Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1914/11.8TTPNF.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANTÓNIO JOSÉ RAMOS
Descritores: COMPLEMENTO DE PENSÃO
CONTRATO DE SEGURO
Nº do Documento: RP201305131914/11.8TTPNF.P1
Data do Acordão: 05/13/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: SOCIAL - 4ª SECÇÃO.
Área Temática: .
Sumário: Sendo o trabalhador beneficiário de um contrato de seguro, celebrado entre o empregador e uma seguradora, que atribui àquele o direito a um complemento de pensão, a execução do contrato de trabalho coloca o trabalhador numa situação jurídica que goza de protecção legal equivalente a um direito em formação, a ser tratado como direito adquirido, desde que a condição temporal se venha a verificar.
Reclamações:
Decisão Texto Integral:
Recurso de Apelação: nº 1914/11. 8TTPNF.P1 - REG. Nº 279
Relator: ANTÓNIO JOSÉ ASCENSÃO RAMOS
1º Adjunto: DES. EDUARDO PETERSEN SILVA
2º Adjunto: DES. JOÃO DIGO RODRIGUES
Recorrente: B….., S.A.
Recorrido: C…..
Acordam os Juízes que compõem a Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
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I – RELATÓRIO
1.
C….., casado, aposentado, residente na Rua …, nº …, …, Amarante, intentou no Tribunal do Trabalho de Penafiel, a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum contra B….., S.A., com sede na Rua …, nº ….,Amarante e D…., S.A., com sede na Av. ….., …., Lisboa, n.º …, …., Amares, pedindo que as Rés sejam solidariamente condenadas a pagar-lhe:
- a quantia de €11.517,50 a título de pensões já vencidas desde 1 de Abril de 2009 até à data da propositura da acção.
- as pensões de €338,75 mensais que se vencerem desde Dezembro de 2011 até que ocorra a morte do Autor, quantia essa a ser paga mensalmente, devendo tal quantia ser recebida em dobro (677,50) nos meses de Julho e
Novembro de cada ano, a título de subsídio de férias e de Natal, respectivamente.
- os juros moratórios legais que em cada momento se vencerem.
Para o efeito, alegou, em síntese, que foi admitido como trabalhador da primeira Ré em 1 de Março de 1965, exercendo, em Fevereiro de 2009, o cargo de chefe de secção, funções pelas quais auferia a remuneração mensal de €3.387,75.
Porém, em Fevereiro de 2009, culminando um processo pensado e querido por ambas as partes, foi vontade e do interesse do Autor e da 1º Ré fazer cessar o contrato de trabalho que entre eles vigorava, passando o Autor à situação de reforma antecipada, o que veio a suceder em 1 de Março de 2009.
Como compensação parcial pela cessação do contrato de trabalho, a 1ª Ré obrigou-se a pagar ao Autor a indemnização global de €72.352,30, montante que o Autor efectivamente recebeu, e bem assim a participar, promover e realizar junto da segunda Ré tudo quanto se tornasse necessário ao efectivo recebimento por parte do Autor da quantia mensal de €338,75, quantia esta a ser recebida pelo Autor catorze vezes em cada ano civil, a partir de 1 de Março de 2009, sendo uma a título de subsídio de férias em Julho de cada ano e outra a título de subsídio de natal em Novembro de cada ano, recebimento esse até à morte do próprio Autor.
Tal quantia respeitava ao benefício, por parte do Autor, do Fundo de Pensões Aberto Horizonte Valorização Mais, nos termos constantes do acordo celebrado entre o Autor e a 1ª Ré e a 2º Ré em 21 de Junho de 2002.
Ambas as partes sabiam que foi essencial à formação da vontade do Autor ser compensado pelas formas descritas.
Para tanto, a 1º Ré enviou, em 20.02.2009, à 2ª Ré, todos os elementos burocráticos necessários para que o Autor passasse a receber desde 1 de Abril de 2009, o que até à presente data não sucedeu, não obstante as diversas interpelações do Autor com vista a esse recebimento.
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2.
Realizada a Audiência de Partes não foi possível alcançar qualquer acordo.
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3.
Ambas as Rés apresentaram contestação.
3.1
A Ré B….., S.A., além de impugnar, em parte, os factos alegados pelo Autor na petição inicial, alegou que o Plano de Pensões em causa consubstancia um benefício atribuído por ela a alguns dos seus colaboradores, a título de complemento da reforma a que tivessem direito em resultado da sua vida contributiva.
Esse benefício não era atribuído a todos os trabalhadores, mas apenas a um grupo restrito de pessoas que, pelo seu passado ao serviço da empresa, recebia uma compensação monetária em paralelo com a situação de reforma.
Por outro lado, o efectivo pagamento da pensão pelo Fundo de Pensão, aqui 2ª Ré, está sempre dependente no cumprimento pelo associado, ora 1ª Ré, das contribuições que se encontram a seu cargo, conforme estabelece a Cláusula IV do contrato de adesão nº9 celebrado entre as Rés.
Sucede que a Ré desde 2007 que atravessa um período especialmente difícil a nível financeiro, o que resulta de uma conjuntura anormalmente desfavorável, caracterizada por uma redução drástica do número de adjudicações e da sua menor dimensão patrimonial face a um passado recente, o que implica que a Ré se encontre desde essa data a executar um número reduzido de empreitadas, sentindo estremas dificuldades no cumprimento das suas obrigações, nomeadamente perante os seus trabalhadores, fornecedores e subempreiteiros.
Por tal motivo, foi impossível até à presente data efectuar as contribuições ordinárias e extraordinárias devidas ao Fundo para pagamento das pensões do Autor, sendo que à data em que o Autor acordou com a Ré quer a revogação do contrato de trabalho, quer o acordo de adesão ao Fundo de Pensões, aquele tinha perfeito e total conhecimento da conturbada situação financeira que esta atravessava. Mais, o Autor, no momento em que assinou o acordo de adesão ao Fundo de Pensões, sabia que pelo menos há dois anos que a Ré não efectuava à 2ª Ré o pagamento das prestações ordinárias devidas ao Fundo.
Para além disso, o ponto número seis da cláusula IV do Contrato de Adesão da Ré ao Fundo de Pensões Aberto Horizonte Valorização Mais estabelece o seguinte “ As posições jurídicas dos participantes emergentes deste Plano de Pensões, enquanto meras expectativas de atribuição de prestações pecuniárias garantidas pelo mesmo…”.
Ou seja, define contratualmente as posições jurídicas dos participantes enquanto meras expectativas de atribuição de um valor e não como a atribuição de uma prestação pecuniária tutelada por lei ou vontade das partes.
Acresce ainda que o mencionado contrato de adesão ao referido Fundo não estabelece qualquer sanção aplicável ao associado, ora Ré, para o facto de este não efectuar as contribuições ordinárias ou extraordinárias a que está obrigado.
Cumpre ainda referir que a qualquer momento a Ré, nos termos da alínea d), da cláusula VII, pode proceder unilateralmente à extinção do fundo, procedendo-se então à liquidação da quota-parte do fundo, nos termos e ordem estabelecidos na Cláusula IX do contrato de adesão.
Todos estes factos são, por si só, demonstrativos de que os participantes no referido Fundo de Pensões são única e exclusivamente detentores de uma expectativa de pagamento e não de um direito a esse mesmo pagamento e, como tal, a natureza do complemento de pensão de que o Autor se arroga titular não é merecedora de qualquer tutela jurídica.
Termos em que conclui pela improcedência, por não provada, desta acção, com a sua consequente absolvição do pedido.
3.2.
A Ré D….., S.A., alegou que como é normal nos planos Benefício Definido a Ré (através da respectiva “actuária responsável”) elabora anualmente uma avaliação actuarial de acordo com a legislação e normas do Instituto de Seguros de Portugal (ISP) aplicáveis, avaliação que inclui, entre outros elementos, (i) o valor actual das responsabilidades do Associado (co-Ré B…., S.A.) com os benefícios previstos no plano de pensões, (ii) o valor das quotas-partes nos CAC n.º 9 e n.º 24 (o património afecto ao financiamento do plano de pensões) e a (iii) diferença entre ambos, o saldo actuarial (que poderá ser um superavit ou deficit actuarial).
Sucede que fruto da inexistência de contribuições do Associado/co-Ré desde 2006, foi reportado ao mesmo a existência de deficits actuariais e foi sendo sucessivamente solicitado que fossem efectuadas as necessárias contribuições.
Acresce que, no caso de um Participante (neste caso o Autor) aceder aos benefícios previstos no plano de pensões por motivo de reforma antecipada o Associado/co-Ré terá que efectuar contribuições extraordinárias – de acordo com calculo a efectuar pela entidade gestora – para além das contribuições normais (cfr. (iv) da alínea b) do n.º 4 da Clausula IV).
Em 2009 o próprio Associado/co-Ré enviou à Ré D….. os elementos necessários ao cálculo da pensão devida por motivo de reforma antecipada do Autor e logo no início de Abril desse ano a Ré D….. calculou e solicitou ao Associado/co-Ré o montante necessário para que se pudesse dar inicio ao pagamento da pensão.
Desde então sucederam-se os pedidos dirigidos à co-Ré, quer por falta das contribuições ordinárias quer das contribuições extraordinárias, bem como pedidos de reuniões para análise de todas as questões pendentes.
Tais solicitações nunca tiveram sequência pois, segundo a co-Ré transmitia à Ré, a mesma enfrentar dificuldades económico-financeiras e em simultâneo um complexo processo de alteração accionista.
Assim, e face ao incumprimento das disposições contratuais por parte do Associado/co-Ré relativos à necessidade de contribuições extraordinárias, nunca a Ré D…. pode dar início ao pagamento da pensão por reforma antecipada do Autor porque, por um lado, as disposições contratuais para o efeito não estavam cumpridas e, por outro, o pagamento de qualquer pensão sempre poderia pôr em causa a capacidade futura de pagamento das pensões aos actuais pensionistas.
Termos em que conclui pela sua absolvição do pedido, com todas as devidas e legais consequências.
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4.
Na resposta às contestações apresentadas pelas Rés o Autor mantém a posição assumida na petição inicial, e veio pedir a condenação da Ré B….., S.A. como litigante de má-fé em multa e indemnização não inferior a mil euros a favor do Autor.
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5.
A Ré D…, na resposta à contestação apresentada pela Co-ré B….., S.A., veio alegar que só não deu início ao pagamento do complemento de pensões que cabia ao Fundo de Pensões pagar por falta de cumprimento por aquela Co-ré da condição prevista na alínea iv do nº4, da Cláusula IV, do contrato de adesão colectiva, uma vez que considera que não estava perante uma mera expectativa mas antes tinha sido efectivamente adquirido um direito, tendo em conta que o Autor cumpria todas as restantes condições previstas naquele nº4.
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6.
Proferiu-se despacho saneador, tendo-se dispensado a selecção da matéria de facto assente e controvertida.
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7.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal.
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8.
O Tribunal a quo deu resposta à matéria de facto controvertida, não tendo sido apresentada qualquer reclamação (vide fls. 206 a 212).
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9.
Foi proferida sentença, cuja parte decisória tem o seguinte conteúdo:
“Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a presente acção e consequentemente:
- Condeno a Ré B…., S.A., a pagar ao Autor a quantia de €11.517,50 a título de pensões já vencidas desde 1 de Abril de 2009 até à data da propositura da acção, bem como as pensões de €338,75 mensais vencidas desde Dezembro de 2011 e vincendas até que ocorra a morte do Autor, quantia essa a ser paga mensalmente, devendo tal quantia ser recebida em dobro (€677,50) nos meses de Julho e Novembro de cada ano, a título de subsídio de férias e de natal respectivamente, prestações essas acrescidas de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data de vencimento de cada uma das prestações até efectivo e integral pagamento.
- Absolvo a Ré B…., S.A., do pedido de condenação como litigante de má fé.
- Absolvo a Ré D…., S.A., dos pedidos contra ela formulados nesta acção.
Custas pela Ré B….., S.A..
Registe e notifique.”
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10.
Inconformada com esta decisão dela recorre a Ré B….., S.A., pedindo a revogação da sentença recorrida, tendo formulado as seguintes conclusões:
A)- Sem se conceder, ainda se dirá que no Contrato celebrado entre a Recorrente e a 2ª Ré D….., foram definidas contratualmente as posições jurídicas dos participantes enquanto detentores de meras expectativas (expectativa de facto) de atribuição de um valor e não como a atribuição de uma prestação pecuniária tutelada por lei (expectativa jurídica).
B)- Foi isto que as partes contrataram, não podendo o tribunal a quo, agora atribuir um significado diferente ou pretender fazer um outro enquadramento jurídico da situação em concreto que foi acordada e contratada em 2l de Junho de 2002, naqueles precisos termos e condições, pelo que entende a Recorrente, para efeitos da alínea b], do nº 2 do artigo 682-A do Código de Processo Civil, que o Tribunal a quo se deveria ter abstido de fazer aquela interpretação, tentando integrar uma lacuna onde ela não existe e atribuir um direito, ou uma expectativa jurídica ao Autor, onde só existe uma expectativa de facto.
C)- A expectativa de facto (a contratada entre as partes), traduz-se numa mera aspiração de facto e só o é na medida em que se torna realidade, ou seja o exemplo clássico é o de um herdeiro não legitimário que tem a expectativa de vir a herdar, ao contrário do herdeiro legitimário que goza de uma protecção legal (expectativa jurídica), ainda que diferida para o momento da abertura da sucessão, podendo inclusivamente accionar mecanismos previstos na lei, para fazer prevalecer essa expectativa (por ex. a redução de liberalidades).
D)- Também têm uma expectativa de facto os sócios em relação a futuras distribuições de lucros, mas só na medida em que esses lucros efectivamente existam e sejam distribuídos.
E)- Na expectativa jurídica a tutela do sujeito não se resume à situação jurídica do sujeito A ou B, mas é composta por uma série de situações jurídicas que se completam.
F)- A sua posição é tutelada através de uma série de disposições e dispositivos legais que podem ser accionados (como acontece no direito das sucessões com os sucessíveis legitimários, o que não se aplica a este caso em concreto.
G)- Motivo, pelo qual, entende a ora Recorrente que o tribunal a quo andou mal ao considerar que a expectativa do Autor "trata-se, assim, de uma situação jurídica que goza de protecção legal, pois expectativa jurídica é alga mais que mera expectativa. No caso dos autos entendemos mesmo que o direito da Autor ao complemento de reforma pode ser configurado como um direita em formação (…) embora sob a verificação das condições suspensivas nele previstas".
H)- São as próprias condições suspensivas que inviabilizam a teoria perfilhada pelo Tribunal a quo, que as reconheceu, porque se não se verificarem as condições acordadas para a realização do negócio, neste caso a realização de contribuições quer ordinárias quer extraordinárias, para o Fundo, então não se produzem os efeitos acordados, a atribuição dos complementos de reforma aos ex trabalhadores.
1)- Refere o Acórdão Nº 0632167, do Tribunal da Relação do Porto, datado de 27.04.2006 que "A expectativa jurídica ao contrário da esperança, que tem mero conteúdo psicológico ou quando muita económico - é um simples esperar, prever ou admitir acontecimento futuro como mais ou menos provável, não possuindo conteúdo jurídico porque a lei não a rodeia de tutela especial, não adoptando providências tendentes a assegurar a sua efectivação, é uma esperança fortalecida pela intervenção do legislador que procura abrir-lhe caminha criando condições para que se torne realidade".
J)- O Tribunal a quo não pode tentar integrar lacunas, onde elas não existem, conferindo agora uma protecção jurídica, que não foi querida pelas partes e que não encontra protecção em qualquer norma legal.
K)- Pelo facto de não existe algo a que se possa chamar "o regime jurídico da expectativa", fica ao critério dos Tribunais fazer a interpretação ou integração de um regime insuficiente, mas só quando necessário ou quando é violada uma norma que confere previamente uma protecção jurídica, não se aplicando contudo ao caso concreto.
L)- Por outro lado, uma das condições que fazia depender a atribuição do benefício, ao Autor, ou seja o recebimento da pensão complementar de reforma, previsto na cláusula IV, de acordo com o ponto quatro, alínea iv], era que o Associado efectuasse o pagamento das contribuições extraordinárias que lhe fossem solicitadas pela Entidade Gestora, de acordo com o estudo actuarial para o efeito realizado, o que efectivamente não veio a acontecer.
M)- Como referido na sua contestação, nos artigos 45°, 46º, 47º, 48° e 49° e amplamente relatado por todas as testemunhas da Ré, a Recorrente não pode pagar ao Fundo quer as contribuições ordinárias, quer as extraordinárias, dado não possuir meios para tal e por uma questão de coerência moral é impossível pagar qualquer contribuição ao fundo, para beneficiar o autor ou qualquer outro ex colaborador, quando na realidade não paga vencimentos aos seus colaboradores que ainda se encontram no activo e a tentar salvar a empresa.
N)- Foi repetidamente provado, pelas testemunhas da Ré, que o Autor sabia, já em 2009, da situação financeira da Ré, sempre soube, dado a natureza das funções que exercia como tesoureiro da Empresa.
O)- As premissas que estiveram subjacentes à criação deste fundo, foram afectar os proveitos e resultados positivos resultantes da actividade comercial da Recorrente, pelos seus colaboradores mais dedicados e com mais anos de serviço, no momento em que estes transitassem da vida activa para uma situação de reforma por velhice, adiada ou antecipada, que seguramente seria o caso do Autor.
P)- Mas esta filosofia só é verdadeira na medida em que possam existir proveitos para afectar àquele Fundo.
Q)- As testemunhas da Recorrente foram todas elas peremptórias, sobre as grandes dificuldades que a empresa tem em sobreviver.
R)- A Recorrente não tem nem teve qualquer intenção de prejudicar o Autor de receber o seu complemento de reforma, no entanto, não tem actualmente capacidade financeira para efectuar quaisquer contribuições para o Fundo de Pensões e dado que é o único associado a financiar o Fundo, o seu objectivo é impossível de concretizar, pelo que já se deveria ter extinguido o Fundo.
S)- Ninguém pode afectar os proveitos que não tem e isso estava previsto no clausulado do Contrato, aquando da formação das vontades, dado que uma das condições de que dependia a atribuição do benefício, ao Autor ou a qualquer outro trabalhador, era que o Associado efectuasse o pagamento das contribuições.
T- Por todos os motivos expostos, o Tribunal a quo deveria ter concluído que o Autor detém uma mera expectativa de vir a receber o seu complemento de reforma e não uma expectativa jurídica tutelada pelo direito.
U- Em conclusão, ficou provado que a Recorrente para além de não ter actualmente capacidade financeira para efectuar quaisquer contribuições para o Fundo de Pensões, também não tem qualquer obrigação de pagar ao Autor as quantias peticionadas e em que foi condenada, pelo que deverá ser total e inequivocamente absolvida de o fazer.
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11.
O Autor apresentou contra-alegações, defendendo a manutenção da sentença recorrida.
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12.
O Ex.º Sr. Procurador-Geral Adjunto deu o seu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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13.
Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II – QUESTÕES A DECIDIR

Como é sabido o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do disposto nos artigos 1º, nº 2, al. a), e 87º do Código de Processo do Trabalho, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso (artigo 660º, nº 2). Assim, dentro desse âmbito, deve o tribunal resolver todas as questões que as partes submetam à sua apreciação, exceptuadas as que venham a ficar prejudicadas pela solução entretanto dada a outras (artigo 660.º, n.º 2, do CPC), com a ressalva de que o dever de resolver todas as questões suscitadas pelas partes, não se confunde, nem compreende, o dever de responder a todos os “argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes”, os quais, independentemente da sua respeitabilidade, nenhum vínculo comportam para o tribunal, como resulta do disposto no artigo 664.º do Código de Processo Civil[1].
De modo que, tendo em conta os princípios antes enunciados e o teor das conclusões formuladas pelo apelante, os fundamentos opostos à sentença recorrida a questão a decidir consiste em saber se a aqui Recorrente deve ser condenada a pagar ao Autor as pensões relativas ao complemento de reforma.
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III – FUNDAMENTOS
1.
SÃO OS SEGUINTES OS FACTOS QUE A SENTENÇA RECORRIDA DEU COMO PROVADOS:
1) O Autor nasceu no dia 30 de Julho de 1949.
2) O Autor foi admitido como trabalhador da 1ª Ré B…., S.A., em 1 de Março de 1965.
3) Em Fevereiro de 2009 o Autor exercia o cargo de chefe de secção, no departamento da tesouraria, por conta, sob as ordens, direcção, fiscalização e no interesse da 1ª Ré.
4) Pagando-lhe a primeira Ré, como contrapartida pelo seu trabalho, a remuneração mensal de €3.387,75.
5) Em 28 de Fevereiro de 2009 a 1ª Ré e o Autor outorgaram, na qualidade de 1ª outorgante e 2ª outorgante respectivamente, o documento junto a fls. 10 e 11, intitulado de “acordo de revogação de contrato de trabalho”, cuja cópia se encontra junta a fls. 10 e 11, e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
6) Nos termos da cláusula 2ª do referido acordo que “as partes fazem cessar a partir desta data o contrato de trabalho que entre elas vigorava, desde a data de admissão do Segundo Contraente”.
7) Consta da cláusula 3ª do referido acordo que “[p]ara o efeito pretendido pelas partes, a Primeira Outorgante pagará ao segundo Contraente uma compensação pecuniária de natureza global de 72.352,30 € (Setenta e dois mil trezentos e cinquenta e dois euros e trinta cêntimos), referentes ao salário normal do mês de Fevereiro/2009, onde se incluem todos os créditos vencidos à data da cessação do contrato, bem como os exigíveis em virtude da cessação nos termos e para os efeitos do número 5 do artigo 349º, do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12/02, pelo que, uma vez satisfeito este pagamento, o Segundo Contraente considera-se integralmente quite, nada mais tendo a receber da Primeira Contraente. O pagamento do valor de 72.352,30 € será efectuado do seguinte modo:
- 1 cheque do valor de 8.836,70€ com data de 28/02/2009;
- 10 cheques do valor unitário de 6.351,56€, com datas de
31/03/2009, 30/04/2009, 31/05/2009, 30/06/2009, 31/07/2009, 31/08/2009, 30/09/2009, 31/10/2009, 30/11/2009 e 31/12/2009 respectivamente.”
8) O Autor recebeu a indemnização global de €72.352,30, referida em 7), tendo na sequência do referido acordo passado à situação de reforma antecipada em 1 de Março de 2009.
9) Com data de 26 de Fevereiro de 2009, o Autor e a 1ª Ré celebraram o acordo cuja cópia se encontra junta a fls. 15, do qual consta que “[é] acordado nos termos da alínea b), do nº4, da Cláusula IV, do Contrato de Adesão Colectiva nº9 – Fundo de Pensões Aberto Horizonte Valorização Mais, celebrado entre B….., S.A. e D….., S.A., a atribuição do benefício da quota-parte do Fundo afecta à B…., S.A., o Pensionista C…., com efeitos a Abril de 2009”.
10) A 1ª Ré é uma sociedade comercial que tem por actividade principal a execução de empreitadas de obras públicas e particulares.
11) A 2ª Ré Pensõesgere é uma sociedade gestora de fundos de pensões, consistindo o escopo da sua actividade societária em promover e assegurar a realização dos planos de pensões previstos nos respectivos contratos constitutivos e regulamentos de gestão, gerindo o património afecto aos fundos com esse objectivo.
12) A 1ª Ré celebrou com a 2ª Ré os contratos de adesão colectiva nº 9 e 24, datados de 21 de Junho de 2002, o primeiro com a designação de fundo de pensões aberto horizonte valorização e mais e o segundo com a designação de fundo de pensões aberto horizonte segurança, cujas cópias constam de fls. 81 a 108, e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
13) Nos termos da cláusula 1ª dos contratos referidos em 12º a adesão a ambos os fundos de pensões teve por objectivo exclusivo o financiamento do Plano de Pensões do Associado – B…., S.A. – tal como definido na cláusula IV desses contratos, e o pagamento aos beneficiários das respectivas prestações pecuniárias em conformidade com aqueles contratos.
14) Nos termos da cláusula 2ª dos contratos referidos em 12º, os Participantes são os trabalhadores que façam parte do quadro permanente da B…., S.A.
15) Nos termos da cláusula 3ª dos contratos referidos em 12º são Beneficiários as pessoas singulares a partir do momento em que adquiram direito às prestações pecuniárias estabelecidas no Plano de Pensões.
16) Nos termos da cláusula IV, nº4, al. b), dos contratos referidos em 12º, em caso de reforma antecipada de um Participante, o mesmo terá direito a uma pensão de reforma calculada e paga nos termos previstos para a Reforma por Velhice, tendo em conta o salário pensionável e o tempo de serviço pensionável à data da reforma antecipada.
17) De acordo com o disposto na alínea b), da cláusula referida em 16), a atribuição do benefício ali referido depende da verificação cumulativa das seguintes condições:
- a atribuição do benefício pela quota-parte do Fundo afecta ao Associado haja sido expressa e obrigatoriamente acordada por escrito entre o Participante e o Associado, devendo cópia do documento ser remetida à Entidade Gestora.
- o participante tenha mais de 20 anos ao serviço do Associado - a assunção pela quota-parte do Fundo afecta ao Associado da responsabilidade pelo pagamento do benefício seja permitida pelas disposições legais e normativas em vigor na oportunidade.
- o associado efectue o pagamento das contribuições extraordinárias que lhe sejam solicitadas pela Entidade Gestora de acordo com o estudo actuarial para o efeito realizado.
18) A Ré D….. elabora anualmente uma avaliação actuarial que inclui o valor actual das responsabilidades do Associado, com os benefícios previstos no plano de pensões, o valor das quotas-partes nos CAC nº 9 e nº 24 anteriormente referidos (o património afecto ao financiamento do plano de pensões) e a diferenças entre ambos, o saldo actuarial (que poderá ser um superavit ou deficit actuarial).
19) Fruto da inexistência de contribuições do Associado/co-ré B….. desde 2006, foi reportado ao mesmo a existência de deficits actuariais e foi sendo sucessivamente solicitado que fossem efectuadas as necessárias contribuições, tudo nos termos dos CAC referidos.
20) Em 2009, a Ré B…. enviou à Ré D…. os elementos necessários ao cálculo da pensão devida por motivo de reforma antecipada do Autor e logo no início de Abril desse ano a Ré D…. calculou e solicitou ao associado/co-Ré B… o montante para que se pudesse dar início ao pagamento da pensão ao Autor, pensão essa que ascenderia à quantia mensal de €338,75, a ser recebida 14 vezes em cada ano civil, a partir de 1 de Março de 2009, sendo uma a título de subsídio de férias em Julho de cada ano e outra a título de subsídio de Natal em Novembro de cada ano, recebimento esse devido até à morte do Autor.
21) Na sequência da interpelação do Autor, a Ré D…. transmitiu-lhe, na pessoa do seu mandatário, que mantendo-se a ausência de contribuições por parte do associado/co-Ré, não podia a Ré D…. ou o próprio Fundo de Pensões substituir-se no cumprimento de obrigações de terceiros, uma vez que o património dos fundos de pensões está exclusivamente afecto ao cumprimento dos planos de pensões, não respondendo por quaisquer outras obrigações, designadamente as de associados.
22) Em 22 de Novembro de 2011 seria necessário uma contribuição extraordinária da parte do Associado Co-Ré Construtora do montante de €37.477,63, de acordo com o estudo actuarial para o efeito realizado, para que a Ré D…. tivesse começado a pagar ao Autor a pensão de reforma prevista no ponto 4, da cláusula IV dos contratos de adesão colectiva nºs 9 e 24.
23) Desde 2007 que a Ré B….. atravessa um período difícil a nível financeiro, sentindo dificuldades no cumprimento das suas obrigações, perante os seus trabalhadores, fornecedores e subempreiteiros.
24) A Ré Construtora celebrou acordos de pagamento com subempreiteiros, fornecedores, Fazenda Social, a fim de dar cumprimento às suas obrigações.
25) Já foram instauradas no Tribunal Judicial de Amarante acções de insolvência contra a Ré Construtora, sendo que em todas elas se alcançou acordo de pagamento.
26) Existem injunções e execuções a correr contra a Ré Construtora.
27) No exercício de 2007 a Ré Construtora apresentou um resultado líquido negativo de €15.687.152,79.
28) No exercício de 2008 a Ré Construtora apresentou um resultado líquido negativo de 11.967.106,08.
29) À data em que o Autor celebrou os acordos referidos em 5) e 9), o Autor tinha conhecimento da conturbada situação financeira que a Ré Construtora atravessava e sabia que a Ré Construtora, pelo menos há dois anos, não efectuava à 2ª Ré o pagamento das prestações ordinárias devidas ao Fundo.
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2.
Debrucemo-nos sobre as questões que nos foram trazidas:
SABER SE A RECORRENTE DEVE SER CONDENADA A PAGAR AO AUTOR AS PENSÕES RELATIVAS AO COMPLEMENTO DE REFORMA

Defende a Recorrente que o Tribunal a quo deveria ter concluído que o Autor detém uma mera expectativa de vir a receber o seu complemento de reforma e não uma expectativa jurídica tutelada pelo direito, sendo certo, além do mais, que a recorrente não tem actualmente capacidade financeira para efectuar quaisquer contribuições para o Fundo de Pensões e dado que é o único associado a financiar o Fundo, o seu objectivo é impossível de concretizar, pelo que já se deveria ter extinguido o Fundo.

O Tribunal a quo condenou a aqui recorrente a pagar ao Autor, aqui recorrido, a quantia de €11.517,50 a título de pensões já vencidas desde 1 de Abril de 2009 até à data da propositura da acção, bem como as pensões de €338,75 mensais vencidas desde Dezembro de 2011 e vincendas até que ocorra a morte do Autor, quantia essa a ser paga mensalmente, devendo tal quantia ser recebida em dobro (€677,50) nos meses de Julho e Novembro de cada ano, a título de subsídio de férias e de natal respectivamente, prestações essas acrescidas de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data de vencimento de cada uma das prestações até efectivo e integral pagamento. Para o efeito referiu que «face ao estabelecido na Cláusula IV do contrato de adesão colectiva nº9 do Fundo de Pensões Aberto Horizonte Valorização Mais, bem como da Cláusula IV do contrato de adesão colectiva nº24 do Fundo de Pensões Aberto Horizonte Segurança, entendemos que o direito ao recebimento da pensão complementar de reforma por parte do Autor, ainda que sujeito a condição suspensiva, não se traduz numa mera expectativa, numa esperança, mas sim numa expectativa jurídica e, como tal, digna de protecção.
Com efeito, tal conclusão impõe-se face ao teor das referidas cláusulas, bem como ao acordo datado de 26 de Fevereiro de 2009, cuja cópia se encontra junta a fls. 15, celebrado entre o Autor e a 1ª Ré do qual consta que “é acordado nos termos da alínea b), do nº4, da Cláusula IV, do Contrato de Adesão Colectiva nº9 – Fundo de Pensões Aberto Horizonte Valorização Mais, celebrado entre B….., S.A. e D…., S.A., a atribuição do benefício da quota-parte do Fundo afecta à B…., S.A., o Pensionista C…., com efeitos a Abril de 2009”. Assim o determina o princípio da boa fé que deve presidir na realização dos negócios jurídicos, em especial do contrato de trabalho.
Por outro lado, também o D.L. 12/2006, de 20 de Janeiro, que regulamenta a constituição e o funcionamento dos fundos de pensões e das entidades gestoras veio proteger as expectativas jurídicas, ao determinar no seu artigo 100º, nº2, que “o presente decreto-lei aplica-se aos fundos de pensões que venham a constituir-se após a sua entrada em vigor, bem como àqueles que nessa data já se encontrem constituídos, salvo na medida em que da sua aplicação resulte diminuição ou extinção de direitos ou expectativas adquiridas ao abrigo da legislação anterior”.
Trata-se, assim, de uma situação jurídica que goza de protecção legal, pois expectativa jurídica é algo mais que mera expectativa. No caso dos autos entendemos mesmo que o direito do Autor ao complemento de reforma pode ser configurado como um direito em formação, pois que a deliberação tomada pela Ré Construtora do Tâmega de instituição de um tal complemento de reforma no seio da sua empresa e em benefício dos seus trabalhadores, desde que reunissem certos requisitos, ou seja, mediante a observância das regras de atribuição que ela própria fixou assume a feição de um regulamento interno, funcionando como uma verdadeira proposta contratual feita por aquela sociedade os seus trabalhadores, entre eles o aqui Autor, proposta esse que passou assim a integrar o conteúdo dos contratos de trabalho celebrados, embora sob a verificação das condições suspensivas nele previstas.
Assim sendo, perante as considerações que antecedem entendemos que deve proceder o pedido de condenação da Ré B…., S.A., ao pagamento ao Autor da quantia de €11.517,50 a título de pensões já vencidas desde 1 de Abril de 2009 até à data da propositura da acção, bem como as que se venceram desde Dezembro de 2011 até que ocorra a morte do Autor, quantia essa a ser paga mensalmente, devendo tal quantia ser recebida em dobro nos meses de Julho e Novembro de cada ano, a título de subsídio de férias e de Natal, respectivamente.
Importa agora apreciar o pedido de condenação da Ré D…. formulado pelo Autor.
Ora, quanto a tal pedido, importa ter presente que se provou que:
- A 1ª Ré celebrou com a 2ª Ré os contratos de adesão colectiva nº 9 e 24, datados de 21 de Junho de 2002, o primeiro com a designação de fundo de pensões aberto horizonte valorização e mais e o segundo com a designação de fundo de pensões aberto horizonte segurança, cujas cópias constam de fls. 81 a 108, e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
- Nos termos da cláusula 1ª desses contratos a adesão a ambos os fundos de pensões teve por objectivo exclusivo o financiamento do Plano de Pensões do Associado – B…., S.A. – tal como definido na cláusula IV desses contratos, e o pagamento aos beneficiários das respectivas prestações pecuniárias em conformidade com aqueles contratos.
- Nos termos da cláusula IV, nº4, al. b), desses contratos, em caso de reforma antecipada de um Participante, o mesmo terá direito a uma pensão de reforma calculada e paga nos termos previstos para a Reforma por Velhice, tendo em conta o salário pensionável e o tempo de serviço pensionável à data da reforma antecipada.
- De acordo com o disposto na alínea b), daquela cláusula, a atribuição do benefício ali referido depende da verificação cumulativa das seguintes condições:
- a atribuição do benefício pela quota-parte do Fundo afecta ao Associado haja sido expressa e obrigatoriamente acordada por escrito entre o Participante e o Associado, devendo cópia do documento ser remetida à Entidade Gestora.
- o participante tenha mais de 20 anos ao serviço do Associado.
- a assunção pela quota-parte do Fundo afecta ao Associado da responsabilidade pelo pagamento do benefício seja permitida pelas disposições legais e normativas em vigor na oportunidade.
- o associado efectue o pagamento das contribuições extraordinárias que lhe sejam solicitadas pela Entidade Gestora de acordo com o estudo actuarial para o efeito realizado.
Mais se provou que a Ré D…. elabora anualmente uma avaliação actuarial que inclui o valor actual das responsabilidades do Associado, com os benefícios previstos no plano de pensões, o valor das quotas-partes nos CAC nº 9 e nº 24 anteriormente referidos (o património afecto ao financiamento do plano de pensões) e a diferenças entre ambos, o saldo actuarial (que poderá ser um superavit ou deficit actuarial).
Fruto da inexistência de contribuições do Associado/co-ré B…. desde 2006, foi reportado ao mesmo a existência de deficits actuariais e foi sendo sucessivamente solicitado que fossem efectuadas as necessárias contribuições, tudo nos termos dos CAC referidos.
- Em 22 de Novembro de 2011 seria necessário uma contribuição extraordinária da parte do Associado Co-Ré Construtora do montante de €37.477,63, de acordo com o estudo actuarial para o efeito realizado, para que a Ré D…. tivesse começado a pagar ao Autor a pensão de reforma prevista no ponto 4, da cláusula IV dos contratos de adesão colectiva nºs 9 e 24.
Conclui-se assim que face ao incumprimento das disposições contratuais por parte da associada/co-ré B…, relativas às contribuições extraordinárias e até ordinárias, não pode a Ré D…. ser condenada a pagar as quantias em dívida ao Autor a título de complemento de reforma, pois que isso nada mais representaria do que uma substituição por parte daquela Ré no cumprimento de obrigações da ré B…., substituição essa que não é legalmente possível, face ao disposto no art. 11º, nº1, do D.L. nº 12/2006, de 20 de Janeiro, nos termos do qual “o património dos fundos de pensões está exclusivamente afecto ao cumprimento dos planos de pensões (…) não respondendo por quaisquer outras obrigações, designadamente as de associados».

Na essência concordamos com esta fundamentação, a qual se coaduna aos factos provados e ao direito aplicável.
Na verdade como se refere no Acórdão desta Relação de 20.09.2010[2]: "Entendem alguns autores que a execução do contrato de trabalho, conferindo o direito a uma expectativa jurídica, não conferem direito - adquirido - a um complemento de pensão, pois tal só surge na data em que o trabalhador passar a ser considerado reformado por velhice ou por invalidez[3]. Entendem outros que o direito ao complemento de reforma integra um verdadeiro direito subjectivo, embora sujeito a condição suspensiva, facto futuro e incerto, por exemplo, a idade, a invalidez ou a morte[4].
O legislador, embora referindo-se a direitos adquiridos[5], também usa expressões do tipo expectativas, expectativas adquiridas[6], direitos em formação[7] ou direitos individuais em formação[8], ficando nós sem saber se temos duas categorias, expectativa e direito ou três, expectativa, direito em formação e direito, ou mais.
Seja como for, certo é que a execução do contrato de trabalho coloca o trabalhador numa situação jurídica que goza de protecção legal, como todos reconhecem, pois expectativa jurídica é algo mais que mera expectativa e direito em formação há-se ser algo mais que aquelas; daí que quando se refere direito adquirido, tratar-se-á certamente de um direito que esteve em formação ou que surgiu de uma situação jurídica terminada recentemente.
Tratar-se-á mais, certamente, de um direito em formação[9], a ser tratado como direito adquirido, desde que a condição temporal se venha a verificar».
No caso em apreço, a aqui Recorrente celebrou com a co-ré D….. os contratos de adesão colectiva nº 9 e 24, datados de 21 de Junho de 2002, o primeiro com a designação de fundo de pensões aberto horizonte valorização e mais e o segundo com a designação de fundo de pensões aberto horizonte segurança, tendo por objectivo exclusivo o financiamento do Plano de Pensões da Associada B…, S.A. e o pagamento aos beneficiários das respectivas prestações pecuniárias em conformidade com aqueles contratos.
Por outro lado, a Recorrente acordou com o Autor, aqui Recorrido, em 26.02.2009, a atribuição a este do benefício da quota-parte do Fundo afecta à Construtora.
Estamos assim, como refere o Exº Sr.º Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, «perante um regime convencional em que as partes acordaram no estabelecimento de um regime complementar de protecção social aos trabalhadores do quadro permanente da B…., S.A. e que encontra a sua fonte de legitimação, na vontade das partes expressa nossa cordos de adesão referidos supra.
Pelo que a partir daí e até à verificação [cumulável] das condições de que dependia, nos termos da cláusula IV, do Contrato de Adesão Colectiva nº 9, a atribuição daquele beneficio ao trabalhador, o autor, (…) tinha já uma expectativa jurídica». Expectativa jurídica essa «a que a lei dispensa protecção, através de providências destinadas a defender o interesse do respectivo titular e a garantir-lhe, tanto quanto possível, a aquisição futura do direito, que permanece como que em estado de gestação, nascendo no momento em que se mostrem verificados todos os seus pressupostos»[10].
Expectativa jurídica e não mera «expectativa de facto», sem qualquer protecção jurídica, como a recorrente e a onda neoliberal que nos vai engolindo desejam.
Mas no caso, mais do que uma expectativa jurídica é um direito assumido por ambas as partes e selado mediante o já referido acordo de 26.02.2009. E tanto assim é que foi a própria recorrente que em 2009 enviou à co-ré D….. os elementos necessários ao cálculo da pensão devida por motivo de reforma antecipada do Autor.
Aliás de olharmos de forma global para a matéria de facto chegaremos à conclusão que este acordo de 26.02.2009 não é mais do que um complemento ao acordo de revogação do contrato de trabalho feita pelas partes dois dias depois. É um absurdo neste caso defender-se que estamos perante uma mera expectativa de facto quando na realidade a própria Ré o assume como um direito já adquirido e consolidado.
Por outro lado, não faz sentido vir com o argumento de exoneração do pagamento face às dificuldades financeiras que a recorrente atravessa, uma vez que estas nada têm a ver com a existência do direito á pensão. As dificuldades económicas não isentam o devedor do pagamento. Certamente que a Recorrente no caso de ter algum crédito sobre algum cliente que se encontra com dificuldades económicas não aceita que este diga que o crédito não existe devido às mesmas dificuldades. E, por absurdo que fosse, e se, aceitasse essa tese, estaria a Recorrente a agir num manifesto abuso de direito – artigo 334º do Código Civil - e de má-fé, pois, na altura em que celebrou o acordo referido no ponto 9. dos factos provados, já se encontrava nessa situação e a mesma não foi óbice à concretização desse clausulado. Além de que, pelas razões apontadas na sentença, recorrida, o pagamento das pensões em causa impendem sobre ela.

Improcedem, destarte, as conclusões do recurso
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3.
As custas do recurso ficam a cargo da recorrente (artigo 446º do CPC).
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IV. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto, em negar provimento ao recurso e confirmarem a sentença recorrida.
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Condenam a Recorrente no pagamento das custas (artigo 446º do CPC).
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Anexa-se o sumário do Acórdão – artigo 713º, nº 7 do CPC.
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(Processado e revisto com recurso a meios informáticos (artº 138º nº 5 do Código de Processo Civil).

Porto, 13 de Maio de 2013
António José Ascensão Ramos
Eduardo Petersen Silva
João Diogo Rodrigues
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SUMÁRIO – a que alude o artigo 713º, nº 7 do CPC.

Sendo o trabalhador beneficiário de um contrato de seguro, celebrado entre o empregador uma seguradora, que atribui àquele o direito a um complemento de pensão, a execução do contrato de trabalho coloca o trabalhador numa situação jurídica que goza de protecção legal, equivalente a um direito em formação, a ser tratado como direito adquirido, desde que a condição temporal se venha a verificar.
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[1]Cfr. ANTUNES VARELA, “Manual de Processo Civil”, 2.ª edição, Coimbra Editora, pp. 677-688; e Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 371/2008, consultável no respectivo sítio, bem como Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 11/10/2001 e 10/04/2008, respectivamente n.º 01A2507 e 08B877, in www.dgsi.pt e Acórdão da Relação do Porto de 15/12/2005, Processo n.º 0535648, in www.dgsi.pt.
[2] Processo nº 524/08.1TTVCT.P1, in www.dgsi.pt.
[3] Cfr. BERNARDO XAVIER, PEDRO FURTADO MARTINS E ANTÓNIO NUNES DE CARVALHO, in Pensões complementares de reforma – Inconstitucionalidade da versão originária do art. 6.º, 1, e) da LRC, anotação ao Acórdão N.º 966/96 – Processo N.º 22/93 do Tribunal Constitucional de 1996-07-11, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, Janeiro-Setembro – 1997, Ano XXXIX (XII da 2.ª Série) – N.ºs 1-2-3, págs. 133 ss., nomeadamente, 155 a 160 e ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, in Convenções colectivas de trabalho e direito transitório: com exemplo no regime da reforma no sector bancário, págs. 15 ss. e Dos conflitos temporais de instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho, págs. 37 ss., ambos em TEMAS DE DIREITO DO TRABALHO, CADERNOS O DIREITO, N.º 1, 2007, Almedina.
[4] Cfr. MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, in Em torno de um equívoco na interpretação e aplicação das convenções colectivas de trabalho: o exemplo das cláusulas sobre pensões do Acordo Colectivo de Trabalho do sector bancário, págs. 57 ss. e CATARINA PIRES/JOÃO DA COSTA ANDRADE, in O regime jurídico relativo à atribuição e cálculo da reforma de certos trabalhadores do sector bancário: tentativa de superação de um (falso) problema de aplicação da lei no tempo, págs. 75 ss., ambos em TEMAS DE DIREITO DO TRABALHO, CADERNOS O DIREITO, N.º 1, 2007, Almedina.
[5] Cfr. os Art.ºs 24.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 415/91, de 25 de Outubro, 20.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 475/99, de 9 de Novembro e 24.º, n.º 2 e 60.º, n.º 1, b), ii) do Decreto-Lei n.º 12/2006, de 20 de Janeiro.
[6] Cfr. os Art.ºs 56.º do Decreto-Lei n.º 475/99, de 9 de Novembro e 100.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 12/2006, de 20 de Janeiro.
[7] Cfr. o Art.º 61.º, n.º 4, alínea a) do Decreto-Lei n.º 12/2006, de 20 de Janeiro.
[8] Cfr. o Art.º 11.º, n.º 4, alínea d), § 2.º da Directiva 2003/41/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 2003-06-03, relativa às actividades e à supervisão das instituições de realização de planos de pensões profissionais, in Jornal Oficial da União Europeia, L 235, de 2003-09-23, págs. 10 ss.
[9] Ou expectativa jurídica, mas em que a tutela é de intensidade semelhante àquela que é conferida pelo direito subjectivo, sob condição: cfr. LUÍS GONÇALVES DA SILVA, in Breves Reflexões sobre a Convenção Colectiva aplicável à Pensão de Reforma no Sector Bancário, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, Janeiro-Setembro – 2004, Ano XLV (XVIII da 2.ª Série) – N.ºs 1-2-3, págs. 255 ss., nomeadamente, págs. 273 a 276.
[10] Neste sentido cfr., entre outros, os Acórdãos do STJ de 18.04.2007, Processo nº 07S2701 e de 10.07.2008, Processo nº 07S4581, ambos in www.dgsi.pt.