Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7008/2007-4
Relator: ISABEL TAPADINHAS
Descritores: JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
FALTAS INJUSTIFICADAS
PRISÃO PREVENTIVA
PROCESSO DISCIPLINAR
INSTAURAÇÃO DO PROCESSO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/21/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Sumário:
I - As faltas dadas ao serviço, em número superior a cinco, por motivo de prisão preventiva do trabalhador, em consequência de acusação de crime de homicídio qualificado abuso de confiança e simulação de crime, crime por que veio a ser condenado e que leva a imputar-lhe a responsabilidade de tal prisão, são consideradas como injustificadas, por procederem de comportamento gravemente censurável, constituindo, por isso, justa causa de despedimento.
II – Nada impede que o processo disciplinar seja instaurado antes de haver decisão penal condenatória, transitada em julgado.
III – Admitir o contrário redundaria numa inversão de valores a ter em consideração numa relação laboral normal e adequada aos interesses do empregador e à generalidade dos trabalhadores ao seu serviço uma vez que quando a entidade patronal pudesse mover o processo disciplinar ela já estaria fora de prazo para tal.
(sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

Relatório
(A) intentou, em 19 de Maio de 2004, acção emergente de contrato individual de trabalho com processo comum contra Banco (S), S.A., pedindo que seja declarada a nulidade do seu despedimento e o réu condenado a:
- reintegrá-lo no seu posto de trabalho e ao seu serviço, com a categoria, antiguidade e retribuição que teria se não tivesse sido despedido e desde a data da decisão do despedimento;
- pagar-lhe as retribuições já vencidas desde a data do despedimento no valor de € 7009,08, acrescidas de juros à taxa legal, até integral pagamento e que perfazem € 35,05;
- as prestações pecuniárias vincendas, relativas às retribuições que deixou de auferir desde a data de despedimento até à data da sentença, acrescidas de juros à taxa legal desde o vencimento de cada uma dessas importâncias;
- o valor, a apurar em liquidação de sentença, correspondente ao valor compensatório mensal, relativo às contribuições para segurança social e uma indemnização compensatória no valor de € 10.000,00, acrescida de juros vincendos calculados à taxa legal.
Para fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese, o seguinte:
(…)
Realizada a audiência de partes e não tendo havido conciliação foi ordenada a notificação do réu para contestar, o que ele fez, concluindo pela improcedência da acção, excepcionando a litispendência relativamente ao processo a correr termos na 3.ª Secção do 3.º Juízo do Tribunal de Trabalho de Lisboa, sob o número 5625/03.0TTLSB.
Na sua contestação, alegou, resumidamente, o seguinte:
(…)
Após vicissitude processual, que ao caso não interessa, foi realizada audiência preliminar, que ordenou a apensação aos autos da providência cautelar instaurada pelo autor em 4 de Fevereiro de 2007, julgou improcedente a excepção de litispendência, deu por verificados os pressupostos de validade e regularidade da instância e proferiu despacho de condensação.
Instruída e julgada a causa foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo o réu do pedido.
Inconformado, com a sentença, o autor veio interpor recurso de apelação dessa decisão, tendo sintetizado a sua alegação nas seguintes conclusões:
(…)
No requerimento de interposição de recurso, o autor invocou a nulidade da sentença, nos termos do primeiro segmento da alínea d) do nº 1 do art. 668.º do Cód. Proc. Civil - omissão de pronúncia.
Na sua contra-alegação o réu pronunciou-se pela manutenção do julgado.
Nesta Relação, o Ex.º Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer a fls. 501 no sentido de ser confirmada a sentença recorrida, negando-se, consequentemente provimento ao recurso interposto.
Colhidos os vistos cumpre apreciar e decidir.
Como se sabe, os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes e decididas pelos tribunais inferiores, salvo se importar conhecê-las oficiosamente – tantum devolutum quantum appelatum (Alberto dos Reis Código do Processo Civil Anotado vol. V, pág. 310 e Ac. do STJ de 12.12.95, CJ/STJ Ano III, T. III, pág. 156).
No caso em apreço, não existem questões que importe conhecer oficiosamente.
As questões colocadas no recurso delimitado pelas respectivas conclusões (com trânsito em julgado das questões nela não contidas) – arts. 684º, nº 3, 690º, nº 1 e 713º, nº 2 do Cód. Proc. Civil – restringem-se às seguintes:
1.ª- nulidade da sentença por omissão de pronúncia – art. 668.º, nº 1, alínea d) do Cód. Proc. Civil;
2.ª- justa causa de despedimento;
3.ª- indemnização por danos não patrimoniais.

Fundamentação de facto
A 1ª instância deu como provada a seguinte matéria de facto não objecto de impugnação e que assim se considera fixada:
A) O autor é o empregado n.º ... do réu, tendo-se mantido ao serviço até 10 de Dezembro de 2002, data em que desempenhava as funções de sub-gerente da agência da ..., em Coimbra, do Banco (T).
B) No dia 10 de Dezembro de 2002, cerca das 20 horas, o requerente foi detido, tendo-lhe sido aplicada a medida de coacção de prisão preventiva por suspeita de homicídio de (AP), de 73 anos de idade, não mais tendo comparecido ao serviço.
C) Após 11 de Dezembro de 2002 o autor não mais compareceu ao serviço.
D) Por acórdão de 27 de Fevereiro de 2004 dos jurados e juízes que constituem o tribunal do júri, no processo comum colectivo nº 1267/02.5TACBR da 1ª Secção da Vara Mista de Coimbra o requerente foi condenado como autor material de um crime de homicídio qualificado p.p. pelos artigos 131º, 132º, nº 1 e 2, alíneas b), d) e f) do Cód. Penal na pena de 16 anos de prisão, como autor material de um crime de abuso de confiança p.p. pelo artigo 205º, nº 1, alínea b) do Cód. Penal na pena de 3 anos e 6 meses de prisão e como autor material de um crime de simulação de crime p.p. pelo artigo 366º, nº 1, do Cód. Penal na pena de 7 meses de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena única de 18 anos de prisão.
Para tanto, foi dada como provada nomeadamente a seguinte matéria de facto:
Há cerca de 25 anos quando trabalhava ainda na agência da Rua ..., do Banco (T) o requerente conheceu o Sr. (AP), que já era então cliente do banco.
Quando o requerente foi nomeado gerente da agência da ..., do Banco (T), há cerca de 6 anos, começou a privar mais assiduamente com o Sr. (AP).
O Sr. (AP) tinha contas na agência da ...e os contactos com o banco passaram a ser feitos frequentemente através do requerente, que pessoalmente tratava das tarefas burocráticas respeitantes às operações que aquele tinha necessidade de realizar.
Assim, quando o Sr. (AP)tinha necessidade de resolver algum problema no Banco (T), era o requerente que pessoalmente o atendia, na maior parte das vezes, tendo-se criado entre ambos, com o decorrer do tempo, uma forte relação de confiança.
O Sr. (AP) havia-se separado de sua esposa e, desde então, vivia sozinho, não tendo também boas relações com qualquer dos seus quatro filhos.
O Sr. (AP) era um homem de personalidade forte, trato difícil e pouco sociável; vivia isolado, sem contactos regulares com qualquer dos seus familiares.
O Sr. (AP) tinha sofrido um acidente vascular cerebral que lhe causou a paralisia da parte direita do corpo, designadamente o braço e a mão direita, pelo que tinha grandes dificuldades na realização de algumas tarefas, como escrever ou conduzir automóvel.
Dada a situação de isolamento do Sr. (AP) e da sua incapacidade motora, o requerente, fruto da relação de confiança que entretanto se estabelecera entre ambos, passou a prestar-lhe pequenos favores, nomeadamente redigindo-lhes cartas e outros documentos e acompanhando-o numa viagem a Torres Novas.
O requerente tornou-se, assim, seu confidente e passou a ser visita de sua casa.
Como mantinha más relações com os seus familiares, e se encontrava a decorrer o processo de partilha de bens subsequente ao divórcio, o Sr. (AP) utilizava vários estratagemas para ocultar os seus bens pessoais.
Uma das formas de ocultação por si utilizada consistiu em abrir uma conta no Banco (S), agência da ... – Coimbra, em nome da sua tia (G), que movimentava com cheques onde figurava o nome de (G).
Através desta conta, com o nº ..., o Sr. (AP) movimentava grande quantidade de dinheiro proveniente dos investimentos e negócios que ia realizando e que pretendia não ser do conhecimento dos seus familiares.
A determinada altura, em meados do ano de 2002, o Sr. (AP) contactou o gerente daquela dependência do Banco (S), o Sr. (V), e solicitou-lhe a entrega de determinada quantia em dinheiro, proveniente de uma das suas contas, dizendo-lhe que necessitava dessa quantia para realizar um negócio.
Acedendo à pretensão do Sr. (AP) o Sr. (V), em finais de Julho de 2002, deslocou-se à residência daquele e ali procedeu à entrega da quantia de € 216.000,00 em notas, conforme solicitado.
Posteriormente o Sr. (AP) entregou essa quantia em dinheiro ao requerente, para que este procedesse à sua aplicação, em negócios cujos contornos não foi possível esclarecer, mas que tinha sido previamente combinado entre ambos.
Por razões não esclarecidas, esse negócio não chegou a concretizar-se, pelo que o Sr. (AP) solicitou ao requerente que depositasse o dinheiro que lhe havia entregue na conta do Banco (S), titulada pela sua tia (G), fornecendo-lhe mesmo, para o efeito, o NIB dessa conta.
Porém, o requerente decidiu apropriar-se daquela quantia, o que fez, recusando-se a devolvê-la ao seu dono.
De início, e para ocultar que se tinha apropriado do dinheiro, o requerente foi dizendo ao Sr. (AP)que estava a tratar de arranjar notas grandes, para evitar levar um grande volume para o banco.
Mas, como este continuasse a insistir na imediata devolução do dinheiro, o requerente decidiu provocar-lhe a morte.
Assim, na manhã de 6 de Setembro de 2002, cerca das 7,30 horas, o requerente dirigiu-se no seu automóvel à residência do Sr. (AP), sita na R..
O requerente ligou para o telemóvel do Sr. (AP) anunciando a sua chegada.
Este, que se encontrava ainda deitado, alertado pela presença do requerente, pelo telefonema, veio abrir-lhe a porta da rua e franqueou-lhe a porta.
Já no interior da residência, no corredor que liga o hall à sala de jantar, o requerente, aproveitando-se da particular debilidade física do Sr. (AP), e munido de um instrumento contundente, cujas características não foi possível apurar, desferiu com o mesmo um golpe no couro cabeludo do Sr. (AP), causando-lhe fractura com afundamento na convexidade do parietal direito que foi causa directa e necessária da sua morte.
Logo de seguida, abandonou o local, pondo-se em fuga.
De tal acórdão foi interposto recurso em 16 de Março de 2004.
Foi proferido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Maio de 2005, no recurso 1618/04, transitado em julgado em 6 de Outubro de 2005, e o requerente foi condenado na pena de 15 anos de prisão por crime de homicídio qualificado e na pena de 3 anos e 6 meses de prisão por crime de abuso de confiança e 7 meses de prisão por simulação de crime, tendo sido fixada a pena única em 17 (dezassete) anos de prisão.
E) Foi instaurado contra o requerente processo disciplinar com intenção de despedimento, junto aos autos de procedimento cautelar, apensos a estes e cujo teor se tem por reproduzido, constando do mesmo designadamente:
a) Participação disciplinar elaborada em 27 de Dezembro de 2002 (fls. 104);
b) Nota de culpa de 5 de Fevereiro de 2003, com intenção de despedimento, imputando ao requerente 38 faltas ininterruptas e injustificadas desde 11 de Dezembro de 2002 até 5 de Fevereiro de 2003 (fls. 110/112);
c) Envio da nota de culpa para a residência do requerente e para o estabelecimento prisional de Coimbra, com comunicação de suspensão preventiva (fls. 113/118);
d) Envio da nota de culpa à Comissão Nacional de Trabalhadores do Banco (T) (fls. 119/121);
e) Resposta do requerente à nota de culpa (fls. 124 e seg.tes);
f) Aditamento à nota de culpa de 3 de Julho de 2003, com manutenção da intenção de despedimento, imputando ao requerente 77 faltas ininterruptas e injustificadas desde 6 de Fevereiro de 2003 até 30 de Maio de 2003 (fls. 143/145);
g) Envio de aditamento à nota de culpa para o estabelecimento prisional de Coimbra e ao mandatário do requerente (fls. 146/150);
h) Envio de aditamento à nota de culpa à Comissão Nacional de Trabalhadores do Banco (T) (fls. 151/153);
i) Resposta do requerente ao aditamento à nota de culpa (fls. 154 e seg.tes);
j) Inquirição das testemunhas arroladas pelo requerente (fls. 161 e seg.tes);
l) Relatório final (fls. 184 e seg.tes);
m) Decisão final (fls. 201 e seg.tes), nos termos da qual, de acordo com estatuído nas cláusulas 34ª, alíneas a), b) e g), 115ª e 117º, nº 1, alínea d) do ACT para o Sector Bancário, e alíneas b), c) e g) do nº 1 do art. 20º do DL 49.408 de 24-11-1969 e alíneas a), d) e g) do DL 64-A/89 de 27.2, foi aplicada ao requerente a sanção disciplinar de despedimento com justa causa, ficando a eficácia de tal deliberação dependente de decisão, com trânsito em julgado, que vier a ser proferida no processo crime em que o requerente é arguido.
F) O réu não pagou retribuições ao autor posteriormente a Novembro de 2002.
G) O autor intentou em 19/11/2003 acção judicial contra o réu, a qual corre os seus termos na 3.ª Secção do 3.º Juízo do Tribunal de Trabalho de Lisboa, sob o número 5625/03.0TTLSB, nos termos constante da p.i. cuja cópia está junta de fls. 68 a 81, tendo o Réu apresentado a sua contestação cuja cópia está junta de fls. 83 a 98 e cujos teores se têm por reproduzidos.
O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Maio de 2007, no recurso 358/07 da 4ª Secção, confirmou a sentença proferida no referido processo 5625/03.0TTLSB e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que condenaram o réu a pagar ao autor tão somente a retribuição referente ao período de 11 de Dezembro de 2002 a 9 de Janeiro de 2003, a liquidar em incidente, considerando-se a partir de então o contrato de trabalho suspenso por impedimento prolongado.
H) Em Novembro de 2003 o autor auferia € 1.232,10 de retribuição base, € 169,85 de diuturnidades, € 300,44 de isenção de horário de trabalho.
2- O autor ascendeu à categoria profissional de subgerente por mérito.
3- O autor comunicou ao réu a sua detenção e consequente impossibilidade de comparecer ao serviço, enquanto permanecesse detido em regime de prisão preventiva.
4- Na data da detenção do arguido responsáveis do Banco réu ficaram bem cientes desta situação, tendo o autor entregue as chaves da agência de ... que detinha na altura.
5- O autor sofreu um profundo choque emocional.
7- A filha do autor entregou mil contos para o advogado que defendeu o pai no processo-crime.
9- O autor encontra-se afectado no seu sistema nervoso.
10- O autor tem necessidade de acompanhamento médico.
11- A esposa do autor trabalha na função pública e que uma sua filha é farmacêutica adjunta.

Fundamentação de direito

Quanto à 1ª questão (nulidade da sentença prevista no. 668º nº 1 alínea d) – omissão de pronúncia - do Cód. Proc. Civil):
No requerimento de interposição do recurso, o apelante vem arguir a nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia, alegando, para tal, que o Tribunal a quo se não pronunciou sobre as faltas.
Desde já se adianta que nenhuma razão lhe assiste.
O art. 668.º, nº 1, alínea d) deve ser conjugado com o art. 660º, n.º 2 do Cód. Proc. Civil, nos termos do qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Quando as partes submetem à apreciação do tribunal determinada questão, é usual socorrerem-se de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; mas o que importa é que o tribunal decida a questão que lhe foi posta, não lhe incumbindo apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.
Não se devem confundir factos (fundamentos ou argumentos) com questões (a que se reportam os arts. 660.º, nº 2 e 668.º, nº 1, alínea d) do Cód. Proc. Civil). Uma coisa é não tomar conhecimento de determinado facto ou de qualquer argumento invocado pela parte, outra completamente distinta, é não tomar conhecimento de determinada questão submetida à apreciação do tribunal. Os factos materiais são apenas elementos para a solução da questão, mas não são a própria questão (Alberto dos Reis, “Código do Processo Civil Anotado” vol. V, págs. 143 a 145)).
A omissão de pronúncia a que alude o art. 668.º, nº 1, alínea d) do Cód. Proc. Civil diz respeito a questões e não a factos.
No caso em apreço, verifica-se que, contrariamente ao afirmado pelo apelante, o juiz a quo na sua sentença começa por referir a fls. 420 que há que decidir se as faltas do A. constituem fundamento de justa causa de despedimento, designadamente se tais faltas são consideradas injustificadas por serem consequência de prisão preventiva e só em caso de resposta negativa haverá que apreciar as consequências do despedimento, em seguida aprecia esta questão escrevendo a fls. 421 que as faltas não são consequência de doença, acidente, de prestação de assistência inadiável a membros do seu agregado familiar, nem foram prévia ou posteriormente autorizadas pela entidade patronal. A prisão preventiva não constitui cumprimento de obrigação legal. O cumprimento supõe a realização voluntária de um dever e na prisão preventiva está excluído o cumprimento voluntário e conclui a fls. 422 que perante tal condenação e tendo em conta que a decisão deve corresponder à situação existente no momento de encerramento da discussão, não restam dúvidas que as faltas foram injustificadas.
Improcede, pois, a nulidade arguida.
Quanto à 2ª questão (justa causa de despedimento):
Uma vez a acção se reporta a factos ocorridos entre 11 de Dezembro de 2002 e 30 de Maio de 2003, ao caso não é aplicável o Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto que apenas entrou em vigor em 1 de Dezembro de 2003 – art. 8.º nº 1 e 3.º nº 1 da lei preambular - mas o regime pré-vigente a que nos vamos referir.
O nº 1 do art. 9.º do Regime Jurídico de Cessação do Contrato Individual de Trabalho aprovado pelo Decreto-Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro (RJCCIT também conhecido por LCCT), dá-nos a noção de justa causa como sendo o comportamento do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
Deste modo para a existência de justa causa de despedimento é necessária a verificação cumulativa de um requisito de natureza subjectiva traduzido num comportamento culposo do trabalhador, pressupondo uma acção ou omissão imputável ao trabalhador a título de culpa e violadora dos deveres emergentes do vínculo contratual a que o trabalhador, como tal, está sujeito e cuja observância é requerida pelo cumprimento da actividade a que se obrigou ou pela disciplina da organização em que essa actividade se realiza, outro de natureza objectiva, traduzido na impossibilidade da subsistência da relação de trabalho e, ainda, a existência de nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade de subsistência da relação laboral.
Sendo o despedimento a mais grave das sanções, para que o comportamento do trabalhador integre a justa causa é ainda necessário que esse comportamento seja grave em si mesmo e nas suas consequências e essa gravidade não pode aferir-se em função do critério subjectivo do empregador, devendo ser apreciadas de acordo com o entendimento de um empregador normal, em face do caso concreto, atendendo-se a critérios de objectividade e de razoabilidade, considerando a natureza da relação laboral, o grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, o carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes - art. 12.º, nº 5 do RJCCIT -, existindo justa causa de despedimento quando se verifica a impossibilidade prática da subsistência da relação laboral ou seja quando o estado de premência do despedimento deve ser julgado mais importante do que os interesses opostos na permanência do contrato de trabalho e dos deveres emergentes do vínculo laboral, o que sucede sempre que a ruptura da relação laboral seja irremediável, por não existir nenhuma outra sanção susceptível de sanar a crise contratual aberta com aquele comportamento culposo do trabalhador.
Nos termos do art. 18.º, nº 1 do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei nº 49.409, de 24 de Novembro de 1969 (RJCIT também designado por LCT), a entidade patronal e o trabalhador são mútuos colaboradores e a sua colaboração deverá tender para a obtenção da maior produtividade e para a promoção humana e social do trabalhador. Tal princípio afirma, fundamentalmente, a exigência de que cada uma das partes do vínculo laboral, atentas as finalidades próprias da contraparte para cuja satisfação o contrato é instrumental, lhes dê, na justa medida, tradução no plano de execução do programa laboral (Mário Pinto, Furtado Martins e Nunes de Carvalho, “Comentário às Leis do Trabalho”, vol. I, pág. 184).
Por força do contrato de trabalho resultam para as partes direitos e deveres. Esses deveres na parte que respeita ao trabalhador encontram-se expressos no nº 1 do art. 20.º do RJCIT e entre eles ressalta, com interesse para o caso que nos ocupa, o dever de assiduidade – alínea b).
Nas notas de culpa que remeteu ao apelante o apelado imputa àquele violação do dever de assiduidade traduzido no facto de ter dado injustificadamente 38 faltas ininterruptas entre 11.12.2002 e 05.02.2003 e - nota de culpa adicional - 77 faltas ininterruptas entre 06.02.2003 e 30.05.2003.
Ficou, efectivamente, provado que o apelante não compareceu ao serviço entre 11.12.2002 e 05.02.2003 data em que foi suspenso preventivamente e entre 06.02.2003 e 30.05.2003, por se encontrar preso preventivamente desde 11.12.2002.
Um breve parêntesis para esclarecer que a alegação do apelante, de que faltas injustificadas seriam apenas as 38 dadas no período compreendido entre 11.12.2002 e 05.02.2003, isto porque estando em situação de suspensão preventiva, não existiram faltas injustificadas, visto o dever de se apresentar estar suspenso, é descabida uma vez que tal questão foi já apreciada por decisão transitada em julgado quer por este Tribunal, quer pelo Supremo Tribunal de Justiça (acórdão de 2 de Maio de 2007) – facto provado constante da Alínea G) - aí se tendo concluído que, juridicamente inexistiu suspensão preventiva do apelante.
Como se escreveu no referido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Maio de 2007 (...) O que acontece é que a suspensão da prestação laboral por iniciativa da entidade empregadora (seja ela decretada no inicio do procedimento disciplinar, seja com a notificação da nota de culpa) pressupõe necessariamente que o trabalhador esteja ao serviço efectivo da empresa. Se tal não acontecer, a suspensão decretada só produzirá o seu efeito útil quando o trabalhador estiver em condições de regressar ao trabalho, lendo-se, mais adiante, que (...) aquela suspensão não era susceptível de produzir quaisquer efeitos imediatos, uma vez que o autor se encontrava preso. A mesma só ganharia eficácia se e quando o autor viesse a ser libertado, o que não veio a acontecer.
Feito este parêntesis, importa começar por saber se a referida ausência ao serviço é ou não justificada.
Tais faltas não se integram na previsão das diversas alíneas do nº 2 do art. 23.º do Decreto-Lei nº 874/76, de 23 de Dezembro, que elenca as faltas justificadas, de modo que nos termos do nº 3 do mesmo preceito elas são injustificadas.
A jurisprudência, sem vozes discordantes conhecidas, tem decidido que a prisão resultante de condenação constitui motivo de faltas não justificadas: na base de tal prisão e das consequentes faltas ao serviço, está sempre um comportamento que o trabalhador quis ou que, podendo evitar tal actuação, não agiu de modo adequado para que o evento criminoso, mesmo que culposo, não ocorresse (Acs. desta Relação de 28.01.87, CJ Ano XII, T. I, pág. 178 e de 20.04.88, CJ Ano XIII, T. II, pág. 182; ex adverso e contrariando quer a referida jurisprudência quer também a opinião dominante na doutrina vide, no entanto, Albino Mandes Baptista “Faltas por motivo de prisão”, “Questões Laborais”, Ano V, 1998, nº 11, págs. 47 e segs.).
Podem ver-se, agora num plano mais específico que o da condenação, pois que se aplica à prisão preventiva, entre outros os Acs. da RP de 17.05.93, (CJ Ano XVIII, T. III, pág. 268) e do STJ de 3.11.88 (BMJ 381º, pág. 489) e de 25.0293, (CJ/STJ, Ano I, T. I, pág. 260), lendo-se neste último que As faltas de serviço, por motivo de prisão preventiva do trabalhador, em consequência de acusação de tráfico de droga, crime porque veio a ser condenado, e que leva a imputar-lhe a responsabilidade de tal prisão, são consideradas como injustificadas, por procederem de comportamento gravemente censurável, constituindo, por isso, justa causa de despedimento.
Sustenta o apelante que o despedimento foi extemporâneo em virtude de a sua condenação no processo crime ter ocorrido posteriormente a tal despedimento.
A deliberação de despedimento é, de facto, anterior à condenação e embora a eficácia da mesma tenha ficado dependente de decisão com trânsito em julgado o certo é uma tal despedimento sujeito a condição suspensiva não é admissível (Albino Mendes Baptista, “Faltas por motivo de prisão”, “Questões Laborais”, Ano V, 1998, nº 11, págs. 51 a 52).
Efectivamente, o despedimento é uma forma de extinção da relação de trabalho por iniciativa do empregador e tecnicamente, o despedimento configura-se como uma declaração de vontade, recipienda (ou receptícia), vinculada e constitutiva, dirigida à contraparte, com o fim de fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro (Pedro Furtado Martins, “Despedimento Ilícito, Reintegração na Empresa e Dever de Ocupação Efectiva”, ed. de 1992, pág. 37).
Sendo o despedimento um acto unilateral recipiendo, torna-se vinculante para o declarante quando se verifica o conhecimento, ou a cognoscibilidade da declaração emitida. A partir desse momento o trabalhador está juridicamente despedido.
Tal como se entendeu no Ac. do STJ 14 de Maio de 1997, disponível em www.dgsi.pt, em que se aprecia questão em tudo semelhante também nós entendemos que a ser levada às últimas consequências a tese do apelante da extemporaneidade do processo disciplinar, traduzia-se, ao fim e ao cabo, em o processo ter sido movido e a sanção ter sido aplicada antes de haver sentença penal condenatória, na maioria dos casos em que os trabalhadores ao serviço da ré cometessem crimes, quando a ré pudesse mover o processo disciplinar ela já estaria fora de prazo para tal, pois que entre o conhecimento por parte da ré dos factos atribuídos ao trabalhador e a sentença condenatória mediaria, normalmente, mais tempo do que o previsto nos arts. 31.º e 27.º do RCIT a menos que houvesse suspensão do processo disciplinar até à decisão no processo crime.
Lê-se ainda nesse acórdão o seguinte:
Mesmo desprezando este ponto, o certo é que a empresa ficaria sujeita a demoras mais do que injustificadas para que pudesse, legalmente, mover algum processo disciplinar a um trabalhador ao seu serviço que cometesse um crime e pelo qual estivesse submetido ao devido processo judicial.
De resto, quanto mais grave ou complexo fosse o crime assacado ao trabalhador, maior seria normalmente a demora o que, portanto redundava numa inversão de valores a ter em consideração numa relação laboral normal e adequada aos interesses do empregador e à generalidade dos trabalhadores ao seu serviço. Já não havia benefício para os trabalhadores, pois que, a ser assim, havia era prejuízo final para todos eles, em geral.
A lei não prevê a suspensão do processo disciplinar.
Efectivamente, o que a lei prevê é a suspensão do decurso do prazo estabelecido no art. 31.º, a qual ocorre com a notificação da nota de culpa ou com a realização de diligências instrutórias necessárias à elaboração da nota de culpa – art. 10,ºs, nº 11 e 12. do RJCCIT. Em rigor nem se trata de uma suspensão do prazo uma vez que ele não retoma em momento ulterior o seu curso: o que acontece é que a notificação da nota de culpa e com a realização de diligências instrutórias necessárias à elaboração daquela constitui uma causa impeditiva da caducidade do exercício da acção disciplinar – art. 331.º do Cód. Civil.
Como se reconheceu no citado acórdão de 14 de Maio de 1997 não adianta chamar à colação a máxima constitucional da presunção da inocência do arguido, pois que estamos no campo do direito disciplinar laboral e não no domínio do direito penal ou processual penal, lendo-se no mesmo aresto que:
Quando muito, a entidade patronal, movendo desatempadamente o processo disciplinar, caso o trabalhador fosse absolvido, sujeitava-se a ver esse processo sem efeito, no caso de ser proferida sentença absolutória. Mas isso não implicava que a empregadora não pudesse mover o processo disciplinar - e até cominar a correspondente sanção, inclusivamente por outro motivo que não fosse as faltas injustificadas (v.g. perda de confiança). O processo não era nulo, ilícita acabaria por ser a sanção baseada nas faltas injustificadas.
Conclui-se, assim, que as faltas dadas pelo apelante são faltas injustificadas e integram um comportamento ilícito, presumindo-se a culpa do trabalhador nos termos dos arts. 799.º, nº 1 do Cód. Civil (Pedro Romano Martinez “Direito do Trabalho”, Almedina, 2002, pág. 514, nota 1, e RDES, 1987, nº 2, pág.228).
Como diz Menezes Cordeiro ("Manual de Direito do Trabalho, "Coimbra, 1991, págs. 839 e 840):
As faltas injustificadas são, por definição, ilícitas e culposas.
(...) Se o trabalhador duma empresa se sente autorizado a faltar sem justificação, ele está a sobrecarregar os seus colegas e a economia em geral. Tal como ele, todos teriam igual direito a faltar: nenhum processo produtivo seria possível. Por isso o absentismo é um problema público, que não pode deixar de ser disciplinarmente reprimido. Além disso, a falta injustificada faz esboroar a confiança merecida pelo trabalhador.
Provadas as faltas injustificadas - logo ilícitas e culposas - no máximo legal, está praticamente preenchido o tipo de justa causa.
Os seus reflexos na relação de trabalho advêm agora de juízos de experiência e de razoabilidade.
Admite-se que, por essa via, se salve o contrato do trabalhador que não logrou justificar a falta em tempo útil, por mera falha documental, mas que, objectivamente, possa convencer que isso nunca mais se repetirá. Mas não parece adequado, por essa via, deixa penetrar um tipo de benevolência que a lei expressamente vedou e que tem imensas custas para o País.
Vejamos, então agora se as faltas aqui em causa justificam a sanção aplicada.
O art. 20.º, alínea b) do RJCIT impõe ao trabalhador o dever de assiduidade e os arts. 27.º, nº 3, do Decreto-Lei nº 874/76, de 23 de Dezembro e 9.º, nº 2 alínea g) do RJCCIT fornecem um critério objectivo de apreciação da gravidade das faltas esclarecendo o primeiro que mais de três faltas seguidas ou de seis faltas interpoladas constitui infracção disciplinar grave e o segundo que mais de cinco faltas seguidas ou dez faltas anuais interpoladas são motivo de despedimento.
O art. 20.º, alínea b) do RJCIT impõe ao trabalhador o dever de assiduidade e os arts. 27.º, nº 3, do Decreto-Lei nº 874/76, de 23 de Dezembro e 9.º, nº 2 alínea g) do RJCCIT fornecem um critério objectivo de apreciação da gravidade das faltas esclarecendo o primeiro que mais de três faltas seguidas ou de seis faltas interpoladas constitui infracção disciplinar grave e o segundo que mais de cinco faltas seguidas ou dez faltas anuais interpoladas são motivo de despedimento.
Põe-se aqui o problema da compatibilização do regime previsto nestes dois diplomas quanto ao número de faltas que provoca o agravamento da infracção disciplinar: três seguidas e seis interpoladas naquele diploma e cinco seguidas e dez interpoladas neste diploma.
Estamos em face de textos legislativos com datas muito aproximadas – apenas 21 dias, o que afasta uma interpretação revogatória do Decreto-Lei nº 874/76 face ao Decreto-lei nº 841-C/76, de 7 de Dezembro (diploma que introduziu a redacção da alínea g) do nº 2 inicialmente do art. 10.º do Decreto Lei nº 372-A/75, - hoje art. 9º do RJCCIT - salvo ocorrendo manifesta incompatibilidade.
Para alcançar uma conclusão, convém aclarar alguns pontos.
Em primeiro lugar, uma infracção disciplinar grave implica uma sanção grave, mas que não tem de ser necessariamente o despedimento. Outras penas disciplinares há que devem merecer essa qualificação – a multa e a suspensão do trabalho com perda de retribuição.
A cláusula geral enunciada no nº 1 do art. 9.º sob exame tem, em relação às diversas alíneas do nº 2, uma relação, não de especialidade, mas uma relação de pressuposição: a verificação dos elementos da hipótese legal da norma do nº 1 do art. 9.º é um pressuposto de aplicação de cada uma das normas das alíneas do nº 2 do mesmo artigo.
Acompanhando a jurisprudência (Acs. do STJ de 25.03.83, BMJ 325, pág. 491, de 11.11.83, AD 267, pág. 409, de 26.05.88, AD 323, pág.1459, da RE de 02.06.81, BMJ 310, pág. 349, da RP de 14.06.82, CJ. Ano VII, T. 3, pág. 256 e de 25.10.82, CJ. Ano VII, T. 4, pág. 266), entende-se que o pressuposto do nº 1 do art. 9º deve ser exigido em qualquer das situações: faltas em qualquer número, três dias consecutivos ou seis interpolados no período de um ano e cinco seguidas ou dez interpoladas no mesmo período. Nos dois primeiros casos, mais é exigido que as faltas determinem directamente prejuízos ou riscos graves para a empresa; no terceiro caso, a entidade patronal não terá que fazer essa prova, admitindo-se que o legislador presumiu “juris et de jure” a existência de prejuízos. A infracção descrita na alínea a) do nº 3 do art. 27.º do Decreto Lei nº 874/76 tem como específico, justificando uma referência particular, a sua valoração como falta grave independentemente do resultado, o que vem a fundamentar uma sanção grave. Temos, assim, uma gradação de gravidade destas infracções, que não se limita a considerar apenas a aplicabilidade do despedimento, sanção máxima, mas as outras sanções. Deste modo, dá-se sentido útil aos três descritivos encontrados nos dois diplomas, compatibilizando-os.
Como se disse, o preenchimento do comportamento previsto na alínea g) do nº 2 do art. 9.º do RJCCIT (faltas não justificadas ao trabalho que determinem directamente prejuízos ou riscos graves para a empresa ou, independentemente de qualquer prejuízo ou riscos, quando o número de faltas injustificadas atingir, em cada ano, cinco seguidas ou dez interpoladas) não implica a verificação automática da justa causa de despedimento. A cláusula geral contida no nº 1 do mesmo art. 9.º (também) cobre esta situação.
Como também já tivemos oportunidade de ver, o conceito de justa causa formulado nesta disposição compreende, de harmonia com o entendimento corrente, três elementos: a) comportamento culposo do trabalhador; b) comportamento grave e de consequências danosas; c) nexo de causalidade entre esse comportamento e a impossibilidade de subsistência da relação laboral.
No caso dos autos, em que o apelante deu 115 falta ininterruptas, a lei prescinde da existência de qualquer prejuízo ou risco.
Resta saber se verifica ou não aquele último elemento - relação de causa-efeito entre o comportamento do trabalhador e a impossibilidade de subsistência da relação laboral.
Como diz Pedro Furtado Martins (“Cessação do Contrato de Trabalho”, 2ª edição, pág. 85) tal impossibilidade há-de ser entendida não em sentido material, mas em sentido jurídico, pelo que somos levados para o campo da inexigibilidade, a determinar através do balanço, em conflito, dos interesses em presença - o da urgência da desvinculação e o da conservação do contrato de trabalho – e envolve um juízo de prognose sobre a viabilidade da relação laboral, a realizar segundo um padrão essencialmente psicológico - o das condições mínimas de suporte de uma vinculação duradoura, que implica frequentes e intensos contactos entre os sujeitos.
Assim, existirá impossibilidade prática de subsistência da relação laboral sempre que, nas circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações pessoais e patrimoniais, que ele importa, sejam de forma a ferir, de modo exagerado e violento, a sensibilidade e a liberdade psicológica de uma pessoa normal, colocada na posição do empregador, ou seja, sempre que a continuidade do vínculo represente uma insuportável e injusta imposição ao empregador (Monteiro Fernandes, “Direito do Trabalho, 8ª edição, págs. 461 e segs., Menezes Cordeiro, “Manual do Direito do Trabalho”, 1997, págs. 822 e segs., Lobo Xavier, “Curso de Direito de Trabalho” págs. 488 e segs., Jorge Leite e Coutinho de Almeida, “Colectânea de Leis do Trabalho”, 1985, págs. 249 e segs., Motta Veiga, “Direito do Trabalho”, II, págs. 128 e segs. e Ac. do STJ de 05.02.97, CJ/STJ, Ano V, T. 1, pág. 275 e jurisprudência aí citadas).
Tal como se entendeu na decisão recorrida também nós entendemos que o referido elemento se mostra verificado, face aos factos constantes das Alínea B), C), e D).
A impossibilidade de subsistência da relação laboral não pode ser objecto de prova directa. Dito de outro modo, porque se trata de um “juízo de valor” não podia ele fazer parte da base instrutória, antes teria que ser extraído de factos concretos dados como provados.
Na verdade, a “impossibilidade de subsistência da relação laboral pelo comportamento culposo do trabalhador” não é algo que possa ser alcançado através da prova pericial (juízo de facto) e muito menos de testemunhas ou por apelo a simples critérios do homem comum. Suscita antes uma questão de direito, na medida em que a “conclusão” a extrair implica necessariamente a ponderação de “valores típicos” da ordem jurídica.
Os referidos factos constantes das Alínea B), C), e D). corporizam um comportamento grave do apelante que, pelas suas consequências, compromete definitivamente a subsistência da relação de trabalho.
Efectivamente, a responsabilidade pela prisão preventiva é imputável ao apelante, que demonstrou um comportamento gravemente censurável pelos crimes cometidos e pela qualidade da vítima e da sua relação com próprio Banco apelado, não se vendo que neste contexto seja possível a manutenção da relação laboral e a aplicação de uma sanção do tipo conservatório.
Improcedem, assim, nesta parte, as conclusões do recurso.
Quanto à 3.ª questão (indemnização por danos não patrimoniais):
A análise desta questão está prejudicada uma vez que a mesma pressupunha a existência de um despedimento ilícito que se provou não ter ocorrido.
Decisão
Pelo exposto, acorda-se em negar provimento à apelação, confirmando a decisão recorrida.
Custas da apelação pelo apelante.

Lisboa, 21 de Novembro de 2007


Isabel Tapadinhas
Natalino Bolas
Leopoldo Soares