Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1196/12.4TBMTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOSÉ IGREJA MATOS
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
ERRO JUDICIÁRIO
Nº do Documento: RP201804241196/12.4TBMTS.P1
Data do Acordão: 04/24/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 825, FLS 83-87)
Área Temática: .
Sumário: I – O erro de julgamento, enquanto fundamento da responsabilidade civil do Estado por actos do judiciário, deve ser demonstrado no próprio processo em que foi cometido e não, por via de regra, na acção de responsabilidade em que se acciona o correlativo direito de indemnização.
II – A exigência estabelecida no citado nº 2 do art. 13º da Lei nº 67/2007, de 31.12 não enferma de vício de inconstitucionalidade material.
III – Numa acção de responsabilidade civil proposta contra o Estado, nomeadamente por erro judicial grosseiro, uma vez invocada a violação do direito comunitário, não deverá ser exigida a prévia revogação da decisão danosa conquanto a mesma tenha sido proferida em última instância e na medida em que, nesses casos, a revogação esteja praticamente excluída.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo 1196-12.4TBMTS.P1

I – Relatório

Recorrente(s): B....
Recorrido(s): Estado Português
Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo Local Cível do Porto.
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B... intentou a presente acção de condenação do Réu, Estado Português, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual do Estado por erro judiciário, no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais sofridos por aquele, sendo o capital no valor de € 367.082,14, e os juros vencidos, calculados à taxa legal, no montante de € 158.463,56, num total de € 525.545,70 (quinhentos e vinte e cinco mil quinhentos e quarenta e cinco euros e setenta cêntimos), acrescido dos juros vincendos até integral e efetivo pagamento, bem como por danos não patrimoniais quantificados até ao momento da entrada da ação em juízo, em € 180.000,00 (cento e oitenta mil euros) e danos não patrimoniais que o Autor vai continuar a sofrer, a liquidar em execução de sentença.
Após os articulados, o tribunal “a quo” proferiu, de imediato, sentença por entender constarem todos os elementos necessários à prolação da mesma, sem necessidade de ulterior produção de prova.
Nessa decisão, entendeu-se inexistir uma condição essencial da ação, traduzida na revogação definitiva da decisão danosa.
Deste modo, a parte dispositiva da sentença ora alvo de presente recurso concluiu que:
Atento o exposto, julga-se procedente a exceção perentória invocada pelo Réu, da falta do pressuposto a que alude o n.º 2 do art. 13.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro e, consequentemente, absolve-se o Estado Português do pedido.
Custas a cargo do Autor, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido nos autos.
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Inconformado o autor deduziu o presente recurso onde formula as seguintes conclusões:
1- A douta sentença de que se recorre julgou procedente a excepção peremptória invocada pelo Ministério Público em defesa do Estado Português que consistiu na falta do pressuposto a que alude o nº 2 do artigo 13º da Lei nº 67/2007 – i.e. a prévia revogação da decisão como pressuposto processual da acção de responsabilidade civil extracontratual do Estado por erro judiciário manifesto e grosseiro.
2- Respeitando o princípio da interpretação conforme à Constituição e o princípio da interpretação conforme ao Direito Comunitário, o artigo 13º, nº 2 deverá ser interpretado no sentido de que o pedido de indemnização deve ser fundado na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente apenas e só quando tal revogação seja possível, face ao direito adjectivo vigente e à hierarquização dos Tribunais.
3- Caso o artigo 13º, nº 2 seja interpretado como na decisão recorrida, ou seja, no sentido de que inexiste responsabilidade civil do Estado se o erro judiciário tiver sido cometido pela última instância, e sem que dessa decisão caiba recurso, tal norma é inconstitucional porquanto viola o disposto nos artigos 18º, nºs 2 e 3, 20º, nºs 1, 4 e 5 e 22º da Constituição da República Portuguesa.
4- O erro judiciário em causa nos autos, consubstanciado numa violação do princípio constitucional e comunitário do Juiz Natural, foi cometido pelo Supremo Tribunal de Justiça pelo que estava legalmente vedado ao Recorrente recorrer dessa decisão, para efeito de obter a sua prévia revogação.
5- O Recorrente apenas teve conhecimento do erro judiciário em crise nos autos em momento posterior ao trânsito em julgado da decisão enfermada pelo erro, pelo que ainda quando fosse legalmente possível obter a sua revogação, nunca ela poderia ser exigível atento o momento em que ocorreu o conhecimento da prática do ilícito.
6- Decidindo como decidiu, e por menos feliz interpretação do Direito aplicável, a douta sentença recorrida violou o disposto no artigo 13º, nºs 1 e 2, da Lei nº 67/2007 e ainda o disposto nos artigos 18º, nºs 2 e 3, 20º, nºs 1, 4 e 5 e 22º da Constituição da República Portuguesa.
Termina requerendo que, na procedência das precedentes conclusões e no provimento do presente recurso, se revogue a sentença, ordenando-se o prosseguimento dos autos.
Houve contra-alegações pelo Réu nas quais se termina peticionando a confirmação da sentença sob escrutínio.
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II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar;
O objecto do recurso é delimitado pelas alegações e decorrentes conclusões, não podendo este Tribunal de 2.ª instância conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser em situações excepcionais que aqui não relevam.
No caso cumpre decidir se se encontra verificada a excepção peremptória invocada consistente na falta do pressuposto a que alude o nº 2 do artigo 13º da Lei nº 67/2007 – i.e. a prévia revogação da decisão – como pressuposto processual da acção de responsabilidade civil extracontratual do Estado por erro judiciário, manifesto e grosseiro.

III) Factos Provados
Encontram-se provados os seguintes factos, com relevância para a decisão a proferir, consignados na sentença apelada:
1.- O Autor intentou uma ação contra o Estado Português, pedindo a sua condenação no pagamento de todos os prejuízos já causados e que continua a causar ao Autor, por erro judiciário no exercício da função jurisdicional, no Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça de 13/11/2008.
2.- Esta ação contra o Estado Português, que correu termos no 1.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos, sob o n.º 2576/04.4TBMTS, foi julgada improcedente.
3.- O Autor, inconformado com a decisão proferida, recorreu para o tribunal da Relação do Porto.
4.- Em 05/02/2007, foi proferido Acórdão pelo tribunal da Relação do Porto, que julgou improcedente a apelação e manteve a decisão recorrida.
5.- O Autor, não se conformando com esta decisão, dela recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça.
6.- Por Acórdão proferido em 09/10/2007, o Supremo Tribunal de Justiça anulou a decisão impugnada e ordenou a baixa do processo ao tribunal da Relação do Porto para se pronunciar sobre a questão omitida.
7.- Em 27/03/08, foi proferido Acórdão pelo tribunal da Relação do Porto, que julgou o recurso improcedente.
8.- O Autor recorreu do mesmo Acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça.
9.- Em 28/10/2008, foi proferido Acórdão no Supremo Tribunal de Justiça, que julgou improcedente o recurso e manteve a decisão recorrida (que absolvera o Estado Português).
10.- Por Requerimento apresentado em 17 de novembro de 2008, o Autor requereu a reforma do Acórdão e arguiu a nulidade do mesmo.
11.- O Supremo Tribunal de Justiça proferiu Acórdão, no qual não atendeu o requerimento do Autor.

IV – Direito Aplicável
A questão fulcral que se discute no âmbito do presente recurso prende-se com uma querela já alvo de discussão jurisprudencial e doutrinal, como aliás surge abundantemente reflectido nas doutas alegações e contra-alegações juntas aos autos.
Nos termos do nº1 do art. 13º da Lei nº 67/2007, de 31.12. – uma vez descartados os casos de condenação penal injusta e de privação ilegal da liberdade, que se encontram sujeitos a um regime especial - a responsabilidade civil (extracontratual) aqui prevista é limitada às situações de erro judiciário grave, o qual pode ser de direito ou de facto.
O erro de direito “deverá revestir-se de um suficiente grau de intensidade, no sentido de que deverá resultar de uma decisão que, de modo evidente, seja contrária à Constituição ou à lei (...). Deverá tratar-se, nestes termos, de uma decisão proferida contra lei expressa e que, em si, represente um comportamento antijurídico suscetível de gerar, nos termos gerais, um dever de indemnizar” (vide Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais entidades públicas Anotado, Carlos Fernandes Cadilha, págs. 211 e 214).
Ou seja, como se intui, não basta que a decisão esteja simplesmente errada à luz da lei ou do direito; é “ainda exigível que se trate de um erro evidente que, por ser evitável segundo a normalidade das coisas, tenha desnecessariamente gerado prejuízos a uma das partes”.
Mas para além destes pressupostos materiais, a citada norma, no seu nº 2, exige ainda que o pedido de indemnização se funde na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente.
A opção legislativa entronca na necessidade de assegurar a protecção dos valores da segurança e certeza jurídica do caso julgado; independentemente de doutos considerandos expendidos sobre a bondade da mesma em diferentes registos, incluindo doutrinais, esta norma existe e a ela deve ser conferido o devido conteúdo.
Entende a decisão apelada, subscrevendo nós tal entendimento, que o erro de julgamento deve ser demonstrado no próprio processo judicial em que foi cometido e através dos meios de impugnação que forem aí admissíveis; nunca na própria ação de responsabilidade em que se pretenda tornar efectivo o direito de indemnização ou sequer em recurso extraordinário de revisão.
Como refere Cardoso da Costa, “Sobre o novo regime da responsabilidade do Estado por atos da função judicial, in Revista de Legislação e Jurisprudência”, ano 138º, pág. 163, não pode “atribuir-se qualquer relevo a um alegado erro judiciário sem que ele seja reconhecido como tal pela competente instância jurisdicional de revisão. Sem tal reconhecimento, o «erro» (o puro «erro») só o será do ponto de vista ou no plano da análise crítico-doutrinária da decisão, não num plano jurídico-normativo (...)”.
A alegada peculiaridade do caso “sub judice” reside na circunstância de o alegado erro ter sido cometido pela última instância de recurso, no caso, o STJ.
Ainda assim entendeu o tribunal “a quo” que não haveria motivos para um tratamento distinto. Ancorada, designadamente, em Ana Celeste Carvalho no estudo “Responsabilidade Civil por Erro Judiciário”, publicado no E-book de Julho de 2014, do Centro de Estudos Judiciários, dedicado à Responsabilidade Civil do Estado, é referido que “não se vislumbram motivos para conceder tratamento distinto para o erro cometido em última instância, em relação ao regime legal traçado por, mesmo nesse caso, não estar vedada a possibilidade de obter a prévia revogação da decisão danosa”.
Pois bem.
À luz do que dos autos consta entendemos que, em bom rigor e desde logo, a pretendida decisão danosa não será a proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça (de 28-10-2008) ou sequer a decisão subsequente que recaiu sobre a reclamação e que pôs fim ao processo (de 13-01-2009).
Na verdade, o que alegadamente configuraria o pretendido erro judiciário teria a ver, sim, com decisões interlocutórias relacionadas com a distribuição do processo que seriam violadoras do princípio do juiz natural (vide artigos 129.º a 141.º, 142.º a 155.º, 161.º a 167.º da Petição Inicial e Conclusão IV do presente recurso); só que tais decisões nunca foram revogadas, alteradas ou sequer foram analisados os seus respectivos fundamentos, a existir, porque o recorrente nunca as impugnou ou pôs em causa.
Sublinhe-se que no ponto 181 da petição inicial é expressamente alegado: “Nos presentes autos, coloca-se em crise, e em síntese, a redistribuição do processo no Tribunal da Relação do Porto, sem qualquer sustentação legal, em violação do princípio do juiz natural.
Concluímos, portanto, que o alegado erro judiciário terá sido cometido em sede de distribuição processual ao longo das instâncias, em particular na segunda, sendo certo que nunca foi posto em causa pela parte que agora o invoca.
Mantém-se, portanto, actuante o entendimento segundo o qual encontra-se institucionalmente vedada a possibilidade de uma decisão jurisdicional consolidada, por não ter sido impugnada, poder ser posteriormente “desautorizada” por outro tribunal de grau inferior (neste sentido, com inequívoca uniformidade na apreciação desta questão, v.g. acórdãos do STJ de 24.02.2015 (processo nº 2210/12.9TVLSB.L1.S1) e de 10.05.2016 (processo nº 136/14.0TBNZR.C1.S1) ou, quanto ao Tribunal Constitucional, acórdão n.º 363/2015, publicado no DR 2.ª Série, n.º 186, de 23.09.2015).
Donde, inexistindo a prova da revogação da decisão que tenha incorrido em erro judiciário, não existirá a pretendida ilicitude, pelo que, como bem sentenciou a decisão recorrida, a presente ação teria necessariamente de improceder.
Cumpre agora apurar se o entendimento plasmado enferma de alguma inconstitucionalidade.
Já tivemos oportunidade de enfatizar que as decisões que poderiam enfermar de erro judiciário grosseiro não foram aquelas, finais, produzidas pelo STJ mas sim as que foram determinando a distribuição processual aos diferentes titulares do processo nas várias instâncias, em especial, de acordo com a alegação do autor, no Tribunal da Relação.
Deste modo, sempre estaria prejudicada a possibilidade de verificação de uma qualquer interpretação do art. 13º, nº 2 da Lei nº 67/2007, de 31.12, contaminada de inconstitucionalidade. Adende-se, todavia, que a questão da conformidade constitucional da aludida norma em termos gerais já foi alvo de apreciação pelo Tribunal Constitucional, mormente no citado acórdão n.º 363/2015, que decidiu “[N]ão julgar inconstitucional a norma do artigo 13.º, n.º 2 do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei n.º 67/2007, de 31/12, segundo o qual o pedido de indemnização fundado em responsabilidade por erro judiciário deve ser fundado na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente”.
Entendeu o Tribunal Constitucional que estaria tão-somente em causa “estabelecer que o reexercício da função jurisdicional coenvolvido na reapreciação da decisão judicial danosa se faça com respeito pelas competências e hierarquia próprias do sistema judiciário e de acordo com o seu específico modo de funcionamento: o reconhecimento do erro judiciário implica uma revogação da decisão danosa pelo órgão jurisdicional competente no quadro de um recurso ou de uma reclamação. Ao fazê-lo, o artigo 13.º, n.º 2 do RCEEP não está a interferir com qualquer âmbito de proteção constitucionalmente pré-definido”.
Temos, portanto, que a decisão apelada estriba-se em fundamentos aos quais aderimos sendo despiciendo repeti-los.
Resta uma nota final e que contende com um outro argumento esgrimido pelo recorrente – a possível violação do direito da União Europeia.
É conhecida a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia: “o direito da União e, em especial, os princípios formulados pelo Tribunal de Justiça em matéria de responsabilidade do Estado por danos causados aos particulares em virtude de uma violação do direito da União cometida por um órgão jurisdicional que decide em última instância devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional que exige como condição prévia a revogação da decisão danosa proferida por esse órgão jurisdicional, quando essa revogação está, na prática, excluída.” (cf. Acórdão (TJUE) Ferreira da Silva e Brito, de 9 de setembro de 2015, proc. C-160/14, a partir da citação de Alessandra Silveira e Sophie Perez Fernandes, em Revista Julgar, “Anotação aos acórdãos (TEDH) Ferreira Santos Pardal c. Portugal e (TJUE) Ferreira da Silva e Brito (ou do “grito do Ipiranga” dos lesados por violação do direito da União Europeia o exercício da função jurisdicional)”
A regra do art. 13.º, n.º 2, do RRCEE não se aplica, portanto, a estes específicos casos de violação do direito da União imputáveis ao Estado no exercício da função jurisdicional por parte do tribunal de última instância, por força do princípio do primado do direito da União.
Porém, essa não aplicabilidade não surge descarnada e pressupõe duas condicionantes que se nos afiguram incontornáveis.
A primeira tem a ver com a evidente exigência que esteja efectivamente em causa a violação do direito da União sendo o caso mais comum – expresso na decisão Ferreira da Silva e Brito – o de omissão de suscitar o reenvio prejudicial que, no caso presente, não está em questão; ainda o de se tratar de decisão fundada na aplicação de norma nacional que viola o direito comunitário, designadamente por atentar contra jurisprudência do TJUE.
O apelante sinaliza existir essa violação do direito da União designadamente quanto ao princípio do juiz natural. Porém, não espoletou essa questão no processo próprio onde teria ocorrido tal erro grosseiro; ora, no processo acima citado, apreciado pelo TJUE, é inequívoco que a questão de suscitar o reenvio prejudicial foi abordada.
Por outro lado, o que se discutia, essencialmente, nesse aresto tinha a ver com o facto de estar em causa o STJ como última instância jurisdicional; neste sentido, o TJUE entendeu que “um órgão jurisdicional cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial de direito interno é obrigado, sempre que uma questão de direito da União seja suscitada perante si, a cumprir a sua obrigação de reenvio, a menos que conclua que a questão suscitada não é pertinente ou que a disposição do direito da União em causa foi já objecto de interpretação por parte do Tribunal de Justiça ou que a correcta aplicação do direito da União se impõe com tal evidência que não dê lugar a qualquer dúvida razoável” (cf. Acórdão Ferreira da Silva e Brito, cit., considerando 38, retomando a jurisprudência firmada no Acórdão Cilfit, de 6 de Outubro de 1982, proc. 283/81, considerandos 6 a 21).
Ou seja, como já se decidira no Acórdão Köbler, de 30 de Setembro de 2003, processo C-224/01, o TJUE afirma que a ausência de reenvio prejudicial acarreta a frustração das pretensões inerentes à tutela jurisdicional efectiva dos direitos dos particulares decorrentes do direito da União.
Depois, num outro segmento, temos que o TJUE igualmente tomou uma posição clara quanto ao facto de o referido artigo 13º, nº2 da Lei n.º 67/2007 poder contrariar o princípio da efectividade: “uma regra de direito nacional como a que figura no artigo 13.º, n.º 2, do RRCEE pode tornar excessivamente difícil a obtenção da reparação dos danos causados pela violação do direito da União em causa” na medida em que “as hipóteses de reapreciação das decisões do Supremo Tribunal de Justiça são extremamente limitadas” sendo que esse obstáculo não pode ser justificado por outros princípios gerais do direito da União como os da autoridade do caso julgado ou da segurança jurídica (cfr. Acórdão Ferreira da Silva e Brito, cit., considerandos 53 a 59).
Simplesmente, como já procuramos analisar, não está em causa nos autos uma decisão final do STJ como nunca poderia necessariamente, a nosso ver, acontecer na medida em que uma questão relativa à distribuição de um processo a um dado juiz num determinado tribunal sempre antecederia a decisão final desse juiz ou desse tribunal. Como já vimos, o ênfase coloca-se até na distribuição no Tribunal da Relação.
Por outro lado, mais uma vez se constata que, no processo em causa, a questão da violação do direito comunitário não foi esgrimida; donde, não está minimamente em apreço discernir se a aplicação do artigo 13º, nº2 contraria o principio da efectividade quer porque não estamos perante qualquer erro judicial cometido em última instância, por decisão final, quer porque a inexistência de revogação da decisão danosa na jurisdição competente nada teve a ver com qualquer posição obstaculizadora do tribunal, designadamente do STJ, como aconteceu na situação denunciada pelo TJUE em que o tribunal nacional incumpriu uma obrigação que sobre si impendia de solicitar o reenvio prejudicial.
Ou seja, ainda que estivesse em causa a violação do Direito da União, o que não ocorre, a alegada decisão danosa não foi proferida em última instância na medida em que a parte nunca invocou, no processo próprio, qualquer vício ou ilegalidade na distribuição; caso o tivesse feito, ancorada em qualquer violação do Direito da União – o que não fez -, e caso estivesse em questão designadamente uma situação de reenvio prejudicial – o que também não ocorre – e caso o STJ tivesse negado tal reenvio sem motivo tido como justificativo – o que igualmente não acontece no nosso caso e está já bem longe da realidade concreta em apreço - é que poderíamos considerar um qualquer paralelismo com uma possível violação do direito da União nos moldes doutamente alegados.
Concluímos, portanto, pela total improcedência do recurso em apreço, confirmando a decisão sob escrutínio.
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Importa agora proceder à sumariação prevista pelo art.663º, nº7 do Código do Processo Civil):
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V – Decisão
Pelo exposto, decide-se julgar improcedente o recurso deduzido, confirmando-se a decisão proferida.
Custas pelo recorrente sem prejuízo do apoio judiciário de que desfruta.

Porto, 24 de Abril de 2018
José Igreja Matos
Rui Moreira
Lina Baptista