Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3376/09.0TBPRD.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: TOMÉ RAMIÃO
Descritores: CONTRATO DE SEGURO
RECUSA DE CELEBRAÇÃO DO CONTRATO DE SEGURO
PRÁTICA DISCRIMINATÓRIA
DIREITO A INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RP201602233376/09.0TBPRD.P2
Data do Acordão: 02/23/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 704, FLS.179-209)
Área Temática: .
Sumário: I - Nos termos da Lei nº46/2006, de 28 de Agosto, é proibida a discriminação, direta ou indireta, em razão da deficiência ou de pessoas com risco agravado de saúde, sob todas as suas formas, sendo considerada prática discriminatória a recusa ou penalização na celebração de contratos de seguros (art.º 4.º, al. c)).
II - Compete ao autor da prática do ato discriminatório provar que as diferenças de tratamento não assentaram em nenhum desses fatores, cabendo a quem alegar a discriminação em razão da deficiência ou do risco agravado de saúde fundamentá-la, apresentando elementos de facto suscetíveis de a indiciarem (seu art.º 6.º).
III - O Autor de ato discriminatório constitui-se na obrigação de indemnizar, nos termos gerais, a pessoa que foi vítima desse ato, pelos danos patrimoniais e morais sofridos.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação n.º3376/09.0TBPRD.P2
2ªSecção
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto
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I- Relatório.
B… e marido, C…, residentes na Rua …, Paredes, intentaram a presente ação declarativa condenatória, na forma ordinária, contra D… COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., com sede na … Lisboa; E…, S.A., com sede na … Lisboa; e F…, S.A., com sede na … Lisboa, pedindo:
a) Serem as Rés condenadas solidariamente a pagarem aos Autores, a título de danos patrimoniais, a quantia de € 68.000,00 decorrente do valor patrimonial deixado de auferir proveniente das mais-valias da edificação que os AA. ficaram privados de construir, referidas supra 49 a 64, as despesas no montante de 195,61€ identificadas supra 65º, e as rendas mensais da sua habitação que entretanto se vencerem, desde a data da citação para a presente ação até à data da morte dos AA., cujo montante se relega para posterior liquidação em execução de sentença, bem como a pagarem a importância de 15.000,00 € a cada um dos AA. pelos danos morais sofridos enumerados supra;
b) Condenar, ainda, as RR. solidariamente nos juros de mora legais desde a citação até efetivo pagamento sobre as quantias referidas nas alíneas anteriores;
Ou, ainda que assim se não entenda,
c) Serem as RR. condenadas solidariamente a pagarem aos AA. a quantia de € 65.000,00 €, montante de empréstimo bancário não concedido por via da recusa das RR. na contratação do seguro de vida e incapacidade, e necessário para construção da habitação pretendida pelos AA., bem como, a quantia de 5.000,00 € a cada um dos AA. pelos danos não patrimoniais sofridos enumerados supra;
d) Serem, ainda, as RR. condenadas solidariamente a pagarem os juros de mora legais desde a citação até efetivo e integral pagamento sobre as quantias referidas na alínea anterior.
Alegaram, em resumo, terem pretendido construir, em prédio propriedade da autora mulher, a sua casa de morada de família, nos finais do ano de 2006, dando início, para o efeito, a todos os procedimentos necessários, obtendo informação da viabilidade da pretensão junto dos competentes serviços autárquicos, contactaram o Banco G…, o H…, o I… e a J… com vista à obtenção de crédito bancário no montante de 65.000,00€, as propostas de crédito foram aprovadas mas, para a obtenção do financiamento bancário pretendido, era condição obrigatória a subscrição de contrato de adesão ao seguro de vida e incapacidade para ambos os titulares, pelo que contactaram as companhias de seguros ora rés, indicadas pelas instituições bancárias contactadas, mas nenhuma das rés aceitou a proposta de seguro de vida para as coberturas de morte e invalidez total e permanente apresentada pelos autores, devido ao seu (autores) quadro clínico.
Por via de tais condutas das rés ficaram os autores impedidos de celebrar o contrato de mútuo necessário para a construção da sua habitação própria, tendo-lhes causado danos patrimoniais e não patrimoniais que descrevem.
Contestaram as rés (tendo invocado matéria de exceção, designadamente a ré E…, S.A., que arguiu a exceção perentória da prescrição), pugnando pela improcedência da ação e sua consequente absolvição do pedido.
Após réplica, os autores terminaram como na petição inicial e findos os articulados foi proferido Despacho Saneador Sentença que julgou verificada a exceção dilatória da nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial (falta de causa de pedir), absolvendo, em consequência, as rés da instância, (cf. fls.231 a 240).
Inconformados com tal Decisão, apelaram os autores pugnando pela sua revogação, tendo sido proferido o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, a fls.304 a 337, que julgou procedente a apelação e, em consequência, revogou a decisão recorrida, determinando a sua substituição por outra que, considerando inexistir a apontada nulidade principal (nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial), determine o prosseguimento dos autos.
Dispensada a audiência preliminar, foi proferido Despacho Saneador, onde foi relegada para final o conhecimento da exceção da prescrição, fixados os factos assentes e organizada a base instrutória, de que a Ré D…, S.A., reclamou nos termos do seu requerimento de fls.429 e 430, tendo tal reclamação sido deferida por Despacho de fls.443.
Realizado o julgamento foi proferida a competente sentença que julgou (dispositivo):
1- a exceção de prescrição invocada pela Ré E… S.A. improcedente;
2- a presente ação parcialmente procedente por parcialmente provada e em consequência:
a) condeno a R. D…, S.A. a pagar ao Autor C… a quantia de €7.000 (sete mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal para as obrigações civis, desde a citação até efetivo pagamento;
b) condeno a R. D…, Companhia de Seguros, S.A. a pagar á Autora B… a quantia de €7.000 (sete mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal para as obrigações civis, desde a citação até efetivo pagamento;
c) condeno a R. E… S.A. a pagar á Autora B… a quantia de €7.000 (sete mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal para as obrigações civis, desde a citação até efetivo pagamento;
d) condeno a R. F…, Companhia de Seguros, S.A. a pagar ao Autor C… a quantia de €3.000 (três mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal para as obrigações civis, desde a citação até efetivo pagamento;
e) condeno a R. F…, Companhia de Seguros, S.A. a pagar á Autora B… a quantia de €4.000 (quatro mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal para as obrigações civis, desde a citação até efetivo pagamento.
f) absolvo as Rés D…, Companhia de Seguros, S.A.,E… S.A. e F…, S.A. do demais peticionado contra as mesmas na presente causa;
g) nos termos do disposto no artº7º, nº3, da Lei nº46/2006, de 28 de Agosto, determino que a presente sentença condenatória seja, no prazo de 5 dias após o trânsito em julgado, publicada, a expensas das Rés (na proporção de 50% para a 1ª Ré, 25% para a 2ª Ré e 25% para a 3ª Ré, quanto a tais expensas de publicação), numa das publicações periódicas diárias de maior circulação do país, por extrato, do qual devem constar apenas os factos comprovativos da prática discriminatória em razão da deficiência, a identidade das condenadas e as indemnizações fixadas, não se procedendo á identidade dos ofendidos por os mesmos não terem manifesto o seu consentimento expresso até ao final da audiência de julgamento, (cfr.artº7º, nº4, da referida Lei).
Desta sentença veio a Ré “F…” interpor o presente recurso, alegando e concluindo nos termos seguintes:
1- No que respeita ao estado de saúde do recorrido encontra-se provado:
- Sofreu amputação do membro Inferior esquerdo;
- É portador do linfoma de Hodgkin;
- Tem incapacidade permanente de 70%;
- O grau de incapacidade é suscetível de Influenciar o risco de Invalidez total e permanente por acidente (conferir factos provados nas alíneas B) a J), N) a P), S), CC) a HH) e SSS).
2 - Foi ainda considerado provado que o recorrido declarou sobre o seu estado de saúde:
- Sofre de deformação física, tem percentagem de invalidez; sofre ou sofreu cancro, não é saudável por linfoma de Hodgkin e próteses no membro inferior esquerdo, padecer de defeito físico ou incapacidade consistente na prótese no membro inferior esquerdo, tem incapacidade profissional de 70% por próteses do membro Inferior esquerdo, tem grau de desvalorização de 70%, não cumpriu o serviço militar por amputação do membro inferior esquerdo (conferir factos provados nas alíneas DD) e FF).
3 - No que respeita ao estado de saúde do recorrido for considerado provado:
- Está clinicamente curado do linfoma de Hodgkin (conferir facto provado na alínea DDDD).
4 - Verifica-se contradição ou colisão direta entre os factos provados sobre o estado de saúde do recorrido.
5 - Verifica-se contradição direta entre os factos provados nas alíneas B) a J), N a P), CC) a HH) e SSS) e os factos provados na alínea DDDD) no que respeita ao estado de saúde do recorrido.
6 - Na alínea BBBB) consta, designadamente:
"Os recorridos foram tratados pelas rés de forma discriminatória".
7 - Na alínea DDDD) consta, designadamente:
" Agiram com desrespeito dos direitos dos recorridos e discriminação destes".
8 - Nas alíneas BBBB) e DDDD) consta matéria conclusiva ou de direito.
9 - No que respeita ao estado de saúde da recorrida encontra-se provado:
- É portadora de melanoma ocular;
- Tem perda de visão no olho esquerdo de 9/10, tendo a visão reduzida a 1/10;
- Foi reformada por Invalidez,
- Tem Incapacidade permanente de 25% (conferir factos provados nas alíneas B) a J), N) a P), S), CC) a HH) e SSS).
10 - Foi ainda considerado provado que a recorrida declarou sobre o seu estado de saúde: .
"Encontra-se atualmente incapacitada total ou parcialmente para exercer a sua atividade profissional, sofre de defeito da vista, tem percentagem de Invalidez, está atualmente reformada, não é saudável por melanoma ocular esquerdo, padece de incapacidade profissional por alteração da visão por motivo do melanoma do olho esquerdo com lesão residual, encontra-se reformada por melanoma ocular (conferir factos provados nas alíneas CC) e EE).
11 - No que respeita ao estado de saúde da recorrida foi considerado provado:
- Está clinicamente curada do melanoma ocular (conferir facto provado na alínea DDDD).
12 - Verifica-se contradição ou colisão direta entre os factos provados sobre o estado de saúde da recorrida.
13 - Verifica-se contradição direta entre os factos provados nas alíneas B) a J), N) a P), S), CC) a HH) e SSS) e os factos provados na alínea DDDD) no que respeita ao estado de saúde da recorrida.
14 - Deve eliminar- se os factos provados nas alíneas BBBB) e DDDD).
15- Na sentença recorrida na fixação da matéria de facto provada, violou-se a disposto nos artigos 653.º, n° 4, do anterior Código de Processo Civil e 607°, n° 4 do atual Código de Processo Civil.
16 - É lícito e legal qualquer seguradora recusar a celebração de contratos de seguro do ramo vida, excluir ou limitar coberturas, ou agravar os prêmios de seguro em consequência do efetivo estado geral de saúde do proponente alterar significativamente a possibilidade ou probabilidade de verificação dos riscos cobertos pelo contrato de seguro do ramo vida.
17-A recusa, a exclusão, a limitação ou o agravamento podem ocorrer relativamente a pessoas com deficiência ou a pessoas com risco agravado de saúde nas mesmas condições que a pessoa que padeça de qualquer doença que não constitua risco agravado de saúde ou deficiência, e que influencie significativamente a possibilidade ou probabilidade de verificação dos riscos cobertos pelo seguro de vida.
18- A Lei n° 46/2006, de 28 de agosto proíbe apenas as práticas ou procedimentos automáticos de recusa de celebração de seguros de vida ou de exclusão ou de limitação de coberturas ou de agravamento de prémios de seguro apenas em consequência do proponente padecer de deficiência ou de risco agravado de saúde.
19 – A Lei n.º 46/2006, de 28 de agosto não proíbe, nem limita a análise e avaliação concreta e casuística do risco em função do efetivo estado de saúde do proponente.
20 - Os recorridos preencheram e subscreveram a proposta relativa ao seguro de vida que pretendiam celebrar com a recorrente.
21 - Nessa proposta responderam aos respetivos questionários clínicos.
22 - Com base no estado de saúde declarado pelos recorridos, a recorrente solicitou a efetuação de exames médicos.
23 - Os exames médicos foram efetuados.
24 - A recorrente efetuou a análise e avaliação concreta do estado de saúde dos recorridos.
25 - A recorrente apresentou aos recorridos, proposta de seguro de vida.
26 - Essa proposta consistiu no que respeita á recorrida na aceitação da cobertura de morte com agravamento de prémios de seguro e na exclusão da cobertura de invalidez absoluta e definitiva e no que respeita ao recorrido na aceitação da cobertura de morte com agravamento de prémios de seguro e na exclusão da cobertura de Invalidez absoluta e definitiva resultante da incapacidade de que já era portador.
27 - Essa proposta resultou da análise médica e de risco concretamente efetuada com base no estado de saúde dos recorridos de acordo com os elementos médicos facultados pelos recorridos, com as declarações de saúde por elas prestadas e com os exames médicos efetuados.
28 - Os recorridos recusaram a proposta apresentada pela recorrente.
29 - Não ocorreu a prática pela recorrente de qualquer ato discriminatório relativamente aos recorridos em razão da deficiência ou do risco agravado de saúde.
30 - A recorrente não causou qualquer dano não patrimonial aos recorridos.
31 - Os recorridos pretendiam construir a sua casa de morada de família.
32 - Para o efeito, necessitavam de obter financiamento bancário.
33 - Pelo que, contactaram diversos bancos para obterem informações sobre a concessão do financiamento bancário.
34 – Os bancos contactados comunicaram que a concessão de financiamento bancário dependia da celebração de seguro de vida.
35 - Esta condição constitui condição contratual.
36 - No existe qualquer norma legal que imponha que a concessão de financiamento bancário deva depender da celebração de seguro de vida.
37 – Os eventuais danos não patrimoniais dos recorridos resultam desta condição contratual exigida pelos bancos.
38 - Não se encontra provado nos presentes autos que os recorridos tenham apresentado em qualquer banco pedido de financiamento bancário.
39 - Não se encontra provado nos presentes autos que qualquer banco tenha recusado a concessão de financiamento aos recorridos.
40 - Não se encontra provado nos presentes autos que qualquer banco tenha recusado a concessão de financiamento aos recorridos em consequência da falta de celebração de seguro de vida com a recorrente.
41 - Não se encontra provado nos presentes autos que os recorridos tivessem perfil financeiro adequado á concessão do financiamento bancário que pretendiam.
42 - Não se encontra provado nos presentes autos que os recorridos tivessem perfil financeiro adequado á concessão do financiamento bancário que pretendiam e que essa concessão tenha sido recusada pela falta de celebração de seguro de vida com a recorrente.
43 - O ónus da alegado e da prova dos pressupostos do direito de indemnização peticionada incumbia aos recorridos.
44 - Os recorridos não alegaram, nem provaram, os elementos constitutivos do direito de indemnização por eles invocado.
45 - Na sentença recorrida ao decidir-se pela condenação parcial da recorrente no pedido, violou-se o disposto nos artigos 342 .º do Código Civil, 1.º, n.s 1 e 2, 3.º, alíneas a), b), c) e d), e 4.º, alínea c), da Lei n° 46/2006, de 28 de agosto e 653.º, n.º 4, do anterior Código de Processo Civil e 607.º, n° 4 do atual código de Processo Civil.
46- Termos em que, deve conceder-se Integral provimento ao presente recurso de apelação, e em consequência, eliminar-se as alíneas BBBB) e DDDD) dos factos provados, e revogar-se a sentença recorrida, substituindo-se a mesma por acórdão em que se decida absolver a recorrente do pedido.
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Inconformada recorreu também a Ré “ D…”, e após o corpo alegatório, concluiu:
1. As presentes alegações de recurso terão por objeto a alteração da matéria de direito, pretendendo a ora Apelante, mais concretamente pugnar pela alteração do teor da sentença proferida com base na matéria dada como provada nos presentes autos indicando as normas jurídicas violadas e o sentido com que as normas que constituem fundamento jurídico da presente decisão deveriam ter sido interpretadas e concretamente aplicadas, na medida em que, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo interpretou de forma errónea normas determinantes na apreciação da responsabilidade da Recorrente, nomeadamente dos preceitos jurídicos a aplicar ao caso em concreto, artigo 4.º alínea c) e 7.º da Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto.
2. Por outra parte, está a Recorrente convicta de que, tendo em conta a matéria dada como provada nunca a ora Recorrente poderia ter sido condenada nos valores arbitrados a título de indemnização por danos não patrimoniais aos AA., tendo o douto tribunal a quo feito uma incorreta aplicação da normas bem como dos critérios de equidade constantes nos artigos 494.º, 496.º, 562.º, 563.º e no nº 3 do artigo 566.º do Código Civil, tendo em conta o caso em apreço.
3. Tendo em conta a matéria dada como provada, entendeu o douto Tribunal, salvo o devido respeito de forma errónea, que a ora Recorrente assumiu uma conduta de discriminação para com os AA, em razão da deficiência ou risco agravado de saúde, violando, desta forma, o disposto no artigo 4.º alínea c) da Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto.
4. A Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto tem por objeto prevenir e proibir a discriminação, direta ou indireta, em razão da deficiência, sob todas as suas formas, e sancionar a prática de atos que se traduzam na violação de quaisquer direitos fundamentais, ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer direitos económicos, sociais, culturais ou outros, por quaisquer pessoas, em razão de uma qualquer deficiência.
5. A Lei n.º 46/2006 deixa muito claro que não há discriminação quando objetivamente se trata de modo diferenciado aquilo que à partida é diferente. Tal conclusão resulta do artigo 3.º alínea b) da Lei 46/2006.
6. Assim, apenas se proíbem práticas discriminatórias injustificadas.
7. Dispõe o artigo 4.º da Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto o seguinte: Consideram-se práticas discriminatórias contra pessoas com deficiência as ações ou omissões, dolosas ou negligentes, que, em razão da deficiência, violem o princípio da igualdade, designadamente: c) A recusa ou o condicionamento de venda, arrendamento ou subarrendamento de imóveis, bem como o acesso ao crédito bancário para compra de habitação, assim como a recusa ou penalização na celebração de contratos de seguros;”
8. Porém, estas práticas discriminatórias não constituirão discriminação se, em virtude da natureza da atividade profissional em causa ou do contexto da sua execução, a situação de deficiência afete níveis e áreas de funcionalidade que constituam requisitos essenciais e determinantes para o exercício dessa atividade, na condição de o objetivo ser legítimo e o encargo proporcional.
9. Não se pode impor às seguradoras a aceitação de todo e qualquer risco inerente à celebração de um contrato de seguro, até porque a essência do contrato de seguro é a análise do risco e a consequente adequação dos prémios de seguro às circunstâncias concretas de cada caso, sendo legítima a recusa, por parte da seguradora, da celebração de determinado contrato de seguro caso se verifique, em concreto, uma considerável desproporção entre o risco assumido e o prémio de seguro a suportar pelo tomador.
10. Assim, o determina a norma prevista no n.º 1 do artigo 51.º do novo regime jurídico do contrato de seguro, introduzido pelo D.L. n.º 72/2008, de 16 de Abril, corroborado pelo artigo 52.º que estipula que “o montante do prémio e as regras sobre o seu cálculo e determinação são estipulados no contrato de seguro, ao abrigo da liberdade contratual”, devendo entretanto, na falta ou insuficiência de determinação pelas partes, ser “adequado e proporcionado aos riscos a cobrir pelo segurador, calculado no respeito dos princípios da técnica seguradora.”
11. Ora, o novo regime do contrato de seguro introduzido pelo D.L. n.º 72/2008, de 16 de Abril, veio concretizar e esclarecer o âmbito de aplicação das normas constantes na Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto, nomeadamente no que toca à alegada proibição de discriminação, na celebração de contratos de seguro, em função de qualquer deficiência ou risco agravado de saúde, de que padeça a pessoa a segurar.
12. Neste sentido, e muito embora o D.L. n.º 72/2008, de 16 de Abril, continue a enunciar o princípio geral da proibição de práticas discriminatórias, tendo por base o princípio fundamental e constitucionalmente garantido da igualdade dos cidadãos, vem o novo regime esclarecer que não se consideram incluídas na proibição “(…) para efeito de celebração, execução e cessação do contrato de seguro, as práticas e técnicas de avaliação, seleção e aceitação de riscos próprias do segurador que sejam objetivamente fundamentadas, tendo por base dados estatísticos e atuariais rigorosos considerados relevantes nos termos dos princípios da técnica seguradora”- cf. art. 15.º, n.º 3.º do D.L. 72/2008 de 16 de Abril.
13. Assim, não obstante serem consideradas práticas discriminatórias “as ações ou omissões, dolosas ou negligentes, em razão da deficiência ou de risco agravado de saúde, que impliquem para as pessoas naquela situação um tratamento menos favorável
do que aquele que seja dado a outra pessoa em situação comparável” (nos termos do art. 15.º, nºs 1 e 2 do D.L. 72/2008 de 16 de Abril) teve o legislador em conta, e como aliás não poderia deixar de ser, a natureza específica do contrato de seguro, possibilitando ao segurador, em determinados casos, recusar a celebração de um contrato de seguro ou agravar o respetivo prémio em razão do risco concretamente avaliado.
14. Com efeito, após a devida análise do questionário clínico preenchido pelos Autores, bem como dos documentos médicos que instruíram a análise concreta da situação clínica de ambos, foi emitido parecer técnico de recusa quanto a ambos os proponentes, conforme consta do documento junto aos autos.
15. A recorrente sempre atuou de boa-fé e de forma criteriosa na análise de risco.
Note-se que tem de se atender à análise de risco à data dos factos.
16. O Tribunal a quo olvidou de apreciar a situação clinica à data das propostas de seguros. Não se podendo basear única e exclusivamente na situação clinica atual dos
AA (com base na produção atual de prova em sede de audiência de julgamento) quando esta era bastante diferente daquela que era à data.
17. Ficou dado como provado que o Autor marido padecia, desde 1978, de uma incapacidade de 70% decorrente da amputação do membro inferior esquerdo, tendo-lhe
sido posteriormente diagnosticado, no ano de 1996, um linfoma de Hodgkin de estádio II B.
18. Em decorrência da doença de Hodgkin, foi o Autor submetido a tratamento de quimioterapia e radioterapia, mantendo-se em vigilância até a data da proposta apresentada, não tendo se considerando terminados por completo, os referidos tratamentos médicos.
19. Relativamente à Autora B…, foi-lhe diagnosticada, no ano de 1998, uma lesão tumoral do olho esquerdo, compatível com melanoma da coroide, tendo a mesma sido submetida a tratamento de radioterapia, e encontrando-se, na data da apresentação da proposta de seguro, igualmente em fase de vigilância clínica.
20. Ora, tendo a Recorrente procedido à análise de risco dos contratos a celebrar, com base nos registos clínicos dos Autores, devidamente enquadrados em dados estatísticos e atuariais tecnicamente aplicáveis à atividade seguradora, constantes dos manuais de risco da Companhia Resseguradora à qual a Ré se encontra contratualmente ligada, a L…, decidiu a Recorrente D… recusar a celebração dos contratos de seguro de vida pretendidos pelos AA.
21. Recusa esta que lhe era legitimamente admissível, no âmbito da sua autonomia, e legalmente aceitável ao artigo 15.º, n.ºs 3 e 4 do D.L. 72/2008 de 16 de Abril.
22. Deste modo, a Recorrente informou aos Autores da impossibilidade de concretização do contrato de seguro pretendido, tendo em conta o risco envolvido, decorrente da situação clínica concreta de ambos.
23. Não conformados com esta decisão, recorreram os Autores ao Instituto de Seguros de Portugal que, na qualidade de autoridade responsável pela supervisão da atividade seguradora, solicitou à Recorrente os devidos esclarecimentos sobre a situação em apreço nos autos.
24. Em resposta ao ISP, a Recorrente remeteu a informação que consta do documento n.º 16 junto aos autos, informando o Departamento de Supervisão de Conduta do Mercado, que a decisão de recusa da companhia se baseara nos dados clínicos concretos dos Autores, enquadrados nos critérios objetivos constantes nas tabelas de análise de risco da sua companhia resseguradora.
25. Nesta sequência, o ISP, no âmbito da sua função de supervisão do mercado segurador, solicitou à Ré que enviasse toda a sustentação técnica constante dos manuais de risco da resseguradora.
26. Apenas na sequência de toda a averiguação concreta do caso em análise, veio o ISP emitir parecer consentâneo com a decisão tomada pela Recorrente D….
27. Para além disso, a Recomendação n.º 3/B/2008, emitida pelo Provedor de Justiça na sequência de queixa apresentada pelos Autores refere expressamente que “na sequência da aprovação da Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto, não pode o Estado deixar de aprovar medidas que permitam, de alguma forma, a assunção pública da diferença entre o valor dos prémios fixados para os portadores de deficiência ou de risco agravado de saúde e aqueles que resultariam de contratos de seguro de igual natureza mas não destinados àquele universo de cidadãos, sob pena da total irrelevância prática daquela legislação.”
28. Ou seja, se de facto se constata que, na sequência da publicação do referido diploma legal, não se verificaram mudanças significativas em termos de inclusão social e de acesso a determinados bens e serviços aos cidadãos portadores de deficiências (ou com riscos agravados de saúde), será o Estado a entidade a quem, em primeira mão, incumbe a realização de políticas nacionais de integração e efetivo apoio financeiro, que permitam viabilizar a igualdade efetiva dos cidadãos.
29. No que toca ao específico ponto do apoio financeiro, a citada recomendação refere ainda que “pode o Estado agir legislativamente assumindo os custos do fim das práticas discriminatórias consubstanciadas na recusa de celebração de contratos de mútuo ou de seguro, ou no inopinado agravamento dos prémios de seguro, por efeito da deficiência e da existência de riscos de saúde. Ou pode o Estado criar um fundo público, acionável subsidiariamente às garantias reais, destinado a garantir as situações que, configurando um elevado risco para as empresas seguradoras, levam atualmente à recusa de contratação.”
30. Concluindo a mencionada Recomendação que “Ademais, neste assunto específico ao menos, deve o Estado ser o primeiro a dar exemplo daquilo que legislativamente proclama e consagra não esperando que sejam as empresas privadas — naturalmente norteadas por objetivos de lícita maximização de lucros — a fazer aquilo que o próprio Estado, através das suas empresas, não faz.” (nosso sublinhado).
31. Ora, não restam dúvidas sobre a legitimidade da Recorrente seguradora na recusa em celebrar o pretendido contrato de seguro com os Autores, atento o quadro clínico apresentado pelos mesmos, o qual consubstancia um risco excessivamente elevado para a companhia de seguros.
32. Não podendo esta decisão de recusa da Recorrente, ser considerada discriminatória, nos termos previstos pela Lei n.º 46/2006, conforme se entendeu na sentença ora posta em crise.
33. As práticas dos seguradores neste âmbito, nomeadamente as práticas e técnicas de avaliação, seleção e aceitação de riscos, não serão, porém, suscetíveis de ser entendidas como discriminatórias e, por isso, proibidas, quando sejam objetivamente fundamentadas, tendo por base dados estatísticos e atuariais rigorosos e considerados relevantes nos termos da técnica seguradora.
34. É lícito qualquer Seguradora recusar a celebração de contratos de seguros do ramo vida, excluir ou limitar coberturas, ou agravar os prémios de seguro em consequência do efetivo estado geral de saúde do proponente, alterar significativamente a possibilidade ou probabilidade de verificação dos riscos cobertos pelo contrato de seguro do ramo vida.
35. De facto, a Recorrente recusou legitimamente aos AA a cobertura de risco de morte e de invalidez absoluta e definitiva por “risco não aceitável/ainda em vigilância”.
36. E a verdade é que à data das propostas apresentadas às Seguradoras o Autor encontrava-se em vigilância na consulta de Hematologia.
37. Aliás, resulta inequivocamente dos autos documento de fls. 149 que “é observado periodicamente nesta consulta para vigilância clinica e de imagem”. A fls. 150 refere-se que “O doente mantém-se em consulta de seguimento na Unidade de Radioterapia”.
38. Pelo que, não restam dúvidas que em decorrente da doença de Hodgkin o Autor, à data da proposta apresentada à Recorrente, encontrava-se em vigilância.
39. Ora, outra conclusão não se poderá retirar senão a de que a Recorrente fez uma correta análise clinica quando recusou celebrar o contrato de seguro, porquanto o Autor encontrava-se efetivamente em vigilância.
40. O Tribunal a quo, com o devido respeito, confunde análise de risco com análise de risco, pois para além de serem coisas totalmente distintas, aquela não serve para substituir esta.
41. Agora não pode, com o devido respeito que é muito, o douto Tribunal a quo fazer tábua rasa dos manuais de resseguros que a Recorrente contratualmente ligada, só porque não descortinou nos mesmos uma referência expressa à realidade portuguesa e bem assim à chamada dieta mediterrânica.
42. Por outra parte, e sem prescindir do supra exposto, não se conforma a Recorrente com o montante arbitrado na douta sentença a título de danos não patrimoniais a pagar aos Autores.
43. No entender da Recorrente o douto tribunal de que se recorre, não cuidou de fazer uma correta interpretação e consequente aplicação do disposto nos artigos 494.º, 562.º, 563.º e no nº 3 do artigo 566.º do Código Civil, desconsiderando o pedido concreto formulado pelos Autores, e bem assim as regras da prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das circunstâncias do caso concreto – antes favorecendo, com o devido respeito, um paradigma de justiça subjetiva, abstrata e moralista.
44. Entendeu a douta sentença recorrida atribuir uma indemnização aos Autores a título de danos não patrimoniais no valor de € 7.000,00 a cada um, sendo que os AA limitaram-se a peticionar nos autos a quantia de €5.000,00 para cada um.
45. A condenação da ora Recorrente num valor muito superior ao pedido formulado pelos AA a título de danos não patrimoniais não pode proceder, porquanto não pode o Tribunal a quo graduar para mais esses danos e não pode o Tribunal a quo substituir-se aos AA nesse campo.
46. O julgador não pode ultrapassar as quantias pedidas a título de indemnizações de danos não patrimoniais.
47. Aliás, convém não olvidar que, sem descurar que os Autores peticionaram a quantia de €5.000,00 para cada um a pagar solidariamente pelas Rés Seguradoras, foi atribuída uma indemnização total e global de 28.000,00€ a título de danos não patrimoniais.
48. Traduzindo-se o pedido, no âmbito processual, a vontade real de quem pede, como seu fator de definição e limitação, a expressão dessa vontade condicionando o exercício do contraditório, induzindo a parte contra quem é deduzido a defender-se no campo expressamente definido pelo Autor.
49. A norma constante do artigo 661.º, n.º 1, do Código de Processo Civil permitiria concluir que o juiz poderia, sempre, independentemente dos fundamentos e natureza própria de cada um dos pedidos formulados na mesma ação, condenar em valor superior ao indicado para cada um deles, desde que o valor da condenação não excedesse o valor da ação – deve ser interpretada em conjugação com os princípios do dispositivo e do contraditório, projetados no artigo 660.º, n.º 2, 2.ª parte, do Código de Processo Civil, onde se dispõe que o juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe impuser o conhecimento oficioso de outras.
50. Ponderando os sobreditos princípios e a noção legal de pedido, é de concluir que o juiz não pode conhecer, em regra, senão das questões suscitadas pelas partes, e na decisão que proferir sobre essas questões não pode ultrapassar, nem em qualidade nem em quantidade os limites constantes do pedido formulado pelas partes.
51. Deste modo, se os Autores peticionaram, no que concerne a cada um a título de danos não patrimoniais, “menos” do que aquilo a que tinha alegadamente tinham direito e que sofreram, não podia, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo proferir condenação em montante superior ao que foi expressamente peticionado, valendo-se o Tribunal a quo da circunstância de, por improcedência parcial de outro dos pedidos, uma tal condenação não exceder o valor global peticionado.
52. Face ao que antecede impõe-se que se revogue a sentença recorrida, na parte que condenou a Recorrente a pagar aos Recorridos uma indemnização por danos não patrimoniais superior à peticionada por aqueles nos presentes autos.
53. Sem prescindir do supra exposto, caberá ainda referir o seguinte, o artigo 496.º do Código Civil manda atender na fixação da indemnização aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
54. A lei portuguesa aceita a ressarcibilidade dos danos não patrimoniais, mas apenas daqueles que, pela sua gravidade, isto é, que afetem profundamente os valores ou interesses da personalidade física ou moral do lesado, mereçam a tutela do direito, em montante a fixar equitativamente pelo tribunal.
55. O dano há-de ser de tal maneira grave que justifique a concessão ao lesado duma satisfação de ordem pecuniária (compensação), ou, como se refere no acórdão do STJ de 15.06.93 (BMJ 428- 535), que revistam gravidade objetiva e acentuada, de modo a justificarem uma compensação de ordem pecuniária. «Só são indemnizáveis os danos não patrimoniais que afetem profundamente os valores ou interesses da personalidade física ou moral» (ac. STJ de 26.06.91- BMJ 408-538).
56. Para que possa ser atribuída uma indemnização por danos não patrimoniais é necessário que a conduta do lesante seja apta a provocar danos graves; e essa gravidade há-de ser aferida objetivamente, ou seja, em função de um padrão médio de sensibilidade, e não da especial suscetibilidade do visado (cf., por exemplo, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de Setembro de 2007 e de 12 de Março de 2009, disponíveis em www.dgsi.pt nos procs. nºs 07B2528 e 08B2972, respetivamente).
57. Portanto, não seria suficiente que os autores provassem que sofreu danos de natureza moral (não patrimonial). Seria ainda necessário que provasse que esses danos eram de tal maneira graves que justificassem a tutela do direito.
58. Assim, tendo em consideração os factos dados como provados (e só estes podem ser tidos em conta), não nos parece que se possa concluir que os autores sofreram danos de natureza não patrimonial que justifiquem a tutela do direito e, portanto, devam ser indemnizados.
59. Sem prescindir do supra exposto, se dirá ainda que, caso V. Ex.a assim não o entenda, o montante atribuído pela douta sentença a título de danos não patrimoniais revela-se manifestamente excessivo e empolado.
60. De facto, e tendo em vista as circunstâncias do caso concreto, designadamente, a matéria dada com provada, considera a recorrente que o montante atribuído pela douta sentença recorrida a título de danos não patrimoniais, mostra-se desadequada, por excessivo.
61. Ora, a indemnização prevista no artº 496º, nº 1, do CC é, mais propriamente, uma verdadeira compensação: o objetivo que lhe preside é o de proporcionar ao lesado a fruição de vantagens e utilidades que contrabalancem os males sofridos, e não o de o recolocar “matematicamente” na situação em que estaria se o facto danoso não tivesse ocorrido; a reparação dos prejuízos, precisamente porque são de natureza moral (e, nessa exata medida, insuscetíveis de indemnização) é uma reparação indireta, comandada por um juízo equitativo que deve atender às circunstâncias referidas no artigo 494º.
62. Pelo exposto, deve a quantia fixada para indemnização por danos não patrimoniais dos Autores ser corrigida, devendo a mesma ser reduzida para um valor mais justo e equitativa. A douta sentença deverá, por mais equilibrada, fixar a quantia de 2.000 € a cada um dos Autores pelos danos não patrimoniais sofridos.
63. Face ao que antecede, é entendimento da ora Recorrente que o Tribunal de que se recorre fez uma incorreta interpretação e aplicação das normas em apreço, mais concretamente as referentes nos artigos 661.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, 483.º,
494.º, 496.º, 562.º, 563.º e no nº 3 do artigo 566.º do Código Civil, artigo 4.º e 7 da Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto, tendo o tribunal a quo, erradamente, condenado a Ré, ora
Recorrente a pagar aos AA os danos não patrimoniais peticionado pelos AA.
Termina pedindo a revogação da sentença proferida, com a consequente absolvição no pagamento do montante peticionado pelos Autores.
***
Também inconformada recorreu a “E...”, apresentando as seguintes conclusões:
A. Enferma de manifesto erro de apreciação da prova produzida – documental e testemunhal - a consideração como não provados dos factos constantes do item 65.º da Base Instrutória: A não - aceitação das propostas de seguro de vida formulada pelos Autores, no que diz respeito á Ré E…, S.A. foi formalizada junto deles nunca depois de 19, 23 ou 24 de Setembro de 2006?”
B. Bem como do item 68º da Base Instrutória: ”Os AA. propuseram à Ré E… S.A. os seguros em questão tendo esta última recusado e/ou condicionado a aceitação dos seguros ainda em 21 de Agosto de 2006?”
C. Devendo ambos os items ser considerados como provados tendo em conta a prova testemunhal e documental produzida, não obstante, relativamente ao 68º, com a precisão de que apenas o Autor marido propôs um seguro à ora recorrente.
D. Consequentemente se dando como não provado o ponto V) dos facto provados.
E. Com efeito, de todas as cartas enviadas pela Ré E… S.A. aos A.A., datadas de 28 de Julho de 2006, 21 de Agosto de 2006, 19 de Setembro de 2006, 14 de Novembro de 2006, consta, além do mais: «Em resultado da análise efetuada pelo nosso Médico Consultor a todo o processo clínico apresentado, lamentamos informar não ser possível aceitar este candidato
F. Tendo os autores recebido as referidas cartas, porque as juntaram com a petição inicial para prova da recusa de contratar e, porque a elas responderam enviando os elementos clínicos solicitados na carta de 28 de Julho de 2006, nos primeiros dias de Agosto de 2006, e o relatório médico solicitado na carta de 21 de Agosto de 2006, ainda durante o mês de Agosto, não podem deixar de as ter recebido para efeitos de tomarem conhecimento da recusa de aceitar a A. B…, como pessoa segura.
G. Os A.A. dizem recordar-se apenas da última carta, por esta ser para eles a recusa definitiva, como se as anteriores não o fossem.
H. Mas do que se trata, na segunda, terceira e demais cartas, é tão-somente de se reafirmar uma primeira e já definitiva recusa, em face da qual os AA. sempre poderiam desde logo acionar a Ré E….
I. O mediador de seguro M… declarou que a A. foi recusada logo na primeira carta.
J. Nos termos do disposto no artº 306º, n.º 1 do Código Civil o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido.
K. E o direito podia ter sido exercido pelo menos desde dia 22 de Agosto de 2006, por este ser o dia seguinte à elaboração da carta que acusa a receção dos registos clínicos do A. solicitados pela carta de 27 de Julho de 2006, ainda que o conhecimento da recusa haja necessariamente ocorrido em momento muito anterior, nos primeiros dias de Agosto.
L. Não há, qualquer evento suscetível de suspender o curso do prazo de prescrição a considerar.
M. Contrariamente ao que parece decorrer da sentença recorrida, o prazo de prescrição não tem que aferir-se pela data de propositura da ação, porque não é a propositura da ação que interrompe o decurso do prazo de prescrição, mas, nos termos do disposto no artº 323º, n.º 1 do Código Civil, da citação através da qual fizeram os A.A. saber à R. a sua intenção de exercer o direito.
N. Ora a citação da R. não ocorreu na data de propositura da ação mas no dia 23 de Outubro de 2009.
O. Assim, face à matéria de facto provada – mesmo sem a pugnada alteração dos itens 65 e 68º da base instrutória - como antes referido, à data de propositura da ação, já tinham decorrido mais que três anos contados da data em que a A. conhecia o seu direito, pelo que a exceção perentória de prescrição deve ser julgada procedente por provada e, em consequência absolvida a Ré E..., S. A. dos pedidos contra ela formulados nestes autos, nos termos do disposto no artº 227º, nº 2 e 498º, nº 1 do Código Civil.
P. Alterando-se as respostas aos números 65º e 68º da base Instrutória, e dando-se como não provada a matéria da alínea V) dos Factos Provados da sentença, então dúvidas não devem existir de que o direito da Autora B… está completa e absolutamente prescrito.
Q. Por a Ré E…, apenas ter sido contactada pelo A., na qualidade de tomador do seguro, como resulta de doc. 8 junto com a petição inicial, e tendo presente o carácter formal do contrato de seguro, na alínea L) da matéria assente, só pode ser dado como provado que: «O A. contactou com a R. E…, e ambos os A.A. todas as demais R.R. com vista à celebração de contrato de seguro do ramo vida e incapacidade».
R. A não ser assim, para além da desconformidade com a prova documental junta aos autos existirá uma contradição entre a matéria constante das alíneas L e M da matéria assente.
S. A matéria constante da alínea TT da matéria assente, mostra-se em manifesta contradição com a prova produzida, uma vez que o A. apresentou a proposta de seguro à R. E..., S. A., em 20 de Julho de 2006 – documento n.º 8 junto pelos A.A. com a petição inicial, e o parecer de viabilidade de Construção foi emitido em 12 de Maio de 2008 – doc. 16, também junto com a petição inicial.
T. Deste modo, em conformidade com a prova produzida, a referida alínea deverá ter a seguinte redação: «Para o efeito referido em SS), os AA., em 2008 contactaram previamente os serviços camarários competentes para saber da viabilidade construtiva da edificação de uma moradia unifamiliar no prédio referido em A), tendo sido informados que a sua pretensão era viável, (resposta ao item 2º da Base Instrutória)».
U. O Tribunal recorrido considerou provado na alínea BBB) que: «Foi o Banco que exigiu aos Autores um seguro de vida e invalidez, (resposta ao item 67º da Base Instrutória).
V. Tal matéria encontra-se em manifesta oposição com a prova produzida pois, como já referimos, a proposta de seguro foi apresentada à R. E… em 20 de Julho de 2006, e os A.A. apresentaram com a petição inicial os documentos 3 e 5, relativos a simulações de empréstimos efetuadas em 12 de Dezembro de 2006, seis meses depois, o que inviabiliza tal condicionamento.
W. Como não ficou provado que os A.A. tivessem efetivamente solicitado um empréstimo bancário para construir uma habitação, como resulta da resposta de não provado ao item 3º da base instrutória, não poderia em nenhum caso ser este inexistente
contrato uma imposição ou exigência válida do que quer que fosse.
X. Não foi feita qualquer prova de que qualquer banco haja exigido dos A.A. um seguro de vida e invalidez, pelo que esta matéria tem que ser considerada – Não provada.
Y. O Tribunal recorrido considerou provado na alínea DDD) que:«Para obtenção do financiamento bancário para a aquisição da habitação era condição obrigatória subscrever o contrato de adesão ao seguro de vida e incapacidade para ambos os titulares, os ora AA., (resposta ao item 6º da Base Instrutória).»
Z. Por um lado, se se tratasse de condição obrigatória, tal seria uma questão de direito que não pode integrar a decisão sobre a matéria de facto.
AA. Por outro, não pode ser tido como facto notório de obrigatoriedade como indica o Tribunal recorrido na fundamentação desta resposta, a circunstância de ser uma prática frequente. A frequência de tal prática não a torna obrigatória por os usos não serem fonte de direito – artº 3º do Código Civil.
BB. Não há qualquer imposição legal de tal prática. As instituições bancárias são livres de exigirem ou não o seguro de vida, mas se o fizerem deverão observar os condicionalismos do apontado diploma legal.
CC. Por não corresponder à verdade e, se correspondesse sempre seria uma questão de direito, tal matéria há - de ser considerado como – Não provada.
DD. A qualificação como discriminatória de uma dada conduta, é questão de direito que pode resultar dos factos provados, mas se não confunde com eles, nem pode integrar a decisão da matéria de facto.
EE. Assim, apenas pode ser considerado provado que: «Pois que, não obstante, os AA. serem cidadãos normais e médios, foram tratados pelas RR. nos termos referidos em VVV), o que lhes causou e causa para o futuro inquietude, complexo e sentimento de segregação perante qualquer cidadão normal, (resposta ao item 44º da Base Instrutória).
FF. A A. B…, não sendo uma parte que entabulou conversações com a seguradora para vir a celebrar um contrato de seguro, nem lhe dirigiu qualquer proposta, não pode invocar uma discriminação por recusa em contratar, porque não apresentou qualquer proposta de celebração de um contrato de seguro.
GG. A responsabilidade pré-contratual tem como titulares as partes contratantes e não um qualquer terceiro que pudesse ter interesse na celebração do contrato.
HH. Tal circunstância torna evidente a falta de fundamento legal da A. B… para formular contra a recorrente as pretensões indemnizatórias já analisadas, por não ser titular da relação material controvertida – negociações pré contratuais deste contrato de seguro.
II. Por esta razão, a ação, no que à aqui recorrente diz respeito, é manifesto que a ação não pode de todo proceder, devendo ser revogada, por falta de fundamento legal a sentença que, em sentido diverso e em desconformidade com a lei a condenou a pagar indemnização pela recusa de contratar com a A. B… que nunca apresentou proposta contratual à recorrente.
JJ. O artº 4º da L. 46/2006 não tem aplicação generalizada a todos e quaisquer seguros, exigindo a relação destes com o acesso a crédito bancário.
KK. Acompanhamos Calvão da Silva, in RLJ “Vida Risco – Crédito à habitação: as pessoas com deficiência ou risco agravado de saúde e o princípio da igualdade na L. 46/2006”, in RLJ, Ano 136, nº 3942, 2007 na interpretação deste preceito como se referindo exclusivamente aos seguros de vida que se mostrem conexionados com os mútuos bancários, por regra hipotecários para acesso à aquisição de habitação própria.
LL. Não só pela razão por ele apontada de que o legislador reconhecendo a prática generalizada dos grupos financeiros de concederem crédito bancário para compra de habitação própria com exigência de seguro de vida do mutuário, foi a este seguro que se referiu naquele preceito.
MM. Mas, e, sobretudo, porque contendo normas de natureza sancionatória e contraordenacional, em que impõe, nomeadamente, a publicação das sentenças que reconheçam a existência de prática discriminatória – artº 7º, nº 3 da L.46/2006 -, matérias em que regem os princípios da estrutura acusatória, da legalidade e da tipicidade penal, impeditivos de qualquer interpretação extensiva da lei como modo de ultrapassar a tipicidade – artº 1º do Código penal, artº1º e 2º do Regime Geral das contraordenações, DL 433/82, de 27 e Outubro e artº 32º da Constituição da República portuguesa.
NN. Deste modo, não estando em causa qualquer crédito bancário para aquisição de habitação, por partes dos A.A. que no seu processo negocial carecesse de um seguro de vida, não pode a recorrente em caso algum ser sancionada pela sua recusa de contratar visto não ser aplicável, neste caso, a L. 46/2006, pelo que a sentença que diferentemente entendeu, terá que ser revogada.
OO. A publicação da sentença cível é, além do mais, uma sanção inconstitucional, por violação dos artigos 29º e 32º da CRP porque decorre automaticamente da condenação no pagamento de indemnização, furtando a aplicação de tal sanção a todas as regras de defesa do arguido típicas do direito penal e absolutamente indiferente à graduação da culpa do infrator.
Pelo exposto deve ser a sentença recorrida revogada e substituída por outra que:
1- Julgue provada e procedente a exceção perentória de prescrição do direito dos A.A. de exigirem indemnização da aqui recorrente com fundamento em prática discriminatória, e, consequentemente absolvida a recorrente de todos os pedidos contra ela formulados.
2- Apenas na hipótese de assim se não vir a entender serem alteradas as alíneas L, TT, BBB, DDD, BBBB, no sentido indicado nestas alegações e, em consequência ser a ação julgada improcedente por não provada e a recorrente absolvida de todos os pedidos contra ela formulados.
3. Declarada a inconstitucionalidade da norma constante do artº 7º, nº 3 da L. 46/2006 por violação dos artº 29º e 32º da Constituição da República Portuguesa, com a consequente ausência de publicação da sentença.
3- Condenados os A.A. como litigantes de má-fé, multa e indemnização condigna em favor da recorrente.
***
Os autores apresentaram contra-alegações, relativamente a cada um dos recursos, defendendo a manutenção da decisão recorrida.
Os recursos foram admitidos como sendo de apelação, a subir nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
***
II – Âmbito do Recurso.
Perante o teor das conclusões formuladas pelas recorrentes – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso - arts. 608.º, nº2, 609º, 620º, 635º, nº4, 639.º/1, todos do C. P. Civil em vigor, constata-se que as questões essenciais a decidir são as seguintes:
a) Deve ou não ser alterada a matéria de facto.
b) Nulidade da sentença por excesso de pronúncia.
c) Prescrição do direito à indemnização relativamente à Ré E….
d) Se a recusa de celebrar os contratos de seguros pelas recorrentes traduz prática discriminatória não consentida.
e) Se os Autores têm direito a indemnização arbitrada e se o valor fixado deve ser alterado, por excessivo.
***
IIIFundamentação fáctico-jurídica.
1. Reapreciação da matéria de facto.
1.1. Defende a recorrente F… haver contradição ou colisão direta entre os factos provados sobre o estado de saúde do recorrido, mais concretamente entre os factos provados nas alíneas B) a J), N a P), CC) a HH) e SSS) e os factos provados na alínea DDDD), devendo eliminar-se os factos provados nas alíneas BBBB) e DDDD) por conterem matéria conclusiva.
Consta da alínea BBBB):
“Pois que, não obstante, os AA. serem cidadãos normais e médios foram tratados pelas RR. de forma discriminatória nos termos referidos em VVV), o que lhes causou e causa para o futuro inquietude, complexo e sentimento de segregação perante qualquer cidadão normal, (resposta ao item 44º da Base Instrutória)”.
E da alínea DDDD):
Ao agirem como referido em VVV), as RR. (á exceção da Ré E…, S.A. no que ao autor marido diz respeito e à exceção da Ré F… no que á cobertura de invalidez total permanente por referência ao autor) agiram sem avaliarem nem ponderarem devidamente, em termos médico-clínicos na especialidade de oncologia, qual o efetivo e atual estado de saúde dos AA., nem qual o efetivo grau de incapacidade permanente da Autora, aquando da apreciação das propostas de seguro por aqueles subscritas, com desrespeito dos direitos dos AA. e discriminação destes em função de uma deficiente avaliação e ponderação do seu real estado de saúde e da efetiva incapacidade permanente de que enferma a Autora (pela perda de 9/10 da visão do seu olho esquerdo):
- O A. marido teve diagnóstico de Doença de Hdgkin Esclorose Nodular, estádio IIB, com grande massa medianística desde 02/1996, tendo sido tratado cokm Doxorubicina, Vinblastina, Dacarbazina e Bleomicina – 6 cinclos e posterior radioterapia de mediastino, tendo terminado o tratamento em 01/11/1996, estando desde essa data em vigilância na consulta de Hematologia, não tendo havido recidiva do Linfoma nem se observaram sequelas físicas do tratamento, (cf. fls.593) o que significa que o Autor está clinicamente curado do aludido Linfoma, circunstância que já se verificava aquando da apresentação das propostas de seguro junto das Rés;
- A A. mulher teve melanoma da coroide do OE, irradiado há 13 anos, tendo sido observada pela última vez na Consulta de Oncologia Médica do Hospital de N… em 08/01/2005, não tendo qualquer observação na Consulta de Oncologia desde Janeiro de 2005, encontrando-se em vigilância na consulta de Oftalmologia do Centro Hospitalar de N… por, devido ao melanoma entretanto irradiado, a A. mulher ter perdido 9/10 da visão do olho esquerdo o que lhe provocou o aludido grau de incapacidade permanente de 25%, o que significa que a Autora está clinicamente curada do aludido melanoma, (cf. fls.606), circunstância que já se verificava aquando da apresentação das propostas de seguro junto das Rés;
- A A. mulher tem apenas uma incapacidade permanente global de 25%, (cf. fls.817), decorrente da perda de 9/10 da visão do seu olho esquerdo onde teve o melanoma ocular, (resposta ao item 46º da Base Instrutória)”.
Ora, quanto à primeira, é evidente que a sua primeira parte contém matéria conclusiva (Pois que, não obstante, os AA. serem cidadãos normais e médios foram tratados pelas RR. de forma discriminatória nos termos referidos em VVV), devendo por isso ser expurgada da matéria de facto”, não assim quanto ao remanescente.
Assim, decide-se alterar essa alínea, passando dela a contar apenas:
BBBB) Os factos descritos em VVV) causou-lhes e causa para o futuro inquietude, complexo e sentimento de segregação perante qualquer cidadão normal”.
Do mesmo modo que a alínea DDDD), para além de encerrar juízo valorativo e conclusivo, contém matéria relativa ao estado clínico dos Autores já referenciado nas anteriores alíneas.
Assim, decide-se eliminá-la dos factos provados.
***
2. Matéria de facto.
Assim, a matéria de facto a considerar é a seguinte:
A) Existe um prédio sito em …, Paredes, inscrito na matriz sob o n.º 524 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 2033/19970207, registado em nome da Autora B… casada com O…, por aquisição datada de 07/02/1997, (facto assente A – fls.401).
B) A Autora, em 1998 foi vítima de melanoma ocular, e o Autor marido, em 1978 sofreu amputação do membro inferior esquerdo, e é portador de linfoma de Hodgkin, (facto assente J - fls.404).
C) - Por causa da amputação do membro inferior esquerdo, o Autor marido padece, desde 1978, de uma incapacidade de 70%, tendo-lhe o linfoma de Hodgkin de estádio II B sido diagnosticado em 1996, (resposta ao item 49º da Base Instrutória).
D) A fls. 143, consta uma declaração médica, emitida pelo Hospital de N…, no Porto, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, respeitante à Autora mulher, na qual consta: “A referida doente frequente a Consulta de Oftalmologia desde Novembro de 1998. Apresenta lesão tumor do OE compatível com melanoma da caroide tratado de forma conservadora na Suíça, Hôpital P…, em Fevereiro de 1999. Apresenta acuidade visual do OE de 20/200 com melhor correção”, (facto assente P – fls. 405).
E) A fls. 149, consta um relatório médico datado de 21/07/1999, emitido pelo Hospital de N…, no Porto, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, respeitante ao Autor marido, de onde consta:
“Esteve internado neste Hospital entre 16/02/1996 e 27/02/1996 tendo tido alta com o diagnóstico de linfoma de hodgkin orientado para consulta de hematologia clínica” “O doente é seguido na consulta de hematologia clínica desde Fevereiro de 1996 com o diagnóstico de doença de hodgkin, esclerose nodular estádio IIB. Fez tratamento de quimioterapia – 6 ciclos até Agosto de 96 e posteriormente radioterapia de mediastino de 01/10/96 a 01/11/96. É observado periodicamente nesta consulta para vigilância clínica e de imagem” ,(facto assente S – fls.405 e 406).
F) A fls. 150, consta, com data de 28/02/2002, declaração médica pelo Hospital de N…, no Porto, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, respeitante ao Autor marido, de onde consta: “Efetuou tratamento de radioterapia externa de 01/10/96 a 17/11/96 por doença de hodgkin em estádio IIA”. ,(facto assente T – fls. 406).
G) A fls. 151, consta um relatório clínico, emitido pelo Hospital de N…, no Porto, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, respeitante ao Autor marido, datado de 11/03/2002, de onde consta: “Doente com doença de Hodgkin, estádio IIB, subtipo esclerose nodular, diagnosticado em Fevereiro de 1996, com grande massa mediastínica” , (facto assente U – fls.406).
H) A fls. 147, consta uma declaração emitida pelo Hospital de N…, no Porto, datada de 04/04/2002, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, de onde consta o seguinte: “Após acidente de viação deu entrada no serviço de urgência com esfacelo da perna esquerda. Foi submetido a desarticulação do joelho em 04/07/1978”, (facto assente R – fls. 405).
I) A fls. 153, consta um documento emitido em 26/11/2002, pela Sub-região de Saúde do Porto, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, no qual se atribuiu ao Autor incapacidade permanente global de 70%., (facto assente X – fls.406).
J) A fls. 141/142, consta uma declaração médica, emitida pela Dra. Q…, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, respeitante à Autora mulher, em que consta: “Frequenta a consulta de oncogenética desde 1999 por melanoma da caroide. Fez tratamento conservador no Hôpital P…, na Suíça, ao OE, apresentado à presente o seguinte exame; olho direito: visão de 10/10; olho esquerdo; lesão residual – visão de 1/10”, (facto assente O – fls.404 e 405).
L) Os AA. contactaram todas as Rés com vista à celebração de contrato de seguro do ramo vida e incapacidade, (facto assente B – fls.401).
M) Para subscrever o contrato de seguro de vida e incapacidade, os Autores contactaram, pelo menos, a Ré F…, S.A. e a Ré D…, S.A., (resposta ao item 7º da Base Instrutória).
N)- Em decorrência da doença de Hodgkin, foi o Autor submetido a tratamento de quimioterapia e radioterapia, mantendo-se em vigilância até á data da proposta apresentada a Ré D…, (resposta ao item 50º da Base Instrutória).
O) Por causa de uma lesão tumoral do olho esquerdo, compatível com melanoma da coroide, diagnosticada em 1998, a Autora B…, foi submetida a tratamento de radioterapia, e encontrando-se, na data da apresentação da proposta de seguro á Ré D…, igualmente em fase de vigilância clínica, com o esclarecimento que a A. mulher foi observada pela última vez na Consulta de Oncologia Médica do Hospital de N… em 08/01/2005, que a A. mulher teve melanoma da coroide do OE, irradiado há 13 anos e que não tem qualquer observação na Consulta de Oncologia desde Janeiro de 2005, encontrando-se em vigilância clínica mas na consulta de Oftalmologia do Centro Hospitalar de N… por, devido ao melanoma entretanto irradiado, a A. mulher ter perdido 9/10 da visão do olho esquerdo o que lhe provocou o grau de incapacidade permanente de 25%, (resposta ao item 51º da Base Instrutória).
P) Em virtude da perda de 9/10 de visão do olho esquerdo decorrente da doença diagnosticada na Autora, foi a mesma reformada por invalidez, sendo portanto pensionista, à data da subscrição da proposta de seguro, (resposta ao item 52º da Base Instrutória).
Q) A fls. 76, consta uma carta, datada de 28 de Julho de 2006, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, remetida pela Ré E… Companhia de Seguros de Vida, S.A., ao Autor marido, de onde consta, que, não era possível aceitar a A. mulher como candidata à proposta de seguro de vida apresentada “em resultado da análise efetuada pelo nosso médico a todo o processo clínico” e, quanto ao A. Marido, que “para apreciação do risco, torna-se necessário apresentar/efetuar os elementos a seguir indicados: relatório pormenorizado, subscrito por especialista, onde se especifique toda a patologia que declarou, classificação clínica e histopatológica, terapêuticas, estado atual, etc.”, (facto assente D – fls.401).
R) A fls. 77, consta uma carta, datada de 21 de Agosto de 2006, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, remetida pela Ré E…, Companhia de Seguros, S.A., ao Autor marido, de onde consta que esta acusou a receção dos relatórios clínicos datados de 2002 e onde esta solicita informação médica atualizada, (facto assente E – fls.401).
S) A fls. 152, consta um relatório clínico emitido pelo Hospital de N… no Porto, datado de 07/09/2006, do qual consta:

Informação Clinica
Doente com o diagnóstico de Doença de Hodgkin estádio II B, sub-tipo Esclerose Nodular desde Fevereiro de 1996.
Na apresentação evidenciava-se grande massa mediastínica.
Fez quimioterapia com Adriamicina, Vinblastina, Bleomicina e Dacarbazina, com inicio em Fevereiro de 1996, tendo terminado em 14/09/96.
Prosseguiu o tratamento com radioterapia do mediaslínio.
Actualmente encontra-se bem, em vigilância na consulta de Hematologia e nunca se observou recidiva da doença.

T) Os Autores propuseram á Ré E…, S.A. os seguros em questão, (resposta ao item 68º da Base Instrutória).
U) A fls. 78, consta uma carta, datada de 19 de Setembro de 2006, cujo teor se dá aqui por integralmente r\reproduzido para todos os efeitos legais, remetida pela Ré E…, Companhia de Seguros, S.A., ao Autor marido, de onde consta que “em resultado da análise efetuada, constatámos a existência de fatores agravantes no risco que nos é proposto. Desta forma apenas nos será possível aceitá-lo em condições especiais. Aceite, apenas, para cobertura Morte (Exclusão da Cláusula de Invalidez. Solicitamos, portanto que até 06-10-2006 nos seja dada uma resposta quanto à proposta apresentada, a fim de podermos ou não proceder à respetiva emissão. Contudo, findo este período e se nada nos for comunicado, consideraremos que está de acordo com as nossas condições e procederemos à emissão da apólice/adesão” e onde se reitera não ser possível aceitar a A. Mulher como candidata. (facto assente F – fls.402).
V) A proposta foi dada sem efeito por parte da Ré E…, S.A. o que foi comunicado aos Autores após o dia 20 de Outubro de 2006, por carta remetida datada de 14/11/2006, junta a fls.769, (resposta ao item 69º da Base Instrutória).
X) Foi emitido parecer técnico de recusa quanto a ambos os Proponentes por parte da Ré D…, S.A., (resposta ao item 48º da Base Instrutória).
Z) A fls. 74 consta uma carta, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, datada de 18/12/2006, remetida pela Ré D… Companhia de Seguros, S.A. ao Autor, de onde consta que, quanto à proposta de seguro de vida apresentada pelos Autores (capital seguro proposto de 65.000,00€ pelo prazo de 24 anos, “após análise atenta do questionário clínico, avaliado o risco envolvido e aplicando à situação os critérios objetivos e gerais em vigor nesta Seguradora, foi considerada como não aceite a proposta de adesão por V. Exa. Apresentada”, (facto assente C – fls.401).
AA) A Ré D… decidiu recusar, pela carta referida em Z), a celebração dos contratos de seguro pretendidos pelos Autores, (resposta ao item 53º da Base Instrutória).
BB) Os exames médicos realizados pelos Autores foram analisados pelo departamento Médico da Ré F… e a Ré remeteu-lhes a proposta que consta da alínea CC) (resposta ao item 61º da Base Instrutória).
CC) A fls. 136 consta uma proposta de contrato de seguro do ramo vida, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, em que a Ré D… figuraria como seguradora, subscrita pelos Autores, datada de 11/11/2007, com o n.º 66/9877, que preencheram o respetivo questionário clínico, onde foi declarado, no que diz respeito ao estado de saúde da Autora mulher o seguinte: esteve hospitalizada por motivo de doença; encontra-se atualmente incapacidade total ou parcialmente de exercer a sua atividade profissional; já se submeteu a intervenção cirúrgica ou sofre de defeito congénito; deformação física, defeito do ouvido ou da vista; tem percentagem de invalidez; está atualmente reformada, (facto assente L– fls.404).
DD) Do questionário que consta da proposta de CC), foi declarado, no que respeita ao estado de saúde do Autor marido o seguinte: esteve hospitalizado por motivo de doença ou acidente; esteve ou está sob tratamento médico superior a duas semanas; já se submeteu a intervenção cirúrgica ou sofre de defeito congénito, deformação física, defeito do ouvido ou da vista; tem percentagem de invalidez; sofreu ou sofre de diabetes, cancro, problemas relacionados com o coração ou com o sistema circulatório”, (facto assente M– fls.404).
EE) No impresso denominado Declarações do Candidato a seguro de Vida, junto a fls. 138/140, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, a Autora mulher declarou; Não ser saudável por melanoma ocular esquerdo em 1998; padecer de incapacidade profissional por alteração da visão por motivo de melanoma do olho esquerdo com lesão residual; encontrar-se reformada por melanoma ocular; esteve internada em Hospital por melanoma ocular; foi submetida a radioterapia; foi submetida a intervenção cirúrgica ao olho esquerdo; foi submetida a estudos radiológicos, TAC ou ecografia até 2003, para rastreio do melanoma”, (facto assente N – fls.403).
FF) No impresso junto a fls. 144/146, denominado Declarações do Candidato a Seguro de Vida, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, o Autor marido declarou: “não ser saudável por linfoma do Hodgkin em 1996 e próteses no membro inferior esquerdo; padecer de defeito físico ou incapacidade consistente na prótese no membro inferior esquerdo; ter incapacidade profissional de 70% por próteses do membro inferior esquerdo; ter grau de desvalorização atribuído de 70%; não cumpriu o serviço militar por amputação do membro inferior esquerdo; já esteve internado em Hospital ou estabelecimento de saúde em 1978 para amputação do membro inferior esquerdo e em 1998 por linfoma de hodgkin; foi submetido a tratamentos de quimioterapia e radioterapia relacionados com a doença de hodgkin; foi submetido a intervenção cirúrgica - amputação do membro inferior esquerdo; foi submetido a endoscopia ou biopsia quando teve o linfoma; foi submetido a outros estudos radiológicos, TAC ou ecografia por doença de hodgkin”, (facto assente Q – fls. 405).
GG) Na sequência da subscrição da proposta e do questionário clínico referido em CC) e DD), a Ré F… solicitou aos Autores a efetuação de exames médicos, sendo que o exame realizado à Autora revelou melanoma ocular esquerdo ocorrido em 1998 e visão de 1/10 no olho esquerdo, (resposta ao item 59º da Base Instrutória).
HH) O exame médico efetuado ao Autor marido revelou ter aquele tido linfoma de hodgkin, ter prótese no membro inferior esquerdo e ter incapacidade permanente global de 70%, (resposta ao item 60º da Base Instrutória).
II) A fls. 83, consta uma carta, datada de 7 de Fevereiro de 2007, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, remetida pela 3.ª R., F… – Companhia de Seguros, S.A., aos AA., de onde consta o seguinte:
“Reportamo-nos à proposta de celebração de contrato de seguro de vida que nos apresentou, para as coberturas de morte e invalidez total e permanente.
O estado de saúde do proponente ao contrato de seguro do ramo vida, no momento da respetiva celebração, é suscetível de influenciar a verificação dos riscos cobertos pelo mesmo.
Após análise de todos os dados clínicos inerentes ao processo de adesão em assunto, constata-se, no que diz respeito á Sra. B…, quadro clínico de patologia ocular, suscetível de influenciar a verificação do risco.
Face ao exposto, informamos de que a proposta de seguro de vida é aceite apenas com a cobertura de morte e agravamento de prémio, para a Sra. B….
No que diz respeito ao Sr. C…, informamos de que a proposta de seguro de vida está aceite. No entanto, a incapacidade pré existente, resultante da invalidez (70%) referente às sequelas mencionadas e sua eventual evolução futura, não será considerada para o cômputo geral de uma eventual invalidez a indemnizar por esta garantia.
Mais informamos de que será aplicada uma taxa 20,00 por cada 1.000,00€ de capital seguro, a adicionar à taxa base do contrato, pelo que o prémio semestral para presente anuidade será de 839,98 €. Para os anos seguintes o prémio será atualizado de acordo com o capital e a taxa em vigor para a idade atuarial dos clientes.
A fim de dar seguimento ao pedido de adesão, aguardamos o vosso acordo escrito, para a morada a seguir indicada, no prazo máximo de 60 dias, a partir desta data, findo o qual daremos a proposta Nula e Sem efeito”, (facto assente G – fls.402).
JJ) Os Autores nunca comunicaram à Ré Tranquilidade a sua aceitação das referidas propostas, (resposta ao item 62º da Base Instrutória).
LL) O grau de incapacidade do Autor era suscetível de influenciar o risco de invalidez temporária permanente por acidente no que respeita ao Autor em consequência da incapacidade já existente e atribuída, (resposta ao item 64º da Base Instrutória).
MM) A Ré D…, S.A. recusou aos autores cobertura de risco de morte e a cobertura de invalidez absoluta e definitiva por “risco não aceitável/ainda em vigilância”: “como ainda está em vigilância deve-se recusar”;
A Ré E… aceitou ao autor C… o prémio de seguro no que respeita á cobertura de risco de morte (exclusão da cláusula de invalidez).
A Ré E… recusou ao autor C… a cobertura complementar de invalidez total permanente e definitiva e á autora B… a cobertura de risco de morte e a cobertura complementar de invalidez total permanente e definitiva “em resultado da análise efetuada pelo nosso Médico Consultor a todo o processo clínico apresentado”.
A Ré F…:
- agravou ao autor C… o prémio de seguro (para o prémio semestral de €839,98) no que respeita á cobertura de risco de morte por o referido autor “padecer de doença de Hodgkin estádio II-B, subtipo Esclorose Nodular;
- agravou á autora B… o prémio de seguro (para o prémio semestral de €839,98) no que respeita á cobertura de risco de morte por a referida autor “na data de subscrição da referida proposta padecia de uma lesão tumor do olhe esquerdo compatível com melanoma da coroide”;
- recusou ao autor C… a cobertura de invalidez absoluta e definitiva e de invalidez temporária permanente por acidente porque o referido Autor padecia de um grau de desvalorização de 70%, na data da subscrição de seguro.
- recusou á autora B… a cobertura de invalidez absoluta e definitiva porque “na data de subscrição da referida proposta padecia de uma lesão tumor do olhe esquerdo compatível com melanoma da coroide”, (resposta ao item 9º da Base Instrutória).
NN) Houve a recusa da 1ª Ré em contratar com ambos os autores o seguro de vida, a recusa da 2ª Ré em contratar com a autora o seguro de vida e a aceitação da 3ª Ré em contratar com ambos os autores, mas com agravamento do prémio, o seguro de vida, (cf. item 15º da Base Instrutória).
OO) Não conformados com tal posição, os AA. expuseram a situação supra descrita ao Provedor de Justiça, tendo este proferido o parecer de PP), (resposta ao item 12º da Base Instrutória).
PP) A fls. 88 e seguintes, consta um documento intitulado recomendação n.º 3B/2008, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, de onde consta, designadamente, o seguinte: «…nenhum processo de contraordenação havia sido instaurado prática dos atos discriminatórios no sector dos seguros».
«A relevância da mencionada posição do Instituto de Seguros de Portugal resulta, no campo que aqui importa, do facto de ela confirmar que as principais, ou únicas, consequências práticas diretas da entrada em vigor da Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto, terão sido a ‘proibição de recusa de negociação’ e a ‘proibição de imposição arbitrária de condições mais gravosas’.
Mas quaisquer condições impostas nos contratos são consideradas aceitáveis, desde que se fundem nos ‘manuais de risco’, em ‘situações clínicas diferenciadas’ ou nos ‘fundamentos da técnica seguradora». Como é bom de ver, tanto a deficiência como os riscos agravados de saúde constituem, sem exceção, ‘situações clínicas diferenciadas’ que, à luz do que ficou visto, autorizam (ou, fazendo uso da expressão do Instituto de Seguros de Portugal, justificam) exorbitantes agravamentos dos prémios de seguro ou, mesmo, a recusa de celebração de contratos ou de concessão de crédito.
Uma vez que, antes da entrada em vigor da Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto, já a mesma motivação era apresentada para fundamentar a recusa de aceitação de propostas ou o agravamento dos prémios de seguro, a situação decorrente do novo regime não revela substanciais alterações. Neste aspeto, portanto, a publicação de legislação proibindo e punindo a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde não significou o fim das práticas discriminatórias”, (facto assente I – fls.403).
QQ) Os AA. têm dois filhos menores, um de 12 anos e outro de 13 anos, (resposta ao item 17º da base instrutória).
RR) Os AA. e seus filhos durante dez anos viveram todos conjuntamente com os pais do Autor marido em casa destes, (resposta ao item 19º da Base Instrutória).
SS) Os AA. pretenderam construir a sua casa de morada de família no prédio referido em A), que haviam adquirido por partilha por morte, com o esclarecimento que tal pretensão se verificou em Maio de 2008, (resposta ao item 1º da Base Instrutória).
TT) Para o efeito referido em SS), os AA. contactaram previamente os serviços camarários competentes para saber da viabilidade construtiva da edificação de uma moradia unifamiliar no prédio referido em A), tendo sido informados que a sua pretensão era viável, (resposta ao item 2º da Base Instrutória).
UU) Os AA. dispunham de terreno consubstanciado no prédio referido em A) e de viabilidade construtiva para a edificação da habitação unifamiliar projetada e que pretendiam construir no referido terreno, (resposta ao item 13º da Base Instrutória).
VV) O Autor marido auferia um vencimento mensal de 408.41 € e a Autora mulher recebe a pensão de 256.72 €, com o esclarecimento de que em 2013 o Autor ficou desempregado por a empresa onde trabalhava (T…) ter aberto insolvência nesse ano, (resposta ao item 18º da Base Instrutória).
XX) Como os AA. não tinham possibilidades económicas para a construção da dita casa, pediram simulações de empréstimos bancários, (resposta ao item 3º da Base Instrutória).
ZZ) Para obtenção de simulações de crédito bancário (no montante de 65.000,00€) para construção de habitação contactaram as seguintes instituições bancárias:
-Banco G…,
-H…,
-I…,
-J…, (resposta ao item 4º da Base Instrutória).
AAA) As instituições bancárias a que se dirigiram os Autores condicionaram a eventual e futura aprovação do financiamento por eles pretendido à contratação de um seguro de vida e invalidez, (resposta ao item 66º da Base Instrutória).
BBB) Foi o Banco que exigiu aos Autores um seguro de vida e invalidez, (resposta ao item 67º da Base Instrutória).
CCC) Só por via do crédito à habitação, os AA. poderiam obter uma casa própria, (cf. item 15º da Base Instrutória).
DDD) Para obtenção do financiamento bancário para a aquisição da habitação era condição obrigatória subscrever o contrato de adesão ao seguro de vida e incapacidade para ambos os titulares, os ora AA., (resposta ao item 6º da Base Instrutória).
EEE) - Saturados de viverem “acompanhados” dos pais, em meados de 2008, os AA. arrendaram um andar onde tiveram que pagar 300,00 € de renda mensal, com o esclarecimento que tal arrendamento durou até 2012, altura em que os AA. deixaram o referido arrendado e regressaram para a casa dos pais do Autor, onde voltaram a habitar juntamente com aqueles e com os seus dois filhos, (resposta ao item 20º da Base Instrutória).
FFF) Os AA. não dispõem de qualquer habitação própria, (resposta ao item 22º da Base Instrutória).
GGG) Na sequência do referido em MM), os autores, recorreram por si e posteriormente através dos seus mandatários, ao Instituto de Seguros de Portugal expondo a posição assumida pelas Rés e reclamaram a atuação deste organismo, tendo este remetido as cartas referidas em MMM), (resposta ao item 10º da Base Instrutória).
HHH) O Instituto de Seguros de Portugal solicitou à Ré esclarecimentos sobre a situação e, em resposta ao ISP, a Ré informou o Departamento de Supervisão de Conduta do Mercado, que a decisão de recusa da companhia se baseara nos dados clínicos concretos dos Autores, enquadrados nos critérios objetivos constantes nas tabelas de análise de risco da sua companhia resseguradora, (resposta ao item 54º da Base Instrutória).
III) Nesta sequência, o ISP, no âmbito da sua função de supervisão do mercado sustentação técnica constante dos manuais de risco da resseguradora, (resposta ao item 55º da Base Instrutória).
JJJ) Tendo então a Ré enviado ao ISP, toda a documentação técnica na qual baseara a sua decisão, (resposta ao item 56º da Base Instrutória).
LLL) O ISP veio emitir parecer consentâneo com a decisão tomada pela Ré D…, (resposta ao item 57º da Base Instrutória).
MMM) A fls. 85/87, constam duas cartas datadas, respetivamente, de 11/06/2008 e de 13/08/2008, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, remetidas pelo Instituto de Seguros de Portugal, ao Exmo. Sr. Dr. S…, por referência ao nome dos Autores, de onde consta, designadamente, o seguinte:
«De facto, embora a Lei n.º 46/2006 represente uma limitação à autonomia da vontade, na medida em que proíbe as situações arbitrárias de recusa de negociação ou de imposição de condições mais gravosas pelas Seguradoras, e embora sirva de base sólida para a superação de problemas sentidos na contratação de alguns seguros por pessoas com deficiência, a verdade é que não parece contrariar os fundamentos da técnica seguradora, visto que devem ser apreciados os riscos concretos de cada situação específica.»
«Deste modo, a simples invocação de que as Seguradoras não contrataram um seguro de vida ou que agravaram o respetivo prémio é insuficiente para a atuação deste Instituto ao abrigo das competências previstas no artigo 3.°, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 34/2007, de 15 de Fevereiro, a não ser que de facto existam indícios e provas de discriminação nos termos expostos, não bastando, pois, as simples decisões das Seguradoras em agravar o prémio ou não contratar o seguro com os clientes de V. Exa. para se desencadear um processo contraordenacional, (facto assente H – fls.402 e 403).
NNN) A presente ação deu entrada em juízo no dia 20 de Outubro de 2009, (facto assente Z – fls.406).
OOO) Em 2009 os AA. pagaram 3.600,00 € de renda (€300 x 12 meses = € 3.600,00), tendo o A. marido 43 anos de idade e a A. mulher 38 anos de idade, (resposta ao item 23º da Base Instrutória).
PPP) Os dados relativos ao triénio 2004-2006 divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) indicam que a esperança de vida à nascença em Portugal se situou nos 78,17 anos, sendo de 74,84 anos para os homens e de 81,3 para as mulheres, (resposta ao item 24º da Base Instrutória).
QQQ) O A. marido é pessoa educada, culta, informada, possui o 12 º ano de escolaridade, e sempre trabalhou como escriturário até ficar desempregado, ciente na vida dos seus direitos e das suas obrigações, (resposta ao item 33º da Base Instrutória).
RRR) Casou e tem dois filhos menores, e sempre ansiou ter uma casa própria, (resposta ao item 34º da Base Instrutória).
SSS) Também a A. mulher sempre trabalhou até à data em que foi confrontada com a sua doença – melanoma ocular e que lhe determinou a incapacidade permanente global de 25%, com o esclarecimento que a A. mulher foi observada pela última vez na Consulta de Oncologia Médica do Hospital de N… em 08/01/2005, que a A. mulher teve melanoma da coroide do OE, irradiado há 13 anos e que não tem qualquer observação na Consulta de Oncologia desde Janeiro de 2005, encontrando-se em vigilância na consulta de Oftalmologia do Centro Hospitalar de N… por, devido ao melanoma entretanto irradiado, a A. mulher ter perdido 9/10 da visão do olho esquerdo o que lhe provocou o aludido grau de incapacidade permanente, (resposta ao item 35º da Base Instrutória).
TTT) Não obstante isso, sempre sonhou em ter a sua casa própria, para dela desfrutar com seus filhos e marido, (resposta ao item 36º da Base Instrutória).
UUU) Os AA. saturados de viver, durante vários anos, na casa dos pais do A. marido, decidiram recorrer ao financiamento bancário para, dessa forma, construírem a sua casa de habitação no terreno referido em A), com o esclarecimento de que tal ocorreu em Maio de 2008, (resposta ao item 37º da Base Instrutória).
VVV) A recusa pela Ré D…, S.A. de cobertura de risco de morte quanto a ambos os Autores e da cobertura de invalidez absoluta e definitiva a ambos os Autores, a recusa pela Ré E… á autora B… da cobertura de risco de morte e a cobertura complementar de invalidez total permanente e definitiva, o grau de agravamento pela Ré F… ao autor C… do prémio de seguro (para o prémio semestral de €839,98) no que respeita á cobertura de risco de morte, o grau de agravamento pela Ré F… á autora B… do prémio de seguro (para o prémio semestral de 839,98) no que respeita á cobertura de risco de morte, a recusa pela Ré F… á autora B… da cobertura de invalidez absoluta e definitiva e a recusa pela Ré F… ao autor da cobertura de invalidez absoluta e definitiva, constituiu para os AA. motivo de frustração, desgosto, angústia e profunda tristeza, (resposta ao item 39º da Base Instrutória).
XXX) Os AA. não se conformam com conduta das RR. referida em VVV), tendo, por via disso, perdido noites de sono e sofrido perturbação nervosa, abalo psicológico e ansiedade, (resposta ao item 40º da Base Instrutória).
ZZZ) A conduta das RR. referida em VVV na referida contratação provocou aos AA. grande sentimento de revolta na sua vida, (resposta ao item 41º da Base Instrutória).
AAAA) Sentindo-se, agora, e em consequência do referido em VVV), os AA. dominados por um enorme sentimento de injustiça, discriminação, inferioridade e desânimo, (resposta ao item 43º da Base Instrutória).
BBBB) Os factos descritos em VVV) causou-lhes e causa para o futuro inquietude, complexo e sentimento de segregação perante qualquer cidadão normal (alterado).
CCCC) Com a sua conduta referida em VVV), as RR. causaram aos AA. frustração, desgosto e angústia, (resposta ao item 45º da Base Instrutória).
***
3. O direito.
3.1. Nulidade da sentença.
A recorrente “D…” suscitou a nulidade da sentença por ter condenado para além do pedido, pois que condenou a Recorrente num valor muito superior ao pedido formulado pelos AA a título de danos não patrimoniais, sendo que os Autores peticionaram a quantia de €5.000,00 para cada um a pagar solidariamente pelas Rés Seguradoras e foi atribuída uma indemnização total e global de 28.000,00€ a título de danos não patrimoniais.
Apreciando.
Como flui do art.º 615.º, n.º1, alínea e), do C. P. Civil, a sentença é nula quando o “juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido”.
Esta nulidade, como corolário do princípio do dispositivo, está relacionada com imposição estabelecida no art.º 609.º/1 do C. P. Civil, em que o tribunal não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.
O conteúdo da sentença deve, portanto, manter-se dentro dos limites definidos pela pretensão do Autor, deve respeitar os petita partium, sob pena de nulidade.
E, no caso concreto, é manifesto que a sentença recorrida foi muito para além do pedido formulado pelos Autores.
Na verdade, os Autores formularam, a título principal, os seguintes pedidos:
a) Serem as Rés condenadas solidariamente a pagarem aos Autores, a título de danos patrimoniais, a quantia de € 68.000,00 decorrente do valor patrimonial deixado de auferir proveniente das mais-valias da edificação que os AA. ficaram privados de construir, referidas supra 49 a 64, as despesas no montante de 195,61€ identificadas supra 65º, e as rendas mensais da sua habitação que entretanto se vencerem, desde a data da citação para a presente ação até à data da morte dos AA., cujo montante se relega para posterior liquidação em execução de sentença, bem como a pagarem a importância de 15.000,00 € a cada um dos AA. pelos danos morais sofridos enumerados supra;
b) Condenar, ainda, as RR. solidariamente nos juros de mora legais desde a citação até efetivo pagamento sobre as quantias referidas nas alíneas anteriores;
E na decisão recorrida as Rés foram condenadas nos seguintes termos:
a) R. D…, Companhia de Seguros, S.A. a pagar ao Autor C… a quantia de €7.000 (sete mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal para as obrigações civis, desde a citação até efetivo pagamento;
b) condeno a R. D…, Companhia de Seguros, S.A. a pagar á Autora B… a quantia de €7.000 (sete mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal para as obrigações civis, desde a citação até efetivo pagamento;
c) condeno a R. E… S.A. a pagar á Autora B… a quantia de €7.000 (sete mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal para as obrigações civis, desde a citação até efetivo pagamento;
d) condeno a R. F…, Companhia de Seguros, S.A. a pagar ao Autor C… a quantia de €3.000 (três mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal para as obrigações civis, desde a citação até efetivo pagamento;
e) condeno a R. F…, Companhia de Seguros, S.A. a pagar á Autora B… a quantia de €4.000 (quatro mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal para as obrigações civis, desde a citação até efetivo pagamento.
Assim, temos que o Autor tem direito a receber das recorrentes D… e F…, Companhia de Seguros, a quantia total de €10.000,00.
E a Autora tem direito a receber das recorrentes D… (€7.000), E… (€7.000) e F…, Companhia de Seguros (€4.000) a quantia total de €18.000,00.
Na decisão recorrida considerou-se:
“Ora, como é jurisprudência uniforme e pacífica dos nossos Tribunais Superiores, “os limites da condenação contidos no art.661º, nº1, do CPC de 1961 têm de ser entendidos como referidos ao pedido global e não às parcelas em que aquele valor se desdobra, podendo, por isso, ser atribuído um valor superior ao peticionado parcelarmente, desde que não se exceda o montante global do pedido”, (cf. por todos, Ac. STJ de 28.3.2006-www.dgsi.pt/jstj-Proc. nº06ª407; no mesmo sentido, Acs. do STJ de 10.10.2002; www.dgsi.pt/jstj-Proc. nº02B2643 e de 23.2.2005; www.dgsi.pt/jstj- Proc. nº04S3164).
O que significa que o presente Tribunal está impedido, pelo limite legal estabelecido no referido artº661º, nº1, do CPC de 1961 (a que corresponde o artº609º, nº1, do CPC de 2013), de poder condenar em quantia superior ao pedido total formulado no valor de €98.195,61, (cf. fls.25), acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento, (cf. fls.24)”.
Concordando com esta orientação, está, assim, devidamente justificada a condenação e respeito pelo limite do pedido, pelo que improcede a pretensa nulidade.
3.2. Prescrição do direito relativamente à recorrente “E…”
Defendeu a Recorrente “E…”, na sua contestação, que o direito à indemnização peticionada pela Autora mostra-se prescrito, por decorridos mais de três anos sobre a propositura da ação. E reafirma, em sede do presente recurso, essa prescrição, alegando que “de todas as cartas enviadas pela Ré E… S.A. aos A.A., datadas de 28 de Julho de 2006, 21 de Agosto de 2006, 19 de Setembro de 2006, 14 de Novembro de 2006, consta, além do mais: «Em resultado da análise efetuada pelo nosso Médico Consultor a todo o processo clínico apresentado, lamentamos informar não ser possível aceitar este candidato», tendo os autores recebido as referidas cartas, porque as juntaram com a petição inicial para prova da recusa de contratar e, porque a elas responderam enviando os elementos clínicos solicitados na carta de 28 de Julho de 2006, nos primeiros dias de Agosto de 2006, e o relatório médico solicitado na carta de 21 de Agosto de 2006, ainda durante o mês de Agosto, não podem deixar de as ter recebido para efeitos de tomarem conhecimento da recusa de aceitar a A. B…, como pessoa segura”.
Sobre esta questão se pronunciou o Senhor Juiz nos seguintes termos:
Ora, conforme resulta provado nos presentes autos, (cf. facto provado NNN) a presente ação deu entrada em juízo no dia 20 de Outubro de 2009, instaurada contra as Rés D… - Companhia de Seguros, S.A., E…, S.A. e F…, S.A., tendo a Ré “E…” sido citada em 23/10/2009, (cf. fls.51).
In casu, o pedido de indemnização é peticionado pelos AA., com base na responsabilidade extracontratual das rés, invocando os AA., em síntese, que tal responsabilidade das rés decorre da sua recusa e/ou penalização na celebração de contratos de seguro pelos AA., em razão da deficiência destes, nos termos do disposto no artº4º, al.c), in fine, conjugado com o estatuído no artº7º, ambos da Lei nº46/2006, de 28 de Agosto.

Ora, nos termos do art. 498º do CC, é de aplicar ao caso o prazo de prescrição de três anos a contar do conhecimento do direito à peticionada indemnização por parte dos AA., o que em relação à seguradora E…, S.A. apenas ocorreu em 14/11/2006, conforme resulta do facto provado V) e do teor da carta daquela seguradora de fls.769.
Com efeito, resulta provado nos presentes autos que a proposta foi dada sem efeito por parte da Ré E…, S.A. o que foi comunicado aos Autores após o dia 20 de Outubro de 2006, por carta remetida datada de 14/11/2006, junta a fls.769, onde não só a aludida Seguradora dá sem efeito a aceitação da proposta da cobertura do risco de morte que havia feito ao autor C… mas também reafirmou de forma definitiva a recusa ao autor da cobertura de invalidez absoluta e definitiva e á autora B… da cobertura de risco de morte e da cobertura de invalidez absoluta e definitiva.
Deste modo, tal significa que aquando da instauração da presente ação (no dia 20 de Outubro de 2009 - cf. facto provado NNN) ainda não haviam decorrido os aludidos três anos de prescrição, nem aquando da citação da Ré Seguradora E… (em 23/10/2009 - cf. fls.51), tendo-se, aliás, interrompido o aludido prazo de três anos de prescrição com a aludida citação, (cf. artº323º, nº1, do CC), prazo de prescrição esse longe de poder haver-se por expirado, (o que só aconteceria em 14/11/2009) à data da instauração da presente ação – 20.10.2009, e bem assim á data da citação da Ré E…, S.A. -23.10.2009, que interrompeu o aludido prazo de prescrição de três anos”.
Ora, analisando os factos provados, e tidos por bastantes para apreciar esta questão, tornando-se irrelevante apreciar a pretendida alteração da matéria de facto para esse efeito, não podemos deixar de concordar com a apelante.
Com efeito, os autores alegaram nos artigos 16.ºe 17.º da sua petição inicial que “ No que respeita à 2.ª R, E…, S.A. veio esta informar a A. mulher não ser possível aceitá-la como candidata à proposta de seguro de vida apresentada em resultado da análise efetuada pelo médico a todo o seu processo clínico”, e “ Quanto ao A. marido a 2ª Ré informou-o de que aceitava a proposta/adesão ao seguro de vida financiamento apresentada por aquele apenas para a cobertura de morte com exclusão da cláusula de invalidez (cf. carta junta sob doc.10 que aqui se dá por reproduzida integralmente)”.
E juntaram as cartas enviadas pela Ré E… datadas de 28/7/2006, 21/8/2006 e 19/9/2006.
E refere-se da alínea Q) dos factos provados que na carta junta a fls. 76, datada de 28 de Julho de 2006, remetida pela Ré E…, S.A., ao Autor marido, consta que não era possível aceitar a A. mulher como candidata à proposta de seguro de vida apresentada “em resultado da análise efetuada pelo nosso médico a todo o processo clínico” e, quanto ao A. Marido, que “para apreciação do risco, torna-se necessário apresentar/efetuar os elementos a seguir indicados: relatório pormenorizado, subscrito por especialista, onde se especifique toda a patologia que declarou, classificação clínica e histopatológica, terapêuticas, estado atual, etc.”.
Esta carta tem a seguinte redação:

“Caro Cliente
Na sequência do processo de análise da proposta/adesão acima referenciada, informamos a situação do(s) candidato(s):

C…

Para uma completa apreciação do risco, torna-se necessário apresentar/efectuar os elementos a seguir indicados:
- Relatório pormenorizado, subscrito por Especialista, onde se especifique toda a patologia que declarou, classificação clínica e histopatológica, terapêuticas feitas, estado actual, etc.

De notar que as garantias que pretende subscrever apenas reduzirão efeito após apreciação por parte da E… dos elementos solicitados, pelo que agradecemos que os mesmos nos sejam apresentados até 15-08-2006.

B…

Em resultado da análise efetuada pelo nosso Médico Consultor a todo o processo clínico apresentado, lamentamos informar não nos ser possível aceitar este Candidato.”

E refere-se na alínea R) que a carta junta a 77, datada de 21 de Agosto de 2006, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, remetida pela Ré E…, S.A., ao Autor marido, de onde consta que esta acusou a receção dos relatórios clínicos datados de 2002 e onde esta solicita informação médica atualizada.
Ora, nessa carta consta:

“Caro Cliente,

Na sequência do processo de análise da proposta/adesão acima referenciada, informamos a situação do(s) candidat(s):

C…

Para uma completa apreciação do risco, torna-se necessário apresentar/efectuar os elementos a seguir indicados:

- Acusamos a recepção de relatórios datados de 2002. Para uma completa análise torna-se necessário informação actualizada, através de Relatório passado por médico especialista.

De notar que as garantias que pretende subscrever apenas produzirão efeito após apreciação por parte da E… dos elementos solicitados, pelo que agradecemos que os mesmos nos sejam apresentados até 21-09-2006.

B…

Em resultado da análise efetuada pelo Médico Consultor a todo o processo clínico apresentado, lamentamos informar não nos ser possível aceitar este Candidato.”

E mais está provado (alínea U)) que a carta junta a fls. 78, datada de 19 de Setembro de 2006, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, remetida pela Ré E…, Companhia de Seguros, S.A., ao Autor marido, de onde consta que “em resultado da análise efetuada, constatámos a existência de fatores agravantes no risco que nos é proposto. Desta forma apenas nos será possível aceitá-lo em condições especiais. Aceite, apenas, para cobertura Morte (Exclusão da Cláusula de Invalidez. Solicitamos, portanto que até 06-10-2006 nos seja dada uma resposta quanto à proposta apresentada, a fim de podermos ou não proceder à respetiva emissão. Contudo, findo este período e se nada nos for comunicado, consideraremos que está de acordo com as nossas condições e procederemos à emissão da apólice/adesão” e onde se reitera não ser possível aceitar a A. Mulher como candidata.
O documento em questão tem a seguinte redação:

“Caro Cliente,

Na sequência do processo de análise efetuada, constatámos a existência de factores agravantes no risco que nos é proposto. Desta forma, apenas nos será possível aceitá-lo em condições especiais.

C…

Em resultado da análise efetuada, constatámos a existência de factores agravantes no risco que nos é proposto. Desta forma, apenas nos será possível aceitá-lo em condições especiais.

Aceite apenas para cobertura Morte (Exclusão da Cláusula de Invalidez).

Solicitamos portanto que, até 06-10-2006, nos seja dada uma resposta quanto à proposta apresentada, a fim de podemos, ou não, proceder á respectiva emissão.

Contudo, findo este período e se nada nos for comunicado, consideraremos que está de acordo com as nossas condições e procederemos à emissão da apólice/adesão.

B…

Em resultado da análise efetuada pelo nosso Médico Consultor a todo o processo clínico apresentado, lamentamos informar não nos ser possível aceitar este Candidato.”

Assim é inquestionável que os autores receberam e tinham na sua posse as mencionadas cartas, porque as juntaram com a petição inicial para prova da recusa de contratar e, a elas responderam, mais concretamente enviaram os elementos clínicos que eram pedidos na carta de 28 de Julho de 2006, a que se faz referência na carta de 21 de agosto, bem como ao relatório médico atualizado que se solicita na carta de 21 de agosto e já ponderado na resposta contida na carta de 19/9/2006, o que revela que as anteriores cartas foram devidamente recebidas pelos Autores ainda em agosto de 2006.
Por isso, considerando a carta de 28 de Julho de 2006 e o relatório médico solicitado na carta de 21 de Agosto de 2006, não podem deixar de as ter recebido para efeitos de tomarem conhecimento da recusa de aceitar a A. B…, como pessoa segura.
E quer na carta de 28 de julho quer na carta de 21 de agosto de 2006 (assim como na enviada em 19/9/2006), a recorrente afirma e reafirma, no que respeita à Autora, que Em resultado da análise efetuada pelo nosso Médico Consultor a todo o processo clínico apresentado, lamentamos informar não nos ser possível aceitar este Candidato”
E a circunstância de ter sido remetido aos Autores uma carta datada de 14/11/2006, a dar sem efeito a proposta, por parte da Ré E…, não legitima a conclusão de ser essa a data a considerar, por traduzir a definitiva manifestação de vontade nessa recusa.
É que essa manifestação de vontade reporta-se apenas ao Autor marido, não quanto à Autora mulher, visto que quanto a esta tal proposta de seguro foi recusada e comunicada nas cartas de 28 de julho, 21 de agosto e 19 de setembro de 2006, limitando-se a recorrente a reafirmar nas segundas aquilo que já tinha expressado, inequivocamente, na primeira.
Decorrentemente, sendo a ação instaurada em 20 de outubro de 2009, e tendo a recorrente sido citada em 23 de Outubro de 2009, conhecendo a Autora, como não podia deixar de conhecer, em agosto de 2006, a recusa da recorrente em celebrar o contrato de seguro, data a partir da qual se iniciou o prazo para o exercício do direito à indemnização, urge concluir estar esgotado o prazo de três anos que a lei concede para esse efeito (art.º 498.º/1 do C. Civil), ou seja, mostra-se prescrito esse direito.
Procede, pois, a apelação da recorrente “E…”, devendo a sentença ser alterada nessa parte.
***
3.3. Se a recusa de celebrar os contratos de seguros pelas recorrentes traduz prática discriminatória não consentida.
1. Os Autores deduziram o pedido de indemnização com fundamento na responsabilidade extracontratual das rés, decorrente da sua recusa e/ou penalização na celebração de contratos de seguro, ramo vida, com os Autores, em razão da deficiência destes, violando o disposto no artº4º, al. c), in fine, conjugado com o estatuído no artº7º, ambos da Lei nº46/2006, de 28 de Agosto.
Vejamos, pois, se a atitude das Rés e recorrentes “D…” e “F…” consubstancia ou não prática discriminatória injustificada.
2. Com a publicação da Lei nº46/2006, de 28 de Agosto, o legislador pretendeu “prevenir e proibir a discriminação, direta ou indireta, em razão da deficiência, sob todas as suas formas, e sancionar a prática de atos que se traduzam na violação de quaisquer direitos fundamentais, ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer direitos económicos, sociais, culturais ou outros, por quaisquer pessoas, em razão de uma qualquer deficiência”, regime que é aplicável “à discriminação de pessoas com risco agravado de saúde” – seu art.º 1.º.
Por sua vez, o seu art.º 3.º define esses conceitos nos seguintes termos:
a) «Discriminação direta» a que ocorre sempre que uma pessoa com deficiência seja objeto de um tratamento menos favorável que aquele que é, tenha sido ou venha a ser dado a outra pessoa em situação comparável;
b) «Discriminação indireta» a que ocorre sempre que uma disposição, critério ou prática aparentemente neutra seja suscetível de colocar pessoas com deficiência numa posição de desvantagem comparativamente com outras pessoas, a não ser que essa disposição, critério ou prática seja objetivamente justificado por um fim legítimo e que os meios utilizados para o alcançar sejam adequados e necessários;
c) «Pessoas com risco agravado de saúde» pessoas que sofrem de toda e qualquer patologia que determine uma alteração orgânica ou funcional irreversível, de longa duração, evolutiva, potencialmente incapacitante, sem perspetiva de remissão completa e que altere a qualidade de vida do portador a nível físico, mental, emocional, social e económico e seja causa potencial de invalidez precoce ou de significativa redução de esperança de vida.
E no seu art.º 4.º são elencadas, a título meramente exemplificativo, algumas dessas práticas discriminatórias contra pessoas com deficiência, entre as quais se integra a recusa ou o condicionamento de venda, arrendamento ou subarrendamento de imóveis, bem como o acesso ao crédito bancário para compra de habitação, assim como a recusa ou penalização na celebração de contratos de seguros (al. c)).
E prevê no seu art.º 7.º o direito à indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, nos termos gerais, por parte da pessoa que foi vítima do ato discriminatório, devendo o tribunal, na fixação do seu montante, atender ao grau de violação dos interesses em causa, ao poder económico dos autores das infrações e às condições da pessoa alvo da prática discriminatória – n.ºs 1 e 2.
Finalmente, de acordo com o seu art.º 6.º, compete ao autor da prática do ato discriminatório provar que as diferenças de tratamento não assentam em nenhum dos fatores mencionados nos art.ºs 4.º e 5.º, cabendo a quem alegar a discriminação em razão da deficiência fundamentá-la, apresentando elementos de facto suscetíveis de a indiciarem.
Como vem sublinhado no Acórdão deste Tribunal da Relação, proferido nos presentes autos [1], “Trata-se de uma densificação, ao nível do direito ordinário, do princípio da não discriminação, consagrado, pela positiva, enquanto princípio da igualdade, na Constituição da República Portuguesa – no art. 13º é estabelecido tal princípio de forma geral e no art. 71º é ele reafirmado no que respeita aos cidadãos portadores de deficiência.
Este princípio da igualdade consagrado na nossa Constituição ‘tem de ser interpretado, não como uma igualdade meramente formal, mas sim como um princípio dinâmico, em que devem ser tratadas de forma desigual as situações que são desiguais, sendo a igualdade um objetivo a atingir e não um ponto de partida. A Lei 46/2006 consagra o princípio da igualdade (ou não discriminação) no sector financeiro, designadamente no acesso ao crédito à habitação e aos seguros de vida de pessoas portadoras de deficiência ou risco agravado de saúde,…”
É que o princípio da igualdade, como escreve Gomes Canotilho e Vital Moreira in “ Constituição da República Portuguesa Anotada ”, Vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, 2007, págs. 336-337, “é um dos estruturantes do sistema constitucional global, “conjugando dialeticamente as dimensões liberais, democráticas e sociais inerentes ao conceito de Estado de direito democrático e social (art.º 2º).”.
“Na sua dimensão liberal, consubstancia a ideia da igual posição de todas as pessoas, independentemente do seu nascimento e do seu status, perante a lei, geral e abstrata, considerada subjetivamente universal em virtude da sua impessoalidade e da indefinida repetibilidade na aplicação.”.
Exigindo “A dimensão democrática (…) a explícita proibição de discriminações (positivas e negativas) na participação no exercício do poder político, seja no acesso a ele (…) seja na relevância dele (…), bem como no acesso a cargos públicos.”.E acentuando “A dimensão social (…) a função social do princípio da igualdade, impondo a eliminação das desigualdades fácticas (…) de forma a atingir-se a «igualdade real entre os portugueses» (art.º 9º/d)”.
Como ensinam também Jorge Miranda e Rui Medeiros, in “Constituição Portuguesa Anotada”, T-I, Coimbra Editora, 2005, pág. 120 e 121, “A igualdade aqui proclamada é a igualdade perante a lei, dita por igualdade jurídico-formal, e ela abrange, naturalmente, quaisquer direitos e deveres existentes na ordem jurídica portuguesa. E “(… O sentido primário da fórmula constitucional é negativo: Consiste na vedação de privilégios e de discriminações.
Privilégios são situações de vantagem não fundadas e discriminações de desvantagem; ao passo que discriminações positivas são situações de vantagem fundadas, desigualdades de direito em resultado de desigualdades de facto e tendentes à superação destas e, por isso, em geral, de caráter temporário”.
Sobre o sentido e alcance constitucional do princípio da igualdade, escreve António Cortês, in “Jurisprudência dos Princípios”, Ensaio sobre os Fundamentos da Decisão Jurisdicional, Universidade Católica Portuguesa, págs. 266 e segs: “ Entre os princípios primeiros da juridicidade encontramos o princípio da igualdade. O princípio da igualdade determina que "o que é igual seja tratado de forma igual e o que é diferente seja tratado de forma diferente na medida da diferença". E, “(… O princípio surge aqui como uma expressão imediata dos princípios da não contradição e da razão suficiente. Ele exige que o sistema jurídico seja congruente e que as diferenciações sejam materialmente justificadas. Quem defenda, num determinado contexto, um certo efeito jurídico para uma determinada situação deve estar disposto a aplicar o mesmo efeito a todas as situações semelhantes sob todos os aspetos relevantes que surjam num contexto análogo. O princípio exige pois que o que é igual seja tratado de forma igual, salvo se houver uma razão materialmente justificada (mérito, necessidade, tempo, etc.) para não o fazer”.
Também Jorge Miranda e Rui Medeiros (Ibidem), realçam que o sentido primário da fórmula constitucional é negativo; “consiste na vedação de privilégios e discriminações”, sendo os primeiros “situações de vantagem não fundadas”, e as segundas “situações de desvantagem.” Sendo o seu sentido positivo o de impor “Tratamento igual de situações iguais (ou tratamento semelhante de situações semelhantes”, e “tratamento desigual de situações desiguais, mas substancial e objetivamente desiguais e não criadas ou mantidas artificialmente pelo legislador.”
Ora, não oferece dúvidas que os Autores pretendiam, em 2006, celebrar um típico contrato de seguro individual, do ramo vida, tal como vinha previsto e regulado no Decreto-Lei n.º 176/95, de 26 de Julho (alterado pelo Dec. Lei n.ºs 60/2004, de 22/3 e Dec. Lei n.º 357-A/2007 de 31/10) e art.º 425.º e seguintes do Cód. Comercial, regime este aplicável, e não o regime jurídico instituído pelo Dec. Lei n.º 72/2008, de 16 de Abril, visto que este apenas entrou em 1/1/2009 (seu art.º 7.º).
Nas palavras de Menezes Cordeiro, in “ Manual de Direito Comercial”, 2.ª Edição, 2007, pág. 725, “No contrato de seguro, uma pessoa transfere para outra o risco da verificação de um dano, na esfera própria ou alheia, mediante o pagamento de determinada remuneração. A pessoa que transfere o risco, assumindo a remuneração, diz-se tomador do seguro ou subscritor; a que assume o risco e recebe a remuneração, é a entidade seguradora; o dano eventual é o sinistro; a pessoa cuja esfera jurídica é protegida pelo seguro, que pode ou não coincidir com o tomador do seguro, é o segurado” [2] [3].
Nos termos do n.º1, alínea f) i) do Decreto-Lei n.º 176/95, o “seguro individual é aquele que é efetuado relativamente a uma pessoa, podendo o contrato incluir no âmbito de cobertura o agregado familiar ou um conjunto de pessoas que vivam em economia comum”.
Apesar do Dec. Lei n.º 72/2008, de 16/4 (diploma legal que estabeleceu o novo regime jurídico do contrato de seguro, em vigor desde 1/1/2009) não ser aplicável à data dos factos, não deixa de ser significativo a definição que é dada ao seu conteúdo: “ Por efeito do contrato de seguro, o segurador cobre um risco determinado do tomador do seguro ou de outrem, obrigando -se a realizar a prestação convencionada em caso de ocorrência do evento aleatório previsto no contrato, e o tomador do seguro obriga -se a pagar o prémio correspondente”.
E como se refere na sua parte preambular “o risco é um elemento essencial do contrato, cuja base tem de ser transmitida ao segurador pelo tomador do seguro atendendo às diretrizes por aquele definidas”.
De sublinhar que também no art.º 15.º deste diploma legal se consagrou a proibição de práticas discriminatórias na celebração, na execução e na cessação do contrato de seguro em violação do princípio da igualdade nos termos previstos no artigo 13.º da Constituição (n.º1), considerando práticas discriminatórias, “em razão da deficiência ou em risco agravado de saúde, as ações ou omissões, dolosas ou negligentes, que violem o princípio da igualdade, implicando para as pessoas naquela situação um tratamento menos favorável do que aquele que seja dado a outra pessoa em situação comparável” (n.º2), isto é, reproduz, em termos idênticos, o conceito de discriminação contido na alínea a) da Lei nº46/2006.
Mas prescreve o seu n.º3: “ No caso previsto no número anterior, não são proibidas, para efeito de celebração, execução e cessação do contrato de seguro, as práticas e técnicas de avaliação, seleção e aceitação de riscos próprias do segurador que sejam objetivamente fundamentadas, tendo por base dados estatísticos e atuariais rigorosos considerados relevantes nos termos dos princípios da técnica seguradora”.
Porém, adianta o seu n.º4 que “Em caso de recusa de celebração de um contrato de seguro ou de agravamento do respetivo prémio em razão de deficiência ou em risco agravado de saúde, o segurador deve, com base nos dados obtidos nos termos do número anterior, prestar ao proponente informação sobre o rácio entre os fatores de risco específicos e os fatores de risco de pessoa em situação comparável mas não afetada por aquela deficiência ou risco agravado de saúde, nos termos dos n.ºs 3 a 6 do artigo 178.º”.
No caso dos autos está provado que o Autor, em 1978, sofreu amputação do membro inferior esquerdo, é portador de linfoma de Hodgkin, padecendo, desde essa data, de uma incapacidade de 70% e em 26/11/2002, foi-lhe atribuída pela Sub-região de Saúde do …, uma incapacidade permanente global de 70%.Em decorrência da doença de Hodgkin, foi submetido a tratamento de quimioterapia e radioterapia, mantendo-se em vigilância até á data da proposta apresentada a Ré D…. E no relatório clínico emitido pelo Hospital de N… no Porto, me 07/09/2006, refere-se que nessa data se encontra bem, em vigilância na consulta de Hematologia e nunca se observou recidiva da doença.
Assim, não restam dúvidas de que o autor é um cidadão portador de deficiência física, com uma incapacidade de 70%.
Quanto à situação pessoal da Autora, está demonstrado que em 1998 foi vítima de melanoma ocular e por causa de uma lesão tumoral do olho esquerdo, compatível com melanoma da coroide, foi submetida a tratamento de radioterapia, encontrando-se, na data da apresentação da proposta de seguro á Ré D…, igualmente em fase de vigilância clínica, com o esclarecimento que foi observada pela última vez na Consulta de Oncologia Médica do Hospital de N… em 08/01/2005, que esse melanoma foi irradiado há 13 anos e que não tem qualquer observação na Consulta de Oncologia desde Janeiro de 2005, encontrando-se em vigilância clínica mas na consulta de Oftalmologia do Centro Hospitalar de D… por, devido ao melanoma entretanto irradiado, ter perdido 9/10 da visão do olho esquerdo, o que lhe provocou o grau de incapacidade permanente de 25%. E, em consequência dessa perda de visão, foi reformada por invalidez, sendo pensionista à data da subscrição da proposta de seguro.
Com base nesses elementos, transmitidos pelos Autores às Rés na proposta de adesão ao contrato de seguro e após parecer técnico no sentido da recusa a ambos os Proponentes por parte da Ré D…, S.A., esta, por carta enviada ao autores e datada de 18/12/2006, referiu (capital seguro proposto de 65.000,00€ pelo prazo de 24 anos), “após análise atenta do questionário clínico, avaliado o risco envolvido e aplicando à situação os critérios objetivos e gerais em vigor nesta Seguradora, foi considerada como não aceite a proposta de adesão por V. Exa. Apresentada, decidindo assim recusar a celebração dos contratos de seguro pretendidos.
Provado está, pois, que a Ré D… recusou contratar com os autores o seguro de vida.
E no que respeita à Recorrente “F…”, está igualmente demonstrado que na proposta se seguro subscrita pelos Autores, em 11/1172007, acompanhada do questionário clínico devidamente preenchido, em que declararam, no que diz respeito ao estado de saúde da Autora, que “esteve hospitalizada por motivo de doença; encontra-se atualmente incapacidade total ou parcialmente de exercer a sua atividade profissional; já se submeteu a intervenção cirúrgica ou sofre de defeito congénito; deformação física, defeito do ouvido ou da vista; tem percentagem de invalidez; está atualmente reformada”, e no que tange ao Autor, que “esteve hospitalizado por motivo de doença ou acidente; esteve ou está sob tratamento médico superior a duas semanas; já se submeteu a intervenção cirúrgica ou sofre de defeito congénito, deformação física, defeito do ouvido ou da vista; tem percentagem de invalidez; sofreu ou sofre de diabetes, cancro, problemas relacionados com o coração ou com o sistema circulatório”.
Na sequência da subscrição da proposta e do questionário clínico referido, a Ré F… solicitou aos Autores a efetuação de exames médicos, sendo que o exame realizado à Autora revelou melanoma ocular esquerdo ocorrido em 1998 e visão de 1/10 no olho esquerdo.
E exame médico efetuado ao Autor marido revelou ter aquele tido linfoma de hodgkin, ter prótese no membro inferior esquerdo e ter incapacidade permanente global de 70%.
Por causa desses dados clínicos a F…, por carta datada de 7 de Fevereiro de 2007, remetida aos Autores, afirmou:
Reportamo-nos à proposta de celebração de contrato de seguro de vida que nos apresentou, para as coberturas de morte e invalidez total e permanente.
O estado de saúde do proponente ao contrato de seguro do ramo vida, no momento da respetiva celebração, é suscetível de influenciar a verificação dos riscos cobertos pelo mesmo.
Após análise de todos os dados clínicos inerentes ao processo de adesão em assunto, constata-se, no que diz respeito á Sra. B…, quadro clínico de patologia ocular, suscetível de influenciar a verificação do risco.
Face ao exposto, informamos de que a proposta de seguro de vida é aceite apenas com a cobertura de morte e agravamento de prémio, para a Sra. B….
No que diz respeito ao Sr. C…, informamos de que a proposta de seguro de vida está aceite. No entanto, a incapacidade pré existente, resultante da invalidez (70%) referente às sequelas mencionadas e sua eventual evolução futura, não será considerada para o cômputo geral de uma eventual invalidez a indemnizar por esta garantia.
Mais informamos de que será aplicada uma taxa 20,00 por cada 1.000,00€ de capital seguro, a adicionar à taxa base do contrato, pelo que o prémio semestral para presente anuidade será de 839,98 €. Para os anos seguintes o prémio será atualizado de acordo com o capital e a taxa em vigor para a idade atuarial dos clientes”.
Assim, e perante a factualidade apurada, não podemos deixar de acompanhar a interpretação seguida na decisão recorrida quando refere:
“(…) , resultou provada matéria de facto reveladora de que o autor mereceu da primeira ré um tratamento que qualquer outra pessoa, sem o quadro clínico do autor, não mereceria (ou seja, um tratamento menos favorável em razão daqueles que se pensava serem os seus riscos agravados de saúde e deficiência) no que ao seguro de vida diz respeito junto da Ré D….
Com efeito, constata-se ter havido uma discriminação totalmente injustificada do autor por parte da primeira ré, porque a morte, para o autor (como para todos nós) é um facto que ocorrerá necessariamente, apenas se ignorando quando o evento se verificará (certus an incertus quando). Mas o mesmo se passa com qualquer outro proponente, que não tenha enfermado do linfoma de Hodgkin, que o autor conseguiu superar encontrando-se bem e sem qualquer recidiva.
Quer para um, quer para o outro a esperança de vida era a mesma no triénio 2004-2006 : 74,84 anos para os homens, (cf. dados do Instituto Nacional de Estatística constantes do facto provado PPP). Celebrado o contrato de seguro de vida em caso de morte a seguradora pagaria sempre a respetiva indemnização ao autor ou ao proponente sem qualquer historial de linfoma de Hodgkin, só não se sabendo quando o pagamento seria feito.
Mas o facto gerador (a morte) ocorrerá necessariamente, seja qual for a origem, para qualquer dos dois proponentes, razão pela qual se considera totalmente injustificada a discriminação quanto ao autor a este respeito, pois em termos clínico-oncológicos o mesmo conseguiu debelar a doença oncológica de que padeceu”.

Daí o legislador ter usado no artº4º da Lei nº46/2006, a expressão “em razão da deficiência”, e não “por causa da deficiência” ou “devido à deficiência”.
Deste modo, a primeira Ré violou os princípios da igualdade e da não discriminação, e consequentemente o disposto na al.c) do artº4º da lei nº46/2006 ao recusar a celebração de seguro de vida em razão da deficiência que, segundo a seguradora, decorreria para o autor de enfermar de linfoma de Hogkin (o autor), resultante da análise das respetivas situações clínicas por médico não especialista em oncologia, vindo-se a constatar que àquela data o autor já estava bem do aludido linfoma, sem recidivas, apenas com vigilância hematológica, tendo a referida seguradora agido com negligência na análise da documentação clínica do autor no não ter recorrido a um médico especializado em oncologia, ou pelo menos contactar os médicos do Serviço de Oncologia do Hospital que seguiram o autor e a evolução da sua doença, não tendo por isso a Ré valorado devidamente em termos oncológicos o termo “ainda em vigilância”, tendo certamente a seguradora Ré ficado convicta de que o autor ainda padecia do linfoma de Hodgkin, o que não corresponde á sua situação clínica.
Assim sendo, resultando provado o facto ilícito praticado pela Ré, com culpa (uma vez que agiu negligentemente), o qual constitui causa adequada da lesão que o Autor sofreu nos seus direitos de personalidade, de não ser discriminado, mormente tratando-se de cidadão com deficiência física, impõe-se a condenação da primeira Ré na correspondente indemnização dos danos não patrimoniais sofridos pelo autor, nos termos dos artºs 7º da Lei nº46/2006 e 483º do CC.

No caso da autora, a mesma teve melanoma ocular do qual ficou curada em 2005, mas do qual pagou o preço elevado de ficar sem 9/10 da visão do olho esquerdo afetado.
Considerar que por esse motivo o seu risco de morte é mais elevado que os restantes é, salvo o devido respeito, mera especulação, sem quaisquer bases científicas, sendo manifesto o erro de avaliação cometido pela seguradora ré por não ter (conforme apurado no julgamento) recorrido a médicos oncologistas (mas sim a médicos de outras especialidades, sem quaisquer conhecimentos oncológicos), que confundiram a vigilância a que a autora é sujeita por motivos oftalmológicos com a sua situação oncológica, cuja última consulta ocorreu no já distante ano de 2005, (cf. fls.193 e fls.606).
Para um apuramento minimamente rigorosa da situação clínica da autora bastaria aos médicos da seguradora aqui rés contactarem com a médica assistente (especialista em oncologia) da autora.
Não o tendo feito, sibi imputet.
E se é certo que por regra as seguradoras são livres na utilização dos seus critérios de avaliação do risco do proponente a um seguro de vida, já quanto aos deficientes têm o imperativo legal da Lei nº46/2006, com exigências acrescidas na fundamentação da sua opção contratual de não contratar ou de agravar substancialmente os prémios de seguro”.
E no que respeita à recorrente F…, lê-se igualmente na decisão recorrida:
“No que á proposta de seguro de vida da autora diz respeito, a 3ª Ré Seguradora aceitou tal proposta…
Porém, a 3ª Ré seguradora considerou que “após análise de todos os dados clínicos inerentes ao processo de adesão em assunto, constata-se, no que diz respeito á Sra. B…, quadro clínico de patologia ocular, suscetível de influenciar a verificação do risco.

Após a exaustiva análise supra já efetuada (cf. 4.1. e 4.2.) á situação de incapacidade da autora, designadamente da sequela definitiva que para si ficou do melanoma de que enfermou no seu olho esquerdo e que irradiou, com perda de visão em 90% daquela vista, não se consegue perspetivar qual a “verificação do risco” (rectius agravamento do risco, uma vez a 3ª Ré condicionou a aceitação do seguro de vida ao agravamento do respetivo prémio) que daí decorra para a vida da autora.
Desconhece-se se as pessoas invisuais (que nem é o caso da autora que vê a 100% do seu olho direito) têm uma esperança de vida menor que as pessoas que o não são, mas seguramente que o “quadro clínico de patologia ocular” mais grave, qual seja o das pessoas
que ficam totalmente invisuais não acarreta uma significativa redução da sua esperança de vida.
Por maioria de razão, certamente que a circunstância de a autora ter ficado com uma incapacidade de 25% decorrente da perda de 90% de visão do seu olho esquerdo não permite justificar um agravamento do risco da sua morte por aquela incapacidade não implicar uma significativa redução da sua esperança de vida, a qual era em 2006, como a da generalidade das mulheres portuguesas, de 81,3 anos de idade, de acordo com os dados relativos ao triénio 2004-2006 divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), (cf. facto provado PPP).
Daí que o agravamento do prémio exigido pela 3ª Ré se apresente como claramente discriminatória porque despida de qualquer justificação ou de qualquer carácter objetivo que possa explicar tal agravamento.
Com efeito um prémio semestral de €839,98 corresponde a um prémio anual de €1.679,96 e a um prémio mensal de €140, para um capital seguro de €65.000, (cf. fls.937), o que em 2007 (mas ainda atualmente, em 2015) representa um agravamento substancial do prémio de seguro exigido á autora, desproporcionado para os prémios de seguro sem esse agravamento e incomportável para a situação económica dos autores, (cf. facto provado VV).
Ou seja, com o agravamento do prémio em causa, na prática a 3ª Ré inviabilizou a possibilidade da sua aceitação pela autora, estando-se perante um caso de discriminação indireta, por tal conduta da 3ª Ré, aparentemente neutra, colocar a autora com deficiência numa posição de desvantagem comparativamente a outras pessoas, (cf. artº3º, al.b) da lei nº46/2006).
Com efeito, e conforme já se referiu, esse agravamento do prémio de seguro não resulta objetivamente justificado, adequado e necessário”.
Assim, não demonstrando as recorrentes, como lhes competia, que essas diferenças de tratamento, no caso, a recusa e a penalização, respetivamente, na celebração de contratos de seguro, por força do art.º 6.º do Lei nº46/2006, urge concluir que se tratou de prática de atos discriminatórios em razão da deficiência e de risco agravado de saúde, conferindo aos autores o direito a indemnização nos termos do art.º 7.º desse diploma legal.
Argumenta a Recorrente F… ser “lícito e legal qualquer seguradora recusar a celebração de contratos de seguro do ramo vida, excluir ou limitar coberturas, ou agravar os prêmios de seguro em consequência do efetivo estado geral de saúde do proponente alterar significativamente a possibilidade ou probabilidade de verificação dos riscos cobertos pelo contrato de seguro do ramo vida e que a recusa, a exclusão, a limitação ou o agravamento podem ocorrer relativamente a pessoas com deficiência ou a pessoas com risco agravado de saúde nas mesmas condições que a pessoa que padeça de qualquer doença que não constitua risco agravado de saúde ou deficiência, e que influencie significativamente a possibilidade ou probabilidade de verificação dos riscos cobertos pelo seguro de vida”.
De facto assim é, agora o que não pode, face ao regime instituído por aquele diploma legal, é assumir esse comportamento de agravamento do prémio de seguro relativamente à Autora, em razão da deficiência ou de risco agravado de saúde, sem que objetivamente fundamentasse essa diferença de tratamento, colocando-a em situação de desvantagem, quando deveria ter observado o princípio da igualdade - tratamento igual de situações iguais (ou tratamento semelhante de situações semelhantes), e tratamento desigual de situações desiguais, mas substancial e objetivamente desiguais.
Nesse sentido, não colhe igualmente o argumento da recorrente “D…” de que “a Lei n.º 46/2006 deixa muito claro que não há discriminação quando objetivamente se trata de modo diferenciado aquilo que à partida é diferente, tal como resulta da conclusão do artigo 3.º alínea b) da Lei 46/2006”, pelo que “ apenas se proíbem práticas discriminatórias injustificadas”, pois como se deixou dito, não demonstraram materialmente essa desigualdade de tratamento.
E também não colhe o argumento de que os Autores não demonstraram os pressupostos da responsabilidade civil, que justifiquem a sua condenação na indemnização pelos danos morais, nomeadamente não provando “que tenham apresentado em qualquer banco pedido de financiamento bancário e que qualquer banco tenha recusado a concessão de financiamento”.
Na realidade, a questão do financiamento bancário é irrelevante para o caso que nos ocupa, já que a responsabilidade civil em que incorreram as recorrentes resulta diretamente da violação do disposto no art.º 4.º, alínea c), in fine, conjugado com o estatuído no artº7º, ambos da Lei nº46/2006, de 28 de Agosto, onde se prevê expressamente o direito à indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, nos termos gerais, por parte da pessoa que foi vítima do ato discriminatório. E nos termos gerais significa a demonstração dos pressupostos da responsabilidade civil (art.º 483.º do C. Civil) – facto ilícito, danos e nexo causal entre o facto e os danos.
Em todo o caso está provado (alíneas ZZ), AAA), BBB, CCC e DDD) que os Autores para obtenção de simulações de crédito bancário (no montante de 65.000,00€) para construção de habitação contactaram entidades bancárias (Banco G…, H…, I… e J…, fazendo-o na qualidade de deficientes e ao abrigo do regime legal respetivo, as quais condicionaram a eventual e futura aprovação do financiamento por eles pretendido à contratação de um seguro de vida e invalidez.
Constitui princípio geral de que “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação" – art.º 483.º do C. Civil - preceito legal que estabelece os pressupostos gerais da responsabilidade civil por facto ilícito. E quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, e verificado o respetivo nexo de causalidade entre o dano e o facto danoso – art.º 562.º e 563.º do C. Civil.
No que respeita aos danos morais ou não patrimoniais, a obrigação de indemnização decorre do disposto no art.º 496º, nº 1, do C. Civil, ao prescrever que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito ”. E acrescenta-se no seu n.º4 que “o montante da indemnização será fixado equitativamente, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494 ”.
Todavia esta norma sofre um desvio decorrente do regime especial previsto no art.º 7.º do mencionado diploma legal, ao estatuir que na fixação do montante da indemnização por danos morais ( ou patrimoniais) o tribunal “deve atender ao grau de violação dos interesses em causa, ao poder económico dos autores das infrações e às condições da pessoa alvo da prática discriminatória”.
No caso concreto a recorrente “F…” foi condenada a pagar ao Autor C… a quantia de €3.000 (três mil euros), acrescida dos juros de mora, bem como à Autora B… a quantia de €4.000 (quatro mil euros), acrescida dos juros de mora, a título de danos morais, sendo a recorrente “D…” condenada a pagar a cada um dos Autores a quantia de €7.000 (sete mil euros), acrescida dos juros de mora, á taxa legal, danos que se demonstraram e que merecem a tutela do direito e cujos montantes se revelam bastante equilibrados e ajustados, face aos apontados critérios legais e que, a pecarem, seriam por defeito.
Inexistem elementos de facto que permitam a condenação dos Autores como litigantes de má-fé, em multa e indemnização a favor da recorrente “E…”, como pretende, por ausência dos respetivos pressupostos, tal como estão definidos no art.º 542.º do C. P. Civil.
Resumindo, a sentença recorrida mostra-se devida e exaustivamente fundamentada, para a qual se remete, não merecendo qualquer censura, devendo ser mantida, salvo no que respeita à prescrição e consequente condenação da recorrente, pelos motivos supra apontados.
Procede, pois, a apelação da recorrente “E…” e improcedem as apelações das recorrentes “D…” e “F…”.
Vencidas no recurso deveram as apelantes “D…” e “F…” suportar as custas respetivas – art.º 527.º/1 do C. P. Civil.
Quanto à apelação da recorrente “E…” as custas serão da responsabilidade dos recorridos/autores, porque vencidos, que suportarão igualmente as custas na 1.ª instância quanto ao pedido contra esta deduzido.
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IV. Sumariando, nos termos do art.º 663.º/7 do C. P. C.
1. Nos termos da Lei nº46/2006, de 28 de Agosto, é proibida a discriminação, direta ou indireta, em razão da deficiência ou de pessoas com risco agravado de saúde, sob todas as suas formas, sendo considerada prática discriminatória a recusa ou penalização na celebração de contratos de seguros (art.º 4.º, al. c)).
2. Compete ao autor da prática do ato discriminatório provar que as diferenças de tratamento não assentaram em nenhum desses fatores, cabendo a quem alegar a discriminação em razão da deficiência ou do risco agravado de saúde fundamentá-la, apresentando elementos de facto suscetíveis de a indiciarem (seu art.º 6.º).
3. O Autor de ato discriminatório constitui-se na obrigação de indemnizar, nos termos gerais, a pessoa que foi vítima desse ato, pelos danos patrimoniais e morais sofridos.
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IV. Decisão
Em face do exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedentes as apelações das apelantes “D…” e “F…” e procedente a apelação da apelante “E…”, julgando verificada a prescrição do direito à indemnização, com a consequente absolvição desta do pedido, revogando, nesta parte, a sentença recorrida, mantendo no mais o aí decidido.
Custas das apelações pelas recorrentes “D…” e “F…”, sendo as da apelação interposta pela “E…” a cargo dos recorridos/autores, que suportarão igualmente as custas na 1.ª instância quanto ao pedido contra esta deduzido.

Porto, 2016/02/23
Tomé Ramião
Vítor Amaral
Luís Cravo
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[1] Proferido em 12/10/2010 (RAMOS LOPES) e disponível em www.dgsi.pt
[2] Moitinho de Almeida, in “O Contrato de Seguro no Direito Português e Comparado”, 1971, página 23-24, define o contrato de seguro como “aquele em que uma das partes, o segurador, compensando segundo as leis da estatística um conjunto de riscos por ele assumidos, se obriga, mediante o pagamento de uma soma determinada a, no caso de realização de um risco, indemnizar o segurado pelos prejuízos sofridos ou, tratando-se de evento relativo à pessoa humana, entregar um capital ou renda ao segurado ou a terceiro, dentro dos limites convencionalmente estabelecidos, ou a dispensar o pagamento dos prémios tratando-se de pretensão a realizar em data determinada”.
[3] “Por contrato de seguro designa-se o contrato pelo qual uma pessoa singular ou coletiva (tomador de seguro) transfere para uma empresa especialmente habilitada (segurador) um determinado risco económico próprio ou alheio, obrigando-se a primeira a pagar uma determinada contrapartida (prémio) e a última a efetuar uma determinada prestação pecuniária em caso de ocorrência do evento aleatório convencionado (sinistro)”. É um contrato típico e nominado – cf. José A. Engrácia Nunes, in “ Direito dos Contratos Comerciais”, Almedina, 2014, págs. 683 e 685.