusive)
- 3,450% de 15 de Fevereiro de 2013 (inclusive) a 15 de Fevereiro de 2014 (exclusive)
- 3,850% de 15 de Fevereiro de 2014 (inclusive) a 16 de Fevereiro de 2015 e o C… pagaria sobre o mesmo montante taxa Euribor a 3 meses (cfr. documentos de fls. 188 e 194 a 195, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido).
25 - Em 30/05/2011, a exequente considerou o cancelamento antecipado de Swap, nos termos documentados a fls. 196/197, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
26 - No período de 2/05/2011 e 31/05/2011, o extracto da conta de depósitos à ordem nº …….., aberta na exequente pela D…, registou os movimentos documentados a fls. 198, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
27 - Em 19 Agosto de 2009, foi feita uma alteração do contrato de factoring n.º ….., celebrado entre a D… e a exequente, nos termos da qual 10% dos adiantamentos seriam retidos em conta margem para amortização de responsabilidades (cfr. documento de fls. 207, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido).
28 - No dia subsequente (20 de Agosto de 2009), por solicitação da exequente, a D… dirigiu carta à mesma solicitando que esses 10% fossem afectos à liquidação do empréstimo aqui em causa (cfr. documento de fls. 208/209, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido).
29 - Em carta dirigida à D…, datada de 4/05/2010, a exequente esclareceu que o contrato celebrado em 18/02/2009 tem o registo interno RLS ……. (cfr. documento de fls. 210, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido).
30 - A instrução dada a 20 de Agosto de 2009 foi cumprida, tendo os 10% retidos sido afectos ao pagamento do empréstimo.
31 - A 23 de Fevereiro de 2010 (e concomitantemente com a celebração de contrato de financiamento de 2.000.000,00 EUR a 18 de Fevereiro de 2010) foi feita nova alteração ao contrato de factoring nos termos da qual o adiantamento a reter em conta margem para amortização de responsabilidades passou a ser de 22,5% (cfr. documento de fls. 211, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido).
32 - No dia 12 de Julho de 2010, a D… dirigiu à exequente a carta de fls. 212, aqui dada por integralmente reproduzida, solicitando que esses 22,5% fossem afectos:
- à amortização do empréstimo aqui em causa, bem como à amortização de empréstimo nº ………, no valor de 2.000.000,00 EUR, contratado posteriormente ao empréstimo de 5.500.000,00 EUR;
- após a liquidação integral de tais empréstimos, à liquidação dos montantes em dívida ao abrigo de contrato de abertura de crédito sob a forma de conta corrente nº ………, no montante de 750.000,00 EUR;
- após a liquidação desse empréstimo, utilizar o remanescente na liquidação parcial dos montantes em dívida ao abrigo da conta corrente n.º 178256319, no montante de 2.743.388,43 EUR.
33 - Nos períodos compreendidos entre 1/02/2010 e 28/02/2010, 1/03/2010 e 31/03/2010, 1/04/2010 e 30/04/2010, 1/05/2010 e 31/05/2010, 1/07/2010 e 29/10/2010, 1/11/2010 e 30/11/2010, 1/12/2010 e 31/12/2010, 2/01/2011 e 31/01/2011, 1/02/2011 e 28/02/2011, 1/03/2011 e 31/03/2011, 1/04/2011 e 29/04/2011, o extracto da conta mercado nº ……….., aberta na exequente pela D…, registou os movimentos documentados a fls. 213 a 224, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
34 - Em 08/06/2006, a D… celebrou com a exequente um Contrato de Abertura de Crédito em conta corrente caucionada (contrato nº ………), nos termos do qual esta concedeu àquela um crédito até ao montante de 750.000,00 EUR. A taxa de juro aplicável a tal contrato foi sujeita a diversas alterações de spread. A partir de 4 de Fevereiro de 2009 o spread passou de 3% para 5.25%. A partir de 6 de Abril de 2009 o spread passou de 5,25% para 6%. A partir de 15 de Janeiro de 2010 o spread passou de 6% para 6,875% (cfr. documentos de fls. 225 a 230, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido).
35 - Em 31/03/2009, 30/04/2009, 31/05/2009, 30/06/2009, 31/07/2009, 31/08/2009, 30/09/2009, 31/10/2009, 30/11/2009, 31/12/2009, 1/02/2010, 28/02/2010, 31/03/2010, a exequente emitiu as notas de lançamento referentes à conta de depósitos à ordem nº ………, documentadas a fls. 231 a 243, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
36 - Em 27/11/2000, a D… celebrou com a exequente um Contrato de Conta Corrente Caucionada (Contrato Umbrella n.º ………) nos termos do qual esta concedeu àquela um crédito até ao montante de €.743.388,43 EUR, nos termos documentados a fls. 244 a 250, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
37 - Em 31/03/2009, 30/04/2009, 31/05/2009, 30/06/2009, 31/07/2009, 31/08/2009, 30/09/2009, 31/10/2009, 30/11/2009, 31/12/2009, 31/01/2010, 28/02/2010, 31/03/2010, a exequente emitiu as notas de lançamento referentes à conta de depósitos à ordem nº ………, documentadas a fls. 251 a 263, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
38 - No âmbito do processo de insolvência nº 1277/11.1TJVNF, que correu os seus termos pelo 5º Juízo Cível de Vila Nova de Famalicão, foi apresentado o plano de insolvência constante do documento de fls. 268 a 295, o qual foi homologado por sentença proferida em 5/01/2012, nos termos documentados a fls. 296 a 298, o que tudo aqui se dá por integralmente reproduzido.
39 - Aquando do registo do respectivo contrato de sociedade, em 4/05/1987, a D… obrigava-se pela assinatura de um administrador ou de dois mandatários dentro dos limites dos respectivos mandatos. Posteriormente, por alteração registada em 29/04/2010, a referida sociedade passou a obrigar-se pela intervenção de dois administradores, de um administrador e um mandatário, ou de dois mandatários (cfr. certidão permanente n.º ….-….-…., cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido).
40 - Em 22/12/2011, a exequente remeteu ao executado/opoente a carta de fls. 341, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, comunicando-lhe o preenchimento da livrança pelo valor de 1.551.312,23 EUR, com vencimento fixado para o dia 28/12/2011.
41 – A exequente remeteu à D… as comunicações de fls. 188 e 194 a 195, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
42 - O executado/opoente foi, até 1999, para além de Administrador da D…, responsável pela área financeira.
43 - Com a entrada para os quadros da empresa, em 1999, de um Director Financeiro, o executado/opoente afastou-se desta área.
44 - Não obstante lhe continuar a caber, até porque a prática da empresa assim o ditava, a assinatura de inúmeros contratos com a Banca e mesmo a avalização de algumas livranças.
45 - Após a entrada para a D… do Dr. I… como director financeiro, as negociações com a banca passaram a ser feitas directamente por este, por delegação do respectivo conselho de administração.
46 - O facto de lhe caberem as assinaturas devia-se essencialmente à prática instituída na D… durante largos anos.
47 - Na decorrência da declaração de insolvência da D…, o executado/opoente solicitou à Dra. H…, do departamento de economia, que efectuasse o levantamento das suas responsabilidades pessoais na qualidade de garante da empresa (resposta ao quesito 10º da base instrutória);
48 - Aquando da celebração do contrato de empréstimo referido em H) dos factos assentes, o endividamento da D… para com a exequente era de cerca de 18 milhões de euros, correspondendo 15 milhões ao empréstimo referido em H) dos factos assentes e o valor remanescente ao saldo de duas contas correntes caucionadas.
49 - O apoio da exequente era vital para a D….
50 - A celebração dos contratos de swap foi sugerida pela exequente, não existindo na D… quem estivesse em condições de fazer a projecção da evolução futura das taxas de juro.
51 - O primeiro contrato de swap celebrado (que foi cumprido até à sua data términos – 15 de Abril de 2008) representou para a D… um prejuízo de 3.419,38 EUR.
52 - O segundo contrato de swap (que se previa durar até 15 de Fevereiro 2012 mas que veio a ser substituído em 15 de Outubro de 2010 pelo 3.º contrato de swap) verificou-se igualmente desastroso, tendo provocado um prejuízo de 459.775,29 EUR.
53 - O terceiro contrato de swap (que se previa durar até 25 de Fevereiro de 2015 mas que veio a ser cancelado antecipadamente em 31 de Maio de 2011) verificou-se também altamente penalizante, tendo provocado um prejuízo de 63.068,07 EUR.
54 - Aquando da insolvência da D… (a 16 de Maio de 2011) a exequente considerou que o contrato de swap tinha sido antecipadamente cancelado.
55 - E que, em consequência, lhe cabia, a esse título, um montante de 359.000,00 EUR.
56 - Que debitou em conta sem qualquer notificação prévia à D…
57 - Como condição da celebração do contrato de crédito RLS n.º …….. foram consignados ao pagamento do referido financiamento as quantias a serem pagas à D… pela K… ao abrigo do contrato de subempreitada “…”.
58 - Nos termos de tal condição, foi dada instrução irrevogável à K… para proceder aos pagamentos da referida subempreitada na conta de depósitos à ordem nº ……… (resposta ao quesito 40º da base instrutória);
59 - E, de igual modo, foi dada instrução irrevogável à exequente para utilizar tais montantes para o pagamento do referido contrato de financiamento.
60 - Tendo, a 23 de Março de 2009, sido feito um pagamento pela K… no montante de 204.892,13 EUR.
61 - O qual foi utilizado, de acordo com as instruções dadas, para proceder a uma amortização extraordinária do referido financiamento (resposta ao quesito 43º da base instrutória);
62 - No entanto, aquando do pagamento subsequente, no valor de 381.522,72 EUR, apesar de tal montante ter sido depositado na conta D.O. indicada, não foi cumprida a instrução irrevogável e o empréstimo não foi amortizado.
62/A - Caso o montante de 381.522,72 EUR, supra referido, tivesse sido imputado ao empréstimo, conforme instruções dadas, o montante do capital em dívida não seria de 1.405.954,06 EUR, mas antes de 1.024.442,34 EUR (adicionado devido à procedência da impugnação da matéria de facto).
63 - Não foi feita qualquer amortização extraordinária no referido montante, ou montante inferior, tendo-lhe sido dado destino diverso.
64 - Apesar de a retenção de 22,5% referida em AF) dos factos assentes, ter sido sempre feita nos adiantamentos concedidos ao abrigo do factoring, os montantes retidos não foram imputados nos termos acordados e de acordo com as instruções dadas.
64/A - Caso tivessem sido cumpridas as instruções dadas quanto à imputação dos valores retidos na conta margem e à amortização dos empréstimos identificados (considerando-se uma imputação proporcional ao valor inicial dos mesmos), do saldo da conta margem de 1.096.337,45 EUR (indevidamente daí libertado para fins diversos), o valor de 803.980,79 EUR (proporção imputável ao empréstimo de 5.500.000,00 EUR), teria igualmente sido imputado à amortização do empréstimo garantido (adicionado devido à procedência da impugnação da matéria de facto).
64/B - E consequentemente, o capital em dívida à data da insolvência não seria de 1.405.964,55 EUR, mas antes de 220.461,55 EUR (1.405.965,06 EUR - 381.522,72 EUR - 803.980,79 EUR) (adicionado devido à procedência da impugnação da matéria de facto).
65 - Constatando-se que o valor de 1.096.337,45 EUR foi retido na conta margem, não tendo sido utilizado para amortização dos empréstimos a que se destinava.
66 - Ao libertar os montantes existentes na conta margem para fins diversos, a exequente permitiu o pagamento de outras obrigações da D…, nomeadamente descobertos na Conta de Depósitos à Ordem.
67 - Relativamente ao contrato referido em AI) dos factos assentes, uma análise cuidada dos juros debitados permite constatar que o spread efectivamente aplicado entre Maio de 2009 e Janeiro de 2010 foi de 9%.
68 - Tendo sido debitado indevidamente um valor de 17.616,93 EUR decorrente da aplicação de um spread de 9% em vez dos 6% e 6,875% contratualizados (84.546,39 EUR - 66.927,18 EUR).
69 - O mesmo se passou relativamente à conta corrente caucionada n.º 178256319.
70 - Apesar de as taxas de juro e spreads contratualizados serem os mesmos para ambas as contas correntes caucionadas, o mesmo débito indevido de juros ocorreu.
71 - Tendo sido debitado indevidamente um valor de 64.442,96 EUR decorrente da aplicação de um spread de 9% em vez dos 6% e 6,875% contratualizados (309.414,24 EUR - 244.971,36 EUR).
72 - O executado/opoente só tomou conhecimento das aludidas divergências depois de lhe ter sido entregue o levantamento referido na resposta ao quesito 10.º.
73 - Na data de emissão da livrança (18/09/2010), a D… só se obrigava com a assinatura de dois administradores, de um administrador e um mandatário, ou de dois mandatários.
74 - Tendo-lhe tal facto sido comunicado, tendo dado azo a uma alteração do modo de movimentação das contas existentes junto do C… a partir de Março de 2010.
75 - Os contratos de swap foram apresentados pela exequente à D… como um «produto pronto», sem possibilidade de negociação.
76 - No decurso das respectivas negociações havidas com a exequente, as condições essenciais dos contratos de mútuo e de swap e outros instrumentos financeiros foram analisadas pelo director financeiro da D…, Dr. I…, por delegação do respectivo conselho de administração.
f) Análise das restantes questões objecto do recurso
1 – Necessidade de duas assinaturas para obrigar a empresa D….
Não assiste razão ao executado.
Na data em que a livrança foi assinada só era exigível uma assinatura quanto aos representantes legais da D….
Por isso, quando as obrigações foram assumidas, foram validamente constituídas.
Mais tarde, a empresa alterou os seus estatutos e passaram a ser necessárias as assinaturas de dois administradores.
Porém, o compromisso, vinculativo, já estava assumido apenas com uma assinatura.
Se não fosse assim, era fácil às sociedades devedoras libertarem-se dos seus compromissos em casos como este ou semelhantes (letras ou livranças assinadas em branco com pacto de preenchimento), pois bastava-lhes alterar depois o pacto social passando a exigir-se mais uma assinatura para obrigar a sociedade.
Improcede, pois, esta pretensão.
2 – Relevância da falta de protesto da livrança.
a) Apesar da qualidade da argumentação do recorrente improcede a sua pretensão.
Não é necessário o protesto.
Este acto destina-se a provar a falta de pagamento do devedor.
Ora, no caso dos autos, como o avalista é representante legal do subscritor da livrança não podia ignorar a falta de pagamento da livrança por parte da D….
Invocar a falta de protesto nesta condições faria incorrer, inclusive, o recorrente em abuso de direito, nos termos do artigo 334.º do Código Civil, por haver na alegação clara ofensa à boa fé.
b) Ainda se dirá o seguinte:
Nos termos do artigo 53.º da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças, «Depois de terminados os prazos fixados (...) para se fazer o protesto por falta de pagamento, o portador perdeu os seus direitos de acção contra os endossantes, contra o sacador e contra os outros co-obrigados, à excepção do aceitante».
Por sua vez, e na parte que aqui interessa, o artigo 32.º da mesma lei diz que «O dador do aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada».
Deste modo, os preceitos citados são suficientemente claros no sentido do portador não carecer de se munir com o protesto para demandar o avalista do subscritor ou aceitante, como é o caso.
Neste sentido pronunciou-se Pinto Coelho; «Se o aval é prestado por conta do aceitante, como a obrigação deste não depende de protesto, não há fundamento para o exigir em relação à obrigação do avalista» [2]
Bem como Gonsalves Dias: «… se o dador do aval se obriga 'da mesma maneira' que a pessoa avalizada, o que a lógica naturalmente impõe é que, se o avalista foi garantir a obrigação do aceitante, o portador não tem de observar as formalidades da apresentação e do protesto para conservar os seus direitos contra o avalista, por tais formalidades também não serem necessárias para conservar a acção contra o aceitante» [3].
E, mais à frente: «Se o aval foi prestado a favor do sacado e êste aceita, o possuidor pode demandar o avalista e o avalizado, sem apresentar a letra a pagamento e sem tirar o protesto por falta de pagamento, por estas diligências não serem necessárias para conservar a acção contra êles (art.º 53º da L. U., que em breve anotaremos). Pelo contrário, a apresentação do título a pagamento e o protesto por falta de pagamento tornam-se indispensáveis para conservar a acção cambiária contra os obrigados de regresso (sacador e endossantes) e respectivos avalistas» [4].
Também Abel Delgado sustentou que «Não á necessário o protesto da letra para accionar o avalista do aceitante» [5].
No mesmo sentido, na jurisprudência mais recente, a título de exemplo:
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10-09-2009, no processo 380/09.2YFLSB (Lopes do Rego), «Não é condição do exercício dos direitos do portador de livrança contra o avalista do subscritor o protesto prévio» e acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 9 de Abril de 2013, no processo com o n.º 199/12.3YYPRT-A (Maria João Areias), «I- Ainda que nos afastássemos da posição que vem sendo adoptada pacificamente na jurisprudência - no sentido da desnecessidade do protesto e da apresentação a pagamento do título para accionar o avalista do subscritor da livrança - o facto de, no caso em apreço, se verificar uma coincidência física entre o avalista/oponente e um dos gerentes que assinou a livrança em representação da sociedade subscritora da mesma, sempre importaria a desnecessidade do protesto».
Improcede, por conseguinte, esta pretensão do recorrente.
3 – Quanto aos eventuais efeitos sobre a dívida, se os houver, resultantes da aprovação e homologação do plano de insolvência relativo à D….
Improcedem todas as pretensões invocados pelo recorrente baseadas neste argumento.
Com efeito, o n.º 4 do artigo 217.º do CIRE é claro quando refere que «As providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afectam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os condevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas poderão agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos».
4 – Vejamos agora se ocorreu erro-vício do executado no que respeita à vontade de avalisar a letra.
O executado invoca o disposto no n.º 1 do artigo 252.º do Código Civil, onde se dispõe que «O erro que recaia nos motivos determinantes da vontade, mas se não refira à pessoa do declaratário nem ao objecto do negócio, só é causa de anulação se as partes houverem reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo».
A resposta a esta questão é negativa, pelas seguintes razões:
Como referiu Manuel de Andrade, «O erro-vício consiste na ignorância (falta de representação exacta) ou numa falsa ideia (representação inexacta), por parte do declarante, acerca de qualquer circunstância de facto ou de direito que foi decisiva na formação da sua vontade, por tal maneira que se ele conhecesse o verdadeiro estado das coisas não teria querido o negócio, ou pelo menos não o teria querido nos precisos termos em que o concluiu.
Trata-se pois de um erro que se insinua na motivação da vontade negocial do declarante, que recai sempre nos motivos determinantes dessa vontade» [6].
Por conseguinte, este erro tem de se referir a uma representação da realidade passada ou contemporânea em relação ao momento da conclusão do negócio.
Por isso, factos que tenham surgido temporalmente após a outorga do aval são irrelevantes para este efeito, por ser impossível a sua acção retroactiva; por não poderem ter exercido influência sobre a vontade do executado no sentido de ter concedido o aval.
Assim, os factos alegados pelo executado posteriores à outorga do aval, em 18 de Fevereiro de 2009, não relevam para efeitos deste erro-vício.
É o caso do contrato de swap celebrado em 13 de Outubro de 2010 (al. Y da matéria de facto provada) e suas vicissitudes ocorridas posteriormente a esta data, bem como o alegado desconhecimento do executado da situação financeira da empresa antes da declaração de insolvência.
Acresce que este erro só releva se a parte contrária teve também conhecimento dele («…se as partes houverem reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo»), facto que não se provou.
Ou seja, é necessário que as partes quando contrataram tenham («houverem») reconhecido por acordo (coincidência na representação e valoração da mesma realidade) que o motivo A, B, ou C era causal para levar uma das partes ou ambas a contratar nos termos em que o fizeram.
Este «acordo» não tem de ser expresso [7], mas há-de ter existido e no caso não existiu.
Aliás, do ponto de vista alegado pelo executado ele desconheceria a situação financeira da empresa.
Porém, esta situação factual, mesmo que correspondesse à realidade, não poderia levar à inutilização da prestação do aval, pois seria imputável a negligência do executado.
E quanto à situação futura, ao risco da evolução dos mercados e conjunturas económicas, não há razões jurídicas para colocar a mencionada negligência e risco a cargo do banco que fez o empréstimo.
Improcede, por conseguinte, este fundamento do recurso.
5 – Por último, cumpre verificar se é imputável ao banco exequente algum comportamento que tenha implicado a não amortização parcial do empréstimo que originou a livrança e, sendo a resposta positiva, se o executado pode ser desresponsabilizado pelo pagamento de tais quantias.
Nesta parte assiste razão ao executado quanto a um aspecto da sua argumentação, ou seja, aquele que respeita à consignação de rendimentos provenientes dos pagamentos feitos pela empresa K….
a) Vejamos, porém, antes disso, o âmbito das relações mediatas e imediatas entre a D…, o banco exequente e o avalista ora recorrente.
A causa de pedir invocada na acção executiva consiste na declaração do executado, colocada na livrança que serve de título executivo, nos termos da qual declarou avalisar essa livrança a favor da empresa D…, bem como nas declarações que emitiu na qualidade de avalista exaradas no contrato celebrado em 18 de Fevereiro de 2009, e seus aditamentos, através do qual o banco exequente emprestou à empresa D… 5.500.000,00 EUR.
Destaca-se nesse contrato a cláusula «12.1» com este teor:
«Uma livrança subscrita por V.Exa(s) e avalisada por ENG. B… E ENG. M…, ficando o banco expressamente autorizado, através de qualquer um dos seus funcionários a preenchê-la designadamente no que se refere à data de vencimento, ao local de pagamento e aos valores, até ao limite das responsabilidades emergentes deste contrato…».
Tendo-se verificado o incumprimento do contrato, no que respeita à restituição do mútuo por parte da D…, e tendo o banco exequente procedido ao preenchimento da livrança, segundo alegou, de acordo com o pacto de preenchimento, que excepções poderá o avalista opor à pretensão executiva do banco exequente?
A resposta a esta questão passa pela consulta da lei que cobre o caso, no caso o artigo 32.º da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças, aplicável por força do artigo 77.º da mesma lei, onde se determina:
«O dador do aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada.
A sua obrigação mantém-se, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma.
Se o dador de aval paga a letra, fica sub-rogado nos direitos emergentes da letra contra a pessoa a favor de quem foi dado o vala e contra os obrigados para com esta em virtude da letra»
Os meios de defesa do avalista, como se vê, são escassos.
Como refere CAROLINA CUNHA, «Quanto aos meios de defesa oriundos da relação subjacente avalizado/credor, a impossibilidade da sua invocação pelo avalista fundar-se-á no princípio geral res inter alios acta, também acolhido pelo art. 17.º LU. Como veremos, a única vicissitude invocável pelo avalista – não por ser avalista, e sim pela posição em que se insere na sequência cambiária (veja-se, desde logo, a regra contida no art. 50.º II LU – consiste no pagamento feito pelo avalizado ao credor» [8].
Ou seja, em regra, de acordo com o princípio geral res inter alios acta, o avalista não pode invocar no confronto com o credor vicissitudes da sua relação com o avalizado, nem vicissitudes da relação entre o credor e o avalizado.
Este jogo de interesses compreende-se melhor considerando ainda, como referiu FERRER CORREIA, que «…a responsabilidade do avalista não é subsidiária da do avalizado. Trata-se de uma responsabilidade solidária. O avalista não goza do benefício da excussão prévia, mas responde pelo pagamento da letra solidariamente com os demais subscritores (art. 47.º I). Além de não ser subsidiária, a obrigação do avalista não é, senão imperfeitamente, uma obrigação acessória relativamente à do avalizado. Trata-se de uma obrigação materialmente autónoma, embora dependente da última quanto ao aspecto formal. De facto – e como já vimos – a lei estabelece o princípio de que a obrigação do avalista se mantém, ainda que a obrigação garantida seja nula – e abre uma única excepção a este princípio para o caso de a nulidade desta segunda obrigação provir de “um vício de forma”. Esta fórmula é aqui manifestamente empregada no seu sentido jurídico comum, importando referência às condições de forma externa do acto de onde emerge a obrigação cambiária garantida, isto é, aos requisitos de validade extrínseca desta obrigação» [9].
Por conseguinte, em regra, o avalista apenas poderá invocar perante o credor, o pagamento por parte do devedor seu avalizado.
Ressalvam-se, porém, os casos em que o avalista, nessa qualidade, intervém no contrato que dá origem à livrança, do qual resultou a dívida cambiária avalizada, pois, neste caso, o avalista não é terceiro, mas sim parte nesse contrato.
Por conseguinte, se desse contrato resultarem relações jurídicas que lhe concedam direitos ou deveres, estamos no domínio das relações imediatas, pois não há aqui interposição de outras pessoas [10].
Mas as relações imediatas limitam-se às concretas relações que foram estabelecidas entre avalista e o credor da livrança e não se estendem a outros domínios da relação contratual existente entre o credor da livrança e o avalizado, onde continua a valer plenamente o princípio geral res inter alios acta.
Com efeito, no âmbito de um mesmo contrato podem existir relações jurídicas diversas e estas podem não ser comuns, mas distintas em relação a todos aqueles que subscrevem o contrato.
Tudo depende dos direitos e obrigações que cada outorgante tenha assumido.
b) Cumpre, por isso, delimitar no caso dos autos, onde começam e acabam as relações imediatas entre banco exequente e o executado, para excluir as questões que não se encontram no domínio das relações imediatas entre banco exequente e executado.
Ou seja, as relações jurídicas resultantes desse contrato que tenham como titulares apenas o banco exequente e a empresa D… não fazem parte das relações imediatas entre banco exequente e executado, são em relação a este último res inter alios acta.
Para efeitos do recurso importa verificar se estão no domínio das relações imediatas as seguintes situações:
(I) Pagamentos feitos pela empresa K… à D….
(II) Instruções dadas pela D… ao banco Exequente, acerca do contrato de factoring existente entre ambos, nos termos das quais ficariam retidos, primeiro 10% e mais tarde 22,5% das quantias devidas à D…, para efeitos de amortização de responsabilidades desta para com o banco exequente.
(III) Circunstâncias em que os contratos de swap e outros instrumentos financeiros foram celebrados entre a D… e o C… e a dificuldade em percepcionar as consequências dessa contratação.
(IV) A aplicação indevida de um spread de 9% nos contratos de conta corrente caucionada no período compreendido entre Maio de 2009 e Janeiro de 2010
(V) Compensação entre os pagamentos feitos ao banco exequente, designadamente 885.262,74 EUR relativos aos contratos de swap e outros instrumentos financeiros, bem como os juros indevidamente debitados relativos às contas correntes caucionadas no valor de 82.059,89 EUR.
Vejamos então.
Apenas a primeira situação (I) cabe no âmbito das relações imediatas, cumprindo no entanto explicar porquê.
Verifica-se que do contrato de empréstimo consta uma cláusula, com o número «12.3» que diz: «Para garantia de todas as responsabilidades assumidas ou a assumir por V.EXa(s), é constituída em instrumento(s) contratual(is) que lhe vai ser anexo, e que dele fará parte integrante para todos os efeitos legais e contratuais, contrato de consignação de rendimentos» (cfr. fls. 325 dos autos, negrito no original).
Consta também dos autos, a fls. 623 (doc. 56 junto com a oposição), um documento datado de 18 de Fevereiro de 2019, no qual a D… se compromete unilateralmente perante o banco exequente a não dar outro destino às quantias pagas à D… pela K… ao abrigo do contrato de subempreitada «…».
Consta, por isso, dos factos provados que «57 - Como condição da celebração do contrato de crédito RLS n.º …….. foram consignados ao pagamento do referido financiamento as quantias a serem pagas à D… pela K… ao abrigo do contrato de subempreitada “…”».
Dada a coincidência de datas entre o contrato de empréstimo e o documento de a fls. 623 (doc. 56 junto com a oposição), bem como a referência neste documento ao empréstimo de 5.500.000,00 EUR, tem de se concluir que este documento satisfaz as condições referidas na cláusula «12.3» do contrato de empréstimo, tratando-se de um negócio jurídico através do qual a empresa D… consigna as quantias que irá obter pela realização da subempreitada «“…”».
Por conseguinte, constando tal cláusula do contrato de empréstimo avalisado pelo executado, e tendo a ver com o cumprimento do mesmo por parte da sociedade avalisada, deve entender-se que resulta para o avalista um direito de exigir perante o banco exequente que cumpra esta cláusula contratual, pois o seu cumprimento beneficia-o e o incumprimento prejudica-o.
Estamos, por conseguinte, quanto a esta cláusula no domínio das relações imediatas entre banco exequente e avalista.
Porém, esta situação já não ocorre com os restantes casos acima referidos.
É o caso da situação (II), isto é, quanto às instruções dadas pela D… ao banco exequente, acerca do contrato de factoring existente entre ambos, nos termos das quais ficariam retidos, primeiro 10% e mais tarde 22,5% das quantias devidas à D…, para efeitos de amortização de responsabilidades desta para com o banco exequente.
Esta situação de afectação de dinheiro à amortização do empréstimo de 5.500.000,00 EUR ocorre quanto à percentagem de 10% em 20 de Agosto de 2009 (cfr., documento 63 da oposição, a fls. 631 dos autos) e em 12 de Julho de 2010 relativamente à percentagem de 22,5% (cfr., documento 66 da oposição, a fls. 635 dos autos).
Trata-se de declarações de vontade emitidas pela D… que não permitem concluir que sejam fruto da obrigação por si assumida através da referida cláusula «12.3» do contrato de empréstimo, ou seja, não se mostra que a D… estivesse obrigada perante o banco exequente a efectuar esta afectação de recursos ou, dito de outra forma, que o banco exequente lhe pudesse exigir o cumprimento desta consignação.
Aliás, o empréstimo já estava concedido e o respectivo montante já tinha sido utilizado.
Também é determinante para a conclusão de que esta afectação de recursos provenientes do contrato de factoring não faz parte da obrigação assumida através da referida cláusula «12.3» do contrato de empréstimo, o seguinte: o facto de nessa cláusula de dizer que a garantia relativa à consignação de rendimentos constará de documento «em anexo» [«12.3» que diz: «Para garantia (…) é constituída em instrumento(s) contratual(is) que lhe vai ser anexo…»].
Ora, os documentos datados de 20 de Agosto de 2009, quanto à percentagem de 10% e de 12 de Julho de 2010 relativamente à percentagem de 22,5%, não podem ser «anexos» relativos ao contrato celebrado em 18 de Fevereiro de 2009.
Apenas se pode dizer que foram opções tomadas pela D… e que apenas esta pode exigir responsabilidades ao banco exequente pelo seu incumprimento, mas não o avalista.
O avalista não tem qualquer direito a exigir responsabilidades do incumprimento daquelas instruções, por se tratar em relação a si de res inter alios acta.
O mesmo ocorre agora com mais evidência relativamente às situações restantes.
Assim, quanto (III) às circunstâncias em que os contratos de swap e outros instrumentos financeiros foram celebrados, entre a D… e banco exequente e a dificuldade por parte do executado em percepcionar as consequências dessa contratação, é matéria que podendo relevar em sede de formação da vontade de outorgar o aval, mas viu-se já que era improcedente, desde logo por ser em parte posterior à data do empréstimo.
Para além disto, as vicissitudes que tenham ocorrido já não se situam no âmbito das relações imediatas.
O facto dos contratos de swap se terem revelado prejudiciais após a concessão do aval, é matéria que não pode ser tomada em conta em sede de liquidação da relação cartular, por se situar no âmbito das relações mediatas existentes entre a empresa avalisada e o banco exequente.
Aliás, como se referiu acima, os factos alegados pelo executado posteriores à outorga do aval, em 18 de Fevereiro de 2009, e respectivas consequências jurídicas, não relevam para efeitos de relações imediatas, porque o avalista não é titulares de direitos e obrigações relativamente a esses factos.
É o caso do contrato de swap celebrado em 13 de Outubro de 2010 (al. Y da matéria de facto provada) e suas vicissitudes ocorridas posteriormente a esta data e o alegado desconhecimento do executado da situação financeira da empresa antes da declaração de insolvência.
Relativamente (IV) à aplicação indevida de um spread de 9% nos contratos de conta corrente caucionada no período compreendido entre Maio de 2009 e Janeiro de 2010.
Estamos também aqui no âmbito das relações entre a D… e o banco exequente, que são para o avalista res inter alios acta.
Vejamos agora o que respeita à (V) Compensação entre os pagamentos feitos ao banco exequente, designadamente €885.262,74 relativos aos contratos de swap e outros instrumentos financeiros, bem como os juros indevidamente debitados relativos às contas correntes caucionadas no valor de €82.059,89.
Estamos ainda aqui no âmbito das relações entre a D… e o banco exequente, que são para o avalista res inter alios acta.
De tais relações não derivam nem direitos, nem obrigações para o avalista.
c) Resulta do exposto nas anteriores duas alíneas que o recurso procede na parte em que o recorrente pretende a redução da quantia exequenda de acordo com o incumprimento do banco exequente relativamente à consignação de rendimentos prevista no contrato de empréstimo relativo aos 5.500.000,00 EUR.
Com efeito, como se referiu, o contrato em causa estabeleceu direitos e obrigações em relação aos seus outorgantes, incluindo o avalista.
O cumprimento ou incumprimento da cláusula «12.2» relativo à consignação de rendimentos beneficiava ou prejudicava, consoante os casos, o avalista.
Nada indica no contrato que esta cláusula tivesse sido estabelecida apenas no interesse do banco exequente, de modo a que este a pudesse deixar de cumprir sem quaisquer consequências para si.
Como também favorecia o avalista, tem de se considerar que este tinha o direito de exigir o seu cumprimento quer ao banco exequente, quer à D….
Por conseguinte, o incumprimento do contrato nesta parte dá ao avalista o direito a ressarcir-se do respectivo prejuízo, nos termos previstos no artigo 798.º do Código Civil, onde se dispõe que «O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor».
Neste caso, o prejuízo está determinado e consiste na verba que devia ter sido amortizada e não foi.
Provou-se que «62 - No entanto, aquando do pagamento subsequente, no valor de €381.522,72, apesar de tal montante ter sido depositado na conta D.O. indicada, não foi cumprida a instrução irrevogável e o empréstimo não foi amortizado».
Cumpre, por conseguinte, abater esta quantia à quantia exequenda.
Quanto ao resto, o recurso improcede.
Resta apenas acrescentar que o recorrente suscitou diversas inconstitucionalidades. Não se fez referência a elas porque as questões tratadas e decididas tornaram essa análise desnecessária.
IV. Decisão
Considerando o exposto, julga-se o recurso parcialmente procedente e retira-se à quantia exequenda a quantia de 381.522,72 EUR (trezentos e oitenta e um mil, quinhentos e vinte e dois euros e setenta e dois cêntimos) e juros proporcionais pedidos.
Custas. Na proporção do vencimento e depoimento.
*
Porto, 29 de Junho de 2015
Alberto Ruço
Correia Pinto
Ana Paula Amorim.
_______________
[1] Código de processo Civil Anotado. Coimbra Editora, 1984.Vol. V (reimpressão), pág. 141.
[2] Lições de Direito Comercial, 2.º Vol., fasc. V, pág. 24.
[3] Da Letra e da Livrança, Vol.VIl, 2.ª parte, pág. 516.
[4] Ibidem, pág. 506.
[5] Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças, 5 ª ed., pág. 197/198.
[6] Teoria Geral do Direito Civil, Vol. II, 7.ª reimpressão, Almedina, 1987, pág. 233.
[7] Neste sentido Pires de Lima/Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 3.ª edição, pág. 235.
[8] Letras e Livranças: Paradigmas Actuais e Recompreensão de um Regime. Coimbra: Almedina, 2102, pág. 112.
[9] Lições de Direito Comercial, Vol III - Letras de Câmbio. Coimbra, 1975, pág. 3.º-215/216.
[10] Neste sentido ver o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15 de Maio de 2014, no processo n.º 1419/11.7TBCBR-A (Tavares de Paiva): «Tendo os avalistas subscrito, também, o contrato de abertura de crédito, onde estava também inserido o pacto de preenchimento da livrança em branco, devem ser qualificadas no domínio das relações imediatas as relações entre eles (avalistas) e o beneficiário da livrança (o tomador – banco)» – em www.dgsi.pt (sumário).
Cfr. ainda o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Outubro de 2013, no processo n.º 4720/10.3T2AGD-A (Alves Velho).