Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7541/2007-1
Relator: RUI MOURA
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/16/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A DECISÃO
Sumário: I - A mediação imobiliária é então um contrato bilateral: o mediador obriga-se a procurar interessado e a aproximá-lo do comitente para a realização do negócio no sector do imobiliário, e este último, o dador do encargo, obriga-se a pagar uma indemnização ao primeiro.
II - A obrigação assumida é conseguir interessado para certo negócio que, raramente, conclui ele próprio; é indiferente que este intervenha na fase final do negócio.
III - Para a mediadora, para o contrato, é necessário que a actividade da mediadora esteja ligada à conclusão do negócio, tenha contribuído para a mesma. O que interessa é que a mediadora encontrou interessados na projectada compra, verdadeiramente interessados, determinados, de vontade esclarecida, e de decisão tomada em adquirir.
IV - Não é suficiente que a mediadora faça diligências no sentido de aproximar os interessados na realização do negócio. Se assim fosse bastar-lhe-ia simular um comprador que se mostrasse interessado e depois desistisse do negócio, mesmo que sem qualquer fundamento sério.
V - Em princípio será necessário que o contrato previsto seja realizado. Mas se depois não for integralmente cumprido já não será a mediadora responsável por tal incumprimento, tendo direito a receber a comissão acordada. O mediador adquire o direito a receber a remuneração quando o seu trabalho influi sobre a conclusão do negócio.
VI - Improcede a arguição de nulidade de contrato, ou de cláusula, por falta de forma legal quando esta arguição configura um abuso do direito, como sucederá nos casos em que a nulidade formal é arguida pelo contraente que a provocou.
VII - Se, encontrados interessados no negócio pretendido de venda, o preço final da mesma fôr, então, alterado, por livre e mútuo acordo entre os comitentes e os interessados no negócio, tal tem a ver com a compra e venda e não com a mediação.
VIII - Entendendo-se que tem interesse para caracterizar o negócio que se visa com a mediação, então, a exigência de passar esse novo valor para a forma escrita, por ser uma estipulação posterior ao documento, e por não se ver que nisso haja razão especial da lei, então o novo preço não carece de forma escrita para relevar em face contrato de mediação – artigo 221º- 2 do Código Civil. Sentença
F.G.
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
I - RELATÓRIO
L, LDA., intentou acção declarativa de condenação com processo comum na forma sumária contra E e marido N, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de Euros 4.375,80, a título de capital – IVA incluído - e bem assim, de juros de mora vencidos e vincendos à taxa supletiva legal para as operações civis.
Alegou, para tanto e em síntese, que no âmbito da actividade de mediação imobiliária a que se dedica, em 4 de Abril de 2003 celebrou com os RR um acordo documentado nos autos, dito contrato de mediação imobiliária, pelo qual a Autora se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessados na compra de um imóvel propriedade dos RR, sito na Av. do Brasil, 103, S. Marcos, Sintra, em regime de não exclusividade, por certo prazo. Acordaram pela prestação dos serviços a quantia de euros 3.740,00, acrescido de IVA, na altura à taxa de 17%, ( euros 635,80 ), ou seja euros 4.375,80. Continua que em 3 de Dezembro de 2003 a A celebrou com terceiros um contrato de reserva para compra do imóvel, documentado nos autos. Os RR acordaram reduzir o preço da venda em 2.500,00 euros, ou seja para euros 103.500,00. Sempre com a intervenção da A, estes interessados celebraram contrato promessa de compra e venda do imóvel. Os interessados promitentes compradores, mediante a intervenção da Autora, diligenciaram pela obtenção de um empréstimo junto do B.P.I.. O B.P.I. avaliou o imóvel, mas apenas concedia 100.800,00 euros de montante. A Autora tentou conciliar os RR e os promitentes compradores para os aproximar quanto aos montantes – o pedido pelos Réus e o concedido pelo banco -, mas não foi possível. O contrato promessa de compra e venda foi rescindido em 5 de Maio de 2004.
Acrescenta que a A até aceitou que o contrato promessa fosse rescindido, considerando este desencontro quanto a valores, acarretando a A com todos os prejuízos atinentes à não concretização do negócio, deixando assim de auferir a remuneração acordada. Porém, a Autora foi alertada para a eventualidade da rescisão do contrato promessa não passar de uma mera manobra das partes para afastar a mediadora, e assim os RR conseguirem furtar-se ao pagamento dos serviços contratados. Junto da Conservatória do Registo Predial a Autora verificou que foi registada a aquisição provisória por parte dos interessados promitentes compradores, sendo os RR os vendedores, datando a apresentação no registo de 21-6-2004.
A A interpelou os RR , quer verbalmente, quer por escrito, no sentido de obter o pagamento a que os RR se vincularam pela outorga do acordo de mediação imobiliária, mas sem êxito. É no pagamento desse capital, e juros de mora vencidos e vincendos, que a A pede neste processo os RR sejam condenados.

Citados, contestam os RR. Entendem os RR que pelo acordo celebrado com a Autora esta se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra do imóvel por euros 106.000,00. Só se esse desiderato fosse conseguido é que a A teria direito a receber o montante acordado no contrato. Impugnam o contrato de reserva que a Autora alega ter celebrado com os terceiros interessados. Negam que os RR tenham acordado na redução do preço do imóvel a vender em 2.500 euros. Dizem os RR que os promitentes compradores incumpriram reiteradamente o contrato promessa celebrado; o cheque para pagamento de parte do sinal previsto na al. a) da cl. 1º, não teve cobertura; os promitentes compradores incumpriram nos prazos; daí a rescisão do contrato promessa. Os RR retiram assim que a A nunca conseguiu obter interessados para a compra do imóvel pelo preço reclamado por eles. Prosseguem que requereram a intervenção de outras mediadoras. Os RR começaram eles próprios a promover a venda do imóvel através da colocação de tabuletas na casa e anúncios na imprensa. Asseveram os RR que rescindiram o acordo com a Autora por esta lhes prestar péssimos serviços e não conseguir novos interessados, sendo a declaração rescisória datada de 14-5-2004.
Continuam que os inicialmente interessados, por via da actividade promotora dos RR pelas tabuletas e pelos anúncios na imprensa, tiveram conhecimento do nº do telefone dos RR, abordaram-nos no sentido de lhes tentarem comprar o imóvel – actuação esta que se não ficou a dever à actividade da A.
Concluem pela improcedência, mas sem condescender, sempre entendem o valor peticionado “ absolutamente injustificado e exagerado “.
Uma tentativa de conciliação não deu frutos. Remeteu-se para os articulados a matéria de facto a levar ao julgamento, sendo a prova objecto de gravação. Fixou-se a matéria provada e não provada.
Produziu-se sentença pela qual se julgou procedente por provada a acção e os RR foram condenados “ a pagarem à Autora a quantia de euros 4.375,80, acrescida de juros legais vencidos e a vencer, à taxa legal de 4%, até integral pagamento “.

Não conformados, recorreram os RR. Recurso recebido adequadamente como de apelação e com efeito meramente devolutivo.
Nas alegações de recurso apresentam os Réus as seguintes conclusões:
Quanto à decisão de facto
1° - Devem ser aditados à matéria dada por provada nos presentes autos, por tal resultar inequivocamente da prova testemunhal produzida na audiência de julgamento, os seguintes factos alegados pelos Apelantes e que são essenciais para a boa decisão do presente pleito:
K - Os Promitente Compradores não conseguiram também cumprir com os prazos fixados nas cláusulas 4ª e 5ª nº 2 do Contrato de Promessa, para a execução do contrato prometido.
L- Perante tais incumprimentos os R. R. comunicaram aos promitentes­ compradores que tinham decidido rescindir o contrato junto aos autos como doc. nº3, por incumprimento do mesmo imputável aos 2°s Outorgantes.
M - E porque estes reconheceram tal incumprimento deram o seu acordo a tal rescisão nos precisos termos constantes do doc. nº 4 anexo à p.i..
N – A Autora nunca conseguiu obter um interessado na compra da casa da propriedade dos Réus, pelo preço de 106.000,00 euros;.
O - Os promitentes vendedores começaram eles próprios a promover a venda do imóvel através da colocação de tabuletas e anúncios das janelas da casa e na Imprensa.
P - Posteriormente e por virtude da actividade referida na alínea O, acima, o Sr. P e mulher souberam o telefone dos RR e abordaram-nos no sentido de lhes tentarem comprar o imóvel.
Q - Apenas em Abril de 2003 o Banco procedeu à avaliação do imóvel objecto da compra, acontecendo que o valor da mesma era insuficiente para cobrir os 110.000,00 € pedidos pelos promitentes-compradores.
R - O banco apenas garantiu um empréstimo de 100.800,00 €.
Quanto à decisão de direito
2ª - Desta matéria resulta evidente que a rescisão do Contrato de Promessa de Compra e Venda operada entre os Apelantes e os Promitentes-compradores nada teve a ver com qualquer maquinação destinada a fugir ao pagamento de qualquer remuneração que poderia vir a ser eventualmente devida à Apelada, mas tão somente ficou a dever-se à impossibilidade objectiva e definitiva por parte dos promitentes-compradores de cumprirem tal contrato, por não terem meios para pagar o preço acordado de € 103.500,00, por estarem de há muito ultrapassados os prazos em que se tinham comprometido para assinarem o contrato prometido e por estar definitivamente assumido que o B.P.I. não lhes emprestaria uma verba suficiente para fazerem tal aquisição pelo referido preço. qualquer interessado na compra do imóvel pelo preço de Euros 106.000,00, como não conseguiu também que tal negócio se
3ª - Ficou ainda provado que a Apelada não só nunca arranjou fizesse com os interessados P e mulher pelo preço mais reduzido de € 103.500,00, pois que resultou claramente provado que o B.P.I. não emprestava tal montante e foi por isso que o negócio não pode realizar-se, por esse preço e só tivesse sido feito depois por valor muito inferior a € 103.500,00, pelo que, em caso algum teria a Apelada direito à remuneração fixada no contrato de mediação, mesmo que este estivesse em vigor à data em que o imóvel foi vendido.
4ª - Resultou também provado que não existiu nexo de causalidade entre a actividade da Apelada e a realização do negócio depois de terminado o contrato de mediação, já que deve ser dado por provado que "Os promitentes vendedores começaram eles próprios a promover a venda do imóvel através da colocação de tabuletas e anúncios das janelas da casa e na imprensa" e que foi " por virtude dessa actividade que o Sr. P e mulher souberam o telefone dos RR e abordaram-nos no sentido de lhes tentarem comprar o imóvel".
5ª - Mesmo que se admita, o que só por cautela de patrocínio se admite que o negócio se deveu ao facto da Apelada encontrar um interessado no mesmo, e que o preço de venda fixado entre esta e os Apelantes foi reduzido para € 103.500,00 para que pudesse haver lugar ao pagamento de remuneração, mesmo assim nunca os Apelantes poderiam ser condenados a pagar tal remuneração porque, nos termos do nº2 da Clausula 5ª do Contrato de Mediação esse pagamento desta só seria devido com a escritura de compra e venda ou conclusão do negócio, e não foi alegado nem provado que isso tivesse acontecido e pelo preço acima referido, pois que apenas se provou terem sido feitos registos provisórios de aquisição e hipoteca o que é muito diferente.
6ª - E muito menos podia a sentença recorrida condenar os Apelantes em " ... juros legais vencidos e a vencer à taxa legal de 4% até integral pagamento." não só porque não deu qualquer fundamento de facto ou de direito para tal condenação, sendo nula por esse facto, como não há qualquer fundamento para tal condenação porque o pagamento da remuneração apenas seria devido com a celebração da escritura de compra e venda ou conclusão do negócio, (cl. 5ª n° 2 do Contrato de Mediação), e não foi alegado ou dado por provada a ocorrência de qualquer destes pressupostos.
7ª - Ao contrário do que diz a sentença recorrida competiria em exclusivo à Apelada e não aos Apelantes o ónus de provar que foi ela quem arranjou um interessado na compra do imóvel pelo preço acordado e que o referido foi concluído por esse preço, para que pudesse ter seguimento o seu pedido de condenação dos Apelantes no pagamento da remuneração fixada no contrato (nº 1 do art. 342 do C. Civil) e neste caso concreto a Apelada não fez prova destes factos pelo não tinham os Apelados qualquer ónus de provar factos extintivos ou modificativos do alegado direito da Apelada, o que não obstante estes lograram fazer como resulta da matéria que deverá ser dada por provada.
8ª - Finalmente é ainda nula por falta de fundamentação a sentença "a quo" quando decide que alegada nulidade por falta de forma da alteração da cláusula 5ª a nº 1 do contrato de mediação não é imputável à Apelada, tanto mais que resulta claro do teor do Dec. Lei 77/99 de 16 de Março e em particular do nº 8 do seu art. 20° que a obrigação de formalização escrita do contrato de mediação incumbe em primeira instância à mediadora, que por lei, nunca poderá sequer valer-se de tal nulidade e resulta da matéria dada por provada as partes sempre consideraram encargo da mediadora a formalização de todos os acordos celebrados no âmbito do negócio pelo que a nulidade por falta de forma da alteração que ocorreu no que respeita ao nº 1 da clausula 5° do contrato de mediação só é de facto imputável àApelada e não o contrario como pretende a sentença recorrida.
Normas apontadas como violadas:
Os arts. art. 19° nº 1 e 20° nºs 1 e 8 do Dec. Lei 77/99 de 16 de Março, os arts. art. art. 334°, 342 nº 1,405° nº 1, 406 nº1 e art. 804 nº 2 todos do C. Civil e os arts. 659° n° 3 e 668° nº 1 - b) do CPC.
Concluem pela absolvição dos Réus do pedido.

A A sustenta o acerto do julgado.

Na instância recorrida deram-se como provados os factos que constam de fls. : 127 a 130 para que ora se remete.

II- ENQUADRAMENTO JURÍDICO

É entendimento pacífico ser pelas conclusões das alegações do recurso que se afere e delimita o objecto e o âmbito do mesmo – artigos 690º- 1 e 684º- 3 do C.P.C., exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso - art. 660º - 2 – fim do mesmo diploma.
O tribunal deve resolver todas as questões que lhe sejam submetidas, dentro desse âmbito, para apreciação, com excepção das questões cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras – artigo 660º - 2 -1ª parte do C.P.C..
É dominante o entendimento de que o vocábulo “ questões “ não abrange os argumentos, os motivos ou as razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja – entende-se por questões as concretas controvérsias centrais a dirimir – neste sentido o Ac. do STJ de 02-10-2003, in “ Rec. Agravo nº 480/03 – 7ª secção “.

III OBJECTO DO RECURSO

1 - DECISÃO DE FACTO

Da análise do conjunto das conclusões da recorrente – artigos 684º, nº 3 e 690º do CPC, resulta que a apreciação do recurso se deve enquadrar no tratamento das questões seguintes:

A- Ficaram provados os factos elencados supra em K), L), M), N), O), P), Q), R)?

Vejamos:
Ouvida a gravação da prova testemunhal, temos que, em síntese as testemunhas se pronunciaram como segue, respectivamente:
(…)
*
A valoração da prova visando a fixação dos factos, para além do esforço lógico, apoia-se em máximas de experiência que resultam do conhecimento do mundo e das realidades da vida por parte do juiz (1).

O depoimento da testemunha F, comissionista, e que acompanhou a elaboração dos contratos e as diligências entre os interessados na compra do andar e o banco B.P.I., onde os interessados já conheciam alguém, é um depoimento lógico, com pormenores, sincero, aberto, espontâneo, credível. Não altera este quadro o facto da testemunha apontar atrasos na apresentação da documentação aos interessados na compra. Nem o facto dos interessados na compra culparem esta testemunha pelos atrasos na aprovação da concessão do crédito no banco.
Há um entrosamento do depoimento da testemunha F com o depoimento da testemunha H, quer pela circunstância da testemunha H estar a trabalhar como vendedora da Autora num posto fixo, fora das instalações da Autora, e a testemunha F fazer serviço externo, com clientes, autora e bancos, quer pelo facto de ambos os depoimentos resultarem consonantes e continuados, credíveis e imbatíveis.
O depoimento de P mostra-se mais inconsequente, ilógico. O da esposa, A, muito menos esclarecedor, e nalguns pequenos aspectos até um pouco contraditório: exemplos são, o sinal e seu pagamento, o valor de aquisição da casa.
Claros em vários aspectos: adquiriram o andar em questão, sendo a escritura pública celebrada com os RR a 5 de Agosto de 2004, havendo lugar a contrato promessa, a registos provisórios de aquisição com vista ao registo provisório da hipoteca garantia do mútuo bancário. Gastaram com a aquisição apenas o dinheiro mutuado pelo B.P.I., segundo a avaliação já efectuada antes, aproveitando todo o processo de concessão do crédito que vinha da actuação da Autora, e que já estava aprovado pelo banco por 6 meses. Vivem na casa adquirida. Estas testemunhas acordaram na “rescisão “ de fls. 11, mas não desistiram do crédito que estava aprovado no BPI, não desistiram do projecto de utilizar aquele empréstimo para o fim aprovado, que era adquirir a casa dos RR, que efectivamente vieram a adquirir. Nesse processo bancário haviam até beneficiado da redução de custos com a avaliação do imóvel ao abrigo de um protocolo existente entre a A e o B.P.I.. Da parte destas testemunhas - P e A -, há todo um processo bancário, que vinha de trás, que se mantém, e que é prosseguido. Um outro aspecto que confirmam é que quem lhes mostrou pela primeira vez a casa foi a testemunha H. Foi apenas com a mediadora A que sempre, nesta medida, contactaram.
O alibi para a “rescisão” de fls. 11 – que data de 5 de Maio de 2004 -que referem – fim do prazo do contrato promessa, o receio de perderem o sinal – não é compaginável com o seguinte conjunto de factos: o prazo da cl. 4ª do contrato de fls. 8 já havia expirado por volta de 20 de Março de 2004; logo em 3 de Fevereiro de 2004 o cheque de fls. 29 foi devolvido, como se vê de fls. 28; no acordo “ rescisório “ de fls. 11 não é referido esse incumprimento por parte dos promitentes compradores, nem qualquer receio por parte dos mesmos, nem são compensados os promitentes vendedores. De facto no texto de fls. 11 é dito que a resolução é feita de boa fé, por mútuo acordo, ficando desobrigados das cláusulas contratuais do contrato promessa.
Não se compreende que não tenham ido desistir do crédito bancário aprovado para aquela casa em concreto.
O reatamento dos contactos entre “ os L “ e os RR é trazido ao julgamento pelo depoimento da testemunha R, que disse que passou pelo local e tirou o nº de telemóvel dos RR e o deu ao cunhado, já depois do doc. de fls. 11 – 5 de Maio de 2004.
Não é credível este depoimento – muito superficial – quando contraposto com o de Maria H. Esta, que assistiu à assinatura do doc. de fls. 11, verificou nesse mesmo dia que as placas de anuncio da venda do andar em causa foram retiradas, e desconfiou do comportamento dos outorgantes de fls. 11, justificadamente.
Dos depoimentos das testemunhas F e Maria H com segurança se retira: o fim do contrato de mediação; o preço pelo serviço da mediadora que foi estabelecido desde a outorga do contrato, e que já estava incluído no preço final da venda ( isto é baixando o preço a pedir ao comprador, o vendedor recebia menos ); a redução do preço do andar efectuada pelos RR para euros 103.500,00, que a testemunha H foi negociar a casa dos RR; o escrupuloso cumprimento do contrato de mediação de acordo com o acordado; a tentativa da A conciliar os RR, vendedores, no sentido deles baixarem o preço do andar, face ao valor que o banco concederia de empréstimo, e que saira da avaliação a que o banco procedera, que era certo, e seu goro.

Pergunta-se então:
Deve aditar-se à matéria provada que:
K - Os Promitente Compradores não conseguiram também cumprir com os prazos fixados nas cláusulas 4ª e 5ª2 do Contrato de Promessa, para a execução do contrato prometido?
Resposta: não. O prazo da cláusula 5ª nunca foi actuado. Nunca houve a aludida prorrogação. O prazo da cláusula 4ª era a actuar pelos primeiros outorgantes, promitentes vendedores, e não pelos compradores.
Há alguns aspectos conclusivos na formulação.
Por outro lado o alcance pretendido com o alegado é mais vasto, não ficando provado que alguma vez os outorgantes tivessem pretendido cumprir com o contrato promessa em causa, e com esses prazos, uma vez que a testemunha P referiu em julgamento haver contrato promessa prévio à escritura pública ( até por via dos registos provisórios ), e esse contrato era outro que não este.
Pergunta-se então:
Deve aditar-se à matéria provada que:
L- Perante tais incumprimentos os R. R. comunicaram aos promitentes ­compradores que tinham decidido rescindir o contrato junto aos autos como doc. nº3, por incumprimento do mesmo imputável aos 2°s Outorgantes?
Resposta: não. Não houve prova.
Pergunta-se então:
Deve aditar-se à matéria provada que:
M - E porque estes reconheceram tal incumprimento deram o seu acordo a tal rescisão nos precisos termos constantes do doc. nº 4 anexo à p.i.?
Resposta: não. Não houve prova.
Pergunta-se então:
Deve aditar-se à matéria provada que: (2)
N – A Autora nunca conseguiu obter um interessado na compra da casa da propriedade dos Réus, pelo preço de 106.000,00 euros?
Resposta: Provado apenas que a Autora conseguiu obter como nteressados na compra da casa dos RR, apenas os Srs. P e esposa;
Fundamentos: o depoimento da testemunha H. O resto da factualidade está prejudicada uma vez que para estes interessados os RR baixaram o preço pretendido para euros 103.500,00.
Pergunta-se então:
Deve aditar-se à matéria provada que:
Resposta: não. Não houve prova. A testemunha H, em depoimento o - Os promitentes vendedores começaram eles próprios a promover a venda do imóvel através da colocação de tabuletas e anúncios das janelas da casa e na Imprensa.
convincente, disse que no mesmo dia em que foi outorgado o doc. de fls. 11 e verso os anúncios que publicitavam o andar foram retirados.
Pergunta-se então:
Deve aditar-se à matéria provada que:
P - Posteriormente e por virtude da actividade referida na alínea O, acima, o Sr. Pedro Miguel de Figueiredo Ferreira Lourenço e mulher souberam o telefone dos RR e abordaram-nos no sentido de lhes tentarem comprar o imóvel?
Resposta: não. Não houve prova.
Pergunta-se então:
Deve aditar-se à matéria provada que:
Q - Apenas em Abril de 2003 o Banco procedeu à avaliação do imóvel objecto da compra, acontecendo que o valor da mesma era insuficiente para cobrir os 110.000,00 € pedidos pelos promitentes-compradores?
E que
R - O banco apenas garantiu um empréstimo de 100.800,00 €?

Resposta: Quanto à data da avaliação do banco, colocada no presente ponto em Abril de 2003, não há a mínima prova. Acresce que pela concatenação de datas, é improvável que a mesma tenha acontecido no mês da outorga do contrato de mediação – Abril de 2003, admitindo-se que se trate de 2004. Não se provou outra data. Sobre os “ 110.000 euros pedidos pelos promitentes vendedores “ igualmente não há a mínima prova. A prova testemunhal havida aponta que o valor da remuneração à mediadora já esteja incluído no preço a pedir aos interessados na compra. Pela prova testemunhal colhida da testemunha Farinha e da testemunha H verifica-se que os RR pediam aos interessados P e A, pelo andar em venda, a quantia de 103.500, 00 euros, o que está de acordo com a cláusula 3ª do contrato promessa de fls. 8 verso. Neste valor, já está incluída a remuneração acordada pagar à mediadora e acertada no acordo de mediação. O que é certo é que – de acordo com a globalidade e o devido entendimento dos depoimentos das testemunhas (…), o B.P.I. avaliou o imóvel dos RR num quadro de pedido de concessão de crédito bancário para aquisição de casa própria por parte de P e A, aprovando um mútuo garantido com primeira hipoteca para o imóvel, a adquirir por estes, até 100.800,00 euros. Estes, mesmo após 5 de Maio de 2004, data do acordo de fls. 11 e verso, não desistiram do crédito, aprovado por seis meses, e acabaram por adquirir a fracção aos RR, aproveitando o mesmo crédito já aprovado, sendo a escritura pública outorgada a 5 de Agosto de 2004.
Há que dar como provado este factualismo, porque essencial, complementar ou concretizador de outros factos, oportunamente alegados, e que resultaram da discussão da causa, com relevância para a procedência ou improcedência das pretensões debatidas no litígio, o que é permitido pelos artigos 264º- 2 e 712º 1 a) do C.P.C.


No mais, na primeira instância operou-se uma correcta e criteriosa apreciação da prova, tendo-se analisado criticamente a prova e tendo-se especificado os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador.

Não há outros factos a considerar, nem factos instrumentais que resultem da instrução e discussão a causa – artigo 264º -2 do C.P.C..

2 - A MATÉRIA PROVADA É ENTÃO A SEGUINTE:
1. A Autora é uma sociedade de mediação imobiliária, detentora de Licença AMI n.º 850, emitida pelo Instituto de Mercados de Obras Públicas e Particulares e do Imobiliário (IMOPPI).
2. No exercício da sua actividade, por escrito datado de 4 de Abril de 2003, celebrou com os Réus um denominado Contrato de Mediação Imobiliária, em que se obrigava a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra de um imóvel propriedade dos Réus, sito na Av. Do Brasil, n.o 103, 1.° A, em S. Marcos, concelho de Sintra, pelo valor de € 106.000,00, em regime de não exclusividade, obrigando-se a pagar à Autora, a título de remuneração a quantia de € 3.740,00 acrescida do respectivo IV A à taxa legal de 17%, conforme documento junto a fls. 6 e verso;
3. Na decorrência da execução do contrato referido em 2. e por escrito datado de 6 de Dezembro de 2003, denominado Contrato de Reserva, outorgado entre a Autora e P e mulher, na qualidade de promitente-comprador, acordaram na celebração do Contrato de Promessa de Compra e Venda do imóvel sito na Av. do Brasil, (…), em S. Marcos, concelho de Sintra, pelo preço de € 103.500,00, sendo paga a quantia de € 500,00 a título de reserva, com o- Contrato de Promessa de Compra e Venda a quantia de € 1.000,00 e na escritura a quantia de € 102.000,00, conforme documento junto a fls. 7 e verso;
4. Por intervenção da Autora, os Réus acordaram na redução do preço de venda do imóvel sito na Av. Do Brasil,(…), em S. Marcos, concelho de Sintra, em € 2.500,00, sendo o preço final de € 103.500,00.
5. Com a intervenção da Autora e nas instalações desta, por escrito datado de 20 de Dezembro de 2003, denominado Contrato de Promessa de Compra e Venda, outorgado entre os Réus e P e mulher, os primeiros prometeram vender e os segundos comprar o imóvel sito na Av. Do Brasil, (…) em S. Marcos, concelho de Sintra, pelo preço de € 103.500,00, devendo a escritura pública de compra e venda ser celebrada no prazo de 90 dias, conforme documento junto a fis. 8 a 10 verso;
6. Os promitentes-compradores recorreram ao B.P.I., S.A., a fim de contraírem um empréstimo para aquisição do imóvel, tendo a Autora facultado a sua identificação para que estes beneficiassem da isenção de custos no processo de avaliação, em conformidade com o Protocolo estabelecido entre a Autora e o B.P.I., S.A.
7. Nas instalações da Autora, por escrito datado de 5 de Maio de 2004, denominado Acordo de Rescisão celebrado entre os Réus e P e mulher, declararam resolver o Contrato Promessa de Compra e Venda do imóvel sito na Av. Do Brasil, n.º 103, 1.º A, em S. Marcos, concelho de Sintra, conforme documento junto a fls. 11 a 11 verso;
8. A Autora acompanhou o processo de empréstimo, verificando-se diversos atrasos do promitente-comprador em entregar a documentação que lhe ia sendo solicitada pelo B.P.I., S.A. e por intermédio da Autora.
9. Na Conservatória do Registo Predial de Agualva-Cacém, pela Ap.08/20040621, foi efectuado o registo provisório da aquisição a favor de P e mulher, do imóvel sito na Av. Do Brasil, (…) S. Marcos, concelho de Sintra, e hipoteca voluntária a favor do B.P.I., S.A., conforme documento junto a fls. 12 e 13;
10. O cheque entregue por Pedro Miguel de Figueiredo Ferreira Lourenço para pagamento do sinal foi devolvido por falta de provisão, conforme documentos junto a fls. 28 e 29;
11. Por carta datada de 14 de Maio de 2004, enviada pelos Réus à Autora, estes procedem à rescisão imediata do contrato de mediação imobiliária, conforme documento junto a fls. 30;
12. Provado apenas que a Autora conseguiu obter como interessados na compra da casa dos RR, apenas os Srs. P e esposa A;(3)
13. Provado apenas que o B.P.I. avaliou o imóvel dos RR num quadro de pedido de concessão de crédito bancário para aquisição de casa própria por parte de P e A, aprovando um mútuo garantido com primeira hipoteca para o imóvel, a adquirir por estes, até 100.800,00 euros. Estes, mesmo após 5 de Maio de 2004, data do acordo de fls. 11 e verso, não desistiram do crédito, aprovado por seis meses, e acabaram por adquirir a fracção aos RR, aproveitando o mesmo crédito, já aprovado e ainda pendente, tendo sido a escritura pública outorgada a 5 de Agosto de 2004;

AINDA O OBJECTO DO RECURSO

3 - QUANTO AO DIREITO AS QUESTÕES COLOCADAS SÃO:
1ª) A existência ou não de acordo de mediação, e sua validade;
2ª) Alteração não reduzida a escrito no contrato de mediação do preço pretendido pelo comitente, sua validade;
3ª) Nexo de causalidade entre a mediação, rescisão desta – fls. 30-, rescisão do contrato promessa de fls. 11, e um outro negócio, posterior à rescisão da mediação, negócio final; conclusão do negócio visado;
4ª) Prova desse negócio;
5ª) A remuneração do contrato de mediação;
6ª) Vencimento da remuneração da mediação e entrada em mora do comitente para com o mediador;

4- DO MÉRITO DO RECURSO:

QUANTO À 1ª QUESTÃO
O contrato de mediação é aquele que tem por objecto promover, de modo imparcial, a aproximação de duas ou mais pessoas, com vista à celebração de um certo negócio, mediante retribuição. Está obrigado a agir com imparcialidade. Não é representante. Age no interesse de ambas as partes.(4)
O contrato de mediação é referido em diversos diplomas disciplinadores da actividade financeira, como acontece com o DL nº 77/99, de 16/3, em vigor à data da celebração do contrato de fls. 6 e verso. Este diploma no seu art. 3º, define essa actividade como “aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra ou venda de bens imóveis ou na constituição de quaisquer direitos reais sobre os mesmos, bem como para o seu arrendamento e trespasse, desenvolvendo para o efeito acções de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e sobre as características dos respectivos imóveis”.
Pires de Lima e Antunes Varela (CC Anotado, vol. II, 4ª ed., pág. 785) entendem que é uma modalidade do contrato de prestação de serviços, definindo-o, como faz Vaz Serra (RLJ, 100º-347, 103º-222 e 104º- 155), como um contrato pelo qual uma das partes se obriga a conseguir interessado para certo negócio e a aproximar esse interessado da outra parte. É, em princípio, oneroso.
A mediação imobiliária é então um contrato bilateral: o mediador obriga-se a procurar interessado e a aproximá-lo do comitente para a realização do negócio no sector do imobiliário, e este último, o dador do encargo, obriga-se a pagar uma indemnização ao primeiro.
No caso a Autora é uma sociedade de mediação imobiliária, licenciada, e actuou nos termos do acordo de fls. 6 no exercício da sua actividade comercial – pontos 1 e 2 dos factos provados.
Tal contrato está previsto no artigo 20º do DL nº 77/99, de 16-3, e sujeito à forma escrita.
O contrato ajuizado de fls. 6 está validamente celebrado, reunindo os requisitos exigidos por esse diploma, e respeitando as regras gerais dos contratos.
Por esse acordo a Autora obrigou-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra pelo valor de 106.000, 00 euros da fracção dos RR, desenvolvendo para o efeito acções de promoção e recolha de informações sobre o negócio pretendido – cl. 2ª. Acordaram a remuneração na cl. 5ª. A mediação não era em regime de exclusividade.

A generalidade da doutrina e até a jurisprudência mesmo mais recente – neste sentido Ac. do TRL de 18-12-2001, in Col. Jur. Tomo V, pág 115 onde se decidiu nomeadamente basta que tenham sido feitas diligências para aproximar os interessados no negócio, para estar cumprida a obrigação do mediador, e ser devida a remuneração ao mediador - entende que, não constitui obrigação fundamental do mediador concluir o contrato. A obrigação assumida é conseguir interessado para certo negócio que, raramente, conclui ele próprio; é indiferente que este intervenha na fase final do negócio.
A obrigação essencial que impende sobre o mediador é, assim, a de angariar interessado para o negócio, praticar actos isolados.(5)
Esta posição já vinha dos vários entendimentos havidos aquando da ausência de regulação do contrato em causa, e depois no âmbito da vigência dos diplomas anteriores ao DL nº 77/99, de 16-3.
No âmbito da vigência destes diplomas, anteriores ao DL nº 77/99, colocava-se a questão de saber se para se concluir pela existência dum contrato de mediação imobiliária cumprido é necessário que o negócio em vista se realize ou se basta que o mediador faça as diligências tendentes a aproximar os interessados nesse negócio e esclarecê-los das condições pretendidas por cada um.
No caso dos autos, estamos em face do DL nº 77/99, e o clausulado do acordo de fls. 6 está conforme ao estipulado nesse DL nº 77/99, o qual foi alterado pelo DL nº 258/2001, de 25-9, que no presente nada influi. É à luz deste diploma que há que analisar.
Como se pode ler no seu preâmbulo, clarifica-se o momento e estabelecem-se as condições em que é devida a remuneração pela actividade de mediação imobiliária, “questões que no domínio da anterior legislação motivaram inúmeras reclamações por parte dos consumidores”.
Portanto, para o DL nº 77/99, não é suficiente que a mediadora faça diligências no sentido de aproximar os interessados na realização do negócio. Se assim fosse bastar-lhe-ia simular um comprador que se mostrasse interessado e depois desistisse do negócio, mesmo que sem qualquer fundamento sério. Em princípio será necessário que o contrato previsto seja realizado. Mas se depois não for integralmente cumprido já não será a mediadora responsável por tal incumprimento, tendo direito a receber a comissão acordada. De qualquer forma, em princípio, o pagamento da comissão encontra-se ligado à conclusão do negócio pretendido, no caso, a projectada venda.
É a posição expendida no Ac. do TRL de 27-1-2004, consultável no site da DGSI. Segundo este entendimento o mediador adquire o direito a receber a remuneração quando o seu trabalho influi sobre a conclusão do negócio. Segue-se a doutrina e jurisprudência italiana no sentido de que o mediador tem direito à comissão quando, embora não sendo a sua actividade a única causa determinante da cadeia dos factos que deram lugar ao negócio pretendido pelo comitente, contribuiu para ela (ver acs. STJ de 18.03.97, C.J. V -I-156 e de 31.03.98 BMJ 475-680).
Perfilhamos este entendimento.
É esse desiderato que consta da cl. 2ª do contrato de fls. 6.
Foi esse o entendimento seguido na sentença recorrida – pág.133
Provou-se em 12 dos factos assentes que: a Autora conseguiu obter como interessados na compra da casa dos RR, apenas os Srs. P e esposa A; e provou-se em 3,4 e 5 que por intermédio ou com a intervenção da Autora, entre os RR e os interessados P e A se celebrou um contrato promessa de compra e venda, tendo estes celebrado “ reserva “ da fraçcão a comprar.

QUANTO À 2ª QUESTÃO
A Autora cumpriu assim a sua obrigação essencial: angariou interessado para o negócio, que estava determinado a comprar, mas por valor inferior ao pretendido pelos vendedores. Os interessados pretendiam uma redução no preço.
Invoca-se: mas o valor para a venda do imóvel deixou de ser euros 106.000 para ser 103.500?
É certo que passou. A Autora uma vez mais aproximou as partes, não escondeu a qualquer delas qualquer pormenor do negócio, e conseguiu que os RR baixassem o valor da venda para euros 103.500 – facto 4 da elencagem dos factos provados.
Não alteraram o contrato de mediação, actualizando por forma escrita que a venda pretendida fosse feita por esse valor.
A questão põe-se porque o artigo 19º 1 do DL 77/99 estipula que : a remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação “.
Porque à luz do contrato de fls. 6 se pode entender que a remuneração à mediadora só era devida se esta conseguisse um comprador pelo preço inicial de 106.000 euros, e ainda porque o artigo 20º do DL 77/99 , nº 2, na al.e) obriga a que do contrato de mediação constem obrigatoriamente “ as obrigações das partes contratantes “.
Porém o contrato de mediação não pode impedir que os comitentes e os interessados no negócio, ponderem, tenham posições diferentes, esgrimam pelos seus legítimos interesses, exercendo a liberdade contratual e a liberdade de estipulação de clausulas prevista no artigo 405º do Código Civil.

A sentença recorrida classifica de abuso de direito o facto dos Recorrentes invocarem a nulidade do contrato de mediação, em violação ao disposto no artigo 334º do Código Civil – fls- 135 e ss.
Os Apelantes apodam de nula – conclusão 8ª – a sentença recorrida por falta de fundamentação a sentença "a quo" quando decide que alegada nulidade por falta de forma da alteração da cláusula 5ª a nº 1 do contrato de mediação não é imputável à Apelada, tanto mais que resulta claro do teor do Dec. Lei 77/99 de 16 de Março e em particular do nº 8 do seu art. 20° que a obrigação de formalização escrita do contrato de mediação incumbe em primeira instância à mediadora, que por lei, nunca poderá sequer valer-se de tal nulidade e resulta da matéria dada por provada sempre as partes sempre consideraram encargo da mediadora a formalização de todos os acordos celebrados no âmbito do negócio pelo que a nulidade por falta de forma da alteração que ocorreu no que respeita ao nº 1 da clausula 5° do contrato de mediação só é de facto imputável á Apelada e não o contrario como pretende a sentença recorrida.

Mas não.
Como diz a Apelada, é posição unanimemente assente na jurisprudência que a nulidade a que se reporta a al b) do nº 1 do artigo 668º do C.P.C. só se verifica quando haja falta absoluta de fundamentos, de motivação da decisão (vide, entre outros, AC. STJ de 3/7/73, BMJ 229.°, 155; Ac. STJ de 13/3/74, BMJ 235.°,152; Ac. STJ de 14/5/74, BMJ 237.°, 132) – o que não é o caso.

Solução jurídica:
Segundo ensinou Mota Pinto, não deve admitir-se a invocação da nulidade de contrato ou cláusula com fundamento em vício de forma, quando essa invocação por uma das partes constitua um abuso do direito (6).
Também a jurisprudência vem entendendo que a figura do abuso do direito é invocável para afastar a nulidade decorrente da falta de forma legalmente prescrita(7).

No caso, a redução do preço pedido pelos RR pela venda da fracção, não se traduziu numa actividade em que a Autora pudesse estar interessada egocentricamente. O que ela pretendeu foi aproximar as partes perante um pedido por parte dos interessados, em baixar o preço. A A fez deslocar uma sua trabalhadora a casa dos RR que conseguiu o assentimento dos RR em fazer a venda àqueles interessados por euros 103.500,00 em vez dos pretendidos 106.000,00. Com base nesse novo valor veio a ser outorgado um contrato promessa de compra e venda entre os RR e os interessados em causa – fls. 8 a 10 verso. Prova de que esse preço foi aceite pelos RR. Tal aludido contrato promessa de compra e venda é um contrato que a A acompanha, mas onde não intervém nem ter de intervir. A vontade contratual é dos contraentes. O interesse é dos contraentes. Não podem os RR, a propósito de um interesse seu, da prossecução de um seu objectivo contratual, arguir esta falta de actualização escrita do valor do preço da venda, para se eximir ao pagamento da remuneração à mediadora.

Improcede a arguição de nulidade de contrato, ou de cláusula, por falta de forma legal quando esta arguição configura um abuso do direito, como sucederá nos casos em que a nulidade formal é arguida pelo contraente que a provocou, procedendo, assim, de modo iníquo e escandaloso(8)(9).
Mas mesmo que assim se não entendesse, é de concluir que o artigo 20º do DL 77/99, nº 2, na al.e) quando obriga a que do contrato de mediação constem obrigatoriamente “ as obrigações das partes contratantes “, não se pode referir às obrigações dos comitentes com os interessados a conseguir com a mediação. Estes não são contraentes da mediação. Logo “ as obrigações dos contraentes “ são as obrigações da A e dos RR. Se, encontrados interessados no negócio pretendido de venda, o preço final da mesma fôr, então, alterado, por livre e mútuo acordo entre os comitentes e os interessados no negócio, tal tem a ver com a compra e venda e não com a mediação. Entendendo-se que tem interesse para caracterizar o negócio que se visa com a mediação, então, a exigência de passar esse novo valor para a forma escrita, por ser uma estipulação posterior ao documento, e por não se ver que nisso haja razão especial da lei, então o novo preço não carece de forma escrita para relevar em face contrato demediação – artigo 221º- 2 do Código Civil.

QUANTO À 3ª QUESTÃO
O mediador adquire o direito a receber a remuneração acordada quando o seu trabalho influi sobre a conclusão do negócio.
No caso sub iudice, o negócio realizou-se, a final, entre os inicialmente interessados, angariados pela mediadora – que nunca outros houve senão estes – e os RR, comitentes do contrato de mediação imobiliária, proprietários da fracção pretendida vender.
Até que ponto a actuação da Autora, como mediadora, influiu nessa transacção?
A resposta só pode ser, face ao conjunto de factos provados: na totalidade, foi absolutamente determinante.
Este nexo de causalidade entre a actividade desenvolvida pela Autora como mediadora e a concretização do negócio, é uma questão de facto, a apurar face ao factualismo provado.

Provou-se em 12. que: a Autora conseguiu obter como interessados na compra da casa dos RR, apenas os Srs. P e esposa;
Em 6. que estes recorreram ao B.P.I., S.A., a fim de contraírem um empréstimo para aquisição do imóvel, tendo a Autora facultado a sua identificação para que estes beneficiassem da isenção de custos no processo de avaliação, em conformidade com o Protocolo estabelecido entre a Autora e o B.P.I. S.A..
E em 13. que: o B.P.I. avaliou o imóvel dos RR num quadro de pedido de concessão de crédito bancário para aquisição de casa própria por parte de P e A, aprovando um mútuo garantido com primeira hipoteca para o imóvel, a adquirir por estes, até 100.800,00 euros. Estes, mesmo após 5 de Maio de 2004, data do acordo de fls. 11 e verso, não desistiram do crédito, aprovado por seis meses, e acabaram por adquirir a fracção aos RR, aproveitando o mesmo crédito, já aprovado e ainda pendente, tendo sido a escritura pública outorgada a 5 de Agosto de 2004;
Entretanto estes interessados haviam celebrado com os RR um contrato promessa de compra e venda da fracção por 103.500,00 euros. Entretanto, também com o acompanhamento da Autora, puseram termo a tal contrato, de mútuo acordo como se vê de fls. 11 verso. Entretanto os RR declararam pôr termo ao contrato de mediação validamente celebrado, pela carta de fls. 30. A tudo isto a Autora assistiu, confiante na boa fé dos RR, chegando-se a conformar com o facto de nada ganhar com a mediação.
Não fosse, o que claramente ficou esclarecido em julgamento.
Os interessados, P e A, embora tendo declarado pôr termo ao contrato promessa de compra e venda - outorgando no documento de fls. 11 à frente de uma empregada da A, precisamente a mesma que os atendia no posto de vendas -, de facto, não desistiram do crédito que no B.P.I. já estava aprovado para aquela fracção e pelo valor de 100.800,00 euros. Não desistiram assim do projecto de adquirirem aquela fracção, com recurso ao crédito bancário, para habitação própria, com todo o formalismo e rigor registral exigido pelos bancos nestes casos, com primeira hipoteca como garanti, e registos provisórios da aquisição e da garantia, facilmente convertíveis em definitivos, com a celebração da compra e venda.
Quanto aos RR, donos da fracção a vender, comitentes no contrato de mediação de fls. 6, igualmente outorgantes do acordo rescisório de fls. 11, levantaram suspeitas na sua actuação, à empregada da Autora, aquando da rescisão do contrato promessa. É que, os presentes - apenas os outorgantes do contrato promessa varões -, comportaram-se amistosamente, comportamento não habitual para quem pretende pôr fim a um contrato promessa que durava há meses. Nesse mesmo dia as placas que no andar em venda anunciavam a mesma, foram retiradas. Porém, dois dias depois, da rescisão do contrato promessa, a mesma empregada, tendo para venda uma outra casa possivelmente mais apetecível para os interessados na dos autos, telefonou para casa dos mesmos. Ao fim de poucos dias deram-lhe como resposta que já não iam comprar casa. Avisou a sua entidade patronal, a Autora, desta desconfiança relativa a comportamentos. Entretanto já os RR haviam pelo doc. de fls. 30 declarado que rescindiam o contrato de mediação. Consultado o Registo Predial verificou-se pela apresentação de 21-6-2004 que os interessados haviam registado provisoriamente a seu favor a compra da fracção aos ora Réus, e feito igualmente registos provisórios de hipoteca a favor do B.P.I., instituição financiadora da aquisição. Significa que também os ora Réus não desistiram de vendem a fracção em causa aos interessados angariados pela A, tudo fora das vistas da A, para assim se furtarem ao pagamento da remuneração acordada a esta na cl. 5ª do contrato.

A actuação da Autora foi absolutamente determinante na transaccão que veio a ser feita, a final, uma vez que foi a A que conseguiu encontrar os interessados para a compra da casa; foi ela que diligenciou por um acordo sobre o preço para a mesma; certo que de permeio celebrou-se um contrato promessa de compra e venda, que veio a terminar; mas apesar disso, quer os vendedores comitentes quer os interessados nunca cada um deles desistiu do concreto projecto de transaccionar este imóvel, o que veio a acontecer, já sem a intervenção da Autora, afastada deliberadamente por vendedores e compradores. A determinação em negociar a compra e venda manteve-se viva, apesar de aspectos de engenharia jurídico-formal.

Consequentemente a Autora cumpriu o que acordou com os RR e que consta da cl. 2ª do contrato de mediação. Por ela se obrigou a encontrar interessados na compra da fracção. O negócio pretendido concluiu-se, no caso, a projectada venda, pelo preço - evidentemente - encontrado por comprador e vendedor, dentro da lógica de liberdade negocial, de mercado, e da concorrência, que a há também neste segmento do imobiliário que é a fracção autónoma, o “ andar “.
No mesmo sentido a posição expendida no Ac. do TRL de 27-1-2004, consultável no site da DGSI, por nós já referido.

Não cabe pronunciarmo-nos sobre a validade da rescisão do contrato promessa, e sobre a validade da rescisão do contrato de mediação. Seria inútil.

QUANTO À 4ª QUESTÃO
Para prova de que o negócio efectivamente se concretizou é bastante a cópia da descrição predial do imóvel, com as cotas e apresentações que levaram aos registos provisórios da aquisição por compra a favor dos interessados. Não foi impugnada, nem arguida de falsidade pelo que lhe assiste a força probatória do artigo 371º- 1 do Código Civil.
Se a situação fosse diversa desta, patente nos autos – cabia aos RR a alegação dos factos em contra-prova – artigo 342º- 2 do Código Civil.
Em audiência foram os próprios compradores a referirem ter celebrado a escritura definitiva da compra e venda em 5 de Agosto de 2004, - e tal se deu como provado – facto 13 supra.

QUANTO À 5º QUESTÃO
Tendo a Autora cumprido a sua parte no negócio bilateral da mediação imobiliária, tem direito à remuneração nele acordada, que lhe é assim devida. Pacta sunt servanda – artigo 406º- 1 do Código Civil.

QUANTO À 6ª QUESTÃO
Na cl. 5ª do contrato de mediação as partes acordaram que: 1- pela prestação dos serviços descritos na cláusula 2ª, o segundo contraente – os ora RR – obriga-se a pagar à Mediadora - ora Autora - a título de remuneração a quantia de euros 3.740,00acrescida do respectivo IVA à taxa legal de 17%; 2 – O pagamento da remuneração será efectuado nas seguintes condições: total da remuneração aquando da celebração da escritura ou conclusão do negócio visado.

Ora a conclusão do negócio visado, para o caso dos autos, e do ponto de vista do cumprimento do contrato pela Autora, verificou-se com a celebração do contrato promessa de compra e venda de fls. 8 a 10 verso, e que ocorreu a 20 de Dezembro de 2003.
Seria contrário aos ditâmes da boa fé – artigo 762º- 2 do Código Civil – fixar o cumprimento da mediação noutro momento. Para a mediadora, para o contrato, é necessário que a actividade da mediadora esteja ligada à conclusão do negócio, tenha contribuído para a mesma - o que se provou indubitavelmente. O que interessa é que a mediadora encontrou interessados na projectada compra, verdadeiramente interessados, determinados, de vontade esclarecida, e de decisão tomada em adquirir. Por outro lado os RR sempre pretenderam vender a estes interessados, que tinham o crédito bancário assegurado, registando-se apenas divergências no preço. O projecto para a venda, quer pela banda dos compradores, quer pela banda dos vendedores, sempre foi definido, seguro. A mediadora não podia ser responsabilizada pelo incumprimento do contrato promessa, como não pode esperar que um outro negócio de realize efectivamente, pois nele não é parte, nem nele tem influência, de modo a que só com ele efectivamente formalizado e comprovado possa vir a receber a remuneração acertada. Poderia, com este entendimento, ter de esperar anos a fio.
A celebração deste contrato promessa de compra e venda implicou, para os respectivos outorgantes, o cristalizar de todo um projecto de negócio, para cada uma das partes, o que se alcança até pelo cuidado clausulado. E esse projecto de negócio – pese embora a rescisão do mesmo contrato ocorrida depois – foi o que veio a vingar: pois que foi a Autora que angariou os interessados na compra, e foi - a Autora que acompanhou junto do B.P.I. o processo de empréstimo, que veio a ser aprovado, e de que os interessados nunca desistiram - factos 8 e 13 -. Sabemos da vida de todos os dias, para quem pretende comprar casa cm recurso ao crédito bancário quão importante é ter o mesmo aprovado. Isso significa que o negócio final da compra e venda, com mútuo e hipoteca está garantido. Ora toda esta sequência de momentos determinantes para a venda concretizada – angariação dos interessados; fixação do projecto concreto de negócio com as partes; pedido, acompanhamento e alcance da concessão do crédito bancário - ocorreu mediante a acção da Autora.
O encontro de vontades entre compradores e vendedores materializou-se com o contrato promessa de compra e venda, não importando que depois tenha sido rescindido. Essa rescisão, válida ou não, com motivos ou sem motivos, com causa ou sem causa, não se ficou a dever à actuação da Autora.
Assim a remuneração é devida, a partir de 20 de Dezembro de 2003. Não tendo sido paga, como não foi pelos RR, são devidos juros de mora peticionados – à taxa supletiva legal para as operações civis -, vencidos desde essa data e vincendos até integral e efectivo pagamento.

V – DECISÃO
Pelo que fica exposto, acorda este Tribunal da Relação em julgar em parte procedente a apelação no que toca à matéria de facto, mas no que tange ao direito, a mesma improcedente, confirmando-se a sentença recorrida, fixando-se o início da mora em 20-12-2003.
Custas pelos Apelantes.
Lisboa, 16.10.2007
Rui Moura
Azadinho Loureiro
Folque de Magalhães
_____________________________________________
1) Fernando Amâncio Ferreira, in Manual dos Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Almedina, pág. 21.
(2) Face ao teor de A4 de fls. 186 é este o facto pretendido pelos recorrentes, uma vez que, certamente por lapso, em sede das conclusões de recurso, o facto N) aparece em repetição do M).
(3) Face ao disposto no artigo 712º- 1 a) do C.P.C..
(4) Maria Helena Brito, in O Contrato de Concessão Comercial, Almedina , 1990, pág. 6 e ss, 112 e ss.
(5) Ver Pinto Monteiro: “a obrigação fundamental do mediador é conseguir interessado para certo negócio que, raramente, conclui ele próprio. Limita-se a aproximar duas pessoas e a facilitar a celebração do contrato, podendo a sua remuneração caber a ambos os contraentes ou apenas àquele que recorreu aos seus serviços. A remuneração do mediador … é independente do cumprimento do contrato (diversamente do que sucede com a retribuição do agente … podendo exigi-la logo que o mesmo seja celebrado” (Contrato de Agência (Anteprojecto), BMJ 360-85).
(6) Teoria Geral, 2.ª edição, pág. 435.
(7) (vide, entre outros, os acórdãos da Relação do Porto, de 21-11-1995, BMJ 451, pág. 506, desta Relação de Lisboa, de 4-7-1996, CJ, 1996, 4.º, pág. 93 - que entendeu que age contra a boa fé aquele que invoca a ausência de forma apenas para obter um proveito violador de uma confiança legítima alheia -, do STJ, de 12-11-1998, BMJ 481, pág. 458, e CJ/STJ, 1998, 3.º, pág. 110 e desta Relação, de 20-5-1999, CJ, 1999, 3.º, pág. 104).
(8)Ac STJ de 02.07.1996 – Procº nº 136/96, in www.dgsi.pt.
(9) Ac. TRL de 28-6-2007 disponível no site da DGSI.