Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4397/07.3TTLSB.L1-4
Relator: JOSÉ FETEIRA
Descritores: LOCAL DE TRABALHO
CONTRATO DE TRABALHO
NULIDADE DA CLÁUSULA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/07/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: I - Decorre do disposto no art. 154.º n.º 1 do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003 de 27.08 que ao estabelecerem um contrato de trabalho devem as partes definir o local da prestação do trabalho, definição que pode ser estabelecida em termos mais ou menos amplos de forma a assegurar, desde logo, uma eventual mobilidade do trabalhador.
II - No entanto, esta mobilidade, quando venha a operar-se, para além de não poder deixar de levar em consideração a natureza das funções que, contratualmente, o trabalhador se obrigou a desempenhar, deve ser concretizada de forma a não implicar para este um prejuízo sério e a corresponder a um interesse, igualmente sério, do empregador.
III - Na definição contratual do local de trabalho, não podem as partes contratantes estabelecer regras donde resulte uma total indeterminação ou indeterminabilidade do local da prestação do trabalho ou da mobilidade geográfica ou transferência do trabalhador.
IV - Sendo a cláusula contratual relativa à definição do local de trabalho composta por pontos donde resulte uma total indeterminação ou indeterminabilidade, quer em relação ao local da prestação do trabalho, quer à mobilidade geográfica ou transferência do trabalhador, a par de pontos donde resulte uma determinação mais ou menos ampla daquele local e da mobilidade geográfica ou transferência do trabalhador, deve a validade dessa cláusula reduzir-se a estes pontos nos termos das disposições conjugadas dos artigos 280.º n.º 1 e 292.º do Código Civil.
V - Tendo em consideração os princípios de boa fé que devem presidir à celebração e execução dos contratos bem como o disposto no art. 97º do referido Código do Trabalho, o trabalhador tem o direito de ser esclarecido pela sua entidade empregadora sobre o modo como deveria interpretar a ordem de deslocação emitida por esta, se como uma transferência temporária ou como uma situação de mobilidade geográfica à luz da cláusula contratual estabelecida entre as partes e tendo em consideração o disposto nos artigos 315º e 316º e ainda os períodos de aviso prévio a que se alude no art. 317.º todos do mencionado Código.
(Elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO
AA, (…), com o patrocínio do M.º P.º instaurou no Tribunal do Trabalho de Lisboa a presente acção emergente de contrato de trabalho, com processo comum, contra a sociedade “BB – COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS ALIMENTARES, LDª”, com sede (…) em Vila ... e dependência (…) em C... (doravante designada por R.), alegando, em síntese, que, foi contratado pela R. mediante contrato de trabalho a termo certo celebrado em 4 de Setembro de 2006, contrato que terminaria em 30 de Junho de 2007 para exercer as funções de “responsável comercial”.
Foi ilicitamente despedido pela R. em 27 de Dezembro de 2006, assistindo-lhe, portanto, o direito a receber as prestações pecuniárias que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao termo do contrato, incluindo, portanto, quer as retribuições mensais, quer as férias, subsídios de férias e subsídio de Natal.
Assiste-lhe ainda o direito a uma indemnização no montante de € 12.846,61, sendo € 9.150,00 de remunerações mensais até 30 de Junho de 2007; € 3.696,61 de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal atendendo ao período de duração do contrato (04-09-2006 a 30-06-2007) e € 199,99 que lhe foi descontada por alegadas faltas injustificadas.
Aquando da cessação da relação laboral em 27 de Dezembro de 2006 e independentemente da ilicitude do seu despedimento, tinha direito a receber da R. a quantia global de € 2.767,81, sendo € 1.350,00 referente à remuneração de 27 dias do mês de Dezembro de 2007; € 941,21 de férias e subsídio de férias atendendo à vigência de facto do contrato (04-09-2006 a 27-12-2006) e € 472,60 de subsídio de Natal atendendo à vigência do contrato (04-09-2006 a 27-12-2006). Pede:
I – Que seja declarada nula a cláusula 3ª do contrato celebrado, ilícito o despedimento de que foi objecto e, consequentemente, que a R. seja condenada a pagar-lhe a quantia global de € 14.396,62, valor que inclui as remunerações mensais, férias, subsídio de férias, subsídio de Natal;
II – Subsidiariamente, independentemente da declaração de ilicitude do despedimento deve a R. ser condenada a pagar-lhe a quantia global de € 2.767,81;
III – Deve, ainda, a R. ser condenada no pagamento de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, até integral pagamento das quantias em dívida.
Frustrada a tentativa de conciliação e notificada a R. para contestar a presente acção, veio fazê-lo, alegando, em síntese que, embora no momento da contratação do A. lhe fosse comunicado e por ele aceite que iria iniciar a sua prestação de trabalho em Lisboa, no decurso da relação laboral iria existir a necessidade de prestar a mesma em várias outras localidades já que a R. se dedica ao negócio de venda de castanhas e, maioritariamente, a sua prestação de trabalho seria realizada fora do distrito de Lisboa. Tanto mais que o A. sabia que a sede da R. era em Vila ... e daí que fosse solicitada ao A., pré-contratualmente, disponibilidade para deslocações não previstas ou preparadas, facto fundamental para o sucesso da prestação do seu trabalho, tendo o A. aceite e ficado contratualmente estabelecido.
A decisão de despedimento do A. é adequada.
A R. procedeu ao pagamento de todas as quantias referentes a salários e proporcionais até à data em que foi notificado da decisão de despedimento.
Conclui que deve ser absolvida do pedido.
Respondeu o A. à matéria da excepção deduzida pela R., alegando que esta lhe pagou a quantia de € 1.087,66 através de cheque que recebeu em Março de 2007 e referente a créditos de retribuição de Dezembro de 2006 e de subsídios de férias e de Natal, continuando por pagar a retribuição de férias peticionada de igual valor ao do subsídio de férias pago.
Conclui que deve ser julgada parcialmente procedente a invocada excepção.
Foi dispensada a realização de audiência preliminar e, proferido o despacho saneador, foi dispensada a selecção de matéria de facto assente e controvertida.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, na sequência da qual foi proferida a decisão de fls. 162 a 165 sobre matéria de facto provada e não provada, a qual não foi objecto de reclamação.
Foi depois proferida a sentença de fls. 167 a 178 – reformada parcialmente a fls. 206 e 207 – que culminou com a seguinte:
Decisão
Por todo o exposto, julga-se a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condena-se a ré a pagar ao autor:
- a quantia de € 11.436,90 (onze mil, quatrocentos e trinta e seis euros e noventa cêntimos) a título de retribuições desde a data do despedimento até 30-06-2006([1]), incluindo as férias, subsídio de férias e de Natal, acrescida de juros desde o vencimento de cada uma, à taxa legal supletiva em vigor e que é actualmente de 4% ao ano;
- a quantia de € 199,00 (cento e noventa e nove euros) acrescida de juros desde 31/10/2006, à taxa legal supletiva em vigor e que é actualmente de 4% ao ano;
- a quantia de € 468,54, a título de retribuição de férias devida pelo trabalho prestado até 27.12.2006.
- absolvendo a ré do demais peticionado.
Custas por autora e ré, na proporção do decaimento – art. 446.º, n.º 1, n.º 2 e n.º 3 do C.P.C.”.
Inconformada com esta sentença, dela veio a R. interpor recurso para este Tribunal da Relação, apresentando alegações que termina mediante a formulação das seguintes:
Conclusões:
(…)
Contra-alegou o A./apelado, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.
Corridos os Vistos, cabe, agora, apreciar e decidir.

II – APRECIAÇÃO
Tendo em consideração as conclusões de recurso acabadas de enunciar e que, como se sabe, delimitam o respectivo objecto, colocam-se, à apreciação deste Tribunal da Relação, as seguintes:
Questões:
§ Validade, pelo menos parcial mediante redução, da cláusula 3ª do contrato de trabalho estabelecido entre as partes;
§ Verificação de justa causa para o despedimento do A./apelado.

Em 1ª instância, foi tida por provada a seguinte matéria de facto:
1. Em 04-09-2006, a ré contratou o autor para sob as suas ordens, direcção e fiscalização exercer as funções de “responsável comercial”, mediante a outorga do escrito de fls. 11 a 13 dos autos cujo teor aqui se dá por reproduzido, designadamente:
- «A celebração do presente contrato é feita a termo certo (...) e fundamenta-se na necessidade (...) com carácter temporário e não
duradouro (...) de realizar a campanha de colheita, preparação, embalagem e comercialização da castanha (...) estas operações decorrem da necessidade de (...)
de realizar testes de mercado numas instalações provisórias...» (Cl. 2.ª);
- «1. O segundo outorgante obriga-se a prestar a sua actividade nos locais que lhe forem indicados pela primeira outorgante.
2. Sem prejuízo do convencionado no número anterior, o segundo outorgante prestará de imediato a sua actividade profissional no distrito de Lisboa, ou eventualmente em outro local ou noutras instalações afectas à actividade do primeiro outorgante, ou por esta indicadas.
3. O local de execução da actividade do segundo outorgante poderá ser livremente alterado pelo primeiro outorgante para qualquer outro onde esteja instalado ou venha a desenvolver algum projecto ou actividade.” (Cl. 3ª).
- «horário de trabalho: de Segunda-feira a Sexta-feira das 9:00 às
18:00 horas com intervalo para almoço das 13:00 às 14:00 horas» (Cl.
4ª)

- «a retribuição mensal ajustada é de 1500,00 € (mil e quinhentos
euros) mensais»(Cl. 5.ª);

- «O presente contrato é celebrado a termo certo, com início no dia
4 de Setembro de 2006 e término no dia 30 de Junho de 2007» (Cl. 6.ª)

2. O local de trabalho referido no ponto 2. da cl. 3.ª situava-se nas instalações da ré, sitas (…) em C...;
3. Onde o autor exerceu funções até 23 de Outubro de 2006;
4. Tendo-lhe, antes da outorga do escrito referido em 1., sido solicitado disponibilidade para deslocações não previstas ou preparadas;
5. No salário acordado teve-se em vista tal necessidade de deslocações urgentes;
6. O autor conseguiu uma entrevista com um potencial cliente (GTC), ao qual não realizou qualquer venda;
7. Enviou a um cliente (A...) preçários errados;
8. Esqueceu-se de enviar preçário para um cliente (CC);
9. No dia 23 de Outubro de 2006 o autor entregou o telemóvel e as chaves da viatura que lhe estava distribuída e as chaves das instalações referidas em 2.;
10. O autor outorgou a carta de fls. 15 dos autos, que remete à ré, datada de 23 de Outubro de 2006, cujo teor se dá aqui por reproduzido;
11. Que a ré recebeu em 24/10/2006;
12. Através de carta datada de 24/10/2006, mas apenas enviada a 25-10-2006 a ré comunica ao autor que se deve apresentar, dia 27-10-2006, pelas 9:00, nas instalações da empresa (….)  sitas em, Vila ..., conforme escrito de fls. 22 que aqui se dá por reproduzido;
13. No local referido em 12. situa-se a sede da ré e é a zona por excelência de produção de castanha;
14. O autor respondeu a tal carta dizendo estar disponível para a deslocação se a ré custeasse as despesas, conforme documentos de fls. 24 e 27 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
15. O autor não se apresentou no local referido na comunicação de
24/10/2006 (Vila ...);

16. Por carta remetida ao autor, em 02-11-2006, a ré comunicou-lhe que havia instaurado um processo disciplinar com vista ao seu despedimento com justa causa, enviando-lhe a nota de culpa e informando-o de que “...se encontra preventivamente suspenso, por considerar inconveniente a sua presença no local de trabalho”;
17. O autor, através de correio registado com A/R, em 14-11-2006, envia a resposta a tal nota de culpa, nos termos do documento de fls. 33 e ss. que aqui se dá por reproduzido;
18. Em 29-11-2006 a ré envia ao autor uma adenda à nota de culpa, conforme fls. 43 dos autos, nos termos da qual «desde 2/11/2006 encontra-se suspendo do exercício da sua actividade (...) o que equivale a dizer que entre 24/10/2006 e 2/11/2006, não compareceu, injustificadamente, ao trabalho, logo contabiliza 6 dias de faltas injustificadas (...)»;
19. O autor envia a resposta a tal adenda, através de correio registado com A/R de 07-12-2006, nos termos do documento de fls. 45 que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;
20. Por carta de 22-12-2006, a ré enviou ao autor a decisão proferida no processo disciplinar de fls. 48 e ss., tendo procedido ao despedimento do autor;
21. Recebida pelo autor em 27-12-2006;
22. A ré descontou € 199,99 no salário do autor de Outubro de 2006, por “faltas injustificadas”;
23. A ré pagou ao autor a retribuição de Dezembro de 2006 (27 dias); subsídio de férias e de Natal pelo trabalho prestado até 27/12/2006;
24. E depositou as quantias de € 233,33 e € 310,50 em processo de execução para pagamento de quantia certa n.° .../06.7TBBRR (Barreiro) em que é executado o autor, que descontou no salário deste.
Muito embora a R./apelante não deduza uma impugnação formal de matéria de facto, afigura-se-nos que a mesma, em face de parte das alegações e de algumas das conclusões de recurso, designadamente as extraídas nas alíneas AJ) a AO), o terá pretendido fazer.
No entanto e à cautela, dir-se-á que, tendo em consideração a lei processual ao caso aplicável, a impugnação de matéria de facto deveria ser feita de acordo com o disposto no art. 690.º-A do Cod. Proc. Civil, na redacção que este diploma tinha antes das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 303/2007 de 24-08, o que no caso não foi minimamente tido em consideração e daí que, para além de não ser claro o propósito da R./apelante em impugnar matéria de facto, se foi essa a sua pretensão, o recurso, nessa parte, não pode deixar de ser rejeitado.
Acresce, por outro lado, que este Tribunal da Relação nem sequer dispõe de todos os elementos que serviram de base à decisão sobre matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, mais propriamente a prova testemunhal produzida em audiência, razão pela qual nem sequer dispunha de elementos de prova susceptíveis de lhe permitirem efectuar uma cabal ponderação sobre a correcção dessa decisão, não podendo, também por essa circunstância, proceder uma eventual impugnação de matéria de facto feita pela R./apelante.
Considera-se, pois, como definitivamente assente a matéria de facto consignada como provada pelo Tribunal a quo e que anteriormente deixámos enunciada.
A primeira das suscitadas questões de recurso, é a que se prende com a validade da cláusula 3ª do contrato de trabalho a termo certo estabelecido entre ambas as partes em 4 de Setembro de 2006 e para vigorar até 30 de Junho de 2007, contrato que se mostra junto a fls. 11 a 13 dos presentes autos.
Defende a R./apelante a validade dessa cláusula, pelo menos, a sua validade parcial mediante redução, mantendo-se o estabelecido pelas partes no que respeita ao ponto 2. da mesma, razão pela qual sempre seria de concluir pela verificação de faltas injustificadas dadas ao serviço pelo A./apelado entre 24 e 30 de Outubro de 2006, circunstância que, aliada à demonstração de um desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, das obrigações inerentes ao exercício do seu cargo, constitui justa causa de despedimento e daí a licitude deste, com as respectivas consequências legais face ao pedido formulado nesta acção.
Importa, antes de mais, ter presente que não se discute a validade do contrato de trabalho a termo certo firmado entre as partes e de que se dá conta no ponto 1. dos factos provados, mas a validade da cláusula 3ª que nele foi estabelecida.
Posto isto, ficou provado que o contrato em causa foi celebrado em 4 de Setembro de 2006, numa altura em que vigorava o Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003 de 27-08 e que, não obstante, ter sido posteriormente introduzido o Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009 de 12-02, este não é aplicável ao caso vertente, por força do disposto no art. 7.º n.º 1 desta última Lei.
Ora, dispõe o art. 154.º n.º 1 daquele Código do Trabalho, que «O trabalhador deve, em princípio, realizar a sua prestação no local de trabalho contratualmente definido, sem prejuízo do disposto nos artigos 315.º a 317.º», sendo que estes normativos dizem respeito à mobilidade geográfica e à transferência temporária a que um trabalhador pode ficar sujeito durante a execução do contrato de trabalho, bem como ao procedimento a observar em relação a uma e a outra.
Decorre do disposto naquele normativo legal que ao estabelecerem um contrato de trabalho – para mais quando, como no presente caso, se trata de um contrato de trabalho a termo que obedece a determinados requisitos de natureza formal – devem as partes definir o local da prestação do trabalho, definição que pode ser estabelecida em termos mais ou menos amplos de forma a assegurar, desde logo, uma eventual mobilidade do trabalhador.
Desde já se avança, no entanto, que esta mobilidade, quando venha a operar-se, para além de não poder deixar de levar em consideração a natureza das funções que, contratualmente, o trabalhador se obrigou a desempenhar, deve ser concretizada de forma a não implicar para este um prejuízo sério e a corresponder a um interesse, igualmente sério, do empregador.
Por outro lado, como bem refere João Leal Amado([2]) a propósito da noção de local de trabalho, «dado que o local do cumprimento da prestação constitui um aspecto essencial do programa contratual, a definição do âmbito geográfico da prestação laboral caberá, naturalmente, aos sujeitos desse contrato».
Acrescenta, todavia, que «Sendo embora um conceito relativo ou elástico, podendo… ser dotado de uma amplitude ou extensão variáveis, o certo é que, ainda assim, não poderá verificar-se uma total indeterminação do local de trabalho, pois a situação de heterodisponibilidade do trabalhador tem de resultar, de algum modo, espacialmente delimitada pelo contrato. Com efeito, o trabalhador não se poderá obrigar a prestar toda e qualquer actividade, em todo e qualquer lugar, sob a autoridade e direcção do empregador. A exigência de determinação ou determinabilidade do objecto do contrato de trabalho é incontornável, quer quanto ao tipo de funções desempenhadas, quer quanto ao lugar de execução das mesmas», referido mais adiante que, «De acordo com o disposto no próprio art. 280.º do CCivil, o trabalhador comprometer-se-á, por conseguinte, a prestar ao empregador uma actividade funcional, temporal e espacialmente delimitada ou balizada – sob pena de, não o fazendo, acabar por se ver colocado numa posição próxima da servil. O que é totalmente inadmissível». «O parâmetro geográfico da prestação de trabalho não pode ficar indeterminado, designadamente através da concessão ao empregador do poder de colocar o trabalhador em qualquer local indicado por aquele» refere Pedro Romano Martinez([3]).
Também José Andrade Mesquita([4]) afirma que «o local de trabalho tem de estar determinado ou ser determinável, correspondendo, em qualquer caso, à efectiva execução contratual e não a hipotéticas necessidades empresariais futuras. Estas podem dar lugar a posteriores alterações do local de trabalho segundo regras que equilibrem os interesses de ambas as partes».
Ora, tendo presentes estas considerações doutrinais, verifica-se que, em consonância com o mencionado dever de definição do local de trabalho, A. e R. estipularam no contrato de trabalho entre ambas estabelecido uma cláusula 3ª com o seguinte teor:
«1. O Segundo Outorgante obriga-se a prestar a sua actividade nos locais que lhe forem indicados pela Primeira Outorgante.
2. Sem prejuízo do convencionado no número anterior, o Segundo Outorgante prestará de imediato a sua actividade profissional no distrito de Lisboa, ou eventualmente em outro local ou noutras instalações afectas à actividade do Primeiro Outorgante, ou por esta indicadas.
3. O local de execução da actividade do Segundo Outorgante poderá ser livremente alterado pelo Primeiro Outorgante para qualquer outro onde esteja instalado ou venha a desenvolver algum projecto ou actividade».
Resulta do teor desta cláusula contratual, que a mesma, para além de conter uma determinação, em termos amplos (Distrito de Lisboa), do local de trabalho onde o A./apelado deveria, de imediato, desempenhar as suas funções ao serviço da R./apelante (cfr. primeira parte do n.º 2 da referida cláusula), consagra um pleno direito de mobilidade geográfica daquele, a ser exercido por esta durante a execução do contrato de trabalho entre ambos estabelecido, sem qualquer determinação ou determinabilidade em termos de parâmetros geográficos da prestação da actividade laboral, como resulta do mencionado ponto 1., ou mediante uma total e livre mobilidade do A./apelado resultante de hipotéticas e futuras necessidades da R./apelante como decorre do ponto 3. da referida cláusula.
Já quanto ao ponto 2. da mesma cláusula contratual, para além de conter uma determinação, embora em termos amplos, do local de trabalho onde o A. deveria, de imediato, exercer a sua actividade profissional ao serviço da R., prevê a possibilidade de ocorrência de mobilidade geográfica daquele em relação a outro local ou a outras instalações afectas à actividade da R., mobilidade que, nessa medida, não pode deixar de se considerar determinada em relação a locais onde se verifique a existência de estabelecimentos a esta pertencentes.
Na verdade, para além de resultar da própria denominação da R. que esta se dedica à comercialização de produtos alimentares, demonstrou-se que o local de trabalho referido no ponto 2. da mencionada cláusula contratual, se situava nas instalações daquela sitas (…) em C... (ponto 2. dos factos provados) e que, no momento da outorga do contrato, a R. era uma sociedade comercial com sede em Vila ... (Distrito de Vila Real), tendo o A. sido admitido para desempenhar as funções de responsável comercial, devendo ainda, acessoriamente, realizar quaisquer outras tarefas que lhe fossem indicadas pela R. e para as quais tivesse qualificação ou capacidade bastantes e que tivessem afinidades ou ligação funcional com as que correspondiam às suas funções normais.
Acresce que na cláusula 2ª do mencionado contrato de trabalho se estipulou que a celebração do mesmo se fundamentava na necessidade da R., com carácter temporário e não duradouro, poder fazer face à necessidade de realizar a campanha de colheita, preparação, embalagem e comercialização da castanha no ano de 2006, bem como ainda da preparação, selecção, embalagem e comercialização de outros produtos alimentares que viesse a conseguir comercializar até 30 de Junho de 2007, estipulando-se ainda nessa cláusula que tais operações decorriam da necessidade da R. realizar testes de mercado numas instalações provisórias, de modo a analisar a potencialidade e viabilidade do negócio de comercialização de produtos alimentares no mercado nacional e internacional, para, em caso de sucesso nesse período experimental, avançar para a construção de uma moderna unidade agro-industrial, no ano de 2007.
Ora, em face destes aspectos e tendo em consideração o que anteriormente deixámos referido, quando conjugado com o disposto nos artigos 280.º n.º 1 e 292.º, ambos do Código Civil, não poderemos deixar de concluir pela verificação da validade parcial, limitada ao ponto 2., da referida cláusula contratual, não se acompanhando o que, quanto a este aspecto foi decidido na sentença sob recurso ao concluir – embora de forma não muito clara – pela nulidade total da mencionada cláusula contratual.
Passando-se, agora, à apreciação da segunda questão de recurso, tem a mesma a ver com a invocada ocorrência de justa causa para o despedimento do A./apelado.
A este propósito, estabelece o art. 396º n.º 1 do Código do Trabalho de 2003, que «o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho constitui justa causa de despedimento», enunciando-se no n.º 3 do mesmo preceito, a título exemplificativo, diversos comportamentos susceptíveis de constituírem justa causa do despedimento, entre eles figurando o desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, das obrigações inerentes ao exercício do cargo [al. d)] e a ocorrência de faltas injustificadas ao trabalho que determinem directamente prejuízos ou riscos graves para a empresa ou, independentemente de qualquer prejuízo ou risco, quando o número de faltas injustificadas atingir, em cada ano civil, 5 seguidas ou 10 interpoladas [al. g)].
            Não basta, no entanto, a demonstração de qualquer comportamento violador de deveres laborais para que se possa ter por verificada a justa causa de despedimento. Decorre do mencionado normativo, a exigência de verificação cumulativa dos seguintes pressupostos:
a) Que o comportamento seja culposamente assumido pelo trabalhador (requisito subjectivo);
b) Que se possa concluir pela impossibilidade de manutenção da relação laboral entre o trabalhador e o empregador (requisito objectivo);
c) Que se verifique a existência de um nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade.
            A justa causa de despedimento, pressupõe, portanto, uma determinada acção ou omissão imputável ao trabalhador a título de culpa, violadora de deveres emergentes do vínculo laboral estabelecido entre si e o empregador e que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a manutenção desse vínculo.
            Quer a culpa, quer a gravidade da violação de tais deveres, na falta de um critério legalmente estabelecido, hão-de apurar-se pelo entendimento de um “empregador normal, médio”, colocado em face do caso concreto, utilizando-se, para o efeito, critérios de mera objectividade e razoabilidade([5]), sendo que, quanto à impossibilidade prática de subsistência da relação laboral e citando, entre outros, o douto Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 30-04-2003([6]), a mesma verifica-se “quando ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, susceptível de criar no espírito da primeira a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral”.
            Acresce que, como se refere neste mesmo Aresto, aquela impossibilidade não se trata de uma impossibilidade material, mas de uma inexigibilidade que se determina mediante um balanço feito, em concreto, entre os interesses em presença, ou seja, de um lado o interesse do empregador na efectivação da desvinculação e do outro o interesse do trabalhador na conservação do vínculo laboral.
            Importa ainda considerar que, sendo o despedimento imediato a sanção disciplinar mais gravosa para o trabalhador, na medida em que é a única que, desde logo e em termos irreversíveis, quebra o vínculo laboral existente entre as partes, só deve ser aplicada relativamente a casos de real gravidade, isto é, quando o comportamento culposo do trabalhador for de tal forma grave em si e pelas suas consequências que se revele inadequada a adopção de uma sanção que, embora correctiva, conserve ou mantenha o vínculo contratual entre as partes. Isso verificar-se-á apenas quando a conduta violadora, culposamente assumida pelo trabalhador, ponha, definitivamente, em causa a relação de confiança em que assenta a relação laboral.
            Finalmente, importa considerar que, nos termos do disposto no n.º 2 do mencionado preceito legal, «Para a apreciação da justa causa deve atender-se, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes … e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes».
Ora, tendo em consideração todos estes aspectos e revertendo ao caso em apreço, demonstrou-se que o A./apelado, no exercício das suas funções de “responsável comercial” ao serviço da R./apelante, enviou à “A...”, cliente da R., preçários errados e esqueceu-se de enviar o preçário a CC, outro cliente da R. (pontos 7. e 8. dos factos provados).
Também se demonstrou que o A. não conseguiu uma entrevista com um potencial cliente da R., ao qual não realizou qualquer venda (ponto 6.). Todavia, em relação a este facto, desconhece-se se o mesmo se verificou por qualquer comportamento culposo assumido pelo A. ou se por qualquer razão imputável ao próprio cliente da R..
Demonstrou-se, por outro lado, que, exercendo o A. aquelas funções desde 4 de Setembro de 2006 em instalações da R. sitas em C... (pontos 1. e 2. dos factos assentes), enviou-lhe uma carta, datada de 23 de Outubro de 2006 e que a R. recebeu no dia seguinte, cujo teor, no que aqui releva, é o seguinte:
No seguimento da ocorrência da manhã do dia 23 de Outubro de 2006 em que me foi comunicado por intermédio do Sr. DD a minha demissão da empresa, venho por este meio informar que não estou de acordo, assim como não vejo justificações plausíveis nos argumentos apresentados para a mesma e que não aceito o acordo que me foi proposto.
Mais informo que também a pedido do Sr. DD entreguei a viatura da empresa que se encontrava ao meu serviço, telemóvel e chaves do local de trabalho onde exerço as minhas funções desde o dia 04 de Setembro de 2006, sito na Delegação Comercial da empresa, (…)  em C....
Desta forma e vendo-me impedido de desenvolver a minha actividade profissional, venho por este meio requerer o integral cumprimento do contrato individual de trabalho que nos liga.
Caso nada me seja comunicado até cinco dias úteis após a data desta carta considero-me demitido sem justa causa, vendo-me forçado a promover as diligências necessárias ao cumprimento do contrato em causa…” (cfr. pontos 10. e 11. dos factos provados).
Provou-se que no dia 23 de Outubro de 2006 o A. entregou o telemóvel e as chaves da viatura que lhe estava distribuída, bem como as chaves das instalações da R. sitas em C... (pontos 9. e 2. dos factos provados).
Provou-se, também, que a R., logo no dia seguinte ao recebimento daquela carta do A., ou seja, em 25 de Outubro de 2006, enviou a este uma carta datada de 24 de Outubro de 2006 com o seguinte teor:
Assunto: Deslocação para as instalações da empresa em Vila ... para acompanhar campanha de produção e comercialização 2006/2007”.
Nos termos da cláusula 3ª, n.º 3 do contrato de trabalho, no qual Vossa Excelência é o 2º outorgante, vem, por este meio, já que não tem comparecido nas instalações da empresa, comunicar-lhe que 6ª feira, dia 27/10/2006, pelas 09h00 deverá comparecer nas instalações da empresa sitas (…) em Vila ..., devendo aí permanecer até nova ordem de trabalho.
Ficará com a incumbência de acompanhar o decorrer da campanha de produção e comercialização 2006/2007, nomeadamente acompanhar os produtores, qualidades e quantidades de campanha produzida, seu acondicionamento e transporte, bem como reunir com potenciais clientes.
Esta deslocação é de vital importância para a empresa, como Vossa Excelência bem sabe…” (cfr. ponto 12. dos factos provados).
 A esta carta respondeu o A. com uma outra, bem como por fax, ambos datados de 30 de Outubro de 2006, com o seguinte teor:
Recebi a vossa carta datada de 24/10/2006, a qual me deixou confuso no seguimento da carta enviada por mim a 23/10/2006.
Apesar da situação apresentada, estou disponível para comparecer no local de trabalho por vós estipulado, salvaguardando os direitos que me assistem, nomeadamente:
♦ A transferência de local de trabalho (não entendo se pretendem mobilidade geográfica ou transferência temporária) tem de ser comunicada com um mínimo de 8 ou 30 dias de antecedência. Desta forma como recebi hoje a vossa comunicação, estou desde já disponível para me apresentar em Vila ... no dia 06/11/2006 no caso de entenderem que se trate de uma transferência temporária, ou no dia 30/11/2006 no caso de se tratar de mobilidade geográfica;
♦ Que me seja indicado o tempo previsível da alteração do local de trabalho ou uma fundamentação que justifique a mobilidade geográfica;
♦ Como as custas decorrentes do acréscimo dos custos de deslocação e alojamento são da vossa responsabilidade, aguardo as vossas instruções relativamente à forma de pagamento das mesmas.
Como referi na minha carta de 23/10/2006, foi-me comunicada a minha demissão pelo Sr. DD. Constato através da vossa resposta que a minha presença em Vila ... é de vital importância para a empresa. Assim continuo disponível para o desenvolvimento da minha actividade profissional na BB.
Reitero mais uma vez que estou disponível para a deslocação proposta, desde que evidentemente, a empresa assuma as responsabilidades resultantes desta deslocação.
Aguardo resposta ás questões colocadas com a máxima urgência a fim de poder definir o meu futuro” (cfr. ponto 14. dos factos provados).
 Provou-se, por outro lado, que o A. não se apresentou em Vila ..., o que levou a R. a comunicar-lhe, em 2 de Novembro de 2006, que lhe havia instaurado um processo disciplinar com vista ao seu despedimento com justa causa, enviando-lhe nota de culpa e informando-o de que se encontrava preventivamente suspenso por considerar inconveniente a sua presença no local de trabalho (ponto 16. dos factos provados).
Provou-se ainda que, em 29 de Novembro de 2006, a R. enviou ao A. uma adenda à nota de culpa nos termos da qual refere que «desde 2/11/2006 encontra-se suspenso do exercício da sua actividade (…) o que equivale a dizer que entre 24/10/2006 e 2/11/2006, não compareceu, injustificadamente, ao trabalho, logo contabilizou 6 dias de faltas injustificadas (…)» (cfr. ponto 18. dos factos provados).
Finalmente provou-se que a R. – não obstante o A. haver respondido às referidas notas de culpa – por carta de 22 de Dezembro de 2006, enviou ao A. a decisão que proferira no aludido processo disciplinar, procedendo ao seu despedimento (cfr. pontos 17., 19. e 20.).
Ora, perante esta matéria de facto provada, não há dúvida que a circunstância do A. haver enviado preçários errados a um cliente da R. e de se haver esquecido de enviar o preçário a um outro cliente desta – factos que integram a nota de culpa enviada em 2 de Novembro de 2006 e que consta de fls. 29 e 30 dos presentes autos – revelam da parte daquele, desinteresse pelo cumprimento diligente de obrigações inerentes ao cargo de “responsável comercial” que então exercia, e, nessa medida, constituem comportamentos merecedores de cesura disciplinar.
Já quanto aos seis dias de faltas injustificadas, dadas ao serviço pelo A. entre 24 de Outubro de 2006 e 2 de Novembro de 2006 e que constituem a imputação feita pela R. na adenda à referida nota de culpa, adenda que consta do documento de fls. 43 dos autos, entendemos que essa imputação não tem suporte na matéria de facto provada, sobretudo se tivermos em devida linha de conta as missivas trocadas pelas partes entre os dias 24 e 30 de Outubro de 2006.
Na verdade, o que resulta da matéria de facto provada, designadamente das referidas missivas, é que desempenhando o A., desde 4 de Setembro de 2006 as suas funções de “responsável comercial” ao serviço da R. em instalações que esta possuía sitas em C... (Distrito de Lisboa), na sequência de carta que o A. enviou à R. em 23 de Outubro de 2006 dando-lhe conta de factos que teriam ocorrido nesse dia e que havia interpretado como de demissão do exercício de funções com obrigação de entrega dos meios que lhe haviam sido por aquela fornecidos para o desempenho das mesmas naquele local, a R. logo do dia 25 de Outubro de 2006 enviou ao A. uma carta determinando a deslocação deste para as instalações da sua sede sitas em Vila ... (Distrito de Vila Real), invocando, para tanto, o n.º 3 da cláusula 3ª do contrato de trabalho entre ambos celebrado, para aí exercer as suas funções, logo a partir do dia 27 de Outubro de 2006 pelas 09h00, comunicando-lhe, também, que aí deveria permanecer até nova ordem de trabalho.
Ora, perante o teor desta carta da R., não há dúvida que ao A. assistia, no mínimo e tendo em consideração os princípios de boa fé que devem presidir à celebração e execução dos contratos bem como o disposto no art. 97º do Código do Trabalho, o direito de ser esclarecido por aquela sobre se deveria interpretar a mencionada ordem de deslocação como uma transferência temporária ou como uma situação de mobilidade geográfica à luz da mencionada cláusula contratual e tendo em consideração o disposto nos artigos 315º e 316º do Código do Trabalho, sendo certo que o A. se disponibilizava, de forma expressa e reiterada, a acatar essa deslocação, indicando, no entanto, as datas em que, por lei, teria direito a fazê-lo face aos períodos de antecedência previstos no art. 317.º daquele Código.
É certo que o A. não se apresentou em Vila ... em 27 de Outubro de 2006 nem, presume-se, até ao dia 2 de Novembro de 2006. No entanto, assistindo ao A. o direito aos esclarecimentos que pedira à R. na carta e fax que lhe enviara em 30 de Outubro de 2006, sendo legítimo que aguardasse pela prestação desses esclarecimentos, também é certo que a R. nem alegou nem demonstrou ter-lhos prestado, optando, ao invés disso, por lhe dar conhecimento da instauração do procedimento disciplinar que, entretanto, decidira mover-lhe, bem como da suspensão do exercício de funções a partir de então.
Acresce, por outro lado, não haver dúvida que a mencionada ordem de transferência temporária ou de mobilidade geográfica – sabe-se lá – não teve em consideração qualquer dos prazos de antecedência estabelecidos no art. 317.º do Código do Trabalho.
Deste modo, não se vê como se possa concluir pela verificação “in casu” das faltas injustificadas imputadas ao A. na aludida adenda à nota de culpa.
Pese embora o direito que assistia ao A. aos referidos esclarecimentos, bem como a ver observado qualquer dos prazos a que se alude no referido art. 317.º do Código do Trabalho, poder-se-ia considerar que a não comparência do A. entre 27 de Outubro e 2 de Novembro de 2006 integraria violação do dever de obediência a ordem emitida pela R.. No entanto, independentemente da legitimidade ou não dessa ordem dada em tais circunstâncias, o que é certo é que nas notas de culpa deduzidas pela R. contra o A. no procedimento disciplinar que lhe instaurou, a mesma não lhe imputa a violação desse dever e, como tal, não se pode levar aqui em consideração.
Resta, portanto, apreciar se o desinteresse pelo cumprimento diligente de obrigações inerentes ao cargo de “responsável comercial” que então exercia, revelado pelo A. ao haver enviado preçários errados a um cliente da R. e ao haver-se esquecido de enviar o preçário a um outro cliente desta são susceptíveis de integrar o conceito de justa causa de despedimento.
Ora a resposta a esta questão não pode deixar de ser em sentido negativo já que, constituindo, embora, comportamentos violadores de um dever profissional do A. e, nessa medida, merecedores de censura disciplinar, de modo algum seria adequada a aplicação de uma sanção disciplinar tão gravosa, sendo suficiente a adopção de uma sanção correctiva que mantivesse o vínculo laboral entre as partes para levar o A. a observar o cumprimento dos seus deveres laborais com zelo e diligência.
Não ocorre, pois, justa causa para o despedimento do A./apelado, não merecendo censura a sentença recorrida ao haver decidido desse modo

III – DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas a cargo da Apelante.
Registe e notifique.

Lisboa, 7 de Março de 2012

José Feteira
Filomena de Carvalho
Ramalho Pinto

(Texto integralmente processado em computador, revisto e rubricado pelo Relator)
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([1]) Crê-se existir um manifesto lapso quanto a esta data, tendo o Sr. Juiz pretendido, por certo escrever 30/06/2007 data do termo do contrato de trabalho a termo celebrado entre as partes.
([2]) In “Contrato de Trabalho – À luz do novo Código do Trabalho” pp. 243/244.
([3]) In “Código do Trabalho – Anotado”, 6ª Edição – 2008 – pagª 366.
([4]) In “Direito do Trabalho” pp. 571/572.
([5]) Cfr. neste sentido e entre muitos os Acs. do STJ de 07-03-1986 e de 17-10-1989, em www.dgsi.pt, Procs. n.ºs  001266 e 002519.
([6]) Cfr. www.dgsi.pt, Proc. n.º 02S568.
Decisão Texto Integral: