Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7169/10.4TBALM-A.L1-7
Relator: GRAÇA AMARAL
Descritores: TÍTULO EXECUTIVO
CONTRATO DE MÚTUO
EXIGIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO
PAGAMENTO EM PRESTAÇÕES
VENCIMENTO
JUROS DE MORA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/15/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I - O erro ou deficiência na fixação do factualismo provado não inquina a sentença de nulidade nos termos da alínea b) do n.º1 do artigo 668.º, do Código de Processo Civil, mas sujeita-a a alteração e/ou revogação, em via de recurso, de acordo com os poderes atribuídos à Relação no artigo 712,º, do Código de Processo Civil.
II – O título executivo delimita o objecto da acção executiva e consubstancia-se num documento que certifica a obrigação exequível.
III – A certeza, exigibilidade e liquidez da obrigação exequenda são encaradas na nossa lei enquanto condições processuais de prosseguimento da acção executiva instaurada impondo-se, nalguns casos, uma actividade preliminar dentro do processo para tal efeito.
IV – Nas dívidas liquidáveis em prestações, de acordo com o regime consagrado no artigo 781.º, do Código Civil, o não pagamento de uma delas não importa a exigibilidade imediata de todas, cabendo ao credor interpelar o devedor para proceder ao pagamento da totalidade da dívida.
V – A falta de emissão da declaração rescisória do contrato de empréstimo liquidável em prestações celebrado com os executados por falta de pagamento dos mesmos, não determina a inexigibilidade da obrigação exequenda porquanto a citação dos executados, no âmbito da execução instaurada, consubstancia a interpelação conducente à exigibilidade imediata da totalidade da dívida.
VI – As consequências do comportamento da exequente quanto à obrigação exequenda reflectem-se, porém, relativamente ao montante dos respectivos juros moratórios, que serão devidos desde a citação quanto às prestações ainda não vencidas nessa data.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 7ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa,

I - Relatório
Partes:
A… e B… (Executados/Recorrentes)
BANCO… SA (Exequente/Recorrida)

Pedido:
Em oposição à execução (instaurada com base no incumprimento do contrato de mútuo hipotecário) os Executados invocam a inexequibilidade do título por falta de vencimento da obrigação por o Banco credor não ter emitido qualquer declaração resolutiva do contrato de mútuo.

Decisão recorrida
Improcedência da oposição à execução face à validade e eficácia do título executivo.

Conclusões da apelação
1. A decisão em crise apoia-se em factualidade que nada tem que ver com os factos vertidos no Requerimento Executivo;
2. De facto, tanto os montantes mutuados, a data do mútuo, o número de escrituras públicas celebradas, as taxas de juros convencionadas bem como o momento da mora dos devedores diferem entre o que vem alegado no Requerimento Executivo e o que consta da fundamentação de facto da decisão sob censura;
3. Estamos, assim, perante um caso de omissão da matéria de facto, que precede e é substrato da decisão final, dando origem, dando origem a uma natural falta de especificação dos fundamentos de facto, nos termos da alínea b) do n.º1 do artigo 668.º do CPC.
4. Logo, e salvo melhor opinião, a sentença é nula por falta de fundamentação de facto, o que inquina a douta decisão com desvalor da nulidade prevista no artigo 668.º do CPC;
5. Nulidade que se argui, com as necessárias consequências;
6. De todo o modo, sempre se dirá que não se encontra, de todo, vencida a quantia de €17.646,71 apresentada no Requerimento Executivo;
7. Com efeito, o Exequente, tal como admite na sua Contestação, não emitiu qualquer declaração resolutória do contrato, sem a qual se não efectiva a extinção contratual e consequente vencimento de todo o capital mutuado e respectivos juros;
8. Em suma, o Exequente não promoveu, contra o que lhe cabia, as diligências necessárias para tornar imediatamente exigível toda a dívida;
9. Na verdade, o vencimento de todas as prestações não se opera ex vi legis, mas mediante interpelação do credor, nos termos gerais;
10. Pelo que, no contrato dos autos, oferecido como título executivo e que configura um contrato de mútuo com pagamento em prestações, o vencimento antecipado e imediato das prestações em falta não prescinde da competente interpelação do devedor pelo credor – Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de Outubro de 2008, no processo n.º 08ª343, in www.dgsi.pt;
11. Pelo que, salvo melhor opinião, a obrigação que o Exequente configura no se Requerimento Executivo é inexigível, estando, assim, preenchida a previsão das alíneas a) e d) do n.º1 do artigo 814.º do CPC, aplicável ex vi artigo 816.º;
12. Nestes termos, deverá revogar-se a douta decisão em crise, substituindo-se por outra que considere a Oposição à Execução procedente. A decisão sob censura violou entre outros, os seguintes preceitos legais: Artigos 659.º, n.3 do CPC e 436.º, n.º 1 do CC.

Não foram apresentadas contra-alegações.

II – Enquadramento fáctico-jurídico

1. Os factos
O tribunal a quo deu como provado o seguinte factualismo:
1. Nos autos de execução com processo comum nº…(aqui apensos), que deram entrada neste Tribunal a 25-11-2005, e em que é exequente a aqui contestante e executados, os aqui oponentes, vem apresentado como título executivo, duas cópias certificadas consubstanciadas num acordo de “Compra e venda e mútuo com hipoteca” e Mútuo com hipoteca” (celebradas por escritura pública, datada de 04.08.1999), entre, no aqui importa e reportado ao mútuo, BANCO, SA e os executados no montante de Esc. 14.625.000$00 e Esc. 1.625.000$00 (documentos de fls. 11 a 37, que aqui se consideram reproduzidos);
2. As partes acordaram em que o empréstimo venceria juros à taxa anual de 4,75% e 4,91% agravados, em caso de mora, acrescidos de uma sobretaxa até 4% a título de cláusula penal (acordo e documento de fls. 11 a 37, que aqui se consideram reproduzidos);
3. O empréstimo em causa foi concedido e as respectivas prestações não foram pagas desde 15.09.2001 e 15.05.2001, respectivamente. 
Tendo em conta os elementos dos autos, designadamente os documentos de fls. 58/74, que constituem cópia certificada do requerimento executivo e da escritura pública de compra e venda, mútuo com hipoteca bem como documento complementar, nos termos do art.º 712, n.º1, alínea b), do CPC, altera-se a matéria de facto considerada na sentença, fixando-se o seguinte factualismo a considerar provado: 
ü O Apelado, BANCO…, SA, instaurou acção executiva contra os Recorrentes para pagamento da quantia de 17.646,71 de capital, juros vencidos e despesas acordadas, bem como juros vincendos às taxas e sobretaxas contratualmente assumidas até integral pagamento e respectivo imposto de selo.
ü Apresentou como título executivo o documento de fls. 62 a 66 dos autos intitulado de COMPRA E VENDA, MÚTUO COM HIPOTECA, datado de 25/09/1998, lavrado no Cartório Notarial de , no âmbito do qual os Executados, na qualidade de segundos outorgantes, adquiriram para sua habitação secundária, o 3º andar direito do prédio urbano sito em …, pelo preço de dez milhões e quinhentos mil escudos, montante que lhes foi mutuado pelo Banco Exequente (intervindo na qualidade de terceiro outorgante, representado por J..) e de que se confessam devedores
ü  Consta ainda do referido documento que para garantia da quantia mutuada e dos respectivos juros à taxa anual efectiva de 7,21%, acrescidos da sobretaxa até 4% em caso do mora, despesas judiciais e extrajudiciais para efeitos de registo em quatrocentos e vinte mil escudos e do montante máximo de capital e acessórios na quantia de catorze milhões e cinquenta e um mil cento e cinquenta escudos, os aqui Executados constituíram a favor do Banco aqui Exequente, hipoteca sobre a fracção adquirida.
ü Com a escritura juntaram ainda documento intitulado “DOCUMENTO COMPLEMENTAR ELABORADO NOS TERMOS DO NÚMERO DOIS DO ARTIGO SESSENTA E QUATRO DO CÓDIGO DO NOTARIADO”, contendo as cláusulas do contrato de mútuo com hipoteca do qual consta como cláusula quarta “O empréstimo é concedido pelo prazo de QUINZE anos a contar do próximo dia dois e será amortizado em CENTO E OITENTA prestações mensais, capital e juros, a primeira com vencimento no dia dois do mês seguinte e do montante de NOVENTA E TRÊS MIL SETENCENTOS E NOVENTA E UM ESCUDOS”.
ü Consta da cláusula sétima das condições gerais do mesmo contrato que “O Banco reserva-se o direito de resolver unilateralmente o contrato e considerar vencido o empréstimo, tornando-se imediatamente exigível toda a dívida, se (…) o(s) Mutuário(s) deixar(em) de cumprir alguma das obrigações resultantes do presente contrato (…)”.
ü Alegou o Banco Exequente como fundamento da execução o não pagamento pelos Executados das prestações devidas a partir de 02.08.2010, data em que ficou em dívida vencida o capital de 14.998,98 euros, acrescendo os juros e despesas, num total de 17.646,71 euros.

2. O direito
De acordo com as conclusões das alegações, a questão submetida ao conhecimento deste tribunal, constituindo assim o objecto do recurso, consiste em determinar da:
à Nulidade da sentença por carência de fundamentação
à Inexigibilidade da quantia exequenda e ausência de título executivo

1. Nulidade da sentença por carência absoluta de fundamentação

Invoca a Agravante a nulidade da decisão recorrida por carência absoluta de fundamentação uma vez que a factualidade constante da decisão recorrida nada tem a ver com os factos alegados no requerimento executivo e constantes dos documentos juntos.
            O dever de fundamentar as decisões impõe-se ao juiz por imperativo constitucional (art.º 208, n.º1, da CRP) e legal (art.º 158, do CPC), e a sua necessidade prende-se com a própria garantia do direito ao recurso, tendo ainda a ver com a legitimação da decisão judicial em si mesma.
            Nos termos do art. 668, nº 1, b) do CPC, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão[1].
Conforme já assinalado (cfr. nota 1), a falta de motivação a que se refere a citada al. b) não é uma especificação/indicação eventualmente incompleta deficiente ou errónea, mas a total omissão dos fundamentos de facto (ou de direito), suporte da decisão. Por conseguinte, sempre que a motivação fáctica (ou de direito) padeça de erro ou deficiência fica sujeita à alteração e/ou revogação em via de recurso, mas não constituirá fundamento de nulidade da decisão.
Assim sendo, e porque na sentença recorrida não se verifica ausência de fundamentação de facto, uma vez que o tribunal fixou o factualismo provado com fundamento no qual alicerçou a sua decisão de direito, não padece a mesma de vício de nulidade.
Porém e tal como se encontra salientado pelos Recorrentes, o tribunal a quo fixou factualismo (quanto ao montante mutuado, data do mútuo, taxas de juros convencionadas, mora dos Executados) que não tem correspondência quer com os factos alegados no requerimento inicial, quer com os documentos que com ele foram juntos e que constituem título executivo da execução. Nessa medida impunha-se proceder à sua alteração nos termos efectuados de acordo com os poderes que são conferidos a este tribunal por força do disposto no artigo 712, alínea b), do CPC.
Improcedem, por isso, quanto a este aspecto, as conclusões do recurso.

2. Inexigibilidade da quantia exequenda e ausência de título executivo
Defendem os Exequentes que a quantia exequenda (de capital e juros) não se encontra vencida, não sendo por isso exigível. Sustentam para esse efeito que o Banco Exequente não emitiu qualquer declaração resolutória do contrato, conforme acordado nos termos da cláusula sétima das condições gerais do contrato de mútuo celebrado.
            Argumentam ainda que no contrato de mútuo com pagamento em prestações, o vencimento antecipado e imediato das prestações em falta não prescinde o credor de interpelar o devedor uma vez que de acordo com o disposto no artigo 781, n.º1, do Código Civil, o vencimento de todas as prestações não se opera ope legis, mas mediante interpelação.
            Consideram os Recorrentes que a Exequente não levou a cabo as diligências necessárias a tornar exequível o seu direito à prestação, pelo que concluem no sentido da inexistência de título executivo.

2.1 De acordo com o n.º1 do artigo 45.º do CPC, o título executivo constitui a base da execução e por ele se determina o fim e os limites da acção executiva. A função do título executivo é, por isso, dar origem à acção executiva, criando para o exequente o poder de promover a acção e para o tribunal o dever de exercer a sua actividade em ordem à satisfação do direito daquele.
Embora a lei não defina título executivo[2], o mesmo assume necessariamente uma determinada forma e conteúdo, representando um facto jurídico constitutivo de um direito.
Delimitando o título o objecto da acção executiva de acordo com as pretensões nele documentadas[3], o mesmo consubstancia-se num documento que certifica a obrigação exequível[4].
É assim indispensável que o documento que seja dado à execução como título executivo esteja em condições de certificar a existência da obrigação que entre as partes se constituiu e formou – a obrigação a considerar nasceu do acto jurídico a que o título dá forma[5] -, uma vez que o mesmo constitui o meio legal de demonstração da existência do direito do exequente.
2.2 Pressupondo a acção executiva o incumprimento ou violação efectiva da prestação, impõe-se que a obrigação exequenda se revista de determinadas características (requisitos de exequibilidade intrínseca) que permitam a sua realização coactiva – certeza, exigibilidade e liquidez.
Estas características de que se deve revestir a obrigação exequenda são encaradas na nossa lei enquanto condições processuais de prosseguimento da acção executiva instaurada e constituem exigências complementares do título sempre que dele não resultarem, cabendo para tal efeito, nalguns casos, desenvolver uma actividade processual preliminar dentro do próprio processo executivo[6] – cfr. artigos 802.º, 803.º, 804.º, 805.º, todos do CPC.

2.3 Considera-se exigível a prestação que se encontrar vencida.
Na situação dos autos, de acordo com os elementos factuais fixados, não oferece dúvidas que as partes celebraram um contrato de mútuo hipotecário (reembolsável em 180 prestações mensais, onde os Executados se reconhecem devedores do Banco Exequente) o qual constitui o título executivo dado à execução – cfr. artigo 46, n.º1, alínea b), do CPC.
Encontra-se admitido pelos Executados na oposição deduzida, que as prestações mensais (capital e juros) para reembolso do referido empréstimo bancário deixaram de ser pagas a partir de 02.08.2010[7].
Defendem, no entanto, que a obrigação exequenda não é exigível por falta de declaração rescisória do contrato e que só a partir da mesma o Banco Exequente poderia executar o contrato celebrado, exigindo o reembolso integral da quantia mutuada e respectivos juros.

2.4 Nos termos da cláusula 7ª das “Condições Gerais” do contrato  encontra-se estipulado que O Banco reserva-se o direito de resolver unilateralmente o contrato e considerar vencido o empréstimo, tornando-se imediatamente exigível toda a dívida, se (…) o(s) Mutuário(s) deixar(em) de cumprir alguma das obrigações resultantes do presente contrato (…)
Perante tal clausulado, tendo presente que os Executados se obrigaram perante o Banco Exequente a restituírem o montante mutuado acrescido de juros, em 180 prestações mensais e uma vez que os mesmos confessam que, a partir de 02.08.2010, deixaram de proceder ao pagamento dessas prestações, encontra-se devidamente evidenciado quer a certificação do direito da Exequente à prestação, quer o incumprimento efectivo por parte dos Executados. Há que determinar quais as consequências desse incumprimento na caracterização da obrigação exequenda.

2.5 De acordo com a redacção da referida cláusula sétima do contrato e dado o teor do preceito supletivo relativo às dívidas liquidáveis a prestações (obrigações cujo objecto, embora globalmente fixado, se encontra repartido em várias fracções, distribuindo-se o respectivo cumprimento ao longo do tempo), na ausência de demonstração do sentido efectivo atribuído pelas partes[8] àquela cláusula, é legítimo considerar que a mesma, corresponde ao alcance do que se encontra consagrado no artigo 781.º, do Código Civil, nos termos do qual “Se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas”..
            Relativamente à interpretação da expressão legal “vencimento de todas[9] (equivalente, a nosso ver, à expressão contratual imediatamente exigível), discute-se na doutrina e na jurisprudência se o vencimento é imediato e automático[10], dispensando a interpelação do devedor, ou se o vencimento significa apenas exigibilidade imediata de todas as prestações, sendo necessária a interpelação do devedor.
Partilhamos o entendimento de que tal expressão significa “exigibilidade imediata” (não no sentido de que o prazo de pagamento de todas as prestações seja o da primeira prestação), mas enquanto perda do benefício do prazo ou antecipação de exigibilidades, isto é, o prazo das prestações antecipadas deixou de existir como facto indicativo do vencimento, tornando-se a obrigação pura, dependendo o seu vencimento de interpelação[11].

2.6 Reportando ao caso concreto, uma vez que em face do não cumprimento de uma das prestações, o prazo para cumprimento das restantes deixou de existir como prazo indicativo de vencimento, cabia ao credor/exequente interpelar o devedor para exigir antecipadamente as restantes prestações. O Banco mutuante, porém, não demonstrou ter emitido qualquer declaração rescisória do contrato (direito que lhe assistia por força do contratualmente estipulado) ou interpelado previamente os devedores para pagamento da totalidade da quantia mutuada e respectivos juros contratuais, tendo optado, perante o incumprimento, por instaurar a acção executiva com base no contrato firmado, requerendo a citação dos Executados para procederem ao pagamento da totalidade da dívida.
Os efeitos de tal comportamento não podem, a nosso ver, ter o alcance pretendido pelos Recorrentes no sentido da inexigibilidade da totalidade da dívida, porquanto o credor encontra-se munido de título executivo idóneo de certificação do seu direito à prestação e o incumprimento desta encontra-se indubitavelmente demonstrado.
            Nessa medida, perante todos os elementos factuais que caracterizam a situação - o título dado à execução e o não pagamento assumido das prestações devidas contratualmente -, não podemos deixar de atribuir relevância à citação dos Executados enquanto acto de interpelação conducente à exigibilidade imediata de todas as prestações devidas até final do prazo do contrato. Contudo, contrariamente ao alegado pela Exequente no requerimento inicial, o vencimento da totalidade da dívida ocorreu com a citação dos Executados e não em 02.08.2010 pelo não pagamento das prestações. 
Deste modo, as consequências do comportamento da Exequente quanto à obrigação exequenda não assumem os contornos de inexigibilidade pretendidos pelos Recorrentes, mas reflectem-se no conteúdo da mesma, relativamente ao montante dos respectivos juros moratórios (quanto às prestações ainda não vencidas à data da citação), que serão devidos desde a citação.


IV – Decisão

Nestes termos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar parcialmente procedente a apelação e, como tal a oposição deduzida, pelo que declaram inexigível a obrigação exequenda relativa aos juros de mora nos termos acima definidos, os quais serão devidos, quanto às prestações vencidas após a citação, a partir desta. Consequentemente, revogam, nesta parte, a sentença recorrida, absolvendo em conformidade os Executados.
            Custas da oposição e do recurso pela Exequente e Executados, na proporção do respectivo decaimento.

Lisboa, 15 de Maio de 2012

Graça Amaral
Orlando Nascimento
Ana Maria Resende
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[1] Como refere Teixeira de Sousa “esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (artº 208º nº 1 do CRP; artº 158º nº 1)”. Porém, “o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (…) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (…); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível” - In Estudos sobre o Processo Civil, pág. 221.
[2] O direito à acção é um direito substantivo e não adjectivo, como a doutrina e a jurisprudência quase unanimemente aceitam. Daí que o Código de Processo Civil não defina o que é um título executivo, limitando-se a indicar quais são e quais os seus requisitos de exequibilidade – Acórdão do STJ de 07.10.93, processo n.º 083767, acedido por http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954.  
[3] O título executivo é o meio legal de demonstração da existência do direito do exequente – Miguel Teixeira de Sousa, “A exequibilidade da pretensão”, Edições Cosmos, Lisboa, 1991, pág. 27, citado por Remédios Marques, CURSO DE PROCESSO EXECUTIVO COMUM À FACE DO CÓDIGO REVISTO, Almedina, 2000, págs. 46.  
[4] Remédios Marques, CURSO DE PROCESSO EXECUTIVO COMUMÀ FACE DO CÓDIGO REVISTO, Almedina, 2000, págs. 46/47.
[5] Acórdão do STJ supra citado.
[6] Remédio Marques, obra citada, págs. 86/87
[7] Os Recorrentes não discutem na oposição a situação de permanecerem em atraso as prestações, quando a execução foi instaurada.
[8] Não tendo sido feita prova de que as partes, com a referida estipulação, quiseram afastar o regime ínsito no art.º 781, do C. Civil
[9] Para alguns (Galvão Teles, Direito das Obrigações, Coimbra, 7ª edição, pág. 271), de acordo com o referido artigo e relativamente às dívidas a prestações, a omissão de uma delas implica o imediato vencimento das restantes prestações independentemente de interpelação. Em sentido contrário, Almeida e Costa (ente outros) defende que o referido preceito estabelece a mera exigibilidade antecipada e não o vencimento automático, impondo-se ao credor a interpretação do devedor para exigir antecipadamente as prestações vincendas (Direito das Obrigações, Almedina, 9ª edição, pág. 950/951).
[10] O actual 781 diverge do que se encontrava consagrado no antigo Código Civil (art.º 742) e, bem assim com o que constava do Anteprojecto e na 1ª Revisão Ministerial onde se estabelecia de forma expressa a mera exigibilidade imediata – “a falta de pagamento de uma delas confere ao credor o direito de exigir o imediato pagamento de todas”. É pois com base na alteração da redacção da lei decorrente da 2ª revisão Ministerial que os defensores desta interpretação fazem assentar o respectivo posicionamento entendendo que mudança de redacção não poderá ter outro significado que não o de substituir a solução da exigibilidade antecipada pela do vencimento automático.
[11] Conforme salientado por Vasco Xavier, a interpretação que defende o vencimento automático não só representa uma injustificada violência para o devedor, como se não concilia com o que dispõe o art.º 805, do C. Civil, nos termos do qual aquele fica constituído em mora após ter sido interpelado para cumprir, excepto se a obrigação tiver prazo certo. Faz ainda salientar este autor que a harmonização dos dois preceitos apenas seria possível se se considerasse que o prazo das prestações após o incumprimento passaria a ser o prazo da prestação não paga (RDES, Ano XXI, n.ºs 1, 21, 3 e 4, pág. 201). No sentido de que o legislador de 1966 se não quis afastar da doutrina que o código anterior estabelecia, cfr. igualmente e entre outros, Menezes Cordeiro, Pessoa Jorge e Almeida Costa.