Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1249/08.3PTLSB.L1-5
Relator: JOSÉ ADRIANO
Descritores: JUSTO IMPEDIMENTO
PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/14/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: Tendo o arguido estado presente na audiência de julgamento e pedido dispensa de comparecer na data designada para leitura da sentença, ocorrendo esta leitura na data marcada, com presença da sua defensora, o facto do arguido se encontrar em prisão domiciliária à ordem de outro processo e alegar não lhe ter sido possível contactar a sua defensora, nem obter autorização para se deslocar ao escritório desta, não constitui justo impedimento da apresentação tempestiva do recurso.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na 5.ª Secção (Criminal) da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO:
1. Após julgamento perante tribunal singular, que teve lugar no 3.º Juízo Criminal de Lisboa, foi proferida sentença em 1 de Julho de 2011[1], na qual, com relevância para o presente recurso, foi decidido:
“ … condenar o arguido A... pela prática, em autoria material, de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos artigos 217°, n.° 1 e 318.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão;

Julgo o pedido de indemnização civil parcialmente procedente, por parcialmente provado, e em consequência, condeno também o arguido/demandado A... a pagar à demandante cível B... a título de danos patrimoniais, a quantia de € 9.001,75 acrescida dos juros (civis) de mora à taxa legal aplicável, desde a data da  n otificação do pedido até integral pagamento e a quantia de € 1500,00 a título de danos morais.
…”

Em 26/09/2011 veio o arguido requerer a prorrogação do prazo para interposição do recurso, por mais 30 dias, invocando que se encontra em prisão domiciliária à ordem de outro processo, não lhe tendo sido possível contactar a sua defensora oficiosa nem obter autorização para se deslocar ao escritório desta.

Foi então proferido o seguinte despacho, em 29/09/2011, conhecendo daquela pretensão:
Requerimento de fls. 229:
Mediante o aludido requerimento, entrado em juízo no dia 26.09.2011, veio o arguido, com os fundamentos aí expostos que aqui se dão por reproduzidos, requer a prorrogação do prazo para interposição do recurso, por mais 30 dias e que seja conferida à sua defensora a confiança do processo.
Decidindo.
Compulsados os autos, verifica-se que a audiência de julgamento teve lugar na presença do arguido, conforme se extrai das respectivas actas, sendo absolutamente indiferente o facto de este ter estado ausente na leitura – o que, de resto, teve origem no seu pedido de dispensa –, onde esteve presente a sua ilustre defensora.
Assim sendo, como decorre do disposto nos art.s 333º, n.º 5, a contrario, e 373º, n.º 3, ambos do CPP, o arguido considera-se notificado da sentença na pessoa do seu defensor.
Dispõe o art. 411º, nº 1 do mesmo diploma legal que: “O prazo para a interposição do recurso é de 20 dias e conta-se:
(…)
b) tratando-se de sentença, do respectivo depósito na secretaria.
Compulsados os autos verifica-se que a sentença proferida no dia 1.07.2011 foi depositada nesse mesmo dia, da qual a ilustre defensora do arguido foi notificada no acto, pelo que o prazo de interposição do recurso terminou no dia 6 de Setembro de 2011, com a possibilidade, cumpridos os requisitos do art. 145º, n.º 6 do CPC, de ter sido apresentado até ao dia 9.09.2011.
Do exposto, deriva-se de imediato que o prazo de interposição de recurso (mesmo que se considerasse o prazo mais alargado do n.º 4 do citado art. 411º do CPP) há muito decorreu, pelo que nada há a prorrogar, porquanto não se pode prorrogar aquilo que já não existe.
Em conformidade, por falta de fundamento legal, indefere-se a prorrogação do prazo para interposição do recurso.
Custas do incidente que fixo em 2 UC’s.
….”

Não se conformando com tal decisão, recorreu o arguido para este Tribunal, assim concluindo:
1. O princípio geral da admissibilidade de recurso em processo penal é expressamente previsto no art. 399° do CPP foi violado como adiante se verá.
2. Com o presente recurso visa-se alcançar uma decisão que reconheça, ao recorrente, ter ocorrido um justo impedimento para recurso da decisão final, justo impedimento esse só veio a cessar no dia 20-09-2011, data em que o ora recorrente teve conhecimento efectivo do teor da sentença final.
3. O requerimento de prorrogação de prazo foi tempestivamente apresentado atento o disposto no n.° 9 do art. 113° do CPP.
4. Ainda que por hipótese de trabalho se considere que a prorrogação de prazo não era de conceder, a verdade é que ao contrário do decidido no despacho recorrido, ainda não se tinha verificado a caducidade do direito de recorrer da sentença final condenatória.
5. Como atrás se disse o recorrente só teve conhecimento da sentença condenatória final no dia 20.09.2011, tendo requerido prorrogação de prazo atempadamente, atento o disposto no n.° 9 do art. 113° do CPP.
6. Ainda que se considere que o que ora se traz aos autos não configure a situação prevista no n.° 6 do art. 107° do CPP, teria que haver lugar a um despacho de reconhecimento da invocada situação de justo impedimento atento o disposto no art. 399° do CPP que é uma das "mediações semânticas" do disposto no n.º 1 do art° 32 da CRP.
7. Só com a entrada em Tribunal do requerimento em que, bem ou mal, se pediu a prorrogação do prazo para interposição do recurso estava o tribunal a quo em condições de conhecer ainda que oficiosamente, da invocada situação de justo impedimento. Por isso,
8. Mal ajuizou o tribunal a quo ao julgar ter caducado o direito a recorrer atento o disposto no n.º 5 do art. 107° do CPP.
9. Acresce ainda o facto de não ser lógico nem razoável sustentar que o arguido, de forma intencional, deixou correr o prazo para recorrer da decisão que lhe veio aplicar 2 anos de prisão efectiva, estando a mesma como está assente em factos que ele não reconhece de maneira nenhuma o que bem se alcança do teor da sentença condenatória que alude a declarações de arguido "previamente ensaiadas/preparadas".
10. Pelo que, reitera-se, o silêncio por parte do arguido ficou a dever-se única e exclusivamente ao facto de este não ter tido, por circunstâncias às quais foi alheio, acesso à sentença e ainda ao facto de não lhe ter sido materialmente possível estabelecer contacto com a sua defensora de molde a ser-lhe transmitido o teor da decisão condenatória.
11. A impossibilidade de estabelecer contacto com a sua defensora, ora signatária deveu-se ao facto de não lhe ter sido entregue a documentação que tinha em seu poder na altura em que estava preso no EPL e onde se encontravam escritos os contactos (nome e telefone) da sua defensora.
12. Com efeito, desde o momento em que foi realizada a l.ª sessão de julgamento até à presente data, o arguido tem alternado entre a situação de privação de liberdade em estabelecimento prisional (no Estabelecimento Prisional de Lisboa) e a de prisão domiciliária;
13. Não foi possível estabelecer qualquer contacto entre o arguido e a sua defensora oficiosa desde a data em que ambos estiveram presentes na 1.ª sessão de julgamento;
      Termos em que se requer V. Exªs. considerem procedente e provado o presente recurso e que em consequência:
a) Se ordene em Acórdão a revogação do despacho recorrido a substituir por Acórdão em que se decrete que no caso dos autos o arguido esteve em situação de justo impedimento;
b) Cumulativamente e em conformidade, que o ora recorrente ainda está em tempo de recorrer começando o prazo, para o efeito, a partir da notificação do Acórdão que irá recair sobre o presente recurso.”

Respondeu o Ministério Público, concluindo do seguinte modo:
1. A decisão recorrida não padece de qualquer vício;
2. Bem andou a Mma. Juiz a quo ao ter indeferido o requerimento do arguido;
3. A Defensora do arguido foi indicada pela Ordem dos Advogados e nomeada nessa qualidade, no despacho de fls. 102 (despacho de acusação) e desde aí que tem vindo a acompanhar sempre o arguido ao longo de todo o processo, designadamente, representou-o em sede de audiência de discussão e julgamento (cfr. fls. 189) e posteriormente, aquando da leitura da sentença (cfr. fls. 214), por este ter requerido a sua dispensa;
4. Dispõe o art. 107 °, n.° 2, do Código de Processo Penal que "os actos processuais só podem ser praticados fora dos prazos estabelecidos por lei, por despacho da autoridade referida no número anterior, a requerimento do interessado e ouvidos os outros sujeitos processuais a quem o caso respeitar, desde que se prove justo impedimento;
5. Em consonância, dispõe o art. 146.°, n.° 1, do Código de Processo Civil que "considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários que obste à prática atempada do acto" (sublinhado nosso, sendo que onde se lê mandatário, deve também entender-se, a figura do Defensor em processo penal);
6. A alegada impossibilidade de contacto entre o arguido e a sua Defensora, pelos motivos invocados, de ter o arguido perdido o contacto da mesma, não cabe na figura do justo impedimento, mas somente numa absoluta inércia, que agora se pretende colmatar.
         Termos em que deve, em nosso entender, ser negado provimento ao recurso do arguido e ser mantido o despacho nos seus precisos termos.

Admitido o recurso e subidos os autos, neste Tribunal e na “vista” a que se refere o art. 416.º, do CPP, a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

Cumprido o art. 417.º, n.º 2, do CPP, nada mais acrescentou o recorrente.
Efectuado o exame preliminar e obtidos os necessários vistos, foram os autos à conferência, cumprindo decidir.
***

II – FUNDAMENTAÇÃO:
1. Conforme Jurisprudência uniforme nos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelos recorrentes a partir da respectiva motivação que fixam o objecto do recurso, sem prejuízo da apreciação de outras questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
Tem o presente recurso por objecto saber se ocorreu algum facto susceptível de ser considerado justo impedimento, que tenha impossibilitado o arguido de interpor recurso da sentença condenatória no prazo legal fixado no art. 411.º, do CPP.

2. Apreciando:
Nos termos do disposto no art. 107.º, n.º 2, do CPP, os actos processuais só podem ser praticados fora dos prazos estabelecidos por lei, por despacho da autoridade judiciária, a requerimento do interessado e ouvidos os outros sujeitos processuais a quem o caso respeitar, desde que se prove justo impedimento.
O requerimento em que este é invocado deve ser apresentado no prazo de três dias contado do termo do prazo legalmente fixado ou da cessação do impedimento (n.º 3, do mesmo artigo).
O justo impedimento constitui uma verdadeira derrogação da regra da extinção do direito de praticar um acto pelo decurso de um prazo peremptório. O prazo para recorrer de uma decisão judicial tem natureza peremptória e o decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto, nos termos do n.º 3 do art. 145.º, do CPC. “O acto poderá, porém, ser praticado fora do prazo em caso de justo impedimento, nos termos regulados no artigo seguinte” (n.º 4, da mesma norma).
Serve assim de válvula de escape ao sistema decorrente da extinção do direito de praticar o acto na sequência do decurso do prazo peremptório (António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Liv. Almedina, Coimbra – 1997, págs. 76- 77).
Nos termos do n.º 1 do art.º 146.º, do CPC, “Considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto”.
O conceito de justo impedimento assim configurado é bastante mais vasto do que o contido neste mesmo artigo na redacção antes da reforma de 1995.
À data da referida reforma introduzida pelo DL n.º 329-A/95 de 12/12, só era considerado justo impedimento o evento imprevisível (“normalmente imprevisível”, dizia a lei) estranho à vontade da parte que a impossibilitasse de praticar o acto por si ou por mandatário, o que levava a doutrina a restringir a respectiva previsão legal àquelas hipóteses em que «a pessoa que devia praticar o acto foi colocada na impossibilidade absoluta de o fazer, por si ou por mandatário, em virtude da ocorrência de um facto, independente da sua vontade, e que um cuidado e diligências normais não fariam prever» (cfr. RODRIGUES BASTOS, Notas ao CPC, 1°-321).
Com a Reforma do Código do Processo Civil introduzida pelo aludido DL n.º 329-A/95 “flexibiliza-se a definição conceitual de «justo impedimento» em termos de permitir a uma jurisprudência criativa uma elaboração, densificação e concretização, centradas essencialmente na ideia da culpa, que se afastou da excessiva rigidificação que muitas decisões, proferidas com base na definição constante da lei em vigor, inquestionavelmente revelam” – Vd. Relatório do referido Decreto-Lei.
O novo conceito de justo impedimento faz apelo, em derradeira análise, ao «meio termo» de que falava Vaz Serra (RLJ, 109.°-267): deve exigir-se às partes que procedam com a diligência normal, mas já não é de lhes exigir que entrem em linha de conta com factos e circunstâncias excepcionais.
A esse «meio termo» também já se referiu a nossa jurisprudência nomeadamente no Ac. RL de 22.03.2000 cujo sumário está disponível in www.dgsi.pt, “o justo impedimento só se verifica quando a pessoa que devia praticar o acto foi colocada na impossibilidade absoluta de o praticar, por si ou por mandatário, em virtude da ocorrência de um facto independente da sua vontade e que um cuidado e diligências normais não fariam prever”.
“Não basta que se trate de um evento não previsto pela parte, nem se exige que se trate de um evento totalmente imprevisível. O aceitável é o meio termo, devendo exigir-se às partes que procedam com a diligência normal, mas já não sendo de exigir-lhes que entrem na linha de conta com factos ou circunstâncias excepcionais” (neste mesmo sentido ver, ainda, os Ac. RL de 13.04.99 e RG de 23.06.2004, ambos in www.dgsi.pt.)
Segundo J. Lebre de Freitas (in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. 1º, págs 257 e 258, citado no Ac. RL de 4.11.2004 in www.dgsi.pt), a nova redacção introduzida no n.º 1 do art.º 146.º visou a “flexibilização de modo a permitir abarcar situações em que a omissão ou o retardamento da parte se haja devido a motivos justificados ou desculpáveis que não envolvam culpa ou negligência séria”. Daí que, “à sua luz, basta para que estejamos perante o justo impedimento, que o facto obstacularizador da prática do acto não seja imputável à parte ou ao mandatário, por ter tido culpa na sua produção. Tal não obsta à possibilidade de a parte ou o mandatário ter tido participação na ocorrência, desde que, nos termos gerais, tal não envolva um juízo de censurabilidade”.
“Passa assim o núcleo do conceito de justo impedimento da normal imprevisibilidade do acontecimento para a sua não imputabilidade à parte ou ao mandatário… cabendo à parte que não praticou o acto alegar e provar a sua falta de culpa”.
”Deixou, portanto a lei de fazer qualquer exigência a respeito da normal imprevisibilidade do evento, estranho à vontade da parte, para se centrar apenas na não imputabilidade à parte nem aos seus representantes ou mandatários pela ocorrência do obstáculo que impediu a prática do acto”.
Sobre o novo conceito de justo impedimento, escreveu-se ainda no Acórdão do S.T.J., de 17-07-02, P° 1.088, da 3ª Secção: ”É certo que actualmente, à luz do Art.° 146º, n.° 1, do CPC (…) o que releva decisivamente para a sua verificação, mais do que a ocorrência de um evento totalmente imprevisível ou em absoluto impeditivo, é que o evento que impediu a prática atempada do acto não seja imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, ou seja, que inexista culpa do sujeito requerente do acto, ou de seu representante ou mandatário, culpa essa a valorar “em consonância com o critério geral estabelecido no n.° 2 do Art.° 487.° do CC, e sem prejuízo do especial dever de diligencia e organização que recai sobre os profissionais do foro no acompanhamento das causas”.
De tudo isto resulta que um evento previsível pode agora excluir a imputabilidade do atraso ou da omissão.
Contudo a parte interessada não pode beneficiar da excepcionalidade do conceito de justo impedimento quando tenha havido da sua parte negligência, culpa ou imprevidência. Se o evento era susceptível de previsão e ela se não acautelou contra a possibilidade da sua verificação, “sibi imputet”.
No que concerne à culpa, tal como na responsabilidade contratual, a mesma não tem de ser provada, cabendo à parte que não praticou o acto alegar e provar a sua falta de culpa, isto é, a ocorrência de caso fortuito ou de força maior impeditivo (cfr. Art.º 146.º n.º 2 do CPC “a parte que alegar justo impedimento oferecerá logo a respectiva prova..” e art.º 799.º n.º 1 do C. Civil): “embora não esteja em causa o cumprimento de deveres, mas a observância de ónus processuais, a distribuição do ónus da prova põe-se nos mesmos termos” – Acórdão da Relação de Guimarães de 23.06.2004 in www.dgsi.pt
Ainda a propósito da culpa, Lopes do Rego refere que, decisivo para a verificação do justo impedimento é a inexistência de culpa da parte, seu representante ou mandatário no excedimento ou ultrapassagem do prazo peremptório, sem prejuízo do especial dever de diligência e de organização que recai sobre os profissionais do foro no acompanhamento das suas causas (Lopes do Rego, “Comentários ao Código de Processo Civil”, Almedina, pág. 125, citado no acórdão da RL de 4.11.2004).
Pode ler-se, a propósito da mesma temática, no Ac. do STJ de 9/7/91 (Proc. 488/91): “Quem alegue o justo impedimento terá que alegar, também, a sua impossibilidade de comunicação à parte, mandatário, ou outro advogado a quem fosse cometido o encargo de efectuar, imediatamente, a diligência em causa.
Em sintonia com a jurisprudência que julgamos unânime neste ponto, entendemos que, embora o actual art. 146º nº 1 do C.P.Civil o não diga expressamente, à semelhança do que aí se estatuía na anterior redacção, para que ocorra justo impedimento é necessário que, em consequência do obstáculo, o acto não possa ser praticado por mandatário. Tratando-se de não entrega de motivação de recurso, por não ter sido tempestivamente feita, terá de alegar-se e provar-se que não pudera ser feita por outro advogado.
Assim, não se verificará justo impedimento se, apesar de um acontecimento, normalmente imprevisível, houver possibilidades, usando a diligência normal, de o acto ser praticado pela parte ou pelo mandatário. O mesmo é dizer, se puder ser praticado por outro advogado, no qual possa substabelecer o mandatário impedido ou que a parte possa entretanto mandatar para o efeito.
Dito isto, vejamos o caso dos autos.
O arguido esteve presente na audiência de julgamento, tendo pedido dispensa de comparecer na data designada para leitura da sentença (cfr. acta de fls. 189 a 191).
Esta leitura teve lugar na data designada – 1/07/2011 – na presença da defensora do arguido (Dr.ª ...), que acompanhou o processo desde a acusação.
Nos termos do disposto no art. 373.º, n.º 3, do CPP, o arguido considera-se notificado da sentença, após a leitura desta, ainda que ausente no acto.
Consequentemente, o prazo para recurso inicia-se com o respectivo depósito, ocorrido nesse mesmo dia 1/07/2011, por força do art. 411.º, n.º 1 al. b), do CPP.
Daí que, o prazo de 20 dias – art. 411.º, n.º 1 – esgotou-se em 6/09 e o de 30 dias – n.º 4 do mesmo normativo – completou-se em 16/09, sendo certo que em ambos os caso disporia o recorrente de mais três dias úteis para a prática do acto (com o que passaria para 9/9 e 21/9, respectivamente, o termo do prazo), pagando o recorrente a respectiva multa prevista no art. 107.º-A, do CPP.
Em 6/9/2011, o arguido apresentou em tribunal um primeiro requerimento pedindo que lhe fosse enviado o contacto da sua advogada e informando da nova morada em que “deve ser notificado da sentença do presente processo, quando esta for proferida”. Nesse requerimento não invocou, todavia, qualquer impedimento para interpor recurso.
Porém, como muito bem sabia o arguido, a sentença já tinha sido lida no dia 1/7/2011, data designada para o efeito e da qual foi pessoalmente notificado, pedindo logo dispensa de comparência, que lhe foi concedida.
Por outro lado, conforme já salientámos supra, o arguido não tinha de ser posteriormente notificado das sentença, pois já fora notificado da mesma na pessoa da sua defensora na data da sua leitura, como muito bem refere a juíza do processo no seu despacho de fls. 224.
Apesar disso, foi satisfeita a pretensão do arguido, tendo-lhe sido enviada cópia da sentença e tendo sido informado do contacto da sua defensora (por carta remetida a 16/9/2011 – fls. 227 – para a morada por ele indicada). Tentado o contacto telefónico com o arguido nessa mesma data (16/09/2011), foi o mesmo infrutífero, tendo sido deixada mensagem com a indicação da morada e contactos telefónicos da sua defensora (fls. 228)
Veio então, apenas em 26/09/2011, em requerimento subscrito pela ilustre defensora oficiosa, pedir a prorrogação do prazo para recorrer (de pelo menos mais 30 dias), invocando que só então o arguido e a sua defensora conseguiram entrar em contacto.
Obviamente que a situação descrita não configura qualquer justo impedimento, pois nem o arguido esteve impossibilitado de contactar a sua defensora em data oportuna, ou seja, durante o prazo normal para recorrer – bastava, nomeadamente, ter contactado o tribunal mais cedo (pois esteve desde 1/7 até 6/9 sem o fazer), para pedir os contactos que nesta última data solicitou –, nem a respectiva defensora esteve impossibilitada de contactar o arguido naquele longo período de 1/7 a 21/9/2011 (último dia para interposição de recurso, com multa, ao abrigo do n.º 4 do art. 411.º), tanto mais que este nem sequer estava em liberdade, tendo passado, em 24/6/2011, da situação de detido no EP para a de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica (cfr. fls. 197), informação que constava dos autos mesmo antes da sessão do julgamento em que ocorreu a leitura da sentença.
O que nos conduz à conclusão de que o evento que foi invocado como causa impeditiva da prática atempada do acto (interposição de recurso), é-lhe inteiramente imputável, decorre da sua manifesta falta de diligência.
Consequentemente, porque não houve qualquer facto ou circunstância, não imputável ao arguido ou à sua defensora, que tenha obstado à prática tempestiva do acto que ora se pretende praticar fora de prazo, não podia o tribunal a quo ter reconhecido a existência de justo impedimento.
Daí que, seja de confirmar o despacho recorrido que decidiu pela não prorrogação de um prazo que há muito se extinguira.

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III – DECISÃO:
Pelas razões e nos termos acima expostos, julga-se improcedente o presente recurso do arguido A..., confirmando-se o despacho recorrido.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em três (3) UC.
Notifique.

Lisboa, 14 de Fevereiro de 2012

Relator: José Adriano;
Adjunto: Vieira Lamim;
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[1]  Na mesma data depositada.