Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7880/08.0TBALM.L1-2
Relator: MARIA DA LUZ BORRERO FIGUEIREDO
Descritores: ALIMENTOS A FILHO MAIOR
LITISCONSÓRCIO
LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO
LEGITIMIDADE
OBRIGAÇÃO DE PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/20/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – A acção de alimentos a filho maior não tem obrigatoriamente que ser deduzida contra ambos os progenitores, já que não estamos diante de um caso de litisconsórcio necessário passivo;
II – A prestação de alimentos devida deve ser proporcional aos rendimentos dos progenitores e necessidades do filho maior efectivamente considerados;
III – Em caso de desproporção dos rendimentos dos progenitores a quota - parte da prestação de alimentos por cada um deverá ser aferida em concreto e não de acordo com critérios padronizados. (Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM AS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

I – Relatório

“A”, intentou contra seu pai “B”, procedimento de pedido de alimentos a filho maior nos termos do Decreto – Lei 272/2001, de 13 de Outubro, junto do Senhor Conservador do Registo Civil de A..., pedindo que:
a) O Requerido fosse condenado a pagar ao Requerente, a título de pensão de alimentos mensal fixa, a quantia de € 772, 30, por vale postal a enviar para a residência do Requerente, pensão esta actualizável anualmente, em Setembro de cada ano em função do índice de inflação divulgado pelo INE para ao ano anterior;
b) O Requerido fosse condenado a pagar as despesas médicas medicamentosas e de material escolar do filho na proporção de 2/3, devendo proceder ao respectivo pagamento, até ao dia 5 do mês seguinte àquele em que o requerente lhe tiver enviado os respectivos comprovativos, por vale postal a enviar para a residência do requerente.
Alegou para tanto e, em resumo, que atingiu a maioridade em ... de 2008, e que os pais se encontram separados desde Dezembro de 2006, e agora pendente acção de divórcio litigioso, não obstante ter sido interposta pela mãe acção de regulação do poder paternal em 30.04.2007, o certo é que não foi fixada qualquer pensão de alimentos ao então menor ora Requerente que não viu regulado o exercício do poder paternal.
Acrescentou que vive com sua mãe e irmã na que foi a casa de morada de família do casal e de seus filhos sendo certo que desde a separação do casal o pai nunca contribuiu para o sustento do Requerente ou para as despesas domésticas.
Ora, não tem meios para o seu sustento e ainda não terminou a sua formação escolar, tendo terminado o 12º Ano e ir frequentar o Curso superior de Design na Universidade ..., em Lisboa, com as inerentes despesas pela frequência do Curso, despesas com material escolar, passe social para se poder deslocar de A... onde reside para a faculdade em Lisboa, vestuário, calçado, alimentação, despesas de água e electricidade, gás, internet, tv cabo, telemóvel pessoal, de farmácia, revistas, livros, idas ao cinema, ocupação de tempos livres.
O pai contribui para o sustento da sua filha mais velha em quantia não apurada, e recusa – se a pagar ao Requerente qualquer quantia a título de pensão. O pai é médico dentista, sócio gerente da Clínica ..., onde é titular de uma quota de 90%, tem rendimentos prediais de € 42.400, 00 e proprietário de 7 ou 8 imóveis, todos em seu nome.
A mãe do Requerente é farmacêutica auferindo rendimento anual de trabalho no montante de € 37.373, 41.
Termina afirmando que as suas despesas fixas ascendem a €1.158, 44, sendo que o pai deverá suportar 2/3 dos rendimentos do Requerente, correspondente a € 772, 30 e a mãe 1/3, sendo que é quem tem suportado a totalidade das suas despesas.
O pai do Requerente foi citado no âmbito daquele procedimento e deduziu oposição, pedindo a sua improcedência e a sua absolvição da instância ou do pedido, alegando em suma:
- A acção deveria ter sido deduzida contra ambos os progenitores, pois ambos são devedores de alimentos e, não o tendo sido, houve preterição do litisconsórcio necessário, pelo que sendo parte ilegítima deverá ser absolvido da instância;
- Está pendente um processo de divórcio litigioso e em apenso a mãe do Requerente deduziu pedido de prestação de alimentos que tendo o requerente atingido a maioridade foi julgado extinto, estando pendente recurso pelo que estamos diante de uma situação de litispendência;
- O comportamento do Requerente para com o Requerido está longe de se pautar pelas regras de respeito devidos pelos filhos aos pais, sendo que o artigo 1880º do Código Civil estabelece que a obrigação de prestar alimentos a filhos maiores apenas existe quando for razoável exigir aos pais o seu cumprimento;
- O comportamento do Requerente – maxime não falando ao pai, não atendendo o telefone ou desligando – o, recusando – se a falar com ele, nem o visitando – não observa os deveres de consideração e de respeito pelo que inibe o filho de vir requerer prestação de alimentos de uma pessoa que gravemente desconsidera e desrespeita;
- O filho, irmã e mãe habitam o ... andar Dto. e Esq. de um prédio sito em A... que pertence exclusivamente ao requerido, sem qualquer contrapartida, sendo que até recentemente foi o requerido quem pagou a água e electricidade a ele respeitante;
-Tem suportado as despesas da filha na íntegra ascendendo a cerca de € 600, 00 /mês;
-As despesas do Requerente são inferiores às da irmã e não ultrapassarão € 350, 00 /mês;
No confronto dos encargos que a mãe do Requerente e o Requerido estão a suportar são bem superiores as despesas a cargo deste; a situação económica da mãe do requerente e do requerido são equivalentes, sendo esta, aliás, mais segura e estável já que é professora do ensino secundário e Directora Técnica em part time de um laboratório de produtos farmacêuticos veterinários sem maiores encargos, enquanto o Requerido tem de suportar despesas maiores com nova habitação que teve de encontrar após a separação e exerce a actividade individual de médico dentista, não se justificando que suportasse maiores encargos que a mãe do requerente nos alimentos para os filhos.
Procedeu – se a conferência na Conservatória do Registo Civil de A..., e, não tendo sido possível o acordo, foram ambos notificados para junção de alegações e requerem produção de novos meios de prova e foi o processo remetido ao tribunal de Família e Menores de A..., nos termos do artigo 8º do Decreto - Lei 272/2001, de 13 de Outubro.
As partes juntaram alegações onde, em síntese, reproduziram os factos já alegados e concluíram de igual forma.

Realizou – se a audiência de julgamento e foi proferida a sentença que julgou a acção parcialmente procedente, por provada apenas em parte e, em consequência, condenou-se o Requerido no pagamento ao Requerente, da prestação de alimentos mensal do valor de € 400,00, a pagar até ao dia 8 de cada mês e até que o mesmo conclua a sua formação profissional.
Mais, nos termos previstos no art. 2006º, do Código Civil, fixa-se o montante em dívida na presente data em € 5.600,00 (desde Janeiro de 2009 a Fevereiro de 2010, inclusive) quantia essa que deverá ser paga em prestações mensais, cada uma no valor de € 200,00 – que acrescerão à prestação fixada – até integral liquidação, sendo certo que a mesma foi parcialmente rectificada por despacho posterior tendo – se substituído o segmento "€ 5.600,00 (desde Janeiro de 2009 a Fevereiro de 2010, inclusive)" por "€ 6.800,00 (desde Outubro de 2008 a Fevereiro de 2010, inclusive)".

Inconformado, recorreu o Requerido apresentando as seguintes conclusões:
“1. Nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 2009º do Código Civil estão obrigados a prestar-lhe alimentos ao recorrido, enquanto deles careça, tanto o recorrente como a sua
mãe.
2. E nos termos do artigo 28º do Código de Processo Civil, para que o Recorrido possa peticionar alimentos, teria de o fazer quer contra sua mãe, quer contra o seu pai, por se verificar o litisconsórcio necessário.
3. As razões são as mesmas do decidido, em caso paralelo, no acórdão da Relação do Porto de 21.05.1992 (BMJ, 417, 817 e CJ, 1992, III - 288) e no Assento nº 6/95 do Supremo Tribunal de Justiça de 4.07.1995 (publicado no DR, 1ª Série A, nº 234, de
10.10.1995 e rectificado no DR, 1ª Série A, nº 276, de 29.11.1995) e ainda do decidido no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16.12.2003, cuja cópia está junta aos autos.
4. O Recorrente deveria, assim, ter sido considerado parte ilegítima para ser demandado isoladamente por inobservância do litisconsórcio necessário, pelo que deveria por essa razão ter sido absolvido da instância — artigo 493º, nºs 1 e 2 e 494º al. e) do Código de Processo Civil.
5. Acresce que resulta dos artigos 2009º e 2010º/CC que sendo várias as pessoas simultaneamente obrigadas a prestar alimentos, elas respondem por eles, não solidária, mas conjuntamente e, no caso dos descendentes ou ascendentes, na proporção das suas quotas como herdeiros do alimentando.
6. Isto salvo demonstração — a ser feita naturalmente na própria acção em que se pedem os alimentos — de que algum dos obrigados não tem recursos para os prestar ou para os prestar na mesma medida dos restantes co-obrigados, caso em que só então a obrigação recairá, na parte necessária, sobre estes.
7. Assim, estando em causa pedido de alimentos pelo filho, ainda que maior, ele teria de os pedir a ambos os progenitores, obrigados em igual medida a prestá-los, e porque a intervenção de ambos sempre é indispensável para que possa ser aferida a medida dos alimentos e ser proferida decisão útil quanto aos obrigados.
8. Sendo, pois, o caso, de litisconsórcio necessário, exigindo a intervenção de ambos os obrigados — o que não foi entendido na decisão recorrida.
9. Discorda também o recorrente — sem conceder — da fixação da pensão de alimentos no montante de 400 €.
10. Assim, e como primeira questão, deve considerar-se excessiva a fixação das necessidades do recorrido na quantia de 968 €/mês, sendo que tais necessidades não têm de aferir-se por quanto efectivamente gaste em cada mês, mas por quanto, segundo um padrão normal, constituam as necessidades de um jovem de 19 anos, frequentando o ensino superior particular e que, nas circunstâncias concretas do recorrido, não correspondem àquele valor.
11. Depois, e como segunda questão, não foi também correcto e adequado à lei o critério estabelecido para fixar o montante da pensão, uma vez que no presente caso estão obrigados à prestação de alimentos, nos termos da alínea c) do artigo 2009º/CC, os ascendentes do recorrido.
12. Ora, a questão sobre como deve fazer-se, entre os obrigados, a repartição do encargo de alimentos é regulada pelo artigo 2010º/CC, do qual decorre que a repartição desses encargos entre os pais do recorrido deveria fazer-se em partes iguais, porque essa é a correspondência às suas quotas como herdeiros do alimentando; e só se apurasse — e não se apurou — que a mãe do recorrido — não demandada na acção — não podia satisfazer a parte que lhe cabe poderia recair sobre o recorrente o restante.
13. A decisão recorrida violou, pois, as disposições legais acima citadas e não tinha condições para fixar nos termos em que o fez a pensão de alimentos, pelo que deve ser revogada e absolvido o recorrente, como é de JUSTIÇA!”

O Requerente contra – alegou, apresentou as seguintes conclusões:
“1) Em acção de alimentos intentada por filho maior, a relação material controvertida é a obrigação creditória alimentar, estabelecida entre cada um dos progenitores e o filho, não fazendo sentido a imposição de litisconsórcio necessário passivo de ambos os progenitores posto que, como é o caso, o Requerente reconhece e alega que o outro progenitor está a cumprir a sua obrigação de alimentos, até para lá daquilo que lhe era exigível;
2) Neste sentido vem a mais moderna jurisprudência, mormente o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 13.01.2005, com o n.º2464/04-3;
3) Não faz sentido demandar alguém que está voluntariamente a cumprir a sua obrigação alimentar para com o filho, maior, e obrigá – lo consequentemente a pagar custas judiciais;
4) Sendo que no caso dos autos, as possibilidades de ambos os progenitores são manifestamente diferentes, terão de quinhoar de forma diferente nas despesas de seu filho maior;
5) Não é necessário, para aferir das possibilidades de cada um dos progenitores, que ambos sejam demandados em juízo, basta que as diferentes possibilidades de cada um sejam alegadas pelo credor de alimentos, que foi o que foi feito nos autos;
6) A pensão fixada, ou melhor que o pai foi condenado a pagar ao filho, de €400 é mais do que justa, face ao caso concreto em que o pai tem praticamente o dobro dos rendimentos da mãe;
7) As despesas do Requerente, fixadas em €968, 00/mês, correspondem às reais despesas do ora recorrido, apuradas e fixadas pelo tribunal;
8) O padrão normal de um jovem, de 19 anos e o salário mínimo nacional não constituem critérios legais para a fixação da pensão alimentar;
9) Os alimentos são fixados e foram – no, no caso em apreço, de acordo com o critério legal das possibilidades de quem os presta e as necessidades de quem os recebe;
10) O critério estabelecido para fixar a pensão dos autos, como se verifica na douta sentença, foram as diferentes possibilidades de ambos os progenitores e as necessidades do filho maior;
11) Sendo os rendimentos do pai quase o dobro dos da mãe, conforme se alegou e provou nos autos, é obvio que a mãe não poderia quinhoar, na obrigação de alimentos, em partes iguais com o pai – cumpriu – se o disposto no artigo 2010º, n.º2 do Código Civil;
12) Na douta sentença deu – se inteiro cumprimento ao disposto nos artigos 2008º, 2009º e 2010º, todos do Código Civil, e o pai foi condenado a cumprir a obrigações de alimentos para com o filho maior, que não cumpria desde Setembro de 2006.
Termos em que deve a Douta Sentença recorrida ser mantida como é de Lei e de Justiça!”.

II – Fundamentos de facto
A 1ª instância considerou provados os seguintes factos, não sujeitos a impugnação, que aqui se aceitam (cfr. Artigo 713º n.º6 do Código de Processo Civil):

1. “A” nasceu a .../.../1990, e é filho de “B” e “C”;
2. Os pais do Requerente vivem em completa separação de cama, mesa e habitação;
3. Os pais do Requerente estão separados de facto desde Setembro de 2006, encontrando-se pendente acção de divórcio litigioso;
4. A mãe do Requerente intentou acção de regulação do poder paternal, em 02/05/2007;
5. Após a separação dos pais, o Requerente ficou a viver em comunhão de mesa e habitação com a mãe e uma irmã, maior, na Av. ..., n.º ..., ... andar Esquerdo, em A...;
6. O pai, desde a separação do casal, nunca contribuiu com qualquer quantia em dinheiro para o sustento do Requerente;
7. O Requerente não tem meios próprios para o seu sustento, e ainda não terminou a sua formação profissional;
8. O Requerente, terminou o 12º Ano, com a média de 14,4 valores, e frequenta o 1º ano do Curso Superior de Design, na Universidade ..., em Lisboa, onde está matriculado e inscrito;
9. As despesas de candidatura, matrícula, inscrição e seguro escolar, do referido curso foram de € 672,00;
10. A propina mensal que o Requerente irá pagar pela frequência do referido Curso é de € 306,90 mensais, e será devida 11 meses por ano;
11. As despesas com material escolar do Requerente são muito variáveis;
12. O Requerente vai mesmo ter que adquirir um computador portátil, com um software próprio e placa gráfica, adequado para o seu Curso, que não se sabe ainda quanto custará;
13. O Requerente tem passe social para se deslocar da sua residência, em A..., para a Faculdade, em Lisboa, que custa a quantia mensal de € 50,70, onze meses por ano;
14. O Requerente gasta em vestuário e calçado, quantia mensal não concretamente apurada;
15. O Requerente tem de almoçar e lanchar na cantina da faculdade, o que tem o custo de € 7,50 por cada dia útil, de segunda a sexta-feira, dez meses por ano;
16. A despesa mensal, em alimentação, em produtos de higiene e limpeza, dos três elementos que compõem o agregado familiar do Requerente, não é inferior a € 600;
17. A despesa de gás, no período compreendido entre 14/5/2008 a 23/7/2008, e de electricidade, no período compreendido entre 15/5/2008 a 16/7/2008, da residência onde vive o Requerente, foram de € 58,14 e € 71,97, respectivamente;
18. A despesa de água no período de 28/05/2008 a 27/6/2008, da residência onde vive o Requerente, foi de € 34,95;
19. A despesa no mês de Julho de 2008, da residência onde vive o Requerente, com a CaboVisão, com internet, telefone e televisão foi de € 52,53;
20. O Requerente tem despesas com o seu telemóvel pessoal de € 20,00 mensais;
21. A despesa de farmácia do Requerente é muito variável;
22. As despesas de mulher - a - dias que faz a limpeza da casa onde vive o Requerente, a irmã e a mãe de ambos, são € 150 mensais;
23. A mãe do Requerente lhe entrega a quantia de € 150,00, por mês a título de mesada, com a qual o Requerente paga revistas, livros, idas ao cinema e ocupação de tempos livres;
24. O Requerente vai ser operado ao ombro esquerdo no final do ano lectivo e não se sabe quais serão as despesas de fisioterapia do Requerente, que se seguirão à operação;
25. O Requerido contribui para o sustento da filha mais velha, para as despesas escolares, de vestuário, transporte e portagens, uma vez que a filha conduz, para se deslocar, um veículo automóvel que o pai lhe faculta, e a mãe suporta algumas despesas da filha, nomeadamente, as de alimentação em casa, gás, água, electricidade e cabovisão, mulher a dias e produtos de higiene e limpeza;
26. A filha mais velha se encontra no último ano do Curso de Medicina Dentária, a qual não tem qualquer fonte de rendimentos;
27. É a mãe quem tem suportado sozinha as despesas de alimentação em casa, e ainda, as despesas de gás, cabovisão, mulher – a - dias, além dos produtos de higiene e limpeza do agregado familiar, e ainda as despesas individuais suas e do Requerente;
28. O Requerente vive com a mãe e irmã na Av. ..., n.º ..., ... andar Esquerdo, cuja propriedade se encontra registada em nome do pai, que é casado com a mãe no regime de separação de bens;
29. O Requerido é médico dentista e sócio gerente da Clínica ..., Lda., com sede na Av. ..., n.º ..., ..., ..., A..., sendo titular de uma quota correspondente a 90% do capital social da referida sociedade;
30. No ano fiscal de 2005, o Requerido teve um rendimento bruto de trabalho dependente no montante de € 23.800, e no ano fiscal de 2007, o Requerido teve um rendimento bruto de trabalho dependente no montante de € 25.200;
31. O Requerido é proprietário de vários imóveis, e no ano fiscal de 2005, teve rendimentos prediais, declarados no seu IRS, no montante de € 42.100, e no ano fiscal de 2007, teve rendimentos prediais, declarados no seu IRS, no montante de € 42.660;
32. A mãe do Requerente é farmacêutica e no ano fiscal de 2006, teve um rendimento bruto de trabalho dependente no montante de € 22.373,41 e um rendimento ilíquido de prestação de serviços no montante de € 15.000;
33. No ano fiscal de 2007, a mãe do Requerente teve um rendimento bruto de trabalho dependente no montante de € 22.781,22 e um rendimento ilíquido de prestação de serviços no montante de € 15.000;
34. O Requerido, em circunstâncias não concretamente apuradas, chamou ao filho, ora Requerente, então menor «imbecil», «estúpido» e «anormal»;
35. O Requerente assistiu ao pai a empurrar a mãe e a chamar-lhe de «cabra», «esterco» e «interesseira», e impor-lhe que deixasse o quarto do casal;
36. O casal tem outra filha, de seu nome “D”, já maior, e vivem ambos os irmãos em comunhão de mesa e habitação com a mãe desde a separação dos progenitores, em Setembro de 2006;
37. O casal, desde 1992 que vivia no ... andar esquerdo e direito do prédio sito na Av. ..., n.º ... em A..., duas fracções autónomas que estavam unidas por dentro;
38. Depois da separação dos progenitores, o Requerido separou de facto o lado esquerdo do lado direito da casa de morada de família a que só o Requerido passou a ter acesso;
39. O Requerido viveu durante algum tempo, desde Setembro de 2006 a Dezembro de 2006, no lado Direito da casa de morada de família não permitindo o livre acesso da família a este lado da casa;
40. O Requerido deixou a família confinada ao lado esquerdo da casa de morada de família, embora tivesse posteriormente, acabado por sair da parte direita da casa de morada de família;
41. A fracção do lado Esquerdo onde reside o Requerido tem quadro divisões assoalhadas, duas casas de banho e duas varandas fechadas;
42. Os pais do Requerente são casados no regime de separação de bens;
43. O Requerente se desloca para a faculdade de transportes públicos, dado que o pai não lhe facultou nenhum automóvel, ao contrário do que fez com a irmã;
44. A mãe do Requerente é professora do ensino secundário e dá assistência técnica a um laboratório de produtos farmacêuticos;
45. O Requerente é filho do Requerido e de “C”;
46. Está pendente entre os pais do Requerente processo de divórcio litigioso, que corre termos no 1º Juízo de Família e Menores do ..., como Proc. n.º .../07....;
47. Desde Junho/Julho de 2007, que o Requerente não tem quaisquer contactos com o Requerido;
48. Quando o Requerido lhe telefona, o Requerente não atende o telefone;
49. Do seu casamento nasceu a “D”, e em .../.../1990, o Requerente;
50. A mãe e os filhos estão a habitar na fracção autónoma designada pela letra «Q», correspondente ao ... andar esquerdo do prédio sito na Av. ..., ..., em A..., cuja propriedade se encontra registada em nome do Requerido, mas que não recebe por isso qualquer contrapartida;
51. Essa fracção tem 90 m2, e é composta por quatro divisões, cozinha, 2 WC e 2 varandas fechadas, e o seu valor locativo não é inferior a € 700/mês, e é o requerido quem sempre suportou a respectiva contribuição autárquica/IMI, o condomínio - € 38,55/mês, o seguro - € 42,63/ano, e despesas extraordinárias com obras;
52. O Requerido suportou durante alguns meses, após a separação do casal, as despesas com a electricidade e o fornecimento de água no andar;
53. É o requerido quem tem suportado, na íntegra, desde a sua entrada na Faculdade, as seguintes despesas da filha:
a) as propinas da Faculdade – cerca € 1.000/ano, livros e demais
despesas escolares - € 50;
b) as despesas com alimentação na faculdade - € 120;
c) as despesas de transporte, em carro disponibilizado pelo Requerido, com combustível - € 100, portagens - € 20, seguro - € 400/ano, e despesas de manutenção, para deslocações diárias
A...-Lisboa-A...;
d) as despesas com vestuário;
e) as despesas com telemóvel;
f) as despesas com ginásio - € 45;
g) e uma mesada - € 100;
54. O Requerido exerce a actividade individual de médico dentista numa clínica dentária de sociedade em que é sócio maioritário.

III - Do mérito do recurso

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente (artigo 684º, n.º3, e 690º, n.ºs 1 e 3, Código de Processo Civil), salvo questões de conhecimento oficioso (artigo 660º, n.º2, in fine), apenas estando o tribunal ad quem vinculado à apreciação das questões suscitadas que relevem para conhecimento do objecto do recurso.
No caso dos autos, cumpre apreciar as seguintes questões:
1- Ilegitimidade do Réu, por preterição de litisconsórcio necessário passivo já que aquele se encontra desacompanhado da mãe do Requerente de alimentos, filho de ambos;
2- A fixação do montante da pensão, designadamente por extravasar a parte da quota do Requerido como herdeiro nos termos do artigo 2010º do Código Civil.
III.1 – Da Ilegitimidade do Requerido
O apelante vem invocar a preterição do litisconsórcio necessário já que o Requerente apenas intentou contra si a acção de alimentos não o tendo feito relativamente a sua mãe.
Quid juris?

O artigo 26º do Código de Processo Civil estabelece que :
“ 1 – O A. é parte legítima quando tem interesse directo em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse directo em contradizer.
2- O interesse em demandar exprime – se pela utilidade derivada da procedência da acção; o interesse em contradizer, pelo prejuízo que dessa procedência advenha.
3-Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor”
E no artigo 28º do Código de Processo Civil:
“1- Se, porém, a lei ou o negócio exigir a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade.
2 – É igualmente necessária a intervenção de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão produza o seu efeito útil normal. A decisão produz o seu efeito útil normal sempre que, não vinculando os restantes interessados, possa regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado.”

Ora, no caso dos autos, o Requerente dirige a acção apenas contra seu pai, certamente porque sua mãe o vem sustentando.

Como bem diz Remédio Marques “Algumas notas sobre alimentos (devidos a menores)”, Fac. De Direito da Universidade de Coimbra, Centro de Direito da Família, 2, 2ªedição a p. 335, 336 e nota 447:
“O problema está na articulação entre a titularidade, por banda do filho maior, do direito a alimentos e o seu exercício no quadro de uma acção de divórcio litigioso ou de separação judicial de pessoas e bens.
De facto a estrita aplicação das normas sobre a legitimidade activa e passiva determina que o filho maior, não estando a viver com nenhum dos progenitores, poderá – mas não é obrigado - a deduzir o pedido contra ambos, já que ambos estão vinculados à obrigação(…)”
E em nota 447 de rodapé: “ Não me parece, pois, que o litisconsórcio seja necessário (cfr. o artigo 28º do Código de Processo Civil). De resto, é duvidoso que se esteja perante uma hipótese de litisconsórcio, mas antes de coligação (voluntária)”.

Efectivamente, parece – nos pouco defensável que se deva demandar em juízo a/o progenitor/a que cumpre a sua obrigação para com seu filho, o que este próprio reconhece.
Ora, o litisconsóricio necessário passivo decorre da imposição legal, da própria natureza da relação jurídica como se viu supra (caso do despejo de prédio para habitação/casa morada de família posta deve ser posta contra ambos os cônjuges, por exemplo), o que também sucede nas obrigações solidárias em que corresponde à pluralidade de sujeitos uma única relação material controvertida.
No caso dos autos, a filiação é o estado que fundamenta o dever de alimentos nas hipóteses do artigo 1880º do Código Civil, mas a relação material controvertida é a creditória alimentícia estabelecida entre cada um dos progenitores e o filho o que significa que, realizando um dos progenitores a prestação alimentícia suficiente para as necessidades do filho, este já não careça de demandar o outro, o que não quer dizer que o que em nada contribui fique desonerado da obrigação de prestar alimentos que sobre o mesmo impende - neste sentido Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 13.01.2005, P.º2464/07-3 in www.dgsi.pt.

E mais: nada obriga o Requerente a deduzir pedido contra sua mãe, cumpridora da sua obrigação, tanto mais que o conhecimento dos seus rendimentos ocorrerá sempre – como sucedeu nos autos – alegando o mesmo tais factos e provando – os, habilitando o tribunal a determinar o montante da prestação de alimentos que o pai deverá suportar e em que proporção.

Improcede, pois, a excepção de ilegitimidade por preterição do litisconsórcio necessário passivo.

III.2 – Montante da prestação de alimentos

Como é sabido, entende – se por alimentos tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário – artigo 2003º do Código Civil.
Por outro lado, os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá – los e à necessidade daquele que houver de recebê – los – artigo 2004º, n.º1, do mesmo Código.
Compete aos pais, para além do mais, velar pela segurança e saúde dos filhos e prover ao seu sustento - artigo 1878º do Código Civil.
Acresce que a obrigação de prover ao sustento dos filhos menores e de assumir as despesas relativas à sua segurança e educação cessará na medida em que eles estejam em condições os pais ficarão de suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos aqueles encargos – artigo 1879º do Código Civil.
Por outro lado, tal dever cessa também logo que os filhos atinjam a maioridade (cfr. artigo 1877º do mesmo diploma).
De todo o modo, o artigo 1880º do Código Civil dispõe:
“ Se no momento em que atingir a maioridade ou for emancipado o filho não houver completado a sua formação profissional, manter – se – á a obrigação a que se refere o artigo anterior na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete”.
Refira – se que em anotação a este preceito Rodrigues Bastos, “Notas ao Código Civil”, Vol. VII, p.107, afirma: “A circunstância de ter baixado para os dezoito anos a maioridade legal (artigo 130º) justifica inteiramente este preceito. Realmente são frequentes os casos em que aos 18 anos ainda não se completou uma formação profissional (…) É claro que, em tais casos, a supressão pura e simples da obrigação de os pais concorrerem para o sustento e educação dos filhos quando estes atingem a maioridade, frustraria os melhores propósitos da lei ao pôr a cargo dos progenitores essa mesma obrigação.”

Também J.P. Remédio Marques, in op. citada, a pp. 291 e seguintes:
“A obrigação de alimentos devidos ao menor não se extingue inelutavelmente com a maioridade. Aliás a recíproca obrigação geral de alimentos, que se devem ascendentes e descendentes, só termina à data da morte, pois se destina à conservação da vida.
(…)
§30.1 Justificação
a) Dado que os pais são responsáveis, como se aludiu, pelo crescimento e desenvolvimento dos filhos, velando pela sua educação (artigo 1878º/1 do CC), bem se compreende que esta obrigação não deva extinguir – se, de modo abrupto, quando os filhos completam os 18 anos – para mais quando se deu o abaixamento da idade em que se atinge a maioridade e se alargou o período de escolaridade.

Ao invés, deve prolongar – se para além do termo da menoridade, por forma a que o filho complete a sua formação profissional e desde que seja razoável exigir dos pais a continuação dessas despesas (artigo 1880º, idem)
(…)
§30.2 Pressupostos de atribuição. Elementos objectivos e subjectivos
a) O critério está, segundo alguma doutrina, na imputação da não ultimação da formação profissional à culpa grave do filho.

Creio, no entanto, que pelo alto, o critério passará pela cláusula geral do abuso de direito e não tanto – ou não só – pela alegação e prova de um comportamento gravemente censurável ao credor dos alimentos, seja a título de dolo seja a título de mera culpa. Cláusula geral, esta, que se traduz no abuso do direito de peticionar alimentos (…) Mas com o limite deste último grau do contra legem, o critério do artigo 1880º do Código Civil não está tanto na (in) existência de culpa grave do filho, quanto, outrossim, na verificação de determinados elementos objectivos e subjectivos que densificam os conceitos de razoabilidade e (in)exigibilidade nele presentes.
(…)
A nova redacção do artigo 1880º do Código Civil, na sequência das alterações introduzidas pelo Decreto - Lei n.º496/77, de 25 de Novembro, prolonga o dever de alimentos dos pais para além do fim da menoridade, precisamente porque estará a pensar que, por via de regra, os filhos não desfrutam da necessária capacidade económica para inaugurarem ou prosseguirem os cursos universitários ou técnico - profissionais.
De facto, as taxas de desemprego relativamente elevadas existentes no mundo ocidental (fundamentalmente nas camadas de jovens que procuram o primeiro emprego, o que tem gerado elevadas taxas de desemprego juvenil), conjugadas com o aumento de competitividade real no mundo laboral implicam a necessidade de uma melhor preparação e formação – mesmo daqueles que, pela primeira vez, pretendem aceder ao mercado do emprego.
Como a ajuda financeira do Estado (a fundo perdido ou mediante o esquema de contrato de mútuo) só beneficia os estudantes economicamente carenciados, a educação e instrução superior ou técnico - profissional dos jovens cujos progenitores (ou estando casado, a pessoa do respectivo cônjuge) dispusessem de meios económicos suficientes ver – se – ia comprometida acaso inexistisse o referido dever legal específico constante do artigo 1880ºdo Código Civil.

(…)
§30.2.1 Requisitos objectivos e subjectivos

a) Cumpre, no entanto, indagar que elementos subjectivos e objectivos são susceptíveis de densificar a cláusula de razoabilidade prevista no artigo 1880º do Código Civil.

Os pressupostos objectivos prendem – se com as possibilidades económicas do jovem maior (rendimentos de bens próprios, rendimentos do trabalho), e com os recursos dos progenitores.
Os pressupostos subjectivos atinam, no essencial, a todas aquelas circunstâncias ligadas à pessoa deste credor (capacidade intelectual, aproveitamento escolar, capacidade para trabalhar durante a frequência escolar) que modelam e estão na génese do prolongamento desta obrigação.

Quanto aos elementos objectivos, importa perquirir das possibilidades económicas dos interessados: os recursos económicos dos pais e as possibilidades do filho maior.
Tal – qualmente ocorre em sede da geral obrigação de alimentos, prevista no artigo 2003º e seguinte do Código Civil, também aqui há que atender ao património do devedor de alimentos e aos rendimentos (líquidos) dessa massa patrimonial.
Depois, há que subtrair as quantias suficientes para satisfazer as respectivas necessidades básicas (mínimo de auto – sobrevivência). Apurados os recursos disponíveis, é preciso, eventualmente, dividir o rendimento disponível por todos os filhos (nascidos dentro e fora do casamento do(s) devedor(es) ou já depois desse casamento ter sido dissolvido.
(…)
De uma certa forma, a efectivação desta específica obrigação de alimentos estará, não raro, reservada aos filhos cujos progenitores disponham de rendimentos acima da média – a não ser que, porventura, o credor seja filho único.
(…)
Embora raro – mas, de todo o modo, verificável se, por exemplo, um dos ascendentes falece ou se o filho maior adquire bens ou direitos inter vivos ou mortis causa -, a titularidade, por parte deste filho, de património próprio (maxime se for produtor de rendimentos) deve ser levada em conta não só como pressuposto do reconhecimento do direito a estes alimentos, mas, também, como factor de quantificação ou medida dessa obrigação.
De todo o modo, a consideração dos bens próprios do filho maior não constitui facto impeditivo da efectivação do dever dos bens, principalmente se esses bens não produzem rendimentos.
É que, neste particular, ao invés da comum obrigação de alimentos, mostra – se altamente desaconselhável a alienação ou oneração do próprio capital ou do património desse filho, por isso que este servirá, ultima ratio e uma vez ultimada a formação profissional propiciar a respectiva colocação (…)”.
E o mesmo autor na nota 427, a fls. 320:
“(…)
É que, na avaliação das possibilidades económicas do obrigado a alimentos cumpre atender não só aos seus rendimentos (v.g. salários, vencimentos, soldos, honorários, prémios, gratificações normais, etc.) mas, também, aos próprios bens de raiz - assim, João de Matos Antunes Varela, Direito da Família, 4ªedição, pp 352-353.
Acresce que, se o credor dos alimentos for o filho maior convivente, que deles careça para completar a formação profissional, é bem de ver que o prolongamento, nos termos do artigo 1880º, do dever de assistência dos pais para com os filhos maiores (traduzido no conteúdo do poder paternal, plasmado no artigo 1878º/1 – à excepção, obviamente, do dever de obediência) -, importa que, a mais do acolhimento em, casa do(s) progenitor(es), o filho tenha disponibilidade financeira para adquirir, sem se sujeitar aos gostos (ou caprichos) desse(s) progenitores, v.g. o calçado e as roupas e bem assim lhe seja disponibilizado o dinheiro de bolso para custear as despesas menores (v.g. café, bilhetes de cinema, discotecas). Tudo isto – bem entendido - em função das possibilidades económicas do obrigado.
Importa, destarte – e tendo em vista impedir que a conjugação das duas formas de prestar alimentos conduzam à não satisfação das necessidades normais (básicas se o obrigado for o progenitor, se for uma das restantes pessoas do artigo 2009º/1, é preciso que se achem satisfeitas as suas necessidades normais de acordo com o padrão de vida que já vinha gozando) do obrigado -, fixar prima facie, o montante dos alimentos em dinheiro, avaliando pecuniariamente as prestações in natura e, depois, subtrair a quantia correspondente a estas prestações.”

“O fundamento da obrigação de alimentos dos pais em relação aos filhos, escreve Maria Clara Sottomayor, (in Regulação do Exercício do Poder Paternal nos Casos de Divórcio, 2ª ed., 128 e 129), é não apenas a menoridade – uma situação de incapacidade – mas também a carência económica dos filhos depois de atingirem a maioridade e enquanto prosseguem os seus cursos universitários ou a sua formação técnico-profissional. Os pais devem, dentro dos limites das suas possibilidades económicas, assegurar aos filhos esta formação profissional que exige, normalmente, um esforço e uma concentração dificilmente compatíveis com um emprego que permita aos filhos sustentarem-se a si próprios.
Trata-se, segundo a mesma Autora, da solução mais de acordo com a realidade portuguesa, em que geralmente os filhos, apesar de maiores, vivem com os pais e não trabalham enquanto prosseguem os estudos, e com o direito à educação, ao ensino e à cultura (arts. 73º a 79º da Constituição), cujos custos deverão ser suportados pelos pais, desde que tenham condições económicas para tal, com a cooperação do Estado.
Por outro lado, o critério de atribuição tem muito a ver não tanto – ou não só – com a alegação e prova de um comportamento gravemente censurável do credor de alimentos, a título de dolo ou mera culpa, mas sobretudo com o abuso do direito em peticionar alimentos” - Acórdão Tribunal da Relação de Évora 18.10.2007, pº2022/7/07-3 in www.dgsi.pt.

No recurso ora em análise não foi posto em causa verdadeiramente que o Requerente satisfaça os aludidos pressupostos de natureza objectiva e subjectiva, de que depende a obrigação prevista no artigo 1880º do Código Civil.
O que é posto em crise é não só o montante da prestação alimentícia como a forma de a repartir pelos pais do Requerente.
Atentemos então no caso concreto:
Vem o recorrente indicar nas conclusões das suas alegações que era “excessiva a fixação das necessidades do recorrido na quantia de 968 €/mês, sendo que tais necessidades não têm de aferir-se por quanto efectivamente gaste em cada mês, mas por quanto, segundo um padrão normal, constituam as necessidades de um jovem de 19 anos, frequentando o ensino superior particular e que, nas circunstâncias concretas do recorrido, não correspondem àquele valor”.
Ora, o reclamante não põe verdadeiramente em causa o valor fixado nem as despesas subjacentes dadas como provadas tanto mais que refere que corresponderão às necessidades efectivas em cada mês do Requerente não indicando qualquer valor que repute adequado e justo em alternativa e respectivos fundamentos, limitando – se a formular uma conclusão genérica, que em nada altera a matéria apurada.
E muito menos se deverá ter em conta um “padrão normal de um jovem de 19 anos “ em iguais circunstâncias, porque tal não corresponde ao critério legal constante do artigo 2004º do Código Civil, este sim o aplicável in casu:: os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá – los e à necessidade daquele que houver de recebê – los. De facto, este critério é elástico e abrangente justamente porque há que atentar, caso a caso, nas necessidades de um e nas possibilidades de outros: e, assim, não podemos encontrar um valor padrão em caso algum: deve ter – se em conta as efectivas despesas de quem necessita – designadamente considerando a frequência de ensino privado ou público, despesas escolares, alimentação, telemóvel, transportes, necessidades culturais etc. – considerando o seu habitual padrão de vida, e os rendimentos de quem suporta os alimentos e não qualquer critério padrão quer para as necessidades de um quer para as possibilidades de outro que, como se sabe, são muito variáveis e, desse modo, implicam um ajustamento para se chegar a um valor equitativo caso a caso.

Assim, bem entendeu a Mm.ª Juiz a quo que as despesas do requerente ascendiam a € 968, 00/ mês considerando designadamente os factos apurados sob os n.ºs 9 a 14 e 16 a 21.
Com efeito, concorda – se com a fundamentação apresentada para a fixação de tal quantia e que corresponde às despesas efectivas do Requerente, improcedendo, nessa medida o pretendido pelo Requerido.

Finalmente vem o Recorrente pôr em causa o modo como deve fazer-se, entre os obrigados, a repartição do encargo de alimentos.
O artigo 2010º do Código Civil estipula:
“1 - Sendo várias as pessoas vinculadas à prestação de alimentos, respondem todas na proporção das suas quotas como herdeiros legítimo do alimentando.
2 – Se alguma das pessoas assim oneradas não puder satisfazer a parte que lhe cabe o encargo recai sobre os restantes.”
Ora no caso sub judice apurou – se sem margem para dúvidas – já que foram alegados factos suficientes pelo Requerente – que a mãe do Requerente, farmacêutica, no ano fiscal de 2006, teve um rendimento bruto de trabalho dependente no montante de € 22.373,41 e um rendimento ilíquido de prestação de serviços no montante de € 15.000 (facto n.º32) e no ano fiscal de 2007, teve um rendimento bruto de trabalho dependente no montante de € 22.781,22 e um rendimento ilíquido de prestação de serviços no montante de € 15.000 (facto n.º 33).
Por seu lado, o Requerido é médico dentista e sócio gerente da Clínica ..., Lda., com sede na Av. ..., n.º ..., ..., ..., A..., sendo titular de uma quota correspondente a 90% do capital social da referida sociedade (facto n.º 29), sendo que no ano fiscal de 2005, o Requerido teve um rendimento bruto de trabalho dependente no montante de € 23.800, e no ano fiscal de 2007, teve um rendimento bruto de trabalho dependente no montante de € 25.200 (facto n.º30), é proprietário de vários imóveis, e no ano fiscal de 2005, teve rendimentos prediais, declarados no seu IRS, no montante de € 42.100, e no ano fiscal de 2007, teve rendimentos prediais, declarados no seu IRS, no montante de € 42.660 (facto n.º31).
Ora, face a tais elementos factuais fácil é concluir que há uma manifesta desproporção entre os rendimentos do pai e da mãe do Requerente: aquele em 2007 teve rendimentos que ascenderam a €67.860, 00 enquanto esta teve rendimentos que ascenderam a €37.781, 22.
Assim, mostra – se adequado e justo que as responsabilidades de ambos tenham ordem de grandeza diferente: a quantia a prestar pelo Requerido enquanto prestação alimentícia seja correspondente a 2/3 das despesas apuradas do filho, ora Requerente e fixadas em €968/mês.
Por outro lado, há que sublinhar que a MmªJuiz a quo teve em consideração o facto do Requerente viver em casa pertença de seu pai – com valor locativo de € 700, 00/mês – suportando as despesas inerentes de IMI, condomínio, seguro e despesas extraordinárias com obras – factos n.º 50 e 51 – deduzindo o valor respeitante às necessidades de habitação do Requerente e, como tal fixou contribuição em €400, 00 valor equilibrado e que com os rendimentos que aufere, mesmo considerando as despesas pessoais - que se não apuraram especificamente o que lhe cabia provar - genericamente consideradas e as despesas que suporta relativamente ao sustento da filha mais velha, o Requerido, ora Recorrente, pode suportar.
Também, nestas vertentes o recurso tem de improceder.

IV - Decisão
Pelo exposto, julgando – se a apelação improcedente, confirma – se a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 20 de Janeiro de 2011

Maria da Luz Borrero C.S. Figueiredo
Ana Paula Boularot
Lúcia de Sousa