Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1866/2004-2
Relator: FARINHA ALVES
Descritores: MANDATO
RATIFICAÇÃO JUDICIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/29/2004
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: PROVIDO.
Sumário: Em qualquer dos casos previstos nos art.ºs 40.º e 41.º do CPC – de falta, insuficiência ou irregularidade do mandato, ou de patrocínio a título de gestão de negócios – se impõe, como pressuposto da declaração de ineficácia do processado, que a própria parte seja notificada para ratificar a gestão, ou o processado, e emitir a procuração.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

S S.A., fez distribuir no tribunal do comércio de Lisboa, a 30-08-2002, petição inicial de recurso de marca subscrita por advogada agindo como gestora de negócios, a qual ali protestou juntar procuração ratificando todo o processado.
Concluso o processo, foi proferido despacho a ordenar a notificação do subscritor do requerimento inicial para, em 20 dias, juntar aos autos procuração forense outorgada a seu favor e/ou declaração de ratificação do processado, sob a cominação prevista no art.º 40.º do Código de Processo Civil.
No prazo assim assinalado, veio a recorrente juntar aos autos cópia da procuração forense a estes destinada, emitida a 11-10-2002, protestando pela junção do respectivo original legalizado com a apostila da Convenção de Haia, de 1961, acompanhado do respectivo certificado de tradução, no mais breve espaço de tempo possível.
Seguiu-se um primeiro despacho a determinar que os autos aguardariam por 15 dias a junção do original e tradução, protestados juntar, que não chegou a ser notificado à parte, seguindo-se, a 27-01-2003, o despacho ora recorrido onde, considerando-se decorrido o prazo que fora fixada para a junção de procuração e ratificação do processado, se julgou ineficaz, nos termos do art.º 40.º, n.º 2 do CPC, o recurso interposto com custas pela ilustre mandatária.
Inconformada, a recorrente agravou do assim decidido, tendo formulado nas respectivas alegações as seguintes conclusões:

A) O despacho do Tribunal de Comércio de Lisboa, de 27 de Janeiro de 2003, que julgou ineficaz o recurso do despacho do INPI, que havia sido apresentado junto desse Tribunal, não fez uma correcta interpretação e aplicação dos preceitos legais.
B) A Recorrente cumpriu o disposto no artigo 40.º do CPC ao juntar cópia da Procuração forense, datada e assinada, em virtude de não ter recebido, até à data que lhe foi fixada judicialmente, o respectivo original.
C) O original da Procuração, ratificando todo o processado, legalizado com a Apostila da Convenção de Haia, assim como a correspondente tradução, foram já juntos a estes autos.

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões, está em causa no presente recurso saber se foi justificadamente aplicada a sanção estabelecida no art.º 40.º n.º 2 do CPC.

A matéria de facto a considerar é a consubstanciada na tramitação processual dos presentes autos, enunciada no relatório que antecede.

Vejamos:

Independentemente de saber se a situação dos autos se enquadrava no art.º 40.º do CPC, como foi entendido, ou no art.º 41.º, por vir invocada a gestão de negócios, julga-se que não foi observado pelo tribunal recorrido o regime estabelecido nos referidos preceitos, que só diverge nos pressupostos, identificados nas respectivas epígrafes. Em qualquer dos casos ali referidos – de falta, insuficiência ou irregularidade do mandato, ou de patrocínio a título de gestão de negócios – se impõe, como pressuposto da declaração de ineficácia do processado, que a própria parte seja notificada para ratificar a gestão, ou o processado, e emitir a procuração. Só a parte pode praticar tais actos e é ela a principal interessada em decidir se a acção deve, ou não, prosseguir, designadamente havendo prazos de caducidade em curso, como era o caso dos autos.
O art.º 41.º- 3 do CPC impõe a notificação pessoal à parte do despacho que fixa prazo para a ratificação do processado, regra que se considera aplicável à ratificação do processado prevista no artigo anterior, por se tratar de uma situação idêntica. Em qualquer dos casos se configura uma situação de gestão de negócios, num caso assumida expressamente e no outro apenas de forma tácita ou implícita.
Num caso como o dos autos, em que a petição inicial é subscrita por advogado que se apresenta como gestor de negócios e protesta juntar procuração, justificava-se uma primeira notificação na pessoa do advogado para juntar a procuração, com eventual ratificação do processado, mas sem a cominação prevista no art.º 40-2 do CPC. O regime aqui estabelecido só seria de observar posteriormente, se a situação não fosse entretanto regularizada. Neste sentido podem ver-se o Professor Lebre de Freitas na anotação ao art.º 40 do seu Código de Processo Civil Anotado, ou o Professor Castro Mendes ali citado. Podem ver-se ainda, o Professor Alberto dos Reis – Código de Processo Civil Anotado, em anotação ao art.º 41, com redacção idêntica ao actual art.º 40.º, ou Abrantes Geraldes – Saneamento e Condensação, editado pelo CEJ em 1997, pag. 42, em nota de rodapé n.º 56.
Ora, no caso apenas foi feita uma notificação na pessoa da ilustre advogada subscritora da petição inicial, tendo sido omitida qualquer notificação à parte.
Depois, tendo sido apresentada, no prazo que foi assinalado, uma cópia de uma procuração expressamente destinada à presente acção, e vindo justificada a não apresentação do original, julga-se que, mesmo a entender-se que bastava a notificação na pessoa do advogado, o despacho ora recorrido não deveria ter sido proferido sem que tivesse sido notificado o despacho proferido sobre aquela apresentação. Melhor dizendo, a declaração de ineficácia do processado e a condenação da senhora advogada em custas, só estaria justificada se lhe devesse ser imputada a não regularização do patrocínio judiciário no prazo assinalado.
Ora tal não está demonstrado nos autos. Dentro do referido prazo foi apresentada uma cópia da procuração e protestada a apresentação do original logo que possível, procedimento aparentemente adequado e que nada permite questionar. Em função disso, impunha-se um novo despacho que, não sendo a dar seguimento ao recurso, devia ter sido notificado.

Julga-se, pois, que não pode ser mantido o despacho ora recorrido, considerando-se não justificada, em termos processuais e materiais, a aplicação da cominação estabelecida no art.º 40.º do CPC.

Termos em que se dá provimento ao agravo, revogando-se o despacho recorrido.

Sem custas

Lisboa, 29-04-2004

( Farinha Alves )
( Tibério Silva )
( Silveira Ramos )