Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
26396/09.0T2SNT.L1-6
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: ELEVADORES
CONTRATO DE ADESÃO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
CLÁUSULA PENAL
NULIDADE DA CLÁUSULA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/01/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I. Em face do disposto no artigo 510º do CPC, findos os articulados, se não houver que proceder à convocação da audiência preliminar, o juiz profere despacho saneador [n.º1] destinado a conhecer das excepções dilatórias e nulidades processuais que hajam sido suscitadas pelas partes ou que deva apreciar oficiosamente [al. a)], bem como a “Conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidas deduzidos ou de alguma excepção peremptória” [al. b)].
II. A estatuição da norma abrange os casos em que a questão seja unicamente de direito, ou simultaneamente de direito e de facto, ou só de facto. Verificada a condição expressa na norma, ou seja, a de não haver “(..) necessidade de mais provas (..)”, o juiz não poderá abster-se de conhecer do mérito da causa.
III. O estado do processo permite o conhecimento imediato do mérito da causa, quando a matéria de facto seleccionada para essa decisão “corresponde ao critério legal, vertido no art. 511º-1 CPC, ou seja, a consideração, na fundamentação de facto da decisão, da matéria de facto relevante, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito”.
IV. Entende-se por contrato de adesão aquele em que um dos contraentes, não tendo participação na preparação das respectivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente, normalmente uma empresa de apreciável dimensão, elaborou e apresenta já impresso, em geral, ao público interessado.
V. O campo de aplicação do DL 446/85, não se restringe exclusivamente aos denominados “contratos de adesão”, por contraposição aos contratos consensuais, abarcando também os contratos, «(..) onde a par de cláusulas que se mantêm inalteráveis de contrato para contrato, suportam todavia a inserção de disposições específicas moldadas no interesse das partes e em particular do aderente; são “os contratos de adesão individualizados”, reconhecidos expressamente no artigo 1º nº 2 do citado DL 446/85».
VI. A valoração a fazer, para se indagar se uma cláusula penal, no quadro negocial padronizado, é proibida nos termos previstos no art.º 19.º al.c), por ser desproporcionada aos danos a ressarcir, deverá ter como referência, não o contrato singular ou as circunstâncias do caso concreto, mas o tipo de negócio em causa e os elementos que normativamente o caracterizam, no interior de todo o regulamento contratual genericamente predisposto, segundo “critérios objectivos, numa avaliação prospectiva guiada por cálculos de proporcionalidade e valores médios e usuais, tendo em conta factores que, em casos daquele género, habitualmente relevam na produção e na medida dos prejuízos”.
VII. A desproporção a que se refere a al. c), do art.º 19.º, tem de ser sensível.
VIII. É desproporcionda e, logo, proibida e nula [art.º 19.º al. c) e art.º 12.º do DL 466/85], a cláusula penal que por denúncia antecipada ou o incumprimento culposo apenas é aplicável a favor da empresa que a elaborou, inseriu nas condições gerais e apresentou à outra parte para subscrever, estabelecendo uma indemnização em montante equivalente ao somatório de todas as prestações mensais do preço previsto até ao termo do prazo do contrato.
IX. Mais do que salvaguardar uma reparação proporcionada do dano, a sua aplicação em concreto conduz a resultados em que ressalta manifestamente o objectivo de penalizar o cliente. E, se assim é, “dentro do quadro negocial padronizado, em que o contrato se integra”, tal conduz necessariamente a uma desproporção sensível e flagrante entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar, contrariando o princípio da boa-fé consagrado no art.º 15.º do DL 446/85 e sendo proibida nos termos previstos na al. c), do art.º 19.º.
( Da Responsabilidade do Relator )
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: I. RELATÓRIO

I.1 A ( ….Elevadores, Lda.) , propôs a presente acção declarativa com processo sumário na Comarca da Grande Lisboa-Noroeste, a qual foi distribuída à 2.ª Secção do Juízo de Média Instância Cível, contra B ( Condomínio ….) , sito em ……Urbanização ..., ..., pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de 6.326,72€ acrescida da quantia de 1.327,85€ correspondente a juros de mora vencidos desde a data de emissão das facturas juntas até 06/10/2009 e da quantia correspondente aos juros de mora vincendos desde 07/10/2009 até efectivo e integral pagamento.
Em abono da sua pretensão, a autora alegou, em síntese, o seguinte:
- No exercício da sua actividade de fornecimento, montagem e conservação de elevadores, celebrou com o réu um contrato de conservação, nos termos do qual, durante o período acordado, renovável por iguais períodos, se obrigou a conservar 2 elevadores instalados no edifício do réu, mediante o pagamento de uma prestação mensal.
- Procedeu a reparações solicitadas pelo réu, emitindo as respectivas facturas, datada de 15/03/2005 no valor de 240,98€ e datada de 07/12/2007 no valor de 52,03€, tendo o réu questionado aquele primeiro valor e não pago nem aquele nem este.
- Em 18/04/2007 a Associação Nacional de Inspectores de Elevadores realizou uma inspecção periódica aos elevadores do réu, da qual resultou a necessidade de correcções, umas a corrigir em 30 dias e outras até à próxima inspecção periódica.
- Em 15/10/2007, o réu comunicou a rescisão do contrato com fundamento na reprovação dos elevadores na inspecção periódica e na consequente quebra de confiança nos serviços prestados por incumprimento das cláusulas 1.3. e 3.1. do contrato.
- A A. procedeu então à emissão da factura relativa à indemnização por denúncia antecipada do contrato, nos termos da sua cláusula 5.7.4., relativamente ao período de 11/2007 a 02/2011, datada de 25/10/2007 no valor de 6.188,42€, que o réu não pagou.
- Aos valores em débito pelo réu há que deduzir o crédito em favor do mesmo em 15/11/2007, no valor de 154,71€.
Citado, o réu apresentou contestação, por seu turno contrapondo, em síntese, o seguinte:
- Não ter celebrado com a autora o contrato em causa e que o mesmo não rege a relação contratual com ela estabelecida verbalmente, porquanto o documento escrito que titula o contrato está assinado por pessoa que pensa ser o construtor do edifício, à qual não foram conferidos poderes para agir em sua representação; esse documento só está assinado no verso da última folha, não constando da face dessa folha nem das demais folhas qualquer rubrica ou assinatura.
- Excepciona o incumprimento por parte da autora da obrigação de manutenção dos elevadores em condições legais por forma a não serem reprovados em inspecção;
- Não pagou a reparação de 2005 por entender que face aos preços de mercado o preço da mão-de-obra não devia exceder 100,00€ e porque o acumulador não funcionava;
- A autora apresentou orçamentos para a adequação dos elevadores às exigências legais depois de estes terem sido reprovados na inspecção, quando o devia ter efeito antes para garantir a aprovação, prevendo neles a realização de trabalhos desnecessários e de valor muito elevado, cuja revisão solicitou, razão pela qual rescindiu o contrato;
- A cláusula 5.7.4. consta de folha que não está assinada, pelo que não foi lida e explicada, sendo desproporcionada aos danos a ressarcir e, por isso, nula.
Termina pugnando pela absolvição do pedido.
Notificada da contestação, a autora apresentou articulado de resposta às excepções suscitadas, pugnando pela sua improcedência, para o efeito alegando o seguinte.
- O documento que titula o contrato foi assinado pelo construtor em representação do réu, enquanto seu administrador provisório, tendo sido cumprido pelo réu durante 8 anos sem nunca pôr em causa a sua vinculação ao mesmo.
- A cláusula penal constante do ponto 5.7.4. do contrato é válida porquanto o seu valor relaciona-se com os investimentos humanos e materiais feitos para execução do contrato durante o respectivo período de vigência, além do que não se está em face de contrato de adesão, uma vez que as suas cláusulas são previamente negociadas, na medida em que além de condições gerais constam do mesmo condições específicas, tendo umas e outras sido explicadas e tendo o réu tomado conhecimento das mesmas através da cópia do contrato que lhe foi entregue.
Notificado da resposta, o réu veio, além do mais, impugnar a assinatura constante do documento que titula o contrato e cujo original a autora juntou.
Concluídos os articulados e atingida a fase de saneamento, a Mmª Juíza considerou que o estado dos autos permitia o imediato conhecimento e decisão do mérito da causa, tendo proferido sentença, julgando a acção parcialmente procedente, e decidindo nos termos seguintes:
- Condenar o réu B a pagar à autora A, a quantia de 86,27€ (oitenta e seis euros e vinte e sete cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa anual de 4%, vencidos desde 08/04/2005 e vincendos até integral e efectivo pagamento; a quantia de 52,03€ (cinquenta e dois euros e três cêntimos),acrescida de juros de mora à taxa anual de 4%, vencidos desde 31/12/2007 e vincendos até integral e efectivo pagamento.
- Declarar a nulidade da cláusula contratual n.º 5.7.4. do contrato n.º NS7626/7, supra referida em B.
- Absolver o réu B do demais peticionado pela autora A.
I.2 A A , não se conformando com a sentença, na parte em que julgou nula a cláusula 5.7.4 e absolveu o R. do segundo pedido, veio interpor o presente recurso de apelação, o qual foi recebido na espécie própria e com o efeito e modo de subida devidos.
Com as alegações apresentou as respectivas conclusões, as quais mereceram despacho convidando ao aperfeiçoamento, nos termos previstos nos artigos 700.º n.º 1 al. a) e b) do n.º2, al.a), do art.º 685.º A.
No prazo legal, a recorrente apresentou complemento às conclusões, nele passando a indicar as normas jurídicas que, no seu entender foram violadas e em que sentido devem ser interpretadas. Assim, no conjunto, das conclusões consta o seguinte:
1. A A. celebrou com o R. o contrato de conservação junto como doc. nº1 com a P.I.
2. Por razões que agora - e para já - não vêm ao caso, o R., por carta de 27.11.2007, pôs termo ao contrato dos autos (doc. nº 13 junto com a P.I.).
3. Nessa data, o contrato já se havia renovado (em 01.03.2006) para vigorar até 28.02.2011;
4. A A. não aceitou existir fundamento (justa causa) para essa atitude do R., e, fazendo funcionar a Cl. “5.7.4.” do contrato, facturou a sanção aí prevista (de Novembro de 2007 a Fevereiro de 2011), cujo pagamento também veio reclamar nesta acção.
5. Atento os articulados e os demais elementos decorrentes dos autos, o Julgador “a quo” entendeu-se apto a decidir de imediato e sem julgamento, e, apesar de condenar o R. no pagamento das duas facturas de reparação também peticionadas (juntas como docs. nºs 20 e 21 com a P.I.), absolveu-o do pagamento da factura relativa a sanção contratual (doc. nº 22), por entender a referida Cl. “5.7.4.” nula.
6. É quanto a esta absolvição que nos insurgimos.
7. O R. estribou - nesta sede – a sua defesa, alegando que a Cl. “5.7.4.” constaria da folha que não estava assinada, pelo que não foi lida nem explicada, sendo desproporcionada aos danos a ressarcir; sendo que, em todo o caso, a mesma seria nula.
8. Oportunamente a A. juntou o original do contrato, de onde decorre que, sendo o contrato impresso numa folha única (em papel corrido e desdobrável), a assinatura da última página representa o conhecimento/compreensão das demais e na integra.
9. Saneando as demais questões de fundo suscitadas pelo R., o Julgador “a quo” qualificou o contrato, considerou-o eficaz relativamente ao R., e terminou operando o tratamento do contrato dos autos, determinando ser de adesão e determinando a nulidade da Cl. “5.7.4.”, o que levou à absolvição do R. no pagamento relativo à sanção contratual peticionada.
10. Salvo o devido respeito, há inúmera factualidade para analisar e que é essencial para a descoberta da verdade, como é o caso de, antes de analisar essa cláusula em concreto, ter apreciado se havia – ou não – justa causa para o R. ter posto termo ao contrato (havendo, nem havia necessidade de tratar dessa matéria – o R. tinha posto termo ao contrato sem assistir à A. o direito de lhe reclamar a sanção contratual facturada), e de permitir, em todo o caso, à A., a possibilidade de provar que o contrato dos autos foi previamente negociado, o que afastava a sua qualificação como de “mero contrato de adesão” (se a A. demonstrasse que o R. não quis derrogar a Cl. “5.7.4.” quando o podia ter feito, então, não havendo justa causa para pôr termo ao contrato dos autos, incorreria nessa sanção como alegado e facturada).
11. Por estas razões, a Acção não podia ter sido decidida logo no saneador, obrigando à realização prévia do julgamento, para aí se apurarem as versões das partes, plasmadas nos articulados e documentos juntos.
12. Pelo que, e numa primeira abordagem, o processo terá de baixar, ordenando-se a realização do julgamento, dando à A. a hipótese de demonstrar – desde logo – que os seus clientes não “assinam de cruz”, e dando ao R. a hipótese de demonstrar que pôs termo ao contrato dos autos com justa causa, com as legais consequências.
13. A Resposta da A. à Contestação do R., é lapidar quanto ao enquadramento do contrato dos autos, e, ao contrário do que o Julgador “a quo” alega no início do Capítulo 3.3. da douta decisão recorrida, encerra inúmeros factos concretos que permitirão à A. – se provados – demonstrar o que aí alega.
14. Termos em que caberá ao R. demonstrar que pôs termos ao contrato dos autos com justa causa, e aí a Acção termina nessa parte; ou, não o demonstrando, só aí se averiguará se mesmo assim a Cl. “5.7.4.” vincula o R., ou se, e mesmo que a A. demonstre que lhe foi explicado o seu conteúdo, se a mesma é válida.
15. No entender da A., haverá, portanto, e desde logo, que seleccionar os factos assentes, a base instrutória, de modo a que, uma vez esclarecidas essas matérias, só assim se assegurará a aplicação da Justiça.
16. Se assim não for doutamente entendido e suprido por V. Exas., à cautela, alega a A. que entende que a Cl. “5.7.4.” não é nula.
17. A qualificação feita ao contrato dos autos, salvo o devido respeito, partiu de um pressuposto absolutamente errado, qual seja o de assumir que o mesmo é um Contrato de Adesão e, como tal, sujeito à disciplina do RJCCG.
18. O contrato da A. encontra-se sujeito à disciplina do Direito das Obrigações, como definida no Código Civil (Arts. 405º, 1 e ss. do CC), com as legais consequências.
19. O RJCCG, veio estabelecer um regime próprio para um sector do tráfego contratual, que a doutrina habitualmente designa por “Contrato de Adesão” ou “Condições Gerais de Contratação”, e que a Lei veio a referir-se com a expressão “Cláusulas Contratuais Gerais”.
20. Trata-se de contratos cujo conteúdo é – em regra na totalidade – prévia e unilateralmente elaborado por uma das partes, sendo proposto a um número indeterminado de destinatários, que não podem discuti-lo, estando colocados perante a alternativa de, aceitando globalmente o clausulado, celebrar o contrato ou, rejeitando-o, prescindir daquela celebração.
21. Ora, basta ler, de facto, e ainda que sumariamente, o contrato dos autos em apreciação, para bem se perceber que não se enquadra minimamente nessa definição.
22. O contrato divide-se em 3 partes, a saber:
1ª Página – identificação dos contraentes;
Páginas intermédias – “Condições Gerais”;
Última página – as denominadas “Condições Contratuais Específicas”, que incluem as denominadas “Condições Particulares”;
23. A 1ª página, não oferece dúvidas, nela se espelhando os elementos identificativos de base, relativos a cada contraente.
24. As páginas intermédias, contêm o acervo das regras gerais que pautam as relações entre os contraentes.
25. Na era massificada em que vivemos, este número de regras é comum a todos os contratos e explica-se por esse facto.
26. A essas regras, acrescem os elementos do caso concreto, plasmados nas “Condições Contratuais Específicas” e as derrogações – quando for o caso – às “Condições Gerais” e às “Condições Contratuais Específicas”, plasmadas nas “Condições Particulares”.
27. Ao cliente, a cada cliente, “de per si”, assiste o direito de contratar coisa diversa ao figurino de base proposto (“Condições Gerais” e “Condições Contratuais Específicas”), fazendo inscrever nas “Condições Particulares” as derrogações negociadas, que se passarão a aplicar, substituindo aquelas.
28. Assim, o contrato dos autos não é um mero Contrato de Adesão (do tipo dos praticados, por exemplo, para os telemóveis ou para os seguros), sujeito ao RJCCG, antes se lhe aplicam as regras do Direito das Obrigações, com as legais consequências.
29. Chegados aqui, os nossos Tribunais, nesta Comarca e noutras, não têm entendido o contrato dos autos como de adesão “tout court”, têm entendido a cláusula como válida, e, quando invocada a excessividade da sanção – o aspecto quantitativo que não já o qualitativo – por vezes reduzem-na em conformidade, aplicando o Código Civil, que não o RJCCG, pois, de facto, consideram o contrato como não sendo de adesão, mas sujeito à disciplina do Direito de Obrigações, com as legais consequências.
30. E é por isso que a Cl. “5.7.4.” está redigida como está: em lugar de discutir os prejuízos dessa saída precipitada e injustificada de um dado contrato, que levariam anos a demonstrar, define logo a fórmula do seu cálculo, como a doutrina acolhe e sem margens para dúvidas e/ou discussões.
31. A A. está dimensionada para atender – bem – os seus clientes e se um deles resolve pôr termo ao seu contrato, se não tem justa causa para o fazer, já sabe que incorre numa sanção predefinida que aceitou ao contratar sem mais discussões.
32. Finalmente, a circunstância de o cliente saber previamente qual a sanção em que incorre, caso queira pôr termo à relação contratual com a A. de forma injustificada, é, paradoxalmente, uma segurança para ele cliente: em lugar de a A. ter que quantificar depois os prejuízos resultantes dessa atitude do cliente, e poderem vir a constituir uma surpresa – que até podia ser para mais – ao serem reclamados, o cliente assim já sabe qual a quantificação exacta dessa sua atitude insensata e injustificada.
33. Desde logo, mostra-se violado o disposto no art.º 202.º da constituição da República Portuguesa.
34. Se a todos é assegurado o acesso ao Direito e aos Tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, a decisão agora sindicada, ao ter sido proferida sem julgamento, quando há matéria controvertida para se apurar a questão da justa causa, viola esse direito fundamental.
35. A necessidade de descongestionar os Tribunais, explicando saneadores - sentenças como o destes autos, viola, em absoluto, esse Princípio.
36. Depois, vem violado o n.º2 do art.º 266.º do CPC (Princípio da Cooperação), pois esta atitude do Julgador "a quo" não permite obter uma justa composição do litígio.
37. Depois, vem violado o n.º 2, al. b) do art.º 510.º do CPC, "a contrario", pois o estado do processo não permitia conhecer imediatamente do mérito da causa sem necessidade de mais prova.
38. Depois, ainda, vem violado o art.º 511.º do CPC, por falta de selecção da matéria de facto, essencialmente indicando os factos a submeter a prova em sede de Base lnstrutória para a Audiência de Discussão e Julgamento
39. Depois, ainda, vem violado o art.º 512.º do CPC, não sendo dado às partes o direito de indicar as suas provas para a demonstração do por elas foi respectivamente alegado.
40. Depois, ainda, vêm violadas todas as normas relativas à instrução do processo (art.ºs. 513.º e ss. do CPC) e à discussão e julgamento da causa (arts. 646.º e ss. do CPC), tendo sido vedado às partes demonstrarem o que alegaram nos seus articulados.
41. Depois, ainda, vem indirectamente violada a al. d) do n.º 1 do art. 668.º do CPC, pois Julgador "a quo" não se pronunciou sobre questões que teria de apreciar se tivesse ocorrido Julgamento, sendo, nessa parte, nula a douta Sentença recorrida.
42. Finalmente, e em termos substantivos, foram violadas as normas dos art.º. 405.º e ss. do CC, pois, como defende a Apelante, não se aplicando o RJCCG (DL 446/85 e legislação complementar), estando o contrato dos autos sujeito ao Direito das Obrigações, não só não é um contrato de adesão (do tipo dos de seguros, de telemóveis ou de mútuo bancário, onde não há negociação possível: ou se assina ou não se contrata), como a cláusula "5.7.4.", em apreciação, tem de ser analisada à luz do Princípio da Autonomia da Vontade, expressamente aplicados aquando da sua assinatura (tendo ao Apelado sido fornecido o contrato para apreciação prévia, explicado o seu conteúdo e tendo tido a possibilidade de alterar/derrogar essa - e outras - cláusulas nas "Condições Particulares", faculdade que, como defende a Apelante e espera provar, não exerceu ou quis exercer).
I.2 Pela recorrida foram apresentadas contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso e consequente confirmação da sentença.
E, para o caso de assim não ser entendido, ao abrigo do disposto no art.º 684º-A, nº 1 do Código de Processo Civil, pretende que esta Relação se pronuncie sobre a questão relativa à sua vinculação ao contrato que a Autora juntou aos autos, o escrito denominado “Contrato …. OC” NS 7626/7, para se concluir, ao contrário do decidido na 1.ª instância, que essa vinculação não se verifica e, logo, pela sua absolvição dos pedidos.
Relativamente a esta matéria apresentou as conclusões seguintes:
A - O recorrido não está vinculado pelo contrato de manutenção NS 7626/7 junto aos autos porque não o subscreveu.
B - Quem subscreveu esse contrato foi A……, Lda. através do seu gerente …. (?) .
C - Tal entidade não obrigava o Recorrido.
D - O Recorrido não ratificou esse contrato pela forma prevista no nº 2 do art. 268º do Código de Processo Civil, concretamente as três modalidades previstas no art. 116º do Código do Notariado.
E - Face ao disposto no nº 220º do Código Civil, não há ratificação ou, a entender-se que há, seria nula por falta de forma, nulidade invocável a todo o tempo, de conhecimento oficioso (art. 286º do Código Civil) que aqui expressamente se argui.
F- O Acórdão de 26.2.2010 desta Relação (processo 4955/07.6TVLSB.L1-7), disponível em www.dgsi.pt. vai no sentido de que estes contratos, assinados pelos construtores, não vinculam os Condomínios.
G - Também não houve cessão da posição contratual (cf. art. 424º e ss. do Código Civil).
H - A relação contratual entre Recorrente e Recorrida limitou-se à prestação de serviços de manutenção e reparação de elevadores e ao seu pagamento, em contrato verbal.
I - A invocação pelo Recorrido de regras do suporte escrito de contrato a que teve acesso mas não assinou, quando rescindiu o contrato que realmente tinha com a Recorrente é irrelevante, pois não pode significar que o ratificava.
J - As normas do abuso de direito não podem servir para suprir a falta de forma de uma qualquer declaração negocial expressa ou tácita, ainda que se pense (por hipótese) que o Recorrido teria ratificado tacitamente o contrato NS 7626/7.
K - Ao decidir que, apesar de não ter subscrito ou ratificado o contrato NS 7626/7, o Recorrido incorreria em abuso de direito ao negar que estivesse vinculado por ele, a decisão recorrida viola os arts. 268º, nºs. 1 e 2, 220º, 286º e 334º do Código Civil, que deveria ter aplicado em termos de declarar que tal contrato não obriga o Recorrido.
I.3 Foram colhidos os vistos legais.
I.4 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas (artigos 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º1, do CPC), as questões a apreciar são as de saber o seguinte:
a) Se a acção podia ter sido decidida logo no saneador ou, pelo contrário, se obrigava à realização prévia do julgamento, devendo a sentença ser anulada e ordenada a baixa do processo para elaboração de base instrutória e termos processuais subsequentes.
b) Se o contrato dos autos é um contrato de adesão, sujeito à disciplina do RJCCG, aprovado pelo DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, e se a Cláusula 5.7.4 do mesmo contrato é, ou não, nula.
c) E, caso se conclua que não há fundamento para anular a decisão, mas se reconheça razão à A. relativamente segunda questão, considerando-se que o contrato não está sujeito à disciplina do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, caberá então, nos termos do disposto no art.º 684º-A, nº 1 do Código de Processo Civil, que apreciar se a R. está, ou não, vinculada ao contrato.

II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO
Na decisão recorrida foram considerados apurados com relevo para a decisão, por acordo das partes e documentos juntos aos autos e não validamente impugnados, os factos seguintes:
1. No exercício da sua actividade de fornecimento, montagem e conservação de elevadores, a autora celebrou com “Administração do Edifício, A/C …….”, sendo esta empresa construtora do edifício do réu, o acordo constante do documento escrito (junto a fls. 127-129), denominado “Contrato …. Controlo OC” com o número NS7626/7, relativo a 2 elevadores instalados no edifício do réu, com início de vigência em 01/03/1999 e válido pelo prazo de 6 anos.
2. Nos termos desse acordo, a autora obrigou-se a assegurar a manutenção, conservação e reparação (inspeccionando-os, limpando-os, lubrificando-os e reparando avarias) dos elevadores instalados no edifício do réu, mediante o pagamento por este, com periodicidade trimestral antecipada, de prestações mensais no valor inicial de 17.720$00/88,39€, acrescido de IVA, actualizado anualmente de acordo com os índices de inflação publicados pelo INE, facturado trimestralmente.
3. Nesse acordo prevê-se, na cláusula n.º 5.7.3. a prorrogação da sua vigência por períodos iguais ao nele previsto, “desde que não seja denunciado com, pelo menos, 90 dias de antecedência do termo do prazo que então estiver em curso, através de carta registada”.
4. Desse acordo consta ainda, entre outras, a cláusula n.º 5.7.4, nos termos da qual: “Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados, é elemento conformante da estrutura empresarial da A , em caso de denúncia antecipada do presente contrato pelo cliente, a
A terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente facturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado.”
5. Desse acordo consta ainda, entre outras, a cláusula n.º 5.5.2., na qual é estabelecido o direito da A a indemnização de valor igual ao previsto na citada cláusula 5.7.4., por resolução contratual fundada em incumprimento do contrato por parte do cliente, incluindo por mora no pagamento das prestações do preço.
6. Do referido acordo não consta qualquer cláusula prevendo o direito do cliente a indemnização no caso de denúncia antecipada pela A e consta uma cláusula n.º 5.6., nos termos do qual, em caso de incumprimento imputável à A, esta “apenas responderá até à concorrência do valor de 3 meses de facturação (…) como máximo de indemnização a pagar ao cliente.”.
7. Desse acordo constam ainda as cláusulas n.º 1.3. que estabelece “Um Supervisor de Manutenção assegura uma visita especial de três em três anos, a fim de proceder a um exame periódico e completo do equipamento, com especial atenção para os aspectos de segurança e de qualidade. Os resultados desta inspecção serão comunicados ao cliente, com sugestões de reparação, melhoria do equipamento e/ou para a sua modernização, com o objectivo de alterar o respectivo desempenho, o mesmo acontecendo, e em qualquer altura, devido a alterações impostas por normas, regulamentos e/ou legislação aplicável.”; e, a cláusula n.º 3.1. nos termos da qual “A A assegura, com um intervalo máximo de três anos, um relatório com: Resultados da Auditoria de Qualidade e visitas de conservação; Resumo e análise de avarias; Trabalhos efectuados; e Recomendações e propostas sobre. - reparações ou modernizações para maximizar a fiabilidade e/ou a disponibilidade do equipamento; - modernizações para melhoria do desempenho e/ou a adaptação a novos standards, regulamentos e/ou legislação.”
8. Foi entregue ao réu uma cópia desse documento1.
9. A partir da sua celebração a autora começou a prestar os serviços a que se refere esse documento, que continuou a prestar a partir da eleição da primeira administração do réu, facturando ao réu as prestações nele acordadas que o réu pagava.
10. Na sequência da reprovação dos elevadores do edifício do réu na inspecção periódica realizada pelo Instituto de Soldadura e Qualidade, em 25/03/2003, em 23/06/2003, a autora enviou ao réu dois orçamentos de reparações que este não adjudicou.
11. Em 23/02/2005, a autora efectuou o fornecimento e montagem nos elevadores do edifício do réu, de 1 bateria e de 5 lâmpadas de botão, tendo emitido a correspondente factura, datada de 15/03/2005 e com vencimento em 08/04/2005, no valor de 240,98€, que o réu não pagou.
12. Por carta datada de 22/08/2005, o réu pediu esclarecimento à autora dos valores dessa factura, a qual lhe enviou duas cartas, datadas de 18/10/2005 de 2 de Novembro de 2005, das quais pelo menos a última foi recebida pelo réu, informando que o valor da mão-de-obra era de 36,44€, o da bateria era de 157,12€ e o das lâmpadas de 8,94€, acrescidos de IVA.
13. Por carta datada de 15/11/2005, o réu informou considerar tais valores excessivos e solicitou a sua revisão, bem como a indicação detalhada do valor das peças e da mão-de-obra nos orçamentos apresentados em 2003.
14. Em 24/05/2007, a autora efectuou o fornecimento e montagem nos elevadores do edifício do réu, de 6 lâmpadas de botão, tendo emitido a correspondente factura, datada de 07/12/2007 e com vencimento em 31/12/2007, no valor de 52,03€, que o réu não pagou.
15. Na sequência da reprovação dos elevadores do edifício do réu na inspecção periódica realizada pela Associação Nacional de Inspectores de Elevadores, em 08/05/2007, por faxes enviados em 16/05/2007 e em 28/05/2007 o réu solicitou à autora o esclarecimento dessa situação, a qual em Junho de 2007 apresentou orçamentos para reparações e fornecimento e montagem de equipamento, designadamente de dispositivos de controlo de excesso de carga, para resolução dos problemas encontrados pela inspecção, no valor global de 4.128,25€.
16. Em 13/08/2007, o réu adjudicou a outra empresa a realização de reparações e da instalação dos dispositivos de controlo de excesso de carga nos elevadores, pelo preço global de 2.300,00€.
17. Por carta datada de 15/10/2007 (junta a fls. 97), o réu comunicou à autora que rescindia o contrato com ela celebrado, em virtude de os elevadores terem sido reprovados em inspecção periódica por não cumprirem os requisitos legais e regulamentares aplicáveis, designadamente não terem o dispositivo de controlo de excesso de carga exigido pelo DL n.º 320/2002, de 28/12, não tendo a autora correspondido à solicitação de apresentação de proposta para os trabalhos necessários à aprovação dos elevadores antes da inspecção, acrescentando que “Desta vossa actuação, decorre a quebra de confiança nos vossos serviços, pelo incumprimento do disposto no n.º 1.3. e no n.º 3.1. do Contrato de Manutenção e Assistência Técnica”.
18. Na sequência dessa comunicação, a autora emitiu e enviou ao réu uma factura datada de 25/10/2007 e com vencimento na mesma data, com referência à “rescisão de contrato referente aos meses de 11/2007 a 02/2011, nos termos da cláusula contratual n.º 5.7.4.”, no valor de 5.114,40€, acrescido de 1.074,02€ de IVA.
19. Por carta datada de 27/11/2007 (junta a fls. 40), o réu reafirma a rescisão contratual unilateral por incumprimento pela autora das cláusulas n.ºs 1.3. e 3.1. do referido acordo e reafirmando entender que a mesma se funda em justa causa, devolve-lhe a factura de 25/10/2007.
20. Por carta datada de 22/01/2008, a autora reenvia ao réu essa factura de 25/10/2007, que este lhe devolve de novo por carta datada de 18/02/2008.
21. Em 15/11/2007 o réu tinha um crédito sobre a autora no valor de 154,71€.
22. Com excepção do número do contrato e da indicação da identificação da subscritora e da indicação “administração do edifício” e morada do réu, bem como das condições específicas, correspondentes à indicação do início de vigência e prazo de validade, ao valor das prestações mensais e ao período de facturação, o conteúdo do referido acordo reconduz-se a “condições gerais” constantes de cláusulas pré-impressas pela autora para utilização em contratos com clientes indeterminados.
II.2 MOTIVAÇÃO DE DIREITO
II.2.1 O tribunal “a quo”, entendendo que o estado dos autos permitia o imediato conhecimento e decisão do mérito da causa na fase de saneamento, nos termos previstos no art.º 510º, n.º 1, b) do CPC, proferiu decisão de mérito nos termos transcritos no relatório.
Sustenta a recorrente que a acção não podia ter sido logo decidida, obrigando à realização prévia do julgamento, para aí se apurarem as versões das partes, por haver “inúmera factualidade para analisar e que é essencial para a descoberta da verdade, como é o caso de, antes de analisar essa cláusula em concreto, ter apreciado se havia - ou não - justa causa para o R. ter posto termo ao contrato”.
No seu entendimento, cabia à recorrida “demonstrar que pôs termo ao contrato com justa causa, e ai a acção terminava nessa parte”. Não o demonstrando, só então se averiguaria se a cláusula penal é nula.
Em face do disposto no artigo 510º do CPC, findos os articulados, se não houver que proceder à convocação da audiência preliminar, o juiz profere despacho saneador [n.º1] destinado a conhecer das excepções dilatórias e nulidades processuais que hajam sido suscitadas pelas partes ou que deva apreciar oficiosamente [al. a)], bem como a “Conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidas deduzidos ou de alguma excepção peremptória” [al. b)].
A estatuição da norma abrange os casos em que a questão seja unicamente de direito, ou simultaneamente de direito e de facto, ou só de facto. Como elucida o Professor Anselmo de Castro, verificada a condição expressa na norma, ou seja, “(..) a de não haver necessidade de prova ou de mais provas, e uma vez que a causa possa terminar por decisão de fundo, não poderá o juiz abster-se de conhecer do pedido” [Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Almedina, Coimbra, 1982, pp. 254].
Não permitindo o estado do processo o conhecimento imediato do mérito da causa, deve o juiz proceder à fixação da base instrutória [art.º 511.º], seleccionando “(..) a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que deva considerar-se controvertida”[n.º1].
Parafraseando o Ac. do STJ de 09-02-2010, relatado pelo Exmo. Conselheiro Alves Velho, na apreciação da questão sob recurso, o que está verdadeiramente em causa é “(..) saber se era possível proferir decisão sobre o mérito da causa no despacho saneador, correspondendo a matéria de facto seleccionada para essa decisão ao critério legal, critério que há-de ser, segundo se crê, o vertido no art. 511º-1 CPC, ou seja, a consideração, na fundamentação de facto da decisão, da matéria de facto relevante, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito” [Proc.º 1176/03.0TCSNT.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase]
Recorrendo de novo à lição do Professor Anselmo de Castro, se a questão é de “direito e de facto, ou só de facto, não poderá o processo também deixar de conter sempre todos os elementos para um decisão conscienciosa; isto é, nunca é possível, em rigor, que subsista qualquer margem de indeterminação a resolver pelo recurso a critérios de oportunidade. Do que se trata é de saber como deve aplicar-se o direito, ou se todos os factos que interessam à sua aplicação estão ou não admitidos por acordo ou já provados – questões em que não pode entrar qualquer margem de discricionariedade, e cuja resolução, estritamente jurídica, como é óbvio, não oferece maior dificuldade neste momento do processo que no final da causa” [Op. Cit., pp. 255].
No caso a recorrente demandou a recorrida com base no incumprimento do contrato celebrado entre ambas, pedindo a condenação desta no pagamento de valores em dívida por serviços prestados no âmbito do mesmo e, também, do montante correspondente à aplicação da cláusula penal prevista no contrato para o caso de incumprimento ou denúncia antecipada pelo cliente.
Por seu turno a recorrida, veio invocar, em primeira linha, não estar vinculada ao contrato; e, para além disso, que se trata de um contrato de adesão, sendo a cláusula penal nula, e que lhe assistiu justa causa na denúncia do contrato.
Por conseguinte, a primeira a questão a apreciar e decidir, porque prejudicial em relação às demais, era a de saber se a recorrida estava ou não vinculada ao contrato.
E, assim o fez o tribunal a quo, concluindo pela afirmativa.
Em face dessa conclusão, as questões que necessariamente teriam que ser apreciadas em seguida, eram as de saber se o contrato era qualificável como contrato de adesão, estando sujeito à disciplina DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, e se a cláusula 5.7.4 é ou não nula.
Só posteriormente, caso se concluísse que a cláusula era válida, é que então faria sentido apreciar a justa causa invocada pela recorrida para denunciar o contrato.
Na verdade, a recorrente parece esquecer que a iniciativa processual foi sua. Foi ela que veio a juízo, sustentada em determinados factos para pretender fazer valer determinado direitos, invocado, nessa causa de pedir complexa, um vínculo contratual incumprido e a existência de uma cláusula penal aplicável nessa situação.
Se a cláusula for nula, como arguido pela recorrida, improcede a pretensão da recorrente sustentada na aplicação da cláusula e, logo, imediatamente fica prejudicada a questão de saber se aquela teve ou não justa causa para denunciar o contrato.
Não faz sentido pretender que primeiro se apreciasse se a recorrida teve ou não justa causa, como se fosse esta que tivesse vindo demandar a recorrente e pedir ao tribunal que declarasse assistir-lhe justa causa para resolver o contrato.
Não é esse o caso, como é evidente.
Sendo certo, por outro lado, que se trata de defesa por excepção peremptória que o juiz deve conhecer imediatamente, desde que o estado do processo o permita, sem necessidade de mais provas [al b), do n.º1 do art.º 510.º].
Foi esse precisamente o percurso da sentença.
Porém, sustenta ainda a recorrente que “há imensa factualidade para analisar e que é essencial para a descoberta da verdade”, nomeadamente, permitindo-lhe “provar que o contrato dos autos foi previamente negociado, o que afastava a sua qualificação como de mero contrato de adesão”.
Acontece que a recorrente não indica qual é então essa “imensa factualidade” que há para analisar, e que o tribunal terá desconsiderado. Com efeito não é feita menção a um único facto material e concreto, susceptível de ser levado à base instrutória, e que sujeito a prova, caso viesse a provar-se, permitisse chegar àquela conclusão.
Mas percebe-se porque não fez essa indicação. Não a fez, simplesmente porque para além dos factos considerados como assentes por acordo das partes e resultantes dos documentos, não existem alegados outros factos materiais e concretos sobre essa questão.
Importando assinalar que as questões apreciadas na sentença, ou seja, as de saber se ao contrato é ou não aplicável a disciplina DL n.º 446/85, de 25 de Outubro e se a cláusula 5.7.4 é ou não nula, foram suscitadas pela recorrida na sua defesa, o que significa que a recorrente ficou ciente de que necessariamente iria ser apreciada e, também, que teve a possibilidade de na resposta à defesa por excepção alegar todos os factos que entendesse relevantes, se porventura existissem.
De resto, não ignorando a recorrente que caso se entendesse aplicável a disciplina do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, e estando em causa saber se a cláusula 5.7.4 é ou não nula - alegando a recorrida que não foi negociada nem lhe foi comunicada - que sobre si recaía o ónus da prova de a mesma ter resultado de negociação prévia entre as partes, bem assim o “ónus da prova da comunicação adequada e efectiva” da cláusula [respectivamente, n.º3, do art.º1.º, e n.º3, do art.º 6.º, daquele diploma].
Como se explica no citado Acórdão do STJ de 09-02-2010, “O critério a utilizar em ordem a ajuizar sobre a possibilidade de conhecimento imediato do mérito da causa, sem necessidade de mais provas, como previsto no referido art. 510º-b) há-de traduzir-se na qualificação jurídica do pedido e dos factos articulados, mormente dos que integram a causa de pedir, ficcionando como provada toda essa factualidade e fazendo repercutir as possíveis qualificações jurídicas por ela comportadas nas pretensões formuladas, na respectiva relação de causa e efeito. Assim, a selecção da matéria relevante e necessária à boa apreciação e decisão da lide, será toda a alegada que contribua para a integração das normas jurídicas susceptíveis de suportarem a procedência do pedido ou, sendo caso disso, de excepção”.
Reportando ao caso, como se disse a ordem lógica de apreciação das questões passava, em primeiro lugar, por saber se a recorrida estava ou não vinculada ao contrato invocado pela recorrente. E, caso assim se concluísse, impunha-se então apreciar se ao mesmo era aplicável a disciplina do DL 446/85, de 25 de Outubro, e se a cláusula 5.7.4 é ou não nula.
Para a apreciação dessas questões foram considerados todos os factos materiais e concretos alegados pelas partes, bem como os documentos juntos, entre eles o contrato, sendo certo que essa matéria não era controvertida e, logo, que podia e devia ser imediatamente considerada assente.
Significa isso que não havia necessidade de produção de prova, na medida em que não existiam sequer outros factos materiais e concretos alegados. Dai que, permitindo o estado do processo o imediato conhecimento do mérito da causa, não poderia o tribunal a quo abster-se de o fazer.
A recorrente invocou ter sido violado, para além do mais, o disposto no n.º2 do art.º 266.º do CPC, mas não concretiza a razão dessa afirmação.
Lê-se nessa disposição que “O juiz pode, em qualquer altura do processo, ouvir as partes, seus representantes ou mandatários judiciais, convidando-os a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinentes, e dando-se conhecimento à outra parte dos resultados da diligência”.
É entendimento pacífico que o princípio da cooperação, expresso no art.º 266º do CPC, é um princípio fundamental do processo civil, preordenado a fomentar a colaboração entre os magistrados, os mandatários e as próprias partes, com vista a obter-se, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio.
Aplicado ao juiz, esse princípio impõe-lhe uma igualdade com as partes e, em simultâneo, uma preocupação séria com o litígio em discussão [cfr. Mariana França Gouveia, Os poderes do juiz na acção declarativa, Julgar, n.º1, 2007, ASJP, pp. 55].
Porém, é também sabido, que esse princípio tem necessariamente que ser compatibilizado com o dever de imparcialidade e com o princípio do dispositivo, do primeiro resultando, desde logo, que o juiz não pode pôr em causa o princípio da igualdade das parte, e do segundo que cabe às partes alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que baseiam as excepções (n.º1 do art.º 264.º do CPC).
No caso em apreço, a recorrente não foi confrontada com uma decisão por iniciativa do tribunal sobre as questões de saber de é aplicável a disciplina do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, e se a cláusula 5.7.4 é ou não nula. Essa questões foram suscitadas pela recorrida em defesa por excepção, foi assegurado o contraditório e a recorrente teve oportunidade de alegar todos os factos materiais e concretos que bem entendesse, sabendo até que, a aplicar-se aqueles regime, sobre ela recaía o ónus de prova sobre a negociação e comunicação da cláusula em questão.
Não se vê, pois, que sobre a Senhora Juíza do tribunal a quo recaísse o dever, ou sequer que se justificasse, de convidar a recorrida a alegar mais factos. São as partes que conhecem o quadro factual de onde emerge o litígio, não cabendo ao juiz, no âmbito princípio da cooperação, perante um quadro factual que pareça desfavorável a uma das partes, e sobre o qual esta já foi chamada a pronunciar-se, questioná-la para verificar se há ou não mais factos que sejam relevantes para a apreciação de determinada questão.
Não há pois qualquer violação dos preceitos legais invocados, na medida em que o Tribunal a quo agiu em conformidade com a lei, nomeadamente a al. b), do n.º1 do art.º 510.º do CPC.
Em conclusão, improcedem as conclusões 7 a 15 e 33 a 41.
II.2.2 O tribunal a quo qualificou o contrato dos autos como um contrato de adesão, sujeito à disciplina do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro, e declarou nula a cláusula 5.7.4 do mesmo.
Insurge-se a recorrente quanto àquela classificação do contrato e decisão sobre a cláusula.
As cláusulas contratuais gerais surgiram nas modernas sociedades técnicas e industrializadas, com a massificação do comércio jurídico, levando a que continuamente, as pessoas celebrem contratos não precedidos de qualquer fase negociatória. Como se pode ler no preâmbulo do DL 446/85, de 25 de Outubro, usualmente conhecido por Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais, “A negociação privada, assente no postulado da igualdade formal das partes, não corresponde muitas vezes, ou mesmo via de regra, ao concreto da vida. (..) A prática jurídico-económica racionalizou-se e especializou-se: as grandes empresas uniformizam os seus contratos, de modo a acelerar as operações necessárias à colocação dos produtos e a planificar, nos diferentes aspectos, as vantagens e as adscrições que lhes advêm do tráfico jurídico.
O fenómeno das cláusulas contratuais gerais fez, em suma, a sua aparição, estendendo-se aos domínios mais diversos. São elaborados, com graus de minúcia variáveis, modelos negociais a que pessoas indeterminadas se limitam a aderir, sem possibilidade de discussão ou de introdução de modificações. Daí que a liberdade contratual se cinja, de facto, ao dilema da aceitação ou rejeição desses esquemas predispostos unilateralmente por entidades sem autoridade pública, mas que desempenham na vida dos particulares um papel do maior relevo” [cfr. Ponto 3].
O reconhecimento dessa nova ordem económica e dos inegáveis benefícios que propícia, mas também de que ela pode conduzir à supressão ou redução da liberdade de negociação, fizeram sentir a necessidade de encontrar mecanismos reguladores jurídicos eficientes para esta realidade do comércio jurídico massificado. Nas palavras do legislador, “As cláusulas contratuais gerais surgem como um instituto à sombra da liberdade contratual” [Cfr. ponto 4].
Como elucida o recente Acórdão do STJ, de 17 de Fevereiro de 2011, relatado pelo Exmo. Conselheiro Távora Víctor, “Assim se explica que os "contratos de adesão", instrumentos reguladores por excelência da massificação, tenham merecido a atenção dos Estados com vista a procurar minorar, tanto quanto possível, as desigualdades provocadas por abusos de regulamentação e capciosidades em consequência do modo como são por vezes intencionalmente redigidos pelos respectivos proponentes. Fruto desta tendência, o DL nº 446/85 de 25 de Outubro, de inspiração germânica, surgiu entre nós como a primeira tentativa de disciplinar as cláusulas contratuais gerais insertas nos contratos – estatuindo que "as cláusulas gerais elaboradas sem prévia negociação individual que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem respectivamente a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente Diploma" – Cfr. artigo 1º nº 1” [ Processo 1458/056.7TBVFR-A.P.S1, em disponível em http://www.dgsi.pt/jstj].
Um dos campos preferenciais de atenção deste Diploma concentra-se nos "contratos de adesão".
Entende-se por contrato de adesão aquele em que um dos contraentes, não tendo participação na preparação das respectivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente, normalmente uma empresa de apreciável dimensão, elaborou e apresenta já impresso, em geral, ao público interessado.
Porém, como se assinala no Acórdão citado, o campo de aplicação do DL 446/85, não se restringe exclusivamente aos denominados “contratos de adesão”, por contraposição aos contratos consensuais, não existindo uma dicotomia absoluta entre uns e outros. O seu âmbito de aplicação abarca também os contratos, «(..) onde a par de cláusulas que se mantêm inalteráveis de contrato para contrato, suportam todavia a inserção de disposições específicas moldadas no interesse das partes e em particular do aderente; são “os contratos de adesão individualizados”, reconhecidos expressamente no artigo 1º nº 2 do citado DL 446/85 (que aliás resulta do nº 2 do artigo 3º da Directiva 93/13/CEE».
Com efeito, o n.º2 do art.º 1.º, estatui que “O presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar”.
A recorrente ao rejeitar que o contrato em causa seja qualificável como contrato de adesão, defende que o mesmo resultou da negociação entre as partes, estando apenas sujeito ao princípio da liberdade contratual, consagrado no art.º 405.º 1, do CC.
Invoca, para tanto, que o contrato se divide em três partes:
- 1.ª página, relativa à identificação dos contraentes;
- as páginas intermédias, onde constam as “Condições Gerais”, que contém o acervo das regras gerais que pautam as relações entre os contraentes, comum a todos os contratos;
- a última página, com as denominadas “Condições Contratuais Específicas”, que incluem as “Condições Particulares”.
Alegando, ainda, que ao cliente assiste o direito de contratar coisa diversa das Condições Gerais e Condições Contratuais Específicas, fazendo inscrever nas condições particulares as derrogações negociadas.
Vejamos agora os factos.
O contrato em causa foi celebrado entre a recorrente, que prossegue a actividade de fornecimento, montagem e conservação de elevadores, com a “administração do Edifício, A/C (..)”, sendo denominado “Contrato …. Controlo OC”, relativo a 2 elevadores instalados no edifício da recorrida, com início de vigência em 01/03/1999 e válido por seis anos (facto 1).
O contrato está junto aos autos, a fls. 127 a 129; e, como afirma a recorrente, é constituído por aquelas 3 distintas partes.
Desse contrato foi entregue ao réu uma cópia [facto 8).
Dele resulta que a recorrente obrigou-se a assegurar a manutenção, conservação e reparação dos elevadores instalados no edifício da recorrida, mediante o pagamento trimestral e antecipado, de prestações mensais, inicialmente com o valor de 17 720$00, acrescido de IVA, anualmente actualizáveis de acordo com os índices de inflação publicados pelo INE (facto 2).
Na parte relativa às condições gerais, na cláusula n.º 5.7.3., prevê-se a prorrogação da sua vigência por períodos iguais ao nele previsto, “desde que não seja denunciado com, pelo menos, 90 dias de antecedência do termo do prazo que então estiver em curso, através de carta registada” (facto 3).
Ainda nas condições gerais, consta, para além de outras, a cláusula n.º 5.7.4, aqui em apreciação, onde se lê: “Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados, é elemento conformante da estrutura empresarial da A , em caso de denúncia antecipada do presente contrato pelo cliente, a A terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente facturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado” (facto 4).
Nas mesmas condições gerais, a cláusula n.º 5.5.2., estabelece o direito da A a indemnização de valor igual ao previsto na citada cláusula 5.7.4., por resolução contratual fundada em incumprimento do contrato por parte do cliente, incluindo por mora no pagamento das prestações do preço (facto 5).
No contrato não consta qualquer cláusula prevendo o direito do cliente a indemnização no caso de denúncia antecipada pela A (facto 6).
Na cláusula n.º 5.6., também das condições gerais, consta que em caso de incumprimento imputável à A, esta “(..) apenas responderá até à concorrência do valor de 3 meses de facturação (…) como máximo de indemnização a pagar ao cliente” (facto 6).
E, finalmente, com excepção do número do contrato e da indicação da identificação da subscritora e da indicação “administração do edifício” e morada do réu, bem como das condições específicas, correspondentes à indicação do início de vigência e prazo de validade, ao valor das prestações mensais e ao período de facturação, o conteúdo do referido acordo reconduz-se à parte “condições gerais”, constantes de cláusulas pré-impressas pela autora para utilização em contratos com clientes indeterminados (facto 25)
Mostra-se ainda pertinente atentar no que é alegado pela própria recorrente, nomeadamente, quando apela à sua estrutura de mais de 600 trabalhadores efectivos, o que significa que é uma grande empresa, dado ter mais de 250 trabalhadores [art.º 100.º n.º1 al. d), do Código do Trabalho]; bem assim quando admite que as condições gerais do contrato em causa são elaboradas previamente e dirigidas à generalidade dos consumidores, embora também alegue que são susceptíveis de derrogação; e, quando alega que tem mais de 25 000 contratos deste tipo activos (ponto 32 das alegações).
Cremos que este quadro é seguramente elucidativo, não permitindo outra conclusão senão a de que ao contrato em causa se aplica com inteira propriedade o regime constante do DL 464/85. Mesmo que possa haver dúvidas em qualificá-lo como um puro contrato de adesão, já pelo contrário não existem quanto a considerar que toda a parte intermédia do contrato, é constituído por cláusulas contratuais gerais, previamente elaboradas e apresentadas aos destinatários, sem que estes as possam influenciar, desse modo consubstanciando um “contrato de adesão individualizado”, a coberto do disposto no n.º2, do art.º 1.º do DL 446/85, com a redacção introduzida pelo DL n º 249/99, de 7 de Julho.
Embora o contrato contenha três partes, das quais duas contém elementos variáveis de caso para caso, a primeira, que apenas se destina à identificação de quem contrata com a recorrente, e a última com as condições específicas, correspondentes à indicação do início de vigência e prazo de validade, ao valor das prestações mensais e ao período de facturação, já no mais, ou seja, toda a parte intermédia, como a própria recorrente reconhece, reconduz-se às “condições gerais”, constantes de cláusulas pré-impressas elaboradas por si para utilização em contratos com clientes indeterminados, que se repetem de caso para caso, na contratação do mesmo tipo de serviços.
E, como se fez notar, pelas próprias palavras da recorrente, estarão nessas condições 25 000 contratos activos.
Importa ter presente, que o artigo 1º nº 3 do DL 446/85, estatui que “O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo”.
Mas a verdade é que essa prova não foi feita pela recorrente, nomeadamente a de que em sede de negociação do contrato tenha sido objecto de apreciação e discussão entre as partes a manutenção ou alteração de qualquer uma das cláusulas constantes naquela parte intermédia, em particular a cláusula penal constante sob o n.º 5.7.4., sendo certo que o interesse era seu, para evitar a aplicação daquele regime legal, como pretende.
Por conseguinte, ao contrato em causa, nomeadamente quanto ao elenco das cláusulas gerais e, particularmente, quanto à cláusula cuja nulidade é arguida, são aplicáveis, para além de outras disposições, mas que aqui não estão em causa, os art.ºs 15.º 16.º e 19.º , deste último constando elencadas, a título exemplificativo, as “Cláusulas relativamente proibidas”.
Foi com base nesta última disposição que a sentença declarou a cláusula 5.7.4 nula, e é contra essa decisão e respectivo fundamento que a recorrente se insurge.
Ao fixar os limites ao conteúdo das cláusulas contratuais gerais, o Dec.-Lei nº 446/85 consagrou a boa-fé como princípio geral de controlo, dispondo no art.º 15.º “São proibidas as cláusulas contratuais gerais contrárias à boa-fé”, para depois o art.º 16.º concretizar o seguinte:
- “Na aplicação da norma anterior devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face da situação considerada, e, especialmente:
a) A confiança suscitada, nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa, pelo processo de formação do contrato singular celebrado, pelo teor deste e ainda por quaisquer outros elementos atendíveis;
b) O objectivo que as partes visam atingir negocialmente, procurando-se a sua efectivação à luz do tipo de contrato utilizado.
Do citado art.º 19.º al.c), resulta serem proibidas, “consoante o quadro negocial padronizado”, as cláusulas contratuais gerais que “Consagrem cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir”.
O apelo ao quadro negocial, significa que a valoração a fazer deverá ter como referência, não o contrato singular ou as circunstâncias do caso, mas o tipo de negócio em causa e os elementos que normativamente o caracterizam, no interior de todo o regulamento contratual genericamente predisposto [Cfr. Ac. STJ de 12-06-2007, proc.º 07A1701, relatado pelo Ex.mo Conselheiro João Camilo, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj].
A cláusula 5.7.4, tem o teor seguinte:
- “Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados, é elemento conformante da dimensão da estrutura empresária da A , em caso de denúncia antecipada do presente contrato pelo Cliente, a A terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente facturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado”.
Segundo o art.º 810.º n.º1 do CC, “As partes podem, porém, fixar por acordo o montante da indemnização exigível: é o que se chama cláusula penal”.
Como elucidam Pires de Lima e Antunes Varela, prevê-se, assim, a possibilidade das partes, por acordo, estipularem o valor o montante da indemnização devida no caso de incumprimento ou mora do devedor ao mesmo tempo que criam ou podem criar um novo modo ou mais eficaz instrumento de pressão sobre o devedor. “O principal objectivo da cláusula penal é evitar dúvidas futuras e litígios entre as partes quanto à determinação do montante da indemnização. Muitas vezes, porém, ela é fixada com o carácter de verdadeira penalidade, ou, ao contrário, com o intuito de pôr um limite à responsabilidade, nos casos em que os danos possam atingir proporções exageradas em relação às previsões normais dos contraentes [Código Civil anotado, Vol.II, 3.ª Ed., Coimbra Editora, 1986, pp. 74].
Nas palavras do Professor Inocêncio Galvão Teles, a cláusula penal “(..) se for de quantitativo apreciável, dá enorme valor prático à obrigação, visto que a mune de sanção certa. Muitas vezes o direito do credor carece de valor efectivo porque a sua violação não causa prejuízos facilmente demonstráveis ou de montante apreciável. Em tais casos o devedor, se não for escrupuloso sentir-se-á tentado a faltar ao cumprimento da obrigação. Não sucederá assim se existir cláusula penal” [Direito das Obrigações, 4.ª Ed., Coimbra Editora, 1982, pp. 353].
Mas se a utilização deste tipo de cláusulas pode ser vantajosa para o credor e para o devedor, como é seu objectivo, a par dessas vantagens comporta também riscos consideráveis para o devedor, sendo das que mais potencialmente se presta à imposição de gravames injustificáveis [Cfr. o citado acórdão de de 12-06-2007].
Justamente para o evitar, importa ter presente que o credor não pode em caso algum exigir uma indemnização que exceda o valor do prejuízo resultante do incumprimento (n.º3 do art.º 811.º, bem assim que é possível a redução equitativa pelo tribunal, quando for manifestamente excessiva (n.º1 do art.º 812.º).
Visa-se, em qualquer dos casos, prevenir e remediar os excessos de fixação do montante da cláusula penal.
Tecendo críticas à redação do n.º3, do art.º 811.º do CC, introduzida pelo DL n.º 262/83, de 16 de Junho, aqueles mesmos autores defendem que “(..) a interpretação conjugada dos dois preceitos (art.º 811.º n.º3 e art.º 812.º n.º 1 e 2), é que o legislador pretendeu admitir a redução equitativa da pena, mesmo no caso de inadimplemento da obrigação, até um valor inferior ao do dano efectivamente sofrido pelo credor” [Op. cit. pp.86].
Não está aqui em causa a redução da cláusula, à luz destas disposições, mas antes e apenas saber se a cláusula é nula, face ao disposto no art.º 19.º al. c), do DL 446/85, porque desproporcionada, ou seja, por impor ao contratante que a ela fica sujeita um sacrifício desproporcionado e injustificado.
Contudo, justifica-se a invocação deste regime, como referência para se determinar se a cláusula em questão é, ou não, desproporcionada, na medida em que o que está em causa no art.º 19.º al. c), é também a desproporção da cláusula, que a verificar-se será proibida, procurando-se assim igualmente evitar que o devedor seja ver sujeito à imposição de uma indemnização injustificada, mas com uma consequência mais gravosa que a redução, solução que se justifica em função de um quadro negocial mais propenso à verificação dessa possibilidade.
Com explicam os Professores Almeida Costa e Menezes Cordeiro, é certo que «(..) o artigo 812º do Código Civil permite que a cláusula pena (rectius, a pena nela prevista) seja judicialmente reduzida de acordo com a equidade». Mas «(..) esta solução, no seu modo de operar, revela-se um tanto incompatível com o tráfico negocial de massas (..). Eis porque a alínea c) proíbe as cláusulas penais excessivas, quando fixadas através do recurso à mera adesão» [Cláusulas Contratuais Gerais. Anotação ao Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, Coimbra, 1990,p. 47].
Como resulta da leitura da cláusula aqui em apreço, a mesma refere-se a uma fixação antecipada do montante de indemnização por danos, exigível em caso de incumprimento do contrato por denúncia antecipada do cliente, mas também em caso de resolução do contrato por parte da A , fundada no “incumprimento do contrato por parte do cliente, incluindo por mora no pagamento das prestações do preço”, conforme decorre da cláusula 5.5.2 (cfr. facto 5).
Alega a recorrente que a finalidade desta cláusula é evitar a discussão sobre os prejuízos da saída precipitada e injustificada de um dado contrato, que levariam anos a demonstrar, definindo-se logo a fórmula do seu cálculo, com vantagens para ambas as partes, pois se o cliente não tem justa causa para o fazer, já sabe que incorre numa sanção predefinida que aceitou ao contratar sem mais discussões, o que também constitui para si uma segurança, evitando que a quantificação dos prejuízos possa constituir uma surpresa.
Por outras palavras, quer a recorrente defender que a cláusula que elaborou para apresentar aos clientes visa apenas a reparação do dano em qualquer um daqueles casos, de modo a evitar litígios quanto à definição do prejuízos, com vantagens mútuas, na medida em o cliente está ciente das consequências do incumprimento e não é surpreendido pelo valor da indemnização.
Vista isoladamente parece ser apenas esse o objectivo da cláusula, tendo também subjacente constituir uma forma de pressão no sentido do cumprimento do contrato pelo cliente.
E, note-se, dizemos apenas pelo “cliente”, já que a mesma cláusula, nos termos do contrato, não tem aplicação à A .
Para o caso de denúncia antecipada por esta, nada está previsto. E, para o caso de incumprimento que lhe seja imputável., nos termos da cláusula 5.6, a A apenas responderá “(..) até à concorrência do valor de 3 meses de facturação (..) como máximo de indemnização a pagar ao cliente” [cfr. facto 6].
Neste quadro, sendo manifesta a desigualdade das consequências para uma e para outra parte, quer em caso de denúncia antecipada quer em caso de incumprimento, é de considerar que para além de definir a indemnização devida pelos prejuízos, a cláusula fixada revela um carácter de verdadeira penalidade.
Vejamos, então, se a cláusula é “desproporciona aos danos a ressarcir”, para tal sendo necessário verificar a que efeitos pode conduzir a sua aplicação.
E, para se fazer essa valoração, como elucida o citado Acórdão do STJ de 12.06.2007, há que estabelecer uma relação entre o montante dos danos a reparar e a pena fixada contratualmente, de modo a que se possa dizer que há uma equivalência entre os dois valores, para tanto atendendo-se não ao caso concreto, mas antes aos danos que “normal e tipicamente resultam, dentro do quadro negocial padronizado, em que o contrato se integra” segundo “critérios objectivos, numa avaliação prospectiva guiada por cálculos de proporcionalidade e valores médios e usuais, tendo em conta factores que, em casos daquele género, habitualmente relevam na produção e na medida dos prejuízos”. Nesse sentido pronuncia-se também o Professor Joaquim de Sousa Ribeiro, aliás, citado no aludido acórdão [Responsabilidade e Garantia em Cláusulas Contratuais Gerais (DL nº 446/85, de 25 de Outubro), Coimbra, Universidade de Coimbra, 1992, pp. 5]
Ainda a este propósito, escreve este mesmo autor «Não é, pois, como no âmbito do art. 812º, ao nível do exercício do direito à pena, tendo em conta o prejuízo real que o facto que fundamenta a sua exigência acarreta para o credor, mas antes ao nível da sua estipulação, e tendo em conta os danos prováveis, que actua a proibição do art.º 19º, al. c)» [Op. cit., pp. 49-50].
Controversa é questão de saber o que se deve entender por “desproporcionada”, na expressão da al. b), do art.º 19.º do DL 446/85, convindo que se tome desde já posição.
No essencial, para uns, a desproporção exigível na al.c), ao contrário da desproporção prevista no art.º 812.º do Código Civil, não tem de ser manifesta, apontando-se como argumento a diferença de redacção dos dois preceitos legais (no art.º 812.º 1, do CC, diz-se manifestamente excessiva, enquanto na al.c) do art.º 19.º, do DL446/85, consta desproporcionada. Para outros, pese embora a diferença de redacção, a desproporção a que se refere a al. c), do art.º 19.º, tem de ser sensível.
Defendendo o primeiro entendimento, o Professor Joaquim de Sousa Ribeiro, escreve «(..) o elemento literal depõe fortemente – há-de convir-se – contra tal interpretação. (..) De facto, representando o art. 19º, al. c), o equivalente funcional, no âmbito das c.c.g., do art. 812º, a lei não reproduz a fórmula aqui utilizada, dispensando o reforço adverbial (“manifestamente”) que nesta norma gradua, de modo explícito, o excesso que justifica a redução da pena. É difícil, nestas condições, deixar de reconhecer à omissão um preciso e intencional valor significante, podendo até sustentar-se que ao texto da lei deverá aqui atribuir-se um peso acrescido em relação ao que normalmente lhe caberia, pelo contraste com o disposto em lugar paralelo tão próximo» [Op. cit., pp. 51].
Acolhendo essa posição, pronunciou-se esta Relação, em Acórdão de 27 de Novembro de 2007 [Proc.º 5424/2007-1, relatado pelo Exmo. Juiz Desembargador Rui Vouga, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrl].
Afirmam o segundo entendimento os Professores de Almeida Costa e Menezes Cordeiro, para os quais «o qualificativo “desproporcionado” não aponta para uma pura e simples superioridade das penas preestabelecidas em relação ao montante dos danos. Pelo contrário, deve entender-se, de harmonia com as exigências do tráfico e segundo um juízo de razoabilidade, que a hipótese em análise só ficará preenchida quando se detectar uma desproporção sensível» [Op. cit., pp.47].
Esse é também o entendimento sufragado no Acórdão do STJ, de 12.06.2007, que se vem citando, onde se escreve o seguinte:
- “É o que resulta, por um lado, da comparação com o conceito de abuso de direito segundo o qual a violação das regras da boa-fé para o instituto funcionar exige que haja uma violação manifesta, sendo que, como dissemos já, a boa-fé está subjacente à introdução das proibições do tipo da aqui em apreço.
Por outro lado a finalidade compulsória inerente à fixação da cláusula penal exige a existência de um certo grau de desproporção, sob pena de inviabilizar os referidos fins compulsórios.
Além disso, estando em causa a regulação do comércio jurídico entre particulares, o princípio da liberdade contratual fixado no art. 405º, nº 1 do Cód. Civil não deve ceder senão quando se levantaram razões com um certo grau de relevância social, o que nos não parece verificar no caso de a cláusula contratual geral apenas permitir uma pequena desproporção entre o dano a reparar e a pena fixada – avaliando o dano em moldes objectivos, como dissemos acima».
Com o devido respeito pelo primeiro dos entendimentos, afiguram-se-nos mais convincentes os argumentos a favor deste último.
Reportando ao caso, como já assinalámos, verifica-se, desde logo, uma manifesta desigualdade entre as posições das partes. Acrescentamos agora, sem que se veja justificação para tal.
Para o cliente, entenda-se um qualquer cliente, a denúncia antecipada ou o incumprimento culposo, aqui aplicável ex vi da clásula 5.5.2, possibilitam à recorrente A accionar a cláusula penal, vendo definida uma indemnização em montante equivalente ao somatório de todas as prestações mensais do preço previsto até ao termo do prazo do contrato.
Já para a A, em caso de denúncia nada está previsto. E, em caso de incumprimento culposo, “apenas responderá até à concorrência de valor de 3 meses de facturação”.
A desigualdade é tão evidente quanto isto: no caso de um cliente vinculado por contratos de 6 anos, como aqui acontece e seguramente não será único naquele universo de 25 000 contratos activos, um cliente que denuncie o contrato, p. ex. a meio da sua vigência, no 36.º mês, ou que por essa mesma altura entre em incumprimento, fica devedor à A pelo valor equivalente ao somatório das prestações mensais que faltam até ao termo do prazo acordado. Em contrapartida, se a A denunciar o contrato, nada está previsto, e se incumprir culposamente, apenas responde até ao limite de três meses de facturação, o que significa, no valor correspondente a 3 prestações mensais.
Ora, salvo melhor opinião, tal só acontece porque, na verdade, a característica que sobressai na cláusula é a de ter em vista a penalização do cliente. Mais do que salvaguardar uma reparação proporcionada do dano, a sua aplicação em concreto conduz a resultados em que ressalta manifestamente o objectivo de penalizar o cliente.
E, se assim é, “dentro do quadro negocial padronizado, em que o contrato se integra”, tal conduz necessariamente a uma desproporção sensível e flagrante entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar, contrariando o princípio da boa-fé consagrado no art.º 15.º do DL 446/85 e sendo proibida nos termos previstos na al. c), do art.º 19.º.
Senão vejamos.
Atendendo ao quadro negocial padronizado em que o contrato se integra, o seu objecto consiste na prestação de serviços de manutenção, conservação e reparação de elevadores, envolvendo a inspecção, limpeza, lubrificação e reparação dos mesmos.
É certo que a prossecução dessa actividade envolve, no essencial, a necessidade de pessoal com formação adequada, de meios logísticos para o deslocar aos locais dos clientes, de material disponível em armazém para as intervenções, de infraestruturas para o efeito e de meios de gestão.
Como já disse antes, a recorrente é uma grande empresa, que segundo alega tem ao seu serviço 600 trabalhadores.
Mas todos aqueles meios e essa dimensão é directamente proporcional ao universo dos seus clientes. Pelas próprias palavras da recorrente, tem 25 000 contratos deste tipo activos.
Para além disso, e não menos importante, não se pode esquecer que a actividade da recorrente não se esgota apenas com a prestação deste tipo de serviços pós montagem. Com efeito, a sua actividade compreende também o fornecimento e montagem de elevadores (facto 1).
Neste quadro, como se refere na sentença, a entrada de um cliente, não significa a necessidade imediata de contratação de mais pessoal, nem de aquisição de material ou equipamentos específicos, nem tão pouco, acrescentamos nós, de alargamento dos meios logísticos, das infraestruturas ou de mais investimentos financeiros. Essas necessidades só se farão sentir com um acréscimo significativo da actividade, ou seja, com um determinado volume de novos clientes.
E, do mesmo modo, como também se diz na sentença, a perda de um cliente, ou o incumprimento por um cliente, não importa para a recorrente a necessidade de dispensa de pessoal ou a perda de utilidade de material ou equipamentos.
É óbvio que exigirá reajustamentos de gestão, mas o próprio mercado tem a sua dinâmica e à perda de um cliente seguir-se-á, normalmente, a angariação de um outro.
Haverá um dano, é indiscutível, mas não se traduzirá seguramente, em regra, num prejuízo equivalente ao valor de todas as prestações correspondentes ao cumprimento integral do contrato, como previsto na cláusula 5.7.4. Assim, nesses casos, a aplicação da cláusula conduzirá sempre a uma sensível superioridade da indemnização em relação ao montante dos danos normalmente previsíveis.
Na verdade, não se vislumbra qualquer razão válida e razoável para justificar essa cláusula, de cuja aplicação resulta uma indemnização variável, com o limite apenas definido pelo período temporal do vínculo contratual, o qual que pode ir, p. ex., até 72 prestações mensais, num contrato de seis anos, como é o aqui em presença.
Para mais quando em contraponto, no caso da recorrente A, em qualquer caso, a indemnização não excederá 3 prestações mensais.
Em suma, tal como se concluiu na sentença recorrida, a cláusula 5.7.4 é proibida nos termos previstos na al. c) do art.º 19.º, porque desproporcionada, importando tal a sua nulidade, conforme disposto no art.º 12.º, ambos do DL n.º 446/85.
Por conseguinte, não se reconhece razão à recorrente, inexistindo fundamento para revogar a sentença.
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Tendo-se concluído no sentido da improcedência do recurso fica prejudicada a apreciação da questão suscitada pela recorrida, nos termos do disposto no art.º 684.º-A, nº1 do CPC.
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Considerando o disposto no art.º 446.º n.ºs 1 e 2, do CPC, a responsabilidade pelas custas recai sobre a recorrente, que atento o decaimento a elas deu causa.

III. Decisão
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, mantendo-se integralmente a decisão recorrida.
Custas em ambas as instâncias pela recorrente.

Lisboa, 1 de Março de 2012

Jerónimo Freitas (Relator)
Fernanda Isabel Pereira (1.ª Adjunta)
Maria Manuela Gomes (2.ª Adjunta)