Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3420/05.0TVLSB.L1-1
Relator: JOÃO AVEIRO PEREIRA
Descritores: EMPREITADA
INCUMPRIMENTO
CUMPRIMENTO DEFEITUOSO
CLÁUSULA MORATÓRIA
CADUCIDADE
EXCEPÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO
ABUSO DE DIREITO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/02/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I – Numa empreitada, haverá incumprimento parcial se a obra apresentar desconformidades quantitativas, ou seja, se a parte em falta tiver uma função própria, autónoma ou individualizada em relação ao todo complexo dessa obra.
II – Mas já ocorrerá cumprimento defeituoso se as desconformidades forem qualitativas, havendo discordâncias em relação ao plano acordado, imperfeições que excluam ou reduzam o valor da obra ou a sua aptidão para o fim a que foi destinada.
III – A partir do reconhecimento de defeitos pelo empreiteiro, disponibilizando-se este para os reparar, o dono da obra fica sem interesse em agir devido à atitude colaborante daquele.
IV - Mas quando o empreiteiro comunica ao dono da obra que já reparou todos os defeitos e que não efectuará mais nenhum trabalho, então, a partir desse momento e dessa posição definida, este pode exercer o seu direito de reclamar em juízo a reparação de defeitos que entenda persistirem e, por conseguinte, começa também a correr o respectivo prazo de caducidade.
V – A cláusula penal moratória tem a natureza de indemnização e, por isso, não deixa de estar sujeita ao prazo de caducidade do direito de reparação dos defeitos da obra, de redução do preço ou de indemnização.
VI – O êxito da invocação do meio de defesa de efeito transitório, em que se traduz a excepção de não cumprimento do contrato, está dependente do accionamento tempestivo dos meios de defesa definitivos, isto é, do exercício em prazo dos direitos do dono da obra decorrentes do cumprimento defeituoso.
VII – Só existe abuso do direito se houver direito. Não é este o caso quando o empreiteiro factura trabalhos que acordara com o dono da obra não facturar, pois aqui o que há é uma violação do acordo e uma ausência de direito.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes na 1.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – Relatório
“A” – CONSTRUÇÃO, LDA., com sede na Travessa da ..., n.º 7 – r/c frente, 0000-000, intentou a presente acção declarativa de condenação, em processo ordinário, contra “B”, DESIGN – DECORAÇÕES E ARTES PLÁSTICAS, LDA., com sede na ..., n.º , 0000-000 Lisboa, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe as quantias de € 15.671,35, de capital, e de € 1.145,75 de juros de mora vencidos, mais os vincendos até integral pagamento.
A ré excepcionou o não cumprimento do contrato e o abuso do direito, reconveio pedindo uma indemnização por atraso da Autora no cumprimento do contrato e impugnou os factos e a pretensão desta, concluindo pela procedência das excepções e da reconvenção, bem como pela improcedência da acção (fls. 55-80).
A A. replicou, defendendo a improcedência das excepções e da reconvenção e a procedência da acção (95-131).
Após a audiência, foi a acção julgada improcedente, com absolvição da Ré do pedido, e procedente em parte a reconvenção, tendo a A. sido condenada a pagar à Ré a quantia de € 7.500,00 e absolvida quanto ao mais.
Inconformada, a A. apelou e concluiu textualmente o seguinte:
A. No entender da Apelante – reiterando sempre o devido respeito por opinião contrária – a apreciação dos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas quer pela Apelante, quer pela Apelada deverá conduzir a entendimento diverso do manifestado na douta sentença a quo relativamente aos artigos 12, 13, 14, 15, 20, 21, 22, 26, 31, 32, 35, 36. 43, 52, 60, 68, 69 e 72 da base instrutória (correspondentes aos pontos 30, 31, 32, 33, 38, 39, 40, 44, 49, 50, 53, 54, 57, 62, 69, 73 e 76 da fundamentação de facto), tanto pelo respectivo teor, pelas ligações à apelada, pela razão de ciência e pela postura que os mesmos claramente evidenciam, como pela inexistência de acervo documental nos autos que os suportem.
B. No que concerne ao entendimento constante na douta sentença relativamente aos artigos 12.º, 13º, 14.º e 15º da base instrutória (correspondentes aos ponto 30º, 31.º, 32.º e 33.º da fundamentação da douta sentença), que da apreciação do depoimento da testemunha “C”, que contraria o depoimento prestado por “D”, cujo interesse pessoal e directo na causa é bem patente, a matéria de facto deles constante deveria ter sido dada como NÃO PROVADA.
C. Relativamente ao entendimento constante na douta sentença relativamente aos artigos 20.º, 21.º e 23.º da base instrutória (correspondente aos pontos 38, 39 e 40 da fundamentação da douta sentença), saliente-se que tendo em atenção os depoimentos das testemunhas “C”, “E” e “F”, bem como as fragilidades do depoimento da testemunha “D”, a matéria de facto deles constante deveria ter sido dada como NÃO PROVADA.
D. No que respeita ao entendimento constante na douta sentença relativamente ao artigo 26.º da base instrutória (correspondente ao ponto 44 da fundamentação da douta sentença), entende a Apelante que a matéria em causa NÃO PODERIA TER SIDO DADA COMO PROVADA, uma vez que o que resulta do depoimento da testemunha “D” não se pode retirar que a obra não estava acabada naquela data, mas apenas que subsistiam alguns vícios a rectificar, que não impediam que a obra fosse dada por concluída.
E. No que respeita ao entendimento constante na douta sentença relativamente ao artigo 43.º da base instrutória (correspondente ao ponto 57 da fundamentação da douta sentença), entende a Apelante, atento o depoimento da Testemunha “D”, a resposta adequada à matéria aí quesitada seria a seguinte: "Provado que a 22 de Março de 2004 apenas estavam por rectificar/executar os seguintes trabalhos: pedra da aduela da montra; acabamento da parede de água, limpeza geral dos aparelhos de iluminação, caixilhos, montras e portas; lavagem dos exteriores das fachadas e azulejos na casa de banho.'
F. No que respeita ao entendimento constante na douta sentença relativamente ao artigo 31.º e 52.º da base instrutória (correspondente aos pontos 49 e 62 da fundamentação da douta sentença), entende a Apelante, que apreciação dos depoimentos das testemunhas “G” e “E”, em patente contradição com o depoimento da testemunha “D”, impõe que a matéria de facto aí constante deveria ter sido dada como NÃO PROVADA.
G. No que respeita ao entendimento constante na douta sentença relativamente ao artigo 32.º da base instrutória (correspondente ao ponto 50 da fundamentação da douta sentença), entende a Apelante, não consta dos autos qualquer suporte probatório que permita concluir que o valor dos trabalhos não executados é superior ao valor da factura peticionado pela Apelante, pelo que o mesmo deveria ter sido considerado NÃO PROVADO, por inexistência de prova.
H. No que respeita ao entendimento constante na douta sentença relativamente ao artigo 35.º da base instrutória (correspondente ao ponto 53 da fundamentação da douta sentença), entende a Apelante, atento da apreciação depoimento da Testemunha “D” e do Documento n.º 5 anexo à Petição inicial, a resposta _adequada à matéria aí quesitada seria a seguinte: Provado apenas que os trabalhos de rebaixamento do piso, assentamento de pavimento na mezanine e partes eléctricas seriam debitados .”
I. No que respeita ao entendimento constante na douta sentença relativamente ao artigo 36.º da base instrutória (correspondente ao ponto 54 da fundamentação da douta sentença), entende a Apelante, não existir qualquer suporte probatório que permita concluir a existência de um saldo credor a favor da Apelada decorrente da compensação entre os trabalhos a mais e os trabalhos a menos, pois o doc. 3 anexo à contestação não só não tem qualquer validade formal, como o seu conteúdo é contraditado pela matéria dada como provada no ponto 69 da fundamentação de facto, pelo que o mesmo deveria ter sido considerado NÃO PROVADO, por inexistência de prova.
J. No que respeita ao entendimento constante na douta sentença relativamente ao artigo 69.º da base instrutória, considerando não provado, entende a Apelante, a matéria de facto constante do referido artigo 69º deveria ter sido dada como PROVADA, uma vez que a Apelada não logrou fazer prova de qualquer outra comunicação de defeitos para além da lista data de 20 de Março de 2004 e da carta datada de 15 de Julho de 2004, a qual não se pode considerar uma verdadeira comunicação de defeitos por não especificar o que quer que seja.
K. No que respeita ao entendimento constante na douta sentença relativamente ao artigo 68.º e 72.º da base instrutória (correspondente aos pontos 73 e 76 da fundamentação da douta sentença), entende a Apelante, que face ao tipo de pavimento inicialmente acordado e aos termos em que foi solicitada a execução de determinado acabamento, conforme resulta da apreciação dos depoimentos das testemunhas “G” e “D”, entende a Apelante que as matérias quesitadas nos artigo 68.º e 72.º da base instrutória deveriam ter sido consideradas PROVADAS, nos precisos termos em que se encontravam redigidas.
L. No entendimento da recorrente, o enquadramento jurídico dos factos considerados provados na douta sentença não foi o mais adequado in casu.
M. A douta sentença padece do vício de nulidade previsto na al. d) do artigo 668.º do CPC porquanto, o Meritíssimo a quo não se pronunciou sobre a excepção de caducidade alegada pela Apelante na réplica
N. Atendendo a que desde a data em que a Apelante deu por concluídos os trabalhos, a Apelada não logrou denunciar quaisquer outros defeitos da obra, nem intentou qualquer acção judicial destinada ao exercício dos direitos conferidos no prazo de um ano, estará impedida de exercer os direitos supra referidos, por caducidade.
O. Mesmo que por mera hipótese de raciocínio se admitisse que houve incumprimento da Apelante (não conclusão da obra/não eliminação dos defeitos), sem todavia conceder, não assiste razão à Apelada, sendo infundada a excepção de não cumprimento invocada.
P. A excepção de não cumprimento do contrato consubstancia uma recusa temporária ou um retardamento da prestação, mas não extingue essa obrigação, pelo que, no caso sub judice, a apelada apenas estaria legitimada a recusar o pagamento da última tranche do valor da obra enquanto, e apenas e só, a Apelante não se dispusesse a rectificar/eliminar os defeitos alegadamente existentes.
Q. Entende ainda a Apelante que, apesar de julgar procedente a excepção, a douta sentença não poderia em caso algum absolver a Apelada do pedido, mas sim apenas relegar a obrigação de pagamento da prestação em falta para um momento ulterior, isto é, para o momento em que a Apelante providenciar a eliminação dos defeitos da obra.
R. Atento o prazo já decorrido entre a data de conclusão dos trabalhos e a presente data, bem como o estado actual das relações entre as partes e a quebra mútua de confiança, poder-se-á inferir com segurança que já nenhuma das partes terá interesse na prestação em falta, pelo que, a alegada mora da Apelante ter-se-á por convertida em incumprimento definitivo.
S. Tendo os trabalhos sido executados e grande parte dos defeitos eliminados, assistirá à Apelante o direito a ser remunerada, uma vez que a obra serve o fim a que se destinou.
T. Neste caso, não tendo sido alegadamente eliminados todos os defeitos, a Apelada apenas poderá exigir a redução do preço da obra, na proporção do valor dos defeitos que alegadamente não foram corrigidos/eliminados.
U. Não pode nunca recusar o pagamento integral da factura correspondente a 20% do preço da empreitada, nem dos trabalhos extra, porquanto os trabalhos por executar/rectificar serão de valor inferior. Caso contrário, estaremos perante um enriquecimento sem causa, injustificado, da Apelada expensas da Apelante.
V. Com o devido respeito, o Meritíssimo Juiz a quo não poderia ter julgado procedente a excepção de não cumprimento invocada pela Apelada, nem tão pouco absolvido a mesma do pedido formulado pela Apelante.
W. Não pode também proceder a excepção de abuso de direito deduzida pela Apelada.
X. Para se poder falar em abuso de direito seria necessário demonstrar que a Apelante actuou no sentido de criar na Apelada uma legítima expectativa de que os trabalhos extra executados não importariam qualquer encargo para a Apelada, pelo que a exigência posterior do pagamento dos mesmos consubstanciaria uma clara injustiça.
Y. A actuação da Apelante não contrariou qualquer expectativa, legítima ou ilegítima, criada pela Apelada, pois a Apelada estava consciente de que os trabalhos extra que excedessem o valor dos trabalhos não executados teriam de ser facturados e pagos à Apelante, bem como os trabalhos extra cujo pagamento foi expressamente acordado (ver matéria de facto dada como provada no ponto 53) da fundamentação de facto da douta sentença e que corresponde ao artigo 35Q da Base Instrutória).
Z. A Apelante limitou-se a facturar os trabalhos extras nos precisos termos acordados com a Apelada, ou seja, deduziu ao valor dos trabalhos extra, o valor dos trabalhos a menos (não realizados), conforme nota descritiva que fez acompanhar as facturas A55 e A 56. Esta nota descritiva foi remetida à Apelada a 2 de Abril de 2004 (vide Doc. 4 anexo à petição inicial), muito antes da factura.
AA. A Apelada deduziu ao valor dos trabalhos extra o custo dos trabalhos que deixaram de ser executados. A saber: Portas basculantes do balcão (€ 560,00) (vide Doc. 5 fls. 1 anexo à petição inicial) e escada amovível do atelier (€ 590,00) (vide Doc. 5 fls. 1 anexo à petição inicial).
BB. O valor peticionado pela Apelante a título de trabalhos extra resulta já efectivamente da compensação efectuada com o valor de trabalhos a menos, pelo que a Apelante não contrariou de forma alguma o acordado com a Apelada.
CC. A Apelada invocou que saldo entre os trabalhos a mais e os trabalhos a menos é-lhe favorável em cerca de € 867,00, tendo para o efeito junto aos autos um quadro excel feito pela própria, sem conhecimento ou acordo da Apelante, no qual faz constar uma listagem (incorrecta) de trabalhos executados e não executados e atribui valores que supostamente corresponderão ao respectivo custo.
DD. Mas tal lista, impugnada pela Apelante e por carecer de valor probatório, não foi corroborada na íntegra pela prova testemunhal produzida em audiência, nem por qualquer outro meio de prova.
EE. Da matéria de facto dada como provada (vide ponto 69) da fundamentação de facto da douta sentença) resulta a execução de trabalhos extra que a Apelada “omitiu" nesta mesma listagem – a saber: 1) portas de correr em inox para debaixo da bancada da parede de fundo, atrás do balcão; 2) Fornecimento e montagem da bancada de inox para o balcão; 3) Maior valia do custo da sanita (superior ao valor orçamentado, por escolha da Apelada); 4) Fornecimento e montagem do termoacumulador e 5) Fornecimento de uma armadura Luminestra 8W e um interruptor para o armário no escritório.
FF. Face ao exposto, constata-se que a actuação da Apelante foi consonante com o que havia acordado com a Apelada, que sabia que tinha que pagar alguns trabalhos extra conforme já referido, pelo que não estão verificados os pressupostos do abuso de direito, pelo que não pode proceder a excepção de abuso de direito invocada pela Apelada.
GG. Caso assim não se entenda, diga-se ainda que, resulta do ponto 53 da fundamentação de facto que a Apelada se obrigou ao pagamento destes trabalhos, os quais foram executados pela Apelante e que não constavam do orçamento inicial, a saber:
a) Rebaixamento do pavimento da loja, no valor de € 500,00 + IVA (vide doc. 7 fls. 6 da Petição inicial).
b) O assentamento de pavimento na mezanine, no valor de € 270,00 + IVA (vide doc. 7, fls. 6 da Petição inicial)
c) As partes eléctricas, no valor de € 1.100,75, IVA incluído (vide doc. 7 fls. 5 e factura n.º A 56 junta aos autos como Doc. 9 da Petição Inicial).
HH. Pelo que a Apelada deveria ter sido condenada, pelo menos, no pagamento da factura n.2 A 56 datada de 10/02/2005 (junta aos autos como Doc. 9 da Petição Inicial), no valor de € 1.100, 75 e no pagamento parcial (€770 + IVA) da factura n.º A 55 datada de 11/02/2005 (junta aos autos como doc. 8 da Petição Inicial), referentes aos trabalhos extra acordados e atrás referidos, já que a própria Apelada confessa que se havia obrigado a pagar esses mesmos trabalhos.
II. Estamos perante um enriquecimento injustificado da Apelada, uma vez que está a beneficiar do trabalho realizado e a retirar utilidade do mesmo sem despender qualquer quantia, a expensas e em prejuízo do património da Apelante, que está desembolsada desta quantia desde a data da execução dos trabalhos, por ter pago já esses trabalhos aos subcontratados.
JJ. Em face do exposto, deve a douta sentença ser alterada em conformidade, condenando-se a Apelada, pelo menos, no pagamento dos trabalhos extra sobre os quais houve acordo expresso de pagamento e orçamentação prévia.
KK. Entende a Apelante que não pode proceder o pedido reconvencional de pagamento da cláusula moratória deduzido pela Apelada.
LL. O Meritíssimo Juiz a quo entendeu que a Apelante se encontra numa situação de mora por não ter concluído a totalidade das obras, pelo que julgou parcialmente procedente o pedido reconvencional e, nessa medida, condenou a Apelante a pagar à Apelada a quantia de € 7.500,00, a título de cláusula penal.
MM. A proposta de empreitada previa efectivamente o pagamento de uma multa no valor de € 250,00 por cada dia de atraso na conclusão dos trabalhos, o que consubstancia uma cláusula penal moratória destinada a sancionar a mora ou o retardamento no cumprimento do contrato.
NN. A fixação desta cláusula no contrato de empreitada visava acautelar o atraso na entrega da obra, no sentido da sua disponibilidade para o fim económico a que se destinava.
OO. A obra, iniciada a 22 de Janeiro de 2004, tinha como data para a respectiva conclusão o dia 5 de Março do mesmo ano, mas por vicissitudes várias, apenas foi concluída e entregue pela Apelante a 20 de Março de 2004.
PP. Contrariamente ao entendimento do Meritíssimo Juiz a quo a Apelante não se encontra numa situação de mora até à presente data, já que a Apelante deu por concluídos os trabalhos a 20 de Março de 2004, tenho a loja sido aberta ao público a 24 de Março de 2004, data a partir da qual se tem mantido ininterruptamente em funcionamento e no exercício da actividade comercial até à presente data.
QQ. Não podemos, portanto, falar aqui no atraso da entrega da obra. Quanto muito, poderemos estar perante uma situação de execução defeituosa ou cumprimento defeituoso da obra, uma vez que segundo a Apelada subsistirão alguns vícios que não foram eliminados pela Apelante.
RR. Foi dado como provado (vide pontos 22, 23 e 24 da fundamentação de facto) que a calendarização inicial da obra que determinou a fixação da data de conclusão para o dia 5 de Março de 2004, foi efectuada apenas e só com base no projecto inicial da obra facultado pela Apelada, não tendo sido considerados os timings necessários para a execução dos diversos trabalhos extra e alterações quer aos trabalhos orçamentados, quer aos próprios trabalhos extra, que entretanto foram solicitados pela Apelada no decurso da obra.
SS. A execução desses trabalhos obrigou a um protelamento do prazo de execução da obra, pelo que a eventual responsabilidade pelo atraso verificado não poderá ser imputada à Apelante, pelo que não assiste à Apelada o direito de reclamar o pagamento da cláusula penal.
TT. Ainda que assim não fosse, sempre se diria que a haver um atraso, apenas se poderia contabilizar até ao dia 20 de Março de 2004, data da conclusão dos trabalhos por parte da Apelante, ou seja, 15 dias de atraso. Desta forma, o valor a pagar pela Apelante a título de cláusula penal nunca poderia exceder os € 3.750,00.
UU. Ademais, e ainda que assim não fosse, sucede que a Apelada deixou caducar o direito de reclamar o pagamento da cláusula penal moratória.
VV. É entendido pela jurisprudência que `(..), revestindo a cláusula penal a modalidade de cláusula moratória, constata-se que a mesma se destina a substituir a indemnização que seria estipulada ao abrigo daquele art. 1223 °. do Código Civil, pelo que também ela está sujeita ao prazo de caducidade estabelecido no art.º 1224.º do mesmo Código. Logo, o direito ao pagamento da cláusula penal, deveria ter sido exercido e judicialmente exigido no prazo de um ano, a contar da data da recepção da obra, (4 pelo que há muito caducou tal direito.' In Acórdão da Relação de Lisboa de 10-04-2008. www.dasi.pt
WW. A Apelada elaborou uma lista a 20 de Março de 2004, dando conta dos trabalhos alegadamente mal executados ou por executar, os quais quase todos rectificados/executados entre o dia 20 e o dia 22 de Março de 2004.
XX. A Apelada dirigiu ainda a 15 de Julho de 2004, uma carta à Apelante na qual invocava existência de defeitos na obra, mas sem especificar quais.
YY. Depois disso não são conhecidas quaisquer outras comunicações, verbais ou escritas, nem a Apelada logrou fazer prova da sua existência.
ZZ. Os defeitos apontados nos presentes autos pela Apelada (vide ponto 49 da fundamentação de facto) são todos visíveis e facilmente detectáveis, pelo que foram forçosamente conhecidos, no mais tardar, na data do início de laboração da loja.
AAA. Da documentação junta aos autos, conclui-se, portanto, que a última comunicação sobre alegados defeitos data de 15 de Julho de 2004 (isto presumindo que se tratava de uma verdadeira comunicação de defeitos, pois já vimos que não pode ser entendida como tal), o que significa que a Apelada dispunha do prazo de um ano - ou seja até 15 de Julho de 2005 - para exercer os direitos constantes do artigo 1223º do Código Civil, ou seja, para exercer o direito e exigir judicialmente o pagamento da cláusula moratória.
BBB. O pedido reconvencional deu entrada em juízo no dia 23 de Setembro de 2005, pelo que havia já caducado esse direito
CCC. Pelo que deve a Apelante ser absolvida do pedido reconvencional de pagamento da cláusula penal moratória.
DDD. Finaliza a Apelante de que por todo o exposto, a Douta sentença Recorrida, além de incorrer em erro na decisão proferida sobre a matéria de facto, violou ainda o disposto nos art.ºs 158º, 653º, n.º 2. e 655, do C.P.C. e ainda os art.ºs 1220º a 1225º do C. Civil
Nestes termos e nos demais de Direito, requer-se seja concedido provimento ao presente recurso, com todas as legais consequências, mormente a revogação da douta sentença proferida nos presentes autos.
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A Ré contra-alegou e concluiu que a sentença não merece qualquer reparo, devendo ser confirmada.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir as seguintes questões que emergem das conclusões da recorrente:
1) se os art.ºs 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 20.º, 21.º, 22.º, 23.º, 26.º, 31.º, 32.º, 35.º, 36.º, 43.º, 52.º, 60.º, 68.º, 69.º e 72.º da b.i. merecem respostas diferentes das que lhes foram dadas;
2) se houve omissão de pronúncia sobre a caducidade alegada pela A. na réplica;
3) se existe caducidade a impedir a Ré de exercer os seus direitos relativos a defeitos da obra;
4) se houve enriquecimento sem causa com a recusa da ré de, ao abrigo da excepção de não cumprimento, pagar 20% do preço da empreitada, que só legitima o retardamento da prestação;
5) do abuso do direito;
6) se a apelada deveria ter sido condenada, pelo menos, no pagamento da factura n.º A56, doc. 9 da p.i., sob pena de enriquecimento injusto.
7) se deve proceder o pedido reconvencional de pagamento da cláusula penal moratória (concl. KK e segs.);
8) se caducou o direito de reclamar a cláusula penal.
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Por se tratar de matéria de facto, cuja solução que vier a merecer pode implicar a alteração da lista infra de factos provados, impõe-se conhecer desde já da primeira questão, sobre o acerto ou não das respostas impugnadas.
Passa-se, pois, a apreciar os pontos impugnados, reexaminados que foram, nesta segunda instância, os meios de prova constantes dos autos, incluindo os depoimentos gravados (alguns transcritos pela A.), e especialmente os das testemunhas em que a A. se funda para pôr em causa a matéria facto.

A - Nos quesitos 12.º, 13.º, 14.º e 15.º da b.i., perguntava-se:
12.º O mobiliário, os azulejos, interruptores e tomadas eléctricas foram encomendadas tardiamente?
13.º O que determinou que a ré tenha sido forçada a aceitar soluções alternativas em termos de colocação dos materiais inicialmente previstos?
14.º Pois os fornecedores daqueles materiais não foram atempadamente contactados para terem disponíveis os produtos pretendidos, por forma a que a obra fosse concluída dentro do prazo?
15.º As tomadas e interruptores de luz tiveram que ser substituídos por tomadas e interruptores de plástico da marca G..., que são de qualidade e preço inferior aos inicialmente previstos?
Cada uma destas perguntas recebeu como resposta: Provado.
- Dos depoimentos das testemunhas “C”, electricista (que nem sequer foi indicado para depor a estes quatro quesitos) e “D”, director comercial e sócio da ré, bem como dos restantes dados do processo, não resulta qualquer fundamento suficiente para alterar as respostas dadas a tais quesitos.

B - Nos quesitos 20.º, 21.º e 23.º da b.i. pretendia-se apurar se:
20.º O que traduziu uma simplificação da obra, que permitiu encurtar o respectivo prazo de execução em uma semana? Provado.
21.º As restantes alterações solicitadas foram de mero pormenor, do tipo colocação de interruptores de luz a determinada altura do solo em vez de os colocar na altura prevista no projecto inicial? Provado.
22.º Sem qualquer significado em termos de tempo de execução da obra?
A este último quesito foi respondido:
Provado apenas que as alterações solicitadas não tinham qualquer significado em termos de tempo de execução de obra”.
- Também da prova dos autos, designadamente dos depoimentos das testemunhas “C” (que também não foi indicado para depor a estes quesitos), “E”, que executou trabalhos de serralharia na loja em causa, e “F”, autora do projecto de arquitectura da mesma loja, em confronto com os restantes elementos, não se encontram razões suficientes para modificar as respostas dadas a estes três quesitos.

C - O quesito 26.º da b.i. perguntava: A loja abriu ao público com a obra inacabada?
Resposta: “Provado que a loja abriu em 24 de Março de 2004 com a obra inacabada”
No quesito 43.º da b.i. pretendia-se saber se:
No dia 22 de Março, o Eng.º “D”, sócio da ré, conferiu com o Sr. “G” a lista elaborada no dia 20 de Março de 2004, constatando que estavam executados todos os trabalhos nela constantes?
Foi dada a seguinte resposta restritiva:
Provado apenas que no dia 22 de Março, o Eng.º “D” com o Sr. “G” conferiu a lista elaborada no dia 20 de Março de 2004, constatando que estavam executados todos os trabalhos nela constantes.
- Da prova testemunhal produzida em audiência, particularmente dos depoimentos de “G”, “E”, “D”, que responderam a toda a matéria da base instrutória, e “F”, arquitecta, em confronto com os restantes elementos dos autos, não se mostram minimamente abaladas as respostas dadas, pelo que inexiste fundamento para a sua alteração. Muito menos no sentido proposto pela recorrente, na sua conclusão E.

D - Nos art.º 31.º da b.i. pretende-se saber se:
Até à presente data, não foram realizados pela autora os seguintes trabalhos:
- Móvel por baixo do lavatório do WC;
- Colocação de chapa de aço escovado na parede por cima da cuba do ateliê;
- Colocação do sistema de exaustão do WC;
- Colocação dos sistemas de abertura / fecho tiquetaque nas tampas dos quadros;
- Colocação de todas as partes de serralharia previstas na listagem em aço inox escovado, pois, o que foi provisoriamente aplicado é em aço inox polido;
- Colocação de bancada em aço inox escovado, tendo sido colocada provisoriamente uma bancada, entregue no dia 14 de Março de 2004, que não está à medida e que ficou de ser substituída; e
- Colocação de rodízios nas portas metálicas de correr, faltando os rodízios em todas as portas?
A resposta a este quesito foi: Provado.
Os elementos probatórios constantes dos autos, especialmente os depoimentos das testemunhas ouvidas a este quesito – “H”, carpinteiro, “E”, serralheiro, “D” e “G”, empresário de construção civil, neste caso subempreiteiro da A., e a arquitecta “F” – não autorizam a modificação da resposta dada.

E - Art.º 52.º da b.i.: No dia 15 de Março foi colocada uma bancada de aço inox escovado com tampo e cuba na loja? Resposta: Provado.
Tal como no quesito anterior – e perante os testemunhos prestados, especialmente os de “G”, “E” e “D” - também em relação a este quesito não se justifica qualquer alteração da resposta dada.

F - O quesito 32.º é do seguinte teor:
Os trabalhos não realizados têm um valor superior ao da factura cuja cobrança a A. pretende? Resposta: Provado.
No quesito 35.º perguntava-se se:
De todos os trabalhos extra realizados foi acordado que apenas seriam debitados o rebaixamento do pavimento da loja; o assentamento de pavimento na mezzanine e as partes eléctricas? Resposta: Provado.
Os testemunhos produzidos – designadamente os de “G” e “D” – sustentam estas respostas positivas, pelo que são de manter.

G - No quesito 36.º perguntava-se se:
O saldo entre trabalhos a mais e trabalhos a menos é favorável à ré, pela quantia de € 867,00? Resposta: Provado.
Nos art.ºs 68.º, 69.º e 72.º da b.i., estava em causa saber se:
Art.º 68.º: Tendo este (afagamento mecânico do pavimento da loja) sido solicitado pela ré já no decurso dos trabalhos de afagamento manual?
Resposta: “provado apenas que este solicitado pela ré já no decurso dos trabalhos de afagamento manual, já que o que estava a ser executado não correspondia ao pretendido e ao que havia sido solicitado e aceite pela autora”.
Art.º 69.º: A ré não denunciou à autora quaisquer defeitos nos 30 dias seguintes ao seu conhecimento?
Resposta: Não provado.
Art.º 72.º: Estava prevista a execução de um pavimento em betonilha na loja e no ateliê, mas o pavimento do ateliê foi executado em betão e o da loja em micro-betão, o que obrigou a dois rebaixamentos do piso?
Resposta: “provado apenas que estava prevista a execução de um pavimento em betonilha na loja e no ateliê, mas o pavimento deste último foi executado em betão e o da loja em microbetão devido à má execução em betonilha por parte da autora, o que obrigou a dois rebaixamentos do piso”
Da documentação junta e dos testemunhos prestados em audiência – nomeadamente os de “G”, “E” e “D” – resultam acertadas as repostas dadas a todos estes quatro quesitos.
Nesta conformidade, improcede totalmente a impugnação da matéria de facto apresentada pela Recorrente.
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II – Fundamentação
A – Factos provados.
1) A autora dedica-se à actividade de construção civil, fiscalização e coordenação de obras (cfr. alínea A) da matéria de Facto Assente).
2) No exercício da sua actividade, a autora foi contactada pela ré para a realização de obras de remodelação na loja que possui, denominada "“I”", sito na ..., n.° , em Lisboa, onde exerce a actividade de florista (cfr. alínea B) da matéria de Facto Assente).
3) A loja referida em 2) foi adquirida pela ré, através de contrato de locação financeira celebrado com o “BANCO”, para substituir um espaço arrendado onde anteriormente funcionava o seu estabelecimento comercial, sito na Rua ..., em Lisboa (cfr. alínea C) da matéria de Facto Assente).
4) Na sequência do contacto referido em 2), a autora apresentou à ré, a 13 de Janeiro de 2004, uma proposta de orçamento para a empreitada de construção civil, estrutura metálica, carpintarias, águas, esgotos e instalações eléctricas, conforme os projectos fornecidos pela ré (cfr. alínea D) da matéria de Facto Assente).
5) A lista de trabalhos a efectuar consta do documento, denominado «PROPOSTA PARA A EMPREITADA DE REMODELAÇÃO LOJA "“I”" ...,– LISBOA», que consta de fls. 10 a 18 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. alínea E) da matéria de Facto Assente).
6) Adquirida a loja da ... e adjudicada a obra à autora, foi rescindido o arrendamento da Rua ... com efeitos a partir de finais de Março de 2004 (cfr. alínea F) da matéria dc Facto Assente).
7) Posteriormente, na sequência de uma reunião realizada no dia 17 de Janeiro de 2004 e do fornecimento de novos elementos por parte da R. e alterações, a proposta apresentada pela autora e referida em 4) e 5) foi objecto de duas revisões relativamente ao preço e prazos de execução: uma datada de 20 de Janeiro, que consta de fls. 19 a 22 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e outra, datada de 21 de Janeiro de 2004, a qual consta de fls. 23 a 25 dos autos e cujo teor aqui se dá, igualmente, por integralmente reproduzido (cfr. alínea G) da matéria de Facto Assente).
8) A ré aceitou a proposta datada de 21 de Janeiro de 2004, tendo ficado acordado o preço global de € 38.121, acrescido de IVA à taxa legal (cfr. alínea II) da matéria de Facto Assente).
9) Os trabalhos a realizar eram os constantes da lista referida em 5), com as alterações constantes das revisões das propostas (cfr. alínea I) da matéria dc Facto Assente).
10) Ficou acordado que o preço global seria liquidado da seguinte forma:
- 40%, ou seja, € 15.248.40 + IVA, com o início da obra;
- 40%, ou seja, € 15.248,40 + IVA, a 20 de Fevereiro de 2004;
- 20%, ou seja, € 7.624,20 + IVA, com a conclusão da obra (cfr. alínea J) da matéria de Facto Assente).
11) O prazo previsto para a conclusão da obra foi 5 de Março de 2004 (cfr. alínea E) da matéria de Facto Assente).
12) O prazo acordado para a conclusão da obra na ..., 5 de Março de 2004, acautelou o tempo necessário para mudanças e instalação do novo espaço, para que a loja não parasse de funcionar, condição que foi essencial para a adjudicação da obra e dela foi dado conhecimento à autora, que a aceitou (cfr. alínea M) da matéria de Facto Assente).
13) A conclusão da obra antes do prazo conferiria à autora direito a um prémio de € 150/dia, e no caso de se verificar um atraso na entrega da mesma, constitui-la-ia na obrigação de pagar uma multa de € 250/dia (cfr. alínea N) da matéria de Facto Assente).
14) A loja da ré foi aberta ao público no dia 24 de Março de 2004 (cfr. alínea O) da matéria de Facto Assente).
15) A autora emitiu a factura n.º A40 no valor de € 9.072,80, datada de 25 de Maio de 2004, da qual se encontra cópia de fls. correspondente ao valor dos últimos 20% do preço, a qual foi remetida à ré, juntamente com listagens de trabalhos extra e de alterações, tudo nos termos dos documentos que constam de fls. 29 a 32 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. alínea P) da matéria de Facto Assente).
16) A factura e listagens referidas em 15) foram devolvidas à autora pela ré, por carta datada de 15 de Julho de 2004, a qual se encontra a fls. 33-34 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. alínea Q) da matéria de Facto Assente).
17) A autora enviou à ré, que a recebeu, a carta que consta de fls. 43 dos autos, acompanhada das facturas n.°s A55 e A56, de 11 de Fevereiro de 2005, no valor total de € 6.518,58, aí mencionadas, que não foram pagas pela ré (cfr. alínea R) da matéria de Facto Assente).
18) A autora remeteu à ré, datada de 27 de Julho de 2004, por esta recebida, a carta cuja cópia consta de fls. 47 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. alínea S) da matéria de Facto Assente).
19) Após 20 de Março de 2004, foram efectuadas algumas reparações e/ou retoques pela autora, em horário acordado com a ré e fora do expediente da loja (cfr. alínea T) da matéria de Facto Assente).
20) No dia 20 de Março de 2004, a ré entregou ao representante da autora, Sr. “G”, a lista junta a fls. 89 a 91, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (cfr. Alínea U) da matéria de Facto Assente).
21) A autora iniciou os trabalhos a 22 de Janeiro de 2004 e deu-os por concluídos em 20 de Março de 2004 (cfr. resposta dada ao artigo 1) da Base Instrutória).
22) Para além dos trabalhos extra, a ré solicitou alterações quer aos trabalhos inicialmente acordados, quer aos próprios trabalhos extra (cfr. resposta dada ao artigo 3) da Base 1nstrutória).
23) A fixação da data de conclusão referida em 11) resultou de uma calendarização e planificação da obra que teve por base — apenas e só a listagem de trabalhos constantes do projecto inicial de obra (cfr. resposta dada ao artigo 4) da Base Instrutória).
24) A realização dos trabalhos extra e das alterações introduzidas ao projecto inicial não foram consideradas, nem incluídas na planificação inicial da obra (cfr. resposta dada ao artigo 5) da Base Instrutória).
25) A obra iniciou-se uma semana após a adjudicação (cfr. resposta dada ao artigo 7) da Base Instrutória).
26) A obra decorreu com normalidade durante as duas primeiras semanas e, a partir daí, esteve quase parada durante cerca de três semanas, com apenas um ou dois trabalhadores na obra (cfr. resposta dada ao artigo 8) da Base Instrutória).
27) Após muitas insistências junto ao gerente da autora, a obra veio a retomar o seu ritmo normal (cfr. resposta dada ao artigo 9) da Base Instrutória).
28) A obra foi executada a um ritmo incerto (cfr. resposta dada ao artigo 10) da Base 1nstrutória).
29) (...) Tendo a maior parte dos trabalhos sido executados sem qualquer planificação e estudo prévio (cfr. resposta dada ao artigo 11) da Base Instrutória).
30) Os azulejos, interruptores e tomadas eléctricas foram encomendados tardiamente (cfr. resposta dada ao artigo 12) da Base Instrutória).
31) (...) O que determinou que a ré tenha sido forçada a aceitar soluções alternativas em termos de colocação dos materiais inicialmente previstos (cfr. resposta dada ao artigo 13) da Base Instrutória.
32) (...) Pois, os fornecedores daqueles materiais não foram atempadamente contactados para terem disponíveis os produtos pretendidos, para que a obra fosse concluída dentro do prazo (cfr. resposta dada ao artigo 14) da Base Instrutória).
33) As tomadas e interruptores de luz tiveram que ser substituídos por tomadas e interruptores de plástico da marca G..., que são de qualidade e preço inferior aos inicialmente previstos (cfr. resposta dada ao artigo 15) da Base Instrutória).
34) (...) O que não originou qualquer redução do preço da obra (cfr. resposta dada ao artigo 16) da Base Instrutória).
35) A cerca de um mês da data prevista para a conclusão dos trabalhos o gerente da autora deixou de acompanhar a obra, continuando lá o Sr. “G” (cfr. resposta dada ao artigo 17) da Base Instrutória).
36) O gerente da autora faltou às reuniões agendadas com os representantes da ré para acertar pormenores da conclusão da obra. quer não comparecendo, quer chegando atrasado e dessa forma inviabilizando essas mesmas reuniões (cfr. resposta dada ao artigo 18) da Base Instrutória).
37) A principal alteração ao projecto inicial da obra consistiu em suprimir-se a execução do piso suspenso, dada a complexidade técnica de tal trabalho (cfr. resposta dada ao artigo 19) da Base Instrutória).
38) (...) O que se traduziu numa simplificação da obra, que permitiu encurtar o respectivo prazo de execução em uma semana (cfr. resposta dada ao artigo 20) da Base Instrutória).
39) As restantes alterações solicitadas foram de mero pormenor, do tipo colocação de interruptores de luz a determinada altura do solo em vez de os colocar na altura prevista no projecto inicial, com excepção do rebaixamento do pavimento da loja, a substituição do piso da mesazzine por madeira (cfr. resposta dada ao artigo 21) da Base Instrutória).
40) As alterações solicitadas não tinham qualquer significado em termos de tempo de execução de obra (cfr. resposta dada ao artigo 22) da Base Instrutória).
41) A autora deu os trabalhos por concluídos no dia 20 de Março de 2004 com a obra incompleta (cfr. resposta dada ao artigo 23) da Base Instrutória).
42) Em 20 de Março de 2004, foi feita uma conferência dos trabalhos efectivamente executados e daqueles que ficaram por executar, tendo sido elaborada a lista manuscrita que consta de fls. 89 a 91 dos autos, com a discriminação dos trabalhos não executados ou inacabados, que foi assinada pelo Sr. “G”, encarregado da autora (cfr. resposta dada ao artigo 24) da Base Instrutória).
43) (...) Tendo ficado então assente que estavam por executar ou por concluir, entre outros, os seguintes trabalhos:

Afagamento e envernizamento do chão;

- Remates do soalho junto às paredes:

- Acabamento da aduela da montra a estuque;
Pintura e remate no embutimento das guardas e limpeza das mesmas;

- Guardas das escadas;

- Limpeza do pilar;
- Acabamento das pinturas gerais:

Porta do contador da água nas escadas;
Acabamento da parede onde foi colocado o detector de presença de intrusão;
Acabamento dos rodapés;
Acabamento da sapata do pilar:
Remate do pladur nos locais onde foi embutida iluminação;

- Alhetas do tecto por baixo da mezanine e junto ao pilar:

- Acabamento do espelho de água;

- Pedra da aduela da montra:

- Acabamento da parede de água;
- Acabamento do tanque do balcão;
- Limpeza geral dos aparelhos de iluminação e caixilhos de montras e portas;
- Acabamento do remate do rebaixe para o tapete da loja;
- Lavagem exterior de fachadas e colagem das pastilhas; e
- Acabamentos do WC: aro da porta e azulejos e colocação de louças (cfr. resposta dada ao artigo 25) da Base Instrutória).
44) A loja abriu em 24 de Março de 2004 com a obra inacabada (cfr. resposta dada ao artigo 26) da Base Instrutória).
45) Foi então acordado entre a autora e a ré que os trabalhos em falta e os inacabados iriam sendo executados e concluídos fora do horário de funcionamento da loja, tendo para tal as partes combinado os domingos (cfr. resposta dada ao artigo 27) da Base Instrutória).
46) A autora emitiu a factura cita em P) no dia 25 de Maio de 2004 (cfr. resposta dada ao artigo 28) da Base Instrutória).
47) Nos três Domingos seguintes à data da abertura da loja estiveram presentes no local os gerentes da ré, pelas 8 horas da manhã, de acordo com combinação prévia com o encarregado da autora, para acabamento dos trabalhos (cfr. resposta dada ao artigo 29) da Base Instrutória).
48) (...) Mas, ninguém apareceu na loja à hora combinada e só ao final da manhã e, por uma das vezes, só depois do almoço, os funcionários da autora se apresentaram ao serviço para trabalhar na obra (cfr. resposta dada ao artigo 30) da Base Instrutória).
49) Até à presente data, não foram realizados pela autora os seguintes trabalhos:
- Móvel por baixo do lavatório do WC:
- Colocação de chapa de aço escovado na parede por cima da cuba do ateliê: - Colocação do sistema de exaustão do WC;
- Colocação dos sistemas de abertura/fecho tiquetaque nas tampas dos quadros;
- Colocação de todas as partes de serralharia previstas na listagem em aço inox escovado, pois, o que foi provisoriamente aplicado é em aço inox polido;
- Colocação de bancada em aço inox escovado, tendo sido colocada provisoriamente uma bancada, entregue no dia 19 de Março de 2004, que não está à medida e que ficou de ser substituída: e
- Colocação de rodízios nas portas metálicas de correr, faltando os rodízios em todas as portas (cfr. resposta dada ao artigo 31) da Base Instrutória).
50) Os trabalhos não realizados têm um valor superior ao da factura cuja cobrança a autora pretende (cfr. resposta dada ao artigo 32) da Base Instrutória).
51) Relativamente aos trabalhos extra que foram solicitados, ficou acordado entre a autora e a ré que os mesmos seriam executados por permuta com outros que deixaram de ser realizados e que sempre que houvesse lugar a custos haveria prévia elaboração de orçamento, com consulta da autora à ré para a sua aprovação, e só após aprovação se passaria à respectiva realização (cfr. resposta dada ao artigo 33) da Base Instrutória).
52) (...) E que, parte dos trabalhos extra seriam compensados com as diferenças de preços originadas pelas trocas de materiais ocorridas (cfr. resposta dada ao artigo 34) da Base Instrutória).
53) De todos os trabalhos extra realizados foi acordado que apenas seriam debitados o rebaixamento do pavimento da loja, o assentamento de pavimento na mecanize e as partes eléctricas (cfr. resposta dada ao artigo 35) da Base Instrutória).
54) O saldo entre os trabalhos a mais e trabalhos a menos é favorável à ré, pela quantia de € 867 (cfr. resposta dada ao artigo 36) da Base Instrutória).
55) A autora realizou o trabalho de colocação de portas de correr em inox para baixo da bancada da parede de fundo, atrás do balcão, mas devido ao facto de as mesmas virem com defeitos foram rejeitadas pelo Sr. “B” (cfr. resposta dada ao artigo 37) da Base Instrutória).
56) A maioria dos trabalhos constantes da lista cita em 43) foram corrigidos até ao dia 22 de Março de 2004 (cfr. resposta dada ao artigo 42) da Base Instrutória).
57) No dia 22 de Março de 2004, o Eng.º “D” com o Sr. “G” conferiu a lista elaborada no dia 20 de Março de 2004, constatando que não estavam executados todos os trabalhos nela constantes (cfr. resposta dada ao artigo 43) da Base Instrutória).
58) (...) Tendo-lhe sido solicitado (ao sócio da ré, Eng.º “D”) que rubricasse a lista, atestando a rectificação dos trabalhos que nela figuravam (cfr. resposta dada ao artigo 44) da Base Instrutória).
59) (...) Ao que este se recusou, alegando que o correcto seria assinarem em conjunto com o Sr. “J”, representante legal da autora (cfr. resposta dada ao artigo 45) da Base Instrutória).
60) Ainda nesse mesmo dia, a ré informou o Sr. “G” de que, após as mudanças e em consequência destas eventualmente teriam de ser dados alguns retoques na pintura, logo que fosse possível por parte da ré (cfr. art.ºs 24 da réplica, 46 b.i. e resposta dada a este último).
61) Nesse mesmo dia, a ré informou o Sr. “G” de que, após as mudanças e em consequência destas eventualmente, teriam de ser efectuados alguns acertos nos planos de água (cfr. resposta dada ao artigo 47) da Base Instrutória).
62) No dia 15 de Março de 2004 foi colocada uma bancada de aço normal com tampo e cuba na loja (cfr. resposta dada ao artigo 52) da Base Instrutória).
63) O Sr. “B” decidiu que a cuba deveria ser centrada conforme o constante do projecto (cfr. resposta dada ao artigo 53) da Base Instrutória).
64) A bancada supra mencionada foi trocada (cfr. resposta dada ao artigo 54) da Base Instrutória).
65) O Sr. “B” foi pessoalmente à carpintaria e mandou fazer duas alterações aos móveis (cfr. resposta dada ao artigo 56) da Base Instrutória).
66) A ré pediu à autora a colocação de azulejos na parede lateral do ateliê numa faixa de 40 centímetros, trabalho a mais este que não foi cobrado (cfr. resposta dada ao artigo 58 da Base Instrutória).
67) Os azulejos foram colocados entre os dias 20 e 22 de Março de 2004 (cfr. Resposta dada ao artigo 59) da Base Instrutória).
68) A execução do pavimento da loja em micro-betão obrigou a dois rebaixamentos do piso e com afagamento mecânico (cfr. resposta dada ao artigo 60) da Base Instrutória).
69) Foram executados os seguintes trabalhos extra:
a) Portas de correr em inox para debaixo da bancada da parede de fundo, atrás do balcão, que vieram com defeitos e que por isso foram rejeitadas pela ré;
b) Fornecimento e montagem da bancada de inox para o balcão, a qual não veio de acordo com o pedido formulado e que apresenta defeitos;
c) Maior valia do custo da sanita (superior ao valor orçamentado. por escolha da ré);
d) Fornecimento e montagem do termoacumulador;
e) Fornecimento de uma armadura Luminestra 8W e um interruptor para o armário no escritório, no valor de € 68,00 (cfr. resposta dada ao artigo 62) da Base Instrutória).
70) Na parede por cima da câmara frigorífica foi colocada uma placa de pladur (cfr. resposta dada ao artigo 63) da Base Instrutória).
71) O balcão teria duas bancadas, sendo que uma já existia (havia apenas que colocar as tais portas basculantes) e a outra deveria ser fornecida e montada pela autora (cfr. Resposta dada ao artigo 64) da Base Instrutória).
72) O pavimento da loja foi executado com afagamento mecânico (cfr. resposta dada ao artigo 67) da Base Instrutória).
73) Este foi solicitado pela ré já no decurso dos trabalhos de afagamento manual, já que o que estava a ser executado não correspondia ao pretendido e ao que havia sido solicitado e aceite pela autora (cfr. resposta dada ao artigo 68) da Base Instrutória).
74) A autora foi dando como prazo limite para a conclusão das obras sucessivas datas, que sistematicamente não foram respeitadas, tendo a ré informado aquela parte que a loja teria de abrir impreterivelmente no dia 24 de Março de 2004, pelo que as obras teriam de estar concluídas no dia 20 e posteriormente no dia 22 (cfr. resposta dada ao artigo 70) da Base Instrutória).
75) Depois da parede junto à escada já estar estucada, foi necessário voltar a parti-la para se proceder à iluminação que não estava inicialmente prevista no projecto (cfr. resposta dada ao artigo 10) da Base Instrutória).
76) Estava prevista a execução de um pavimento em betonilha na loja e no ateliê, mas o pavimento deste último foi executado em betão e o da loja em micro-betão devido à má execução em betonilha por parte da autora, o que obrigou a dois rebaixamentos do piso (cfr. resposta dada ao artigo 72) da Base Instrutória).
77) A ré adquiriu os degraus da escada, tendo estes ficado armazenados no estaleiro do sócio da ré, o Eng.° “D”, e ficado acordado entre as partes que a autora os iria aí buscar quando achasse pertinente, o que só veio a acontecer em Março de 2004 (cfr. Resposta dada ao artigo 77) da Base Instrutória).
78) Os degraus e a respectiva escada foram montados no dia 12 de Março de 2004 (cfr. resposta dada ao artigo 80) da Base Instrutória).
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B – Apreciação jurídica.
A A. e a Ré ajustaram entre si uma empreitada, um contrato sinalagmático, oneroso e consensual, através do qual a primeira se obrigou a efectuar obras de remodelação na loja da segunda, mediante o pagamento de um preço, nos termos do art.º 1207.º do C. Civ.. O empreiteiro obriga-se a efectuar uma prestação de facto (de facere), em conformidade com o que foi acordado com o dono da obra e sob fiscalização deste (art.º 1208.º e 1209.º do código civil).
1) Da omissão de pronúncia sobre caducidade alegada pela A. na réplica
A réplica serve para o autor responder a alguma excepção que o réu deduza ou para aquele se defender contra uma reconvenção (art.º 503.º, n.º 1, do C. Civ.).
No caso dos autos, a R. excepcionou e reconveio. De seguida, a A. replicou e este seu articulado foi admitido. Acontece que a A. replicante também deduziu uma excepção de caducidade e, agora como recorrente, conclui ter havido omissão de pronúncia sobre este ponto. Porém, não tem razão.
Na sentença, existe uma pequena alusão à réplica e ao seu conteúdo, nos seguintes termos: «A autora apresentou réplica à contestação apresentada, vindo, por um lado, impugnar os factos apresentados pela ré e mantendo, no essencial, a versão apresentada na petição inicial. Alega, ainda que eliminou todos os defeitos apontados pela ré e que deveriam improceder as excepções invocadas, bem como a reconvenção deduzida pela ré» (fls. 326).
Do elenco das questões a decidir, na mesma sentença, também consta efectivamente qualquer referência à excepção de caducidade deduzida pela autora (fls. 327). Depois, ao longo de toda a fundamentação da decisão recorrida não se encontra qualquer alusão a tal caducidade invocada na réplica.
Por conseguinte, na sentença verificou-se efectivamente uma omissão de pronúncia geradora de nulidade, nos termos do art.º 668.º, n.º 1, al. d), do CPC.
Contudo, suscitada esta omissão pela autora nas suas alegações de recurso (fls. 428), o Tribunal a quo, reconhecendo não ter conhecido da excepção em causa, supriu a respectiva nulidade conhecendo (a fls. 457-459) da caducidade, no uso da faculdade reparadora que lhe confere o n.º 4 do mesmo art.º 668.º, completando assim a referida sentença.
Deste modo, ficou sem objecto a questão da nulidade da sentença invocada pela autora nas suas alegações, improcedendo assim a nulidade arguida.

2) Se existe caducidade a impedir a Ré de exercer os seus direitos relativos a defeitos da obra
A A., como se viu, invocou a excepção de caducidade do direito que a ré pretende fazer valer na reconvenção, questão que mantém nas conclusões das alegações com que ampliou o objecto do recurso, após o suprimento judicial da nulidade tratado no número anterior. São as seguintes essas conclusões, que não tiveram resposta da parte contrária:
A. Uma vez que a decisão da excepção de caducidade invocada pela Autora é posterior à apresentação das alegações de recurso e da consequente delimitação do seu objecto, e fazendo esta decisão parte integrante da sentença recorrida, deverá ser permitido à Autora/Apelante alargar o âmbito do recurso apresentado, abrangendo, assim, a decisão que lhe é desfavorável de improcedência da excepção de caducidade invocada pela mesma, por não se conformar com a mesma.
B. Nestes termos, deverá ser admitida a presente ampliação do objecto do recurso.
C. O Meritíssimo Juiz a quo alicerçou a decisão da excepção de caducidade em factos que, com o devido respeito pela decisão recorrida, foram incorrectamente dados como provados.
D. Esses factos foram já objecto de impugnação nas alegações de recurso apresentadas, mais concretamente no ponto III - C) da impugnação da matéria de facto e no ponto E) das conclusões do recurso, para os quais se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
E. Com o devido respeito, entende a Autora/Apelante não existir fundamento para a decisão de improcedência da excepção proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo.
F. Não é verdade, nem tal resulta da prova produzida nos autos, que tenha havido por parte da Autora/Apelante um qualquer reconhecimento (tácito ou expresso) da existência de defeitos/trabalhos por executar para além dos indicados na listagem datada de 20 de Março de 2004.
G. Também não pode proceder a conclusão de que a própria Autora/Apelada não logrou fazer prova da data a partir da qual se iniciaria a contagem do prazo para efeitos de caducidade.
H. Mesmo que a Apelante tivesse reconhecido a existência de quaisquer outros defeitos/trabalhos por executar, o que por mera hipótese se admite sem todavia conceder, passível de ser equiparada a denúncia dos mesmos por parte da Apelada, esse reconhecimento ter-se-ia que reportar à data de 22 de Março de 2004, data na qual terão acordado a realização de retoques nos Domingos posteriores à abertura da loja.
I. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 1224.º do Código Civil, a Apelada dispunha de um ano para exercer o direito de eliminação dos defeitos (denunciados ou reconhecidos pelo empreiteiro), reduzir o preço, resolver o contrato ou exigir indemnização, sob pena de caducidade dos mesmos
J. Para além da tal listagem datada de 20 de Março de 2004, a Apelada dirigiu apenas a 15 de Julho de 2004, uma carta à Apelante na qual invocava existência de defeitos na obra, mas sem especificar quais, não tendo sido feita qualquer prova pela Ré/Apelada da existência de quaisquer outras comunicações posteriores a essa data, como lhe competia.
K. Para além disso, os alegados defeitos apontados nos presentes autos pela Apelada (vide ponto 49 da fundamentação de facto) são todos visíveis e facilmente detectáveis, pelo que foram forçosamente conhecidos pela Ré/Apelada, no mais tardar, na data do início de laboração da loja - 24 de Março de 2004.
L. Da documentação junta aos autos, conclui-se, portanto, que a última comunicação sobre alegados defeitos data de 15 de Julho de 2004 (isto presumindo que se tratava de uma verdadeira comunicação de defeitos, pois já vimos que não pode ser entendida como tal), o que significa que a Apelada dispunha do prazo de um ano - ou seja, o mais tardar, até 15 de Julho de 2005 - para exercer os direitos constantes do artigo 1223 do Código Civil.
M. Não o tendo feito - a contestação e o pedido reconvencional deram entrada em juízo no dia 23 de Setembro de 2005 - caducou esse direito.
N. Incumbia à Apelada, e não à Apelante, fazer prova da denúncia dos defeitos e do exercício atempado dos direitos que lhe assistiam.
Nestes termos e nos demais de Direito, requer-se que seja admitida a ampliação do objecto de recurso nos termos supra explanados, devendo ser concedido provimento ao recurso ora ampliado, com todas as legais consequências, mormente a revogação da douta sentença proferida nos presentes autos.
Estamos no âmbito de uma relação contratual de empreitada, pelo que os direitos do dono da obra em matéria de defeitos e de indemnização se pautam pelas disposições próprias deste contrato. No entanto, à falta de uma definição legal de defeito ou de um critério normativo orientador do que por tal se deve entender (art.º 1218.º do código civil), impõe-se averiguar se este caso é de cumprimento defeituoso ou de incumprimento parcial do contrato, pois, só na primeira hipótese é que se aplica o regime da invocada caducidade.
É geralmente reconhecida a dificuldade em distinguir, na prática, os vícios que integram o cumprimento defeituoso dos vícios que caracterizam o incumprimento parcial. Os primeiros decorrem normalmente de uma desconformidade qualitativa, enquanto os segundos derivam sobretudo de diferenças quantitativas, embora estes últimos possam configurar também um defeito e não um incumprimento parcial. Mas tem-se entendido que, nos casos de fronteira, há incumprimento parcial quando a parte em falta teria exercido uma função própria, claramente individualizada no vasto quadro complexo que constitui toda a obra e haverá cumprimento defeituoso nos casos em que faltar essa função própria e nitidamente individualizada (cf. João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2005, pp. 63-64; acs. do STJ de 14-12-2004, 04A33473, 6.ª sec., e de 11-1-2007, 06B4564, 7.ª sec., www.dgsi.jstj.pt).
No caso dos autos, ficou provado que não foram realizados os seguintes trabalhos: «- Móvel por baixo do lavatório do WC; - Colocação de chapa de aço escovado na parede por cima da cuba do ateliê; Colocação do sistema de exaustão do WC; Colocação dos sistemas de abertura / fecho tiquetaque nas tampas dos quadros; Colocação de todas as partes de serralharia previstas na listagem em aço inox escovado, pois, o que foi provisoriamente aplicado é em aço inox polido; - Colocação de banda em aço inox escovado, tendo sido colocada provisoriamente uma bancada, entregue no dia 19 de Março de 2004, que não está à medida e que ficou de ser substituída; e - Colocação de rodízios nas portas metálicas de correr, faltando os rodízios em todas as portas».
Com base no critério doutrinal e jurisprudencial acima enunciado, todos estes trabalhos (facto provado n.º 49) não impedem a afectação do espaço onde foi realizada a obra ao fim a que foi destinado (loja), mas reduzem-lhe o valor e a aptidão para a sua utilização normal e contratualmente prevista. O móvel e as outras componentes não instalados, supra referidos, não possuem por si só uma funcionalidade própria, claramente individualizada, diferenciada ou dissociada do complexo que constituía a obra de remodelação da dita loja, pois integram-se antes nesse todo a que as obras diziam respeito. Portanto, a falta de execução desses trabalhos releva em termos da qualidade da obra executada e, por isso, o que existe é um cumprimento com vários defeitos e não incumprimento parcial. O cumprimento é defeituoso quando a obra tenha sido realizada com desconformidades, ou seja, com discordâncias em relação ao plano acordado, ou com vícios traduzidos em imperfeições que excluam ou reduzam o valor da obra ou a sua adequação ou aptidão para o uso ordinário ou o previsto no contrato (neste sentido, v. Pedro Romano Martinez, Direito das Obrigações, Contratos, 2.ª ed.. p. 468, e Cumprimento Defeituoso, em Especial na Compra e venda e na Empreitada, col. Teses, Almedina, Coimbra, 2001, pp. 166, 178-179).
Por conseguinte, o regime jurídico aqui aplicável não é o do incumprimento obrigacional em geral, mas sim o dos defeitos da empreitada, à luz do qual há que apreciar a excepção de caducidade.
Os sucessivos direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e de indemnização caducam, nos termos do art.º 1224.º, n.º 1, do código civil, se não forem exercidos dentro de um ano a contar da recusa da aceitação da obra ou da aceitação com reserva, sem prejuízo da caducidade prevista o art.º 1220.º. De harmonia com este último preceito, o dono da obra deve, sob pena de caducidade dos direitos conferidos nos artigos seguintes, denunciar ao empreiteiro os defeitos da obra dentro dos trinta dias seguintes ao seu descobrimento (n.º 1). Equivale à denúncia o reconhecimento por parte do empreiteiro, da existência do defeito (n.º 2).
Ainda segundo o n.º 2 daquele art.º 1224.º, se os defeitos eram desconhecidos do dono da obra e este a aceitou, o prazo de caducidade conta-se a partir da denúncia; em nenhum caso, porém, aqueles direitos podem ser exercidos depois de decorrerem dois anos sobre a entrega da obra. Porém, no caso em apreciação, o problema do desconhecimento não se coloca, já que não vem demonstrado que os defeitos fossem desconhecidos do dono da obra.
Encontra-se provado que a A., empreiteira, deu a obra por concluída em 20 de Março de 2004 (factos n.ºs 21 e 41). Contudo, nesse mesmo dia, a ré entregou ao representante da autora uma lista de trabalhos por concluir (factos n.ºs 20, 42 e 43.ºe documento de fls. 89 a 91). Não obstante, a loja abriu no dia 24 de Março, com a obra inacabada (facto n.º 44), tendo então sido acordado entre autora e ré que os trabalhos em falta e os inacabados iriam sendo executados e concluídos fora do horário de funcionamento da loja, tendo para tal as partes combinado os Domingos (facto n.º 45).
Perante estes factos, entendeu-se na primeira instância que a autora finalizaria a obra «num prazo incerto» ou num «prazo não rigorosamente delimitado». E concluiu-se que a empreiteira não logrou sequer provar a data a partir da qual se iniciou o prazo de caducidade legalmente previsto, julgando-se assim improcedente a respectiva excepção (fls. 459).
Salvo o devido respeito, não resulta da matéria de facto que as partes tenham estabelecido qualquer prazo para a autora completar ou corrigir a obra. Aliás, não se concebe aqui um prazo incerto ou não rigorosamente delimitado – ou há prazo ou não há. Com efeito, provou-se (facto n.º 45) que houve efectivamente reconhecimento pela autora da existência na obra de trabalhos em falta e de outros inacabados (art.º 331.º do código civil), o que equivale à denúncia pelo dono da obra e impede que até aí comece a correr o prazo de caducidade, mas, normalmente, a partir desse reconhecimento pelo inadimplente, começa a correr este último prazo, nos termos do art.º 329.º do código civil (cf., o ac. do STJ de 11-1-2007, 06B4564, 7.ª sec., www.dgsi.jstj.pt). Por outro lado, a ré enviou à autora uma carta, datada de 15 de Julho de 2004 (fls. 33-34), em que aquela se refere ao estado inacabado da obra e acusa a ora recorrente de ter abandonado o trabalho sem o concluir, embora não especifique aí quais os concretos defeitos ou partes inacabadas que ainda permanecem por suprir ou concluir – não configurando assim tal missiva uma verdadeira denúncia de defeitos, pois esta deve especificar os concretos pontos defeituosos ou incompletos.
Por carta datada de 27 de Julho de 2004, a autora responde à ré que foram corrigidos todos os defeitos, retoques e trabalhos extra por esta indicados durante o mês de Abril e em horários indicados por ela. Mais afirma a autora ser «estranho que só após a recepção da nossa Factura e das “listas de trabalhos a mais” executados, venham reclamar só agora de defeitos e trabalhos inacabados, pois desde a última intervenção do n/ pessoal em que o Sr. “B” confirmou a conclusão dos trabalhos extra e algumas correcções, faltando apenas a nova alteração dos puxadores anteriormente escolhidos pelo Dono da Obra, à qual não demos seguimento por afirmarem prontamente que não pagariam o trabalho dessa alteração» (facto n.º 18 e doc. de fls. 47).
Do teor desta carta, resulta uma posição definida da autora. Ela quer fazer contas com a ré e considera já ter feito tudo o que tinha a fazer e o que não fez não fará porque a ré disse que não lhe pagaria esse trabalho.
Deste modo, se não a partir do reconhecimento (cf., no entanto, o citado ac. do STJ de 11-1-2007), dada a falta de interesse da ré em agir devido à disponibilidade então manifestada pela empreiteira para suprir os defeitos, pelo menos, desde a carta da autora de 27 de Julho de 2004, o direito da ré relativo aos defeitos (art.º 1224.º, n.º 1, do código civil) podia ser exercido e, por isso, o prazo de caducidade começou a correr. Tudo isto na sequência da carta da ré a denunciar o estado imperfeito da obra e perante aquela posição clara de rejeição definitiva de responsabilidade por mais defeitos assumida pela ora recorrente (cf. ac. do STJ de 24-9-2009, 2210/06.8TVPRT.S1, 7.ª sec., www.dgsi.jstj.pt), após a intervenção desta na mesma obra a seguir ao reconhecimento (factos n.ºs 47 e 48). Ora, tendo-se a ré apresentado a exercer tal direito só em 23 de Setembro de 2005, mediante reconvenção deduzida na presente acção intentada pela empreiteira (fls. 55 e ss.), passou efectivamente mais de um ano e com ele sobreveio a caducidade desse seu direito.
Assiste, pois, razão à autora, procedendo assim a excepção de caducidade do direito da ré fazer valer judicialmente os seus direitos relativos aos defeitos da obra.

3) Da alegada caducidade do direito de reclamar a cláusula penal
Está provado o acordo entre as partes segundo o qual se a autora concluísse a obra antes do prazo teria direito a um prémio de € 150,00 por dia, mas, se se atrasasse na entrega da mesma, ficaria obrigada a pagar uma multa de € 250,00 por dia (facto n.º 13). Esta cláusula reveste a natureza da indemnização prevista no art.º 1223.º e 1224.º, n.º 1, do código civil, a favor do dono da obra em caso de mora do empreiteiro na entrega dessa obra concluída. Com efeito, este tipo de cláusulas visa estabelecer a priori uma forma de liquidação do valor do dano resultante da mora no cumprimento da obrigação principal. Portanto, o devedor fica desonerado do ressarcimento do dano que efectivamente cause ao credor pelo não cumprimento pontual, ficando obrigado a pagar apenas o valor fixado convencional e previamente, desde que não tenha sido estipulado o ressarcimento do dano excedente.
Por isso, a mesma cláusula moratória não deixa de estar sujeita ao prazo de caducidade do referido direito de correcção dos defeitos, redução do preço ou indemnização a que se reporta o n.º 1 do citado art.º 1224.º.
Por conseguinte, também o direito consagrado nesta cláusula deveria ter sido judicialmente exercido pelo dono da obra, tal como os outros direitos previstos no art.º 1224.º, n.º 1, dentro de um ano a contar de Julho de 2004 (ac. desta Relação de 10-4-2008, 1798/2008-6, www.dgsi.jtrl.pt). Mas, como o pedido reconvencional só entrou em juízo em 25-9-2005, a única conclusão a que seja chega, é que o direito da ré de exigir em juízo a indemnização moratória também caducou.

4) Da excepção de não cumprimento
A autora suscita a questão do enriquecimento sem causa da ré com a recusa por esta de, ao abrigo da exceptio, pagar 20% do preço da empreitada, uma vez que tal excepção só legitima o retardamento da prestação.
Na verdade, nos contratos bilaterais, a excepção de não cumprimento faculta a cada um dos contraentes a recusa da sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo, isto se não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações – art.º 428.º, do código civil. E mesmo que haja prazos diferentes, em certos casos, a parte que deve cumprir em primeiro lugar poderá prevalecer-se da exceptio non adimpleti contractus, quando depois da celebração do contrato se verificar alguma circunstância daquelas que, nos termos do art.º 780.º do código civil, implicam a perda do benefício do prazo (cf. M.J. Almeida Costa, R.L.J. ano 119.º, p. 143).
No contrato de empreita, em caso de cumprimento defeituoso, esta faculdade é utilizável pela parte que deve cumprir depois de a outra ter efectuado a sua prestação. Todavia, a invocação deste meio de defesa de efeito transitório está dependente do accionamento tempestivo dos meios de defesa definitivos, ou seja, do exercício em prazo dos direitos do credor, aqui a dona da obra, decorrentes do cumprimento defeituoso pelo devedor, neste caso a autora.
Ora, como o exercício desses direitos da ré caducou, não pode agora a reconvinte prevalecer-se desta excepção dilatória de direito material (neste caso exceptio non rite adimpleti contractus), para se eximir ao pagamento do resto do preço da obra. Isso seria um locupletamento à custa da autora.
Procede assim esta questão levantada pela recorrente.
Em todo o caso, quando procedente esta excepção apenas suspende a exigibilidade da prestação, pelo que não pode, sem mais, justificar uma absolvição definitiva da parte que a invoca. O tribunal, conhecendo da obrigação e da excepção, se reconhecer a existência da primeira e a procedência da segunda deve condenar o excepcionante a cumprir a respectiva prestação no momento próprio, quando a outra parte cumprir a sua ou se oferecer para a cumprir.

5) Do abuso do direito
Na contestação, a ré alega que a autora facturou, cerca de um ano depois da pretensa conclusão da obra, trabalhos extra que lhe fez crer não ir facturar, debitou outros que não realizou e que outros ficaram integralmente compensados com trabalhos a menos, sendo o saldo entre os trabalhos a mais e a menos favorável à ré (cf. art.ºs 82.º a 89.º). Por isto, a ré imputa à autora abuso do direito.
Há abuso do direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito, casos em que o seu exercício é ilegítimo (art.º 334.º do código civil). A conclusão a que de imediato este preceito nos permite chegar é que se há abuso é porque há direito, se não há direito, como é natural, não pode haver abuso do direito.
Portanto, verifica-se um tal abuso sempre que o titular do direito actua em contradição com os referidos valores e fins, designadamente quando agiu contra uma situação de confiança que, com a sua conduta, fez legitimamente criar ou ajudou a criar na parte contrária de que não exerceria esse direito (venire contra factum proprium).
No caso presente, a posição da ré é que a autora facturou trabalhos que não deveria ter facturado, quer porque não os realizou, quer porque foram compensados com trabalhos a menos ou com diferença de preços em materiais trocados, em qualquer caso, sem ter direito a debitá-los à ré. Na verdade, provou-se que:
51.Relativamente aos trabalhos extra que foram solicitados, ficou acordado entre a autora e a ré que os mesmos seriam executados por permuta com outros que deixaram de ser realizados e que sempre que houvesse lugar a custos haveria prévia elaboração de orçamento, com consulta da autora à ré para a sua aprovação, e só após aprovação se passaria à respectiva realização (cfr. resposta dada ao artigo 33) da Base Instrutória).
52.(...) E que, parte dos trabalhos extra seriam compensados com as diferenças de preços originadas pelas trocas de materiais ocorridas (cfr. resposta dada ao artigo 34) da Base Instrutória).
53.De todos os trabalhos extra realizados foi acordado que apenas seriam debitados o rebaixamento do pavimento da loja, o assentamento de pavimento na mezanine e as partes eléctricas (cfr. resposta dada ao artigo 35) da Base Instrutória).
54.O saldo entre os trabalhos a mais e trabalhos a menos é favorável à ré, pela quantia de € 867 (cfr. resposta dada ao artigo 36) da Base Instrutória).

Deste modo, o que a ré faz é negar à autora o direito de facturar os referidos trabalhos extra, a não ser o rebaixamento do pavimento da loja, o assentamento de pavimento na mezanine e as partes eléctricas.
Além disso, em função da matéria de facto provada verifica-se a existência, não de uma mera conduta da autora, de fazer crer à ré que não facturaria tais trabalhos, mas de um acordo entre as partes no sentido de a autora não ter o direito de os facturar. Por conseguinte, a autora não tinha o direito de facturar outros trabalhos extra que não fossem os acabados de referir, sob pena de violar o acordo.
Assim, a autora não incorreu em abuso do direito, pela simples razão de que não tinha direito de facturar. Quanto aos trabalhos facturados abrangidos pelo acordo a que se refere o ponto 53 da matéria de facto provada também não existe abuso do direito porque a autora, facturando-os, mais não faz do que cumprir o dito acordo. E estas conclusões levam inexoravelmente à improcedência de mais esta excepção oposta pela ré.

6) Se a apelada deveria ter sido condenada no pedido
A recorrente defende que a apelada não devia ter sido absolvida do pedido formulado pela apelante (conclusão V) e que, pelo menos, deveria ter sido condenada no pagamento da factura n.º A56, doc. 9 da p.i., sob pena de enriquecimento injusto. Esta factura, junta a fls. 42, refere-se expressamente a “Trabalhos Extra de Electricidade”, trabalhos estes acima excepcionados e que por isso podiam ser facturados, como se comprova pelo facto provado n.º 53, sem que exista aqui abuso do direito da autora ao facturá-los, pois assim foi acordado entre as partes. Todavia, esta factura, no valor de € 1.100,75, não discrimina os concretos trabalhos de electricidade que a autora efectuou para justificar tal valor. Sendo certo que, de electricidade, prova-se apenas o fornecimento de uma armadura Luminestra 8W, um interruptor para o armário do escritório, este no valor de € 68,00, e o fornecimento e a montagem de um termoacumulador, sem valor indicado [ponto 69, als. d) e e) da matéria de facto provada].
Por outro lado, a factura n.º 55, junta a fls. 41, no valor de € 5.497,80, apresenta como descritivo “Trabalhos Extra de Construção Civil”, uma vez mais, sem descrever quais os trabalhos concretos realizados, para se aferir se foram mesmos executados e se são daqueles que poderiam ser facturados, à luz do acordo a que se refere o ponto n.º 53 da matéria de facto provada.
Por conseguinte, não é possível, para já, determinar o valor dos trabalhos extra que a autora podia facturar à ré, pelo que tal apuramento terá de ficar para liquidação de sentença.
Quanto ao demais pedido, relativamente aos 20% do preço acordado, a respectiva importância – € 9.072,80 (facto provado n.º 15) -, é efectivamente devida, pois a obra foi realizada e entregue. A loja remodelada não deixou de abrir ao público, apesar dos defeitos por regularizar. O facto de a ré ter deixado caducar os seus direitos em relação ao suprimento ou indemnização desses defeitos, não impede nem afasta o direito da autora a receber o preço da obra que ajustado foi entre as partes, no contrato de empreitada que celebraram.
Nesta conformidade, a ré não pode deixar de ser condenada a pagar os últimos 20% do preço total da obra, mais os juros de mora, a contar 15 de Julho de 2004 até integral pagamento, data da devolução da factura pela ré à autora, altura em que se tem a certeza de que a devedora foi interpelada (art.º 805.º, n.º 1, do código civil), às seguintes taxas legais aplicáveis aos créditos de empresas comerciais:
Até 30.09.2004 – 12%, Portaria n.º 262/99, de 12.04
01.10.2004 a 31.12.2004 – 9,01%, Aviso n.º 10097/2004, DR II, de 30.10
01.01.2005 a 30.06.2005 – 9,09% (1.º Semestre 2005) Aviso n.º 310/2005, DR II, de 14.01
01.07.2005 a 31.12.2005 – 9,05% (2.º Semestre 2005) Aviso n.º 6923/2005, DR II, de 25.07
01.01.2006 a 30.06.2006 – 9,25% (1.º Semestre 2006) Aviso n.º 240/2006, DR II, de 11.01
01.07.2006 a 31.12.2006 – 9,83% (2.º Semestre 2006) Aviso n.º 7705/2006 , DR II, de 10.07
01.01.2007 a 30.06.2007 – 10,58% (1.º Semestre 2007) Aviso (extracto) n.º 191/2007, DR II, de 05.01
01.07.2007 a 31.12.2007 – 11,07% (2.º Semestre 2007) Aviso (extracto) n.º 13665/2007, DR II, de 30.07
01.01.2008 a 30.06.2008 – 11,20% (1.º Semestre 2008) Aviso n.º 2152/2008, DR II, de 28.01
01.07.2008 a 31.12.2008 – 11,07% (2.º Semestre 2008) Aviso (extracto) n.º 19995/2008, DR II, de 14.07
01.01.2009 a 30.06.2009 – 9,50% (1.º Semestre 2009) Aviso (extracto) n.º 1261/2009, DR II, de 14.01
01.07.2009 a 31.12.2009 – 8,00% (2.º Semestre 2009) Aviso (extracto) n.º 12184/2009, DR II, de 02.07
01.01.2010 a 30.06.2010 – 8,00% (1.º Semestre 2010) Despacho nº 597/2010, DR II, de 11.01
01.07.2010 a 30.12.2010 – 8,00% (2.º Semestre 2010) Aviso nº 13746/2010, DR II, de 12.07 ;
e as que sucessivamente vigorarem até integral pagamento.
Por outro lado, a autora deverá ser absolvida do pedido reconvencional, ficando o mais, relativo a trabalhos extra, para a liquidação da sentença.
Em conclusão, a apelação procede e a douta sentença recorrida não pode subsistir.
***

III – Decisão
Pelo exposto, julga-se procedente o recurso e, por consequência, revogando-se a sentença recorrida:
a) absolve-se a autora do pedido reconvencional; e
b) condena-se ré a pagar à autora € 9.072,80, acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos, desde 15 de Julho de 2004 até integral pagamento, às taxas supra referidas sucessivamente aplicáveis aos créditos de empresas comerciais; e
c) condena-se a ré a pagar à autora a quantia que se apurar em liquidação de sentença, quanto aos supra referidos trabalhos extra que a ora recorrente estava autorizada a facturar.
Custas a cargo da recorrida.
Notifique.
***
Lisboa, 2 de Novembro de 2010

João Aveiro Pereira
Manuel Marques
Pedro Brighton