Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
317/06.0TBLSD.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: ACÇÃO EXECUTIVA
DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
Nº do Documento: RP20160314317/06.0TBLSD.P1
Data do Acordão: 03/14/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 612, FLS.415-420)
Área Temática: .
Sumário: I - Com a extinção da figura da interrupção da instância, o requisito da negligência das partes em promover o impulso processual transitou para a deserção, cfr. art. 281º, do Código de Processo Civil.
II – No processo executivo, pese embora, se considere a instância deserta “independentemente de qualquer decisão judicial”, cfr. nº 5, daquele art. 281º, não se prescinde igualmente da verificação da negligência da parte na observância do ónus de impulso processual.
III – Sendo que a paragem do processo por mais de seis meses, para que se considere deserta a instância, tem de ser devida a uma omissão culposa do ónus do impulso processual e entre elas, a paragem e a omissão tem de haver um nexo de causalidade adequada.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. Nº 317/06.0TBLSD.P1
Origem: Comarca do Porto Este, Lousada – Inst. Central – Secção Execução – J1
Recorrente: B1… S.A.
Recorrida: C…, Ldª e outros
Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I - RELATÓRIO
O Banco B… S.A., agora, B1… S.A., em 14.02.2006, requereu, execução para pagamento de quantia certa – Dívida comercial - contra C… Ldª, D… e E…, indicando bens à penhora para liquidação do valor de 12.475,77 €.
Após serem citados, deduziram oposição à execução, os executados, D… e E…, cfr. informação de fls. 33.
Conforme consta a fls. 46, 49, 55, 64 e 75 foram penhorados bens móveis e imóveis.
Em 14.09.2007, cfr. consta do despacho de fls. 66, foi sustada a execução relativamente ao bem imóvel, ao abrigo do disposto no art. 871º do CPC.
Nos termos do requerimento apresentado a fls. 95, a exequente veio requerer que lhe fosse passada certidão do despacho de sustação, de onde conste que o mesmo lhe foi notificado em 19.11.2007 pela Srª Solicitadora de Execução, o que ocorreu em 06.03.2008, conforme consta da cópia da certidão junta a fls. 102, notificada à ilustre mandatária da exequente.
Em 20.05.2008 a Srª Solicitadora de Execução, veio juntar cópia das notificações a que aludem os nºs 1 e 4 do art. 886º-A do CPC e informar que irá proceder à venda dos bens penhorados através da venda por negociação particular.
Em 23.05.2008 foi emitida a certidão requerida pela exequente para fins fiscais, cfr. fls. 118.
Em 30.07.2008 a Srª Solicitadora de Execução veio juntar aos autos proposta apresentada para compra dos bens móveis e cópia de quatro notificações enviadas à ilustre advogada da exequente, cfr. fls. 123 e ss.
Pela mesma foram juntos aos autos, em 20.08.2008, cópia do fax enviado pela ilustre mandatária da exequente a concordar com a proposta apresentada e, em 16.09.2008 cópia do título de transmissão dos móveis e notificação à ilustre mandatária da exequente, para a mesma requerer o que tivesse por conveniente, sem prejuízo da alínea b) do nº 2 do art. 51º do CCJ, atendendo a que o produto da venda dos bens móveis era insuficiente para garantia da quantia exequenda e demais custas (vide fls. 132), cfr. consta a fls. 128 e ss..
Em 04.05.2009 a Agente de Execução veio juntar aos autos, nos termos do nº3 do art. 33, do CCJ, nota discriminativa e justificativa das despesas e honorários.
Em 24.08.2009, a exequente veio expor e requerer o prosseguimento dos autos nos termos do art. 919º do CPC quanto ao imóvel, invocando mostrar-se cessado o motivo que esteve na origem do despacho de sustação, cfr. fls. 143.
Notificada, a Agente de Execução, em 19.10.2009, veio informar ter verificado que sobre o imóvel existe penhora anterior à dos presentes autos, no processo nº 1227/05.4TBLSD do 1º Juízo.
Após diligências junto daquele processo, em 17.03.2010, foi proferida a seguinte decisão: “…
Mantém-se, pois, a sustação da execução quanto ao bem imóvel aqui penhorado.
Os autos aguardarão que algo seja requerido, sem prejuízo do decurso do prazo relativo à interrupção da instância.
Notifique.”.

Em 14.06.2011, após diligências junto da exequente, foi proferido despacho a manter a presente execução sustada quanto ao imóvel.
Após, nova notificação, veio a Agente de Execução, nos termos que constam a fls. 159, em 02.10.2012, informar que desde o despacho de sustação proferido nos presentes autos nada mais foi requerido pela ilustre mandatária da exequente.

Conclusos, em 11.10.2012, foi proferida a seguinte decisão:
“Em face do decurso do prazo de um ano sem que os autos fossem impulsionados, declaro interrompida a instância – artigo 285º do CPC.
Aguardem os autos no arquivo o impulso processual ou a extinção da instância por deserção – art. 291º nº 1 do CPC.”.
Esta foi notificada, em 23.10.2012, à ilustre mandatária da exequente.

Em 17.01.2013 a exequente veio juntar aos autos o requerimento de fls. 161 e ss., em que requer a admissão de junção de um substabelecimento sem reserva e que ao seu signatário fosse admitido o acesso à aplicação “Citius” para consulta deste processo e seus apensos.

Em 18.01.2013, conforme resulta do histórico electrónico dos autos nos mesmos foi aposto Visto em Correição.

Cfr. consta de fls. 165, em 17.06.2015, o processo é requisitado ao arquivo geral, constando a data de arquivo de 20-06-2014.
E, foram para distribuição remetidos à Comarca de Porto Este, Lousada – Unidade Central, ver fls. 166.
De fls. 167 a 191, do processo físico, encontram-se vários requerimentos da exequente, o primeiro com data de entrada no Tribunal Judicial de Lousada, em 10.09.2014.
O requerimento junto a fls. 181, tem carimbo de entrada no Tribunal Judicial da Comarca Porto Este - Núcleo Lousada, em 17.06.2015, no qual a exequente requer a renovação da instância executiva, nos termos e para efeitos do disposto no art. 850º, nº 5, do CPC e a notificação da Agente de Execução para proceder à penhora de parte penhorável do vencimento do executado, sendo a última página designada de “Índice da Peça Processual”, dela constando assinado por F… e a data de 06.04.2015.

Após conclusão, em 25.06.2015, foi proferida a seguinte decisão:
Fls. 182 e ss.: A instância dos presentes autos foi declara interrompida por despacho de 11/10/2012 devidamente notificado à exequente, nada mais se tendo requerido quanto ao seu impulso processual até 06/04/2015. Face a isso, é manifesto que a instância se encontra deserta (quer à luz do CPC anterior, quer à luz do CPC actual), o que se declara, indeferindo-se o requerido pelo exequente nesta acção executiva.
Notifique e arquive.
Aponha vistos em correição no apenso A.”.
*
Inconformada com o assim decidido, apela a exequente, nos termos das alegações juntas a fls. 193 e ss. que termina com as seguintes CONCLUSÕES:
1. Da análise dos presentes autos verifica-se que o despacho judicial a jugar interrompida a instância nos termos do aludido artigo 285º do CPC apenas foi proferido em 11.10.2012,
2. Pelo que, só partir dessa data, e nunca antes, a instância foi considerada interrompida, sendo desde então contabilizado o prazo de dois anos para efeitos da sua deserção, a qual teria assim lugar em finais de Outubro de 2014, caso não fosse requerido pelas partes, nomeadamente pelo aqui Recorrente, algum ato no processo tendente à promoção do seu andamento.
3. Ora, conforme resulta do processo, entre 11.10.2012 e Outubro de 2014, foram requeridos nos autos diversos atos conducentes ao prosseguimento da instância executiva e, consequentemente, ao levantamento da declarada interrupção da instância.
4. Apesar de todas aquelas iniciativas processuais, até à data, o Banco recorrente não havia sido notificado de qualquer decisão ou do resultado das penhoras requeridas, bem como da admissão do substabelecimento sem reserva a favor do advogado signatário e da sua associação ao processo na plataforma Citius, ou reconhecimento da posição processual do “B1…” enquanto exequente.
5. Pelo que, ao contrário do exposto no despacho recorrido, antes do cumprimento do prazo a que alude o disposto no artigo 291º do CPC (na sua anterior redação), o Banco recorrente agiu processualmente no sentido de dar impulso à instância,
6. Razão pela qual, na hipótese de se entender ser aplicável in casu a legislação processual civil resultante do Código aprovado pelo DL 329-A/95 de 12 de Dezembro, certo é que se demonstra a impossibilidade e inadmissibilidade de ser a instância julgada deserta nos termos do disposto no referido artigo 291º, impondo-se a prolação de despacho de ordene o seu imediato prosseguimento, nos termos anterior e oportunamente requeridos pelo Recorrente.
7. Acresce que, na hipótese de não se considerar aplicável ao caso o CPC na sua anterior redação atendendo ao disposto no artigo 6º n.º 1 da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, que aprovou o atual Código de Processo Civil, ainda assim se terá de concluir pela revogação do despacho recorrido, conforme se passará a expor.
8. De facto, o artigo 281º n.º 5 do NCPC não afasta, nem pode afastar, o direito das partes em serem previamente ouvidas para se poderem pronunciar sobre tal severa hipótese de deserção da instância, não só porque esta depende sempre do seu suposto comportamento negligente, que emerge de comportamentos ativos ou omissivos na vontade do seu agente e que, portanto, devem ser objeto de análise e valoração para assim se poder fundamentar e justificar o peso da extinção de um processo com base em deserção (cfr. artigo 3º n.º 3 do CPC),
9. Mas, também, importa equacionar que a aplicação do citado artigo 281º n.º 5 do CPC ocorre por força de uma alteração legal que se verificou na pendência do processo e que, por via disso, veio minorar substancialmente o prazo da deserção e, assim, consequentemente, atingir direitos anteriormente constituídos a favor das partes.
10. Facto que não foi estranho ao legislador que entendeu considerar um regime provisório de aplicação do NCPC, impondo uma intervenção oficiosa do Juiz durante o primeiro ano de vigência desse diploma, corrigindo ou convidando as partes a corrigir o erro sobre o regime legal aplicável por força da aplicação das normas transitórias previstas nessa nova lei, bem como, quando da análise dos autos verifique a possibilidade da parte poder omitir um ato que lhe seja devido, promover pela superação desse possível equivoco [cfr. artigo 3º, al. a) e b) da Lei n.º 41/2013, de 26/06].
11. Nesses termos e corroborando a posição jurisprudencial da Relação do Porto, no caso dos autos o Recorrente entende que, pelo menos até Setembro de 2014, ou seja durante o primeiro ano de vigência do NCPC, caso se considerasse verificado o prazo de seis meses de deserção da instância, não se poderia excluir o dever de cooperação e de intervenção oficiosa do Tribunal, no sentido de ordenar a notificação prévia do exequente para vir aos autos demonstrar a ausência de comportamento negligente quanto à eventual inércia processual (tanto mais que essa negligência é requisito essencial para efeitos de aplicação do n.º 5 do artigo 281º do NCPC), mas também, permitindo-lhe dar seguimento aos autos, caso assim o entendesse fazer, antes da prevista deserção.
12. Por outro lado, atento ao requisito essencial da negligência das partes na promoção dos autos, não pode o Tribunal “a quo” julgar a instância deserta sem primeiro fundamentar em que consistiu a tal conduta negligente do exequente, nomeadamente, demonstrando-a através de factos que constem dos autos e que, indubitavelmente, assegurem esse pressuposto legal.
13. Sendo certo que, inexistindo esses factos notórios e na impossibilidade imediata de fundamentação dessa necessária negligência por ausência de indícios claros, deveria o Tribunal “a quo” ter notificado o Recorrente para que este pudesse justificar a inércia processual por mais de seis meses e, bem assim, demonstrar inexistir qualquer conduta negligente como fator responsável por essa eventual inércia, conferindo ao Recorrente o direito de contraditar previsto no n.º 3 do artigo 3º do NCPC.
14. Tanto mais que, como consta dos autos, o Recorrente tem efetivo interesse do prosseguimento da instância executiva, tendo já apresentado diversos requerimentos no ano de 2014 destinados a esse fim.
15. Donde se afere a inexistência de qualquer conduta negligente do exequente, que sempre pautou a sua conduta no cabal compromisso das responsabilidades processuais que lhe são impostas, tendo cumprido oportunamente todas as diligências necessárias ao correto e célere andamento da presente ação executiva.
16. Ora se o artigo 281º n.º 5 do CPC impõe que se verifique “negligência das partes” para efeitos de deserção da instância por falta de impulso processual há mais de 6 meses, sempre teria o Tribunal “a quo” de atender à eventual violação dos deveres impostos ao exequente, à intensidade da vontade de praticar a conduta omissiva na promoção dos autos e à conduta posterior ou anterior do exequente.
17. O que, da apreciação correta e concreta destes autos e face a tudo o quanto é vindo de referir, jamais se poderá atribuir ao Recorrente qualquer ação ou omissão concordante com a vontade, interesse, motivação ou objetivo de obstar ao andamento natural da instância, ainda que a título meramente negligente,
18. O que, por si só, afasta a culpa do Recorrente.
19. Sendo que, para efeitos de aplicação do artigo 281º n.º 5 do CPC, se deve entender por negligência o atuar do exequente sem que se proceda com o cuidado a que, segundo as circunstâncias concretas, se está obrigado e se é capaz.
20. Ora, face exposto, verifica-se que o Recorrente jamais atuou com negligência, não se afigurando qualquer censurabilidade na sua conduta processual.
21. Razão pela qual, o Banco recorrente não aceita, nem pode aceitar, a decisão de deserção da instância nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 281º do CPC e muito menos o indeferimento do requerimento de fls. 182 e seguintes,
22. Não só porque esta não se mostra devidamente fundamentada – como se impunha -,como não ocorrem dos autos factos que sustentem, por si só, a existência de motivos que justifiquem a verificação dos requisitos enunciados naquele preceito legal.
23. Tanto mais que tendo a execução sido sustada por penhora anterior sobre o imóvel penhorado, o preceito legal aplicável à luz do Código de Processo Civil atual nunca seria o art. 281º, nº6 (deserção da instância) mas antes o art. 794º, nº4, que determina a extinção da execução sem prejuízo da sua ulterior renovação ao abrigo do art. 850º, nº5.
24. Pelo que, salvo melhor opinião, o despacho recorrido padece de falta de fundamento legal, mostrando-se contrário ao disposto na legislação em vigor e aos fins do processo executivo.
25. Constando do processo meios de prova plena que, só por si, implicariam decisão diversa da proferida.
TERMOS EM QUE DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO-SE A DECISÃO RECORRIDA E SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE:
A) ADMITA O PROSSEGUIMENTO DA INSTÂNCIA, DEFERINDO O REQUERIMENTO DO RECORRENTE DE FLS. 182 E SEGUINTES, OU, EM ALTERNATIVA,
B) ORDENE A NOTIFICAÇÃO DO RECORRENTE PARA SE PRONUNCIAR SOBRE A EVENTUAL NEGLIGÊNCIA NA FALTA DE IMPULSO PROCESSUAL E PARA NO PRAZO MÍNIMO DE 10 DIAS, PROMOVER PELO ANDAMENTO DOS AUTOS OU REQUERER O QUE TIVER POR CONVENIENTE, SOB PENA DA INSTÂNCIA SER JULGADA EXTINTA POR DESERÇÃO, OU, AINDA EM ALTERNATIVA,
C) DETERMINE A EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO, SEM PREJUÍZO DO DISPOSTO NO Nº5 DO ART. 850º, AO ABRIGO DO DISPOSTO NO ART. 794º, Nº4, NA REDAÇÃO ATUAL. COM O QUE SE FARÁ INTEIRA E SÃ JUSTIÇA.

Não foram apresentadas contra-alegações

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
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O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo da apreciação daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, cfr. art.s 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC.
Assim, a questão a decidir traduz-se em saber se a instância executiva se encontra deserta, como foi declarado na decisão recorrida, ou a mesma deve ser revogada por não existir fundamento para declarar aquela, como defende a recorrente.
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II – FUNDAMENTAÇÃO
Os factos a considerar para a decisão da questão são os que resultam do relatório supra e o que consta do processo electrónico, no período (entre a aposição do visto em correição em 18.01.2013 e a data de 17.06.2015 em que o processo é apresentado por Lousada - Tribunal Judicial (Extinto), de onde decorre que foram praticados os seguintes actos:
- Em 16-06.2014 foi apresentado por F… com a referência 943223 o seguinte: “Execução – Requerimento para outras questões” e com a referência 943224 “Comunicação do Mandatário a Agente de Execução”;
- Em 21.07.2014 aquele mesmo apresentante com a referência 956361 praticou o seguinte acto processual “Requerimento com indicação de bens à penhora”;
- Em 06.04.2015 com a referência 832530 o referido apresentou “Requerimento”.
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O DIREITO
Insurge-se a recorrente contra a decisão que declarou deserta a instância executiva, defendendo que esta decisão tem de ser revogada por falta de fundamento legal e substituída por outra que admita o prosseguimento da instância.
Apreciando.
A presente execução, como se verifica, foi instaurada em 14.02.2006.
Sendo-lhe, no entanto, aplicável o novo Código de Processo Civil, (diploma a que pertencerão todos os artigos a seguir referidos sem outra menção de origem) aprovado pelo art. 1º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, “ex vi” do art. 6º da mesma Lei, que dispõe no seu nº 1: “O disposto no Código de Processo Civil, aprovado em anexo à presente lei, aplica-se, com as necessárias adaptações, a todas as execuções pendentes à data da sua entrada em vigor.”, o qual entrou em vigor em 01.09.2013, cfr. decorre, do art. 8º daquela Lei nº 41/2013.
Diploma legal que, além de outras e significativas alterações que não interessam, no caso, veio eliminar a (existente no CPC revogado) interrupção da instância e determinar, conforme decorre do actual art. 281º, sob a epígrafe, “Deserção da instância e dos recursos” que:
“1 - Sem prejuízo do disposto no nº 5, considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses.
2 - O recurso considera-se deserto quando, por negligência do recorrente, esteja a aguardar impulso processual há mais de seis meses.
3 - Tendo surgido algum incidente com efeito suspensivo, a instância ou o recurso consideram-se desertos quando, por negligência das partes, o incidente se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses.
4 - A deserção é julgada no tribunal onde se verifique a falta, por simples despacho do juiz ou do relator.
5 - No processo de execução, considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses.”.
Verifica-se e tem-se por assente que, em todas as hipóteses de deserção consideradas neste normativo, não se prescinde da negligência das partes.
Decorre da redacção que lhe foi dada pela Lei nº 41/2013 a alteração, no actual Código de Processo Civil, do regime relativo à interrupção e deserção da instância, que até aí vigorava e, nos termos do art. 285º do revogado CPC, dispunha: “A instância interrompe-se, quando o processo estiver parado durante mais de um ano por negligência das partes em promover os seus termos ou os de algum incidente do qual dependa o seu andamento”.
“Cessa a interrupção, se o autor requerer algum ato do processo ou do incidente de que depende o andamento dele, sem prejuízo do disposto na lei civil quanto à caducidade dos direitos”, cfr. art. 286º, do mesmo código.
E, o art. 291º, nº1, do mesmo diploma, dispunha: “Considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando esteja interrompida durante dois anos”.
Da análise destes dispositivos e do actual regime atentas as alterações introduzidas pela Lei nº 41/2013 referida, verifica-se que no código em vigor, não só se encurtou para seis meses o prazo, até aí em vigor, de dois anos, que a parte dispunha para impulsionar os autos sem que fosse extinta a instância por deserção, como se eliminou a figura da interrupção da instância, dispondo-se, agora, que a instância fica deserta logo que o processo, por negligência das partes, esteja sem impulso processual durante mais de seis meses, deixando de existir o período de tempo da interrupção da instância.
Assim, não podem subsistir dúvidas que o actual regime é muito mais severo, no caso de negligência das partes, ao não impulsionarem o andamento do processo, sancionando-as desde logo com a deserção e, consequente, a extinção da instância, nos termos da al. c) do art. 277º.
Como referem J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. I, 3ª ed., 2014, pág 555, “No esquema do código revogado, tal como no do CPC de 1939, a deserção da instância pressupunha uma anterior interrupção da instância, quando as partes, maxime o autor, tivessem o ónus de impulso subsequente.”.
Sendo a interrupção que pressupunha a negligência das partes.
Actualmente, a deserção da instância decorre directamente da circunstância de o processo estar parado há mais de seis meses a aguardar o impulso da parte e o único despacho, legalmente previsto, é aquele que declara essa deserção, nada justificando um anterior despacho de alerta, nem podendo defender-se a sua obrigatoriedade em razão de se ter eliminado, na actual lei, a expressão do revogado art. 291º, nº 1 do CPC, “independentemente de qualquer decisão judicial”, pois, com a distinção da figura da interrupção da instância, como resulta bem claro da redacção do actual nº 1 do art. 281º, o requisito da negligência das partes em promover o impulso processual transitou para a deserção, cfr. neste sentido vejam-se, Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras in “Notas ao Novo Código de Processo Civil – Os Artigos da Reforma”, 2013, Vol. I, pág. 249.
Pois, como os mesmos continuam a fls. 250, “A ideia de negligência das partes não é conciliável com a ausência de uma decisão do juiz que a verifique. Embora a decisão, prevista no nº 4 seja meramente declarativa, até ser proferida não pode, pois, a instância ser considerada deserta, designadamente pela secretaria judicial.”, quanto a outro anterior despacho, defendem os mesmos autores que, “De modo a evitarem-se equívocos, pode justificar-se a notificação da parte, esclarecendo-se que o processo aguarda o seu impulso (art.7º). Esta notificação constitui um dever, nos casos abrangidos pela al. b) do art. 3º do diploma de aprovação do código”.
Ou seja, estando os autos a aguardar há mais de seis meses impulso processual por negligência da parte, o juiz deve, sem mais, lavrar despacho a julgar deserta a instância, cfr. art. 281º, nº 4, tendo sido isso, aliás, o que no presente caso ocorreu, pese embora, estarmos perante uma acção executiva.
E, como decorre do nº 5 daquele mesmo art. 281º, a deserção ocorre “independentemente de qualquer decisão judicial, como é apanágio da extinção da execução (art. 849º), como referem os autores antes citados, na mesma obra, pág. 251.
No entanto, como bem consta daquele mesmo nº5, o que não se prescinde, também, no processo de execução é do controlo prévio da exigida negligência das partes, enquanto causa da situação do processo estar a aguardar impulso processual.

Regressando ao caso, vejamos se assiste razão à recorrente quando defende que agiu processualmente, no sentido de dar impulso à instância antes de decorrido o prazo da deserção.

O despacho recorrido declarou a deserção da instância, ao arrepio aliás do previsto na lei de processo, como decorre do disposto naquele nº5 do já citado artº 281º, assimilando a referida negligência na invocação da paragem do processo na circunstância de nada haver sido requerido pela exequente quanto ao seu impulso processual, desde a instância ser declarada interrompida, em 11.10.2012 até 06.04.2015.
Mas, sempre com o devido respeito, o que consideramos errado, por não podermos concordar que tenha havido por parte da exequente qualquer inobservância, por negligência, do ónus de impulso processual, susceptível da declaração de deserção.
Justificando.
Da análise dos autos resulta que o despacho a declarar interrompida a instância foi notificado à exequente em 23.10.2012.
Em 17.01.2013 (decorridos menos de 3 meses) a exequente veio apresentar nos autos o requerimento de fls. 161, o qual não foi objecto de apreciação.
No dia 18.01.2013 foi aposto no processo “Visto em Correição, tendo os autos sido remetidos ao arquivo, onde permaneceram até serem requisitados em 17.06.2015.
Mais se verifica que, além daquele requerimento de 17.01.2013, após a exequente apresentou para serem juntos aos autos outros requerimentos, os quais, também, não foram objecto de apreciação, excepto o último, apresentado em 06.04.2015, tendo em 25.06.2015, sido indeferido, nos termos que constam da decisão recorrida, por considerar a instância deserta.

Ora, sendo desse modo e, face a tudo o que se deixou exposto é para nós evidente que a instância nos presentes autos não se encontra deserta, nem à luz do CPC anterior, nem à luz do actual, como erradamente o Tribunal “a quo” a declarou.
Dos autos resulta claro que, não é correcta a afirmação de que a exequente, após 11.10.2012, nada mais tenha requerido até 06.04.2015.
A exequente, após ter sido notificada do despacho proferido naquela primeira data, apresentou nos autos vários requerimentos, o primeiro deles logo em 17.01.2013.
No entanto, nenhum deles foi objecto de apreciação até 25.06.2015.
Da leitura daquele nº5 do art. 281º, resulta que a deserção da instância é uma sanção que se aplica à parte que, devendo dar impulso processual, por negligência sua o não faz, determinando a paragem do processo por mais de seis meses.
Nele é exigida uma omissão culposa do ónus do impulso processual, da qual resulte estarem os autos parados por mais de 6 meses, sendo evidente que, entre esta paragem e aquela omissão tem de haver um nexo de causalidade adequada.
Ora, no caso em apreço, tendo a exequente, agora, recorrente apresentado aqueles requerimentos, o primeiro dos quais, menos de três meses após ter sido declarada interrompida a instância, o qual nunca foi objecto de apreciação e outros, não lhe pode ser imputada a paragem dos autos, pelo que não é lícito aplicar-lhe a mencionada sanção.
A instância não pode ser declarada deserta se a paragem do processo ocorre não a falta de impulso processual da parte, mas porque os requerimentos por si apresentados, não foram, atempadamente, apreciados.
Razão porque, é evidente que a decisão recorrida não se pode manter, por falta de fundamento legal, nem tendo em atenção a legislação pretérita, nem a vigente, aqui aplicável.
Na verdade, não é possível concluir que os autos estiveram parados por negligência da exequente. O tempo decorrido sem que nos autos fosse proferido qualquer despacho, não é imputável à inércia daquela, não podendo a mesma ser sancionada por falta do impulso processual devendo-se o decurso do tempo, ao facto dos seus requerimentos não terem sido, oportunamente, apreciados.
Pelo que, a decisão recorrida dado violar, na interpretação feita, o disposto no art. 281º, nº 5, tem de ser revogada e, em consequência, a apelação julgada procedente.
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III – DECISÃO
Face ao exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar procedente a apelação, revogar a decisão recorrida e, consequentemente, ordena-se o prosseguimento do processo, devendo a 1ª instância apreciar os requerimentos, oportunamente, apresentados pela exequente, necessários à normal tramitação dos autos, nomeadamente, o apresentado em 06.04.2015.
Custas pela parte responsável, pelas mesmas, a final.

Porto, 14 de Março de 2016
Rita Romeira
Caimoto Jácome
Sousa Lameira