Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3821/21.7T8LRS-B.L1-4
Relator: MARIA JOSÉ COSTA PINTO
Descritores: SINDICATO
DELIBERAÇÕES RELATIVAS À ELEIÇÃO DOS CORPOS GERENTES
ACÇÃO DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE DELIBERAÇÕES
ACÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DOS ACTOS ELEITORAIS
PRAZOS DE CADUCIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/12/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: I– As deliberações da Assembleia Geral de um sindicato que decide anular as eleições para um órgão do sindicato, assim configurado nos respectivos Estatutos, e que marca novo acto eleitoral, admite à eleição anulada uma lista afastada naquelas eleições, bem como afasta do processo eleitoral uma outra lista, constituem “deliberações relativas à eleição dos corpos gerentes”, estando a propositura da acção que visa a declaração de nulidade de tais deliberações submetida ao prazo de caducidade de 15 dias enunciado no artigo 164.º, n.º2, 2.ª parte, do CPT.
II–Se a acção visa a impugnação dos “actos eleitorais” propriamente ditos, aplica-se o artigo 164º-B do CPT, sendo a acção instaurada pelo vencido no prazo de 10 dias a contar da mesma ou do conhecimento da irregularidade, se posterior.
III–Não é de conhecimento oficioso a caducidade do direito de instaurar a acção prevista no artigo 164.º do CPT.

(Pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:


1. Relatório


1.1. AAA, associada n.º … do BBB, com sede na Rua da …, Odivelas, instaurou contra este Sindicato a presente acção sob a forma de processo especial sustentando verificar-se a nulidade das deliberações da Assembleia Geral extraordinária que teve lugar no dia (...), por entender que estão viciadas por violação da Lei e dos Estatutos.

Pediu que seja imediatamente determinada a suspensão da eficácia de todas as deliberações tomadas na Assembleia Geral extraordinária de … 2021 e que, a final, se declare a invalidade das mesmas deliberações por estarem feridas de nulidade por violação da lei e dos estatutos.

Alegou em fundamento da sua pretensão, em síntese, que em 20-03-2021, o associado …, invocando o disposto no art.° 173.°, n.° 3 do Código Civil, convocou uma assembleia geral extraordinária do BBB, com outros associados, para o dia …, estando esta Assembleia Geral e todas as deliberações nela tomadas viciadas por violação da lei e dos estatutos, devendo ser declaradas inválidas.

Por decisão liminar de … de 2021, o tribunal da 1.ª instância decretou a suspensão da eficácia de todas as deliberações tomadas na indicada Assembleia Geral extraordinária por a convocatória de …de 2021, a Assembleia Geral e as deliberações nela tomadas estarem feridas de nulidade. No final, determinou a notificação da Autora e a citação do Réu, dando-lhe notícia do despacho, bem como para, querendo e em dez dias, contestar, nos termos do art.º 162.º do CPT.

O R. interpôs recurso dessa decisão, vindo este Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão de 29 de Setembro de 2021, a decidir revogar o despacho recorrido no segmento que determina a citação do R., que deverá ser substituído por outro que ordene a notificação do R., nos termos do artigo 366.º, n.º 6 e para efeitos do disposto no artigo 372.º do CPC.

Prosseguindo o procedimento cautelar com o exercício do contraditório subsequente ao decretamento da providência, o R. deduziu oposição, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 372.º do CPC, alegando, em primeiro lugar, a caducidade do direito de a A. pedir a declaração de nulidade das deliberações e, por maioria de razão, a suspensão da respectiva eficácia, por as mesmas dizerem respeito à eleição de órgãos dos corpos gerentes e terem sido tomadas em (...), mas a acção só ter dado entrada em 03 de Maio de 2021, sendo que, de acordo com o disposto na segunda parte do n.º 2 do art.º 164.º do CPT, o prazo para instaurar a acção é de 15 dias a contar da data em que foram tomadas as deliberações. Alegou também que o mero facto de ter sido realizada uma Assembleia Geral na véspera que deliberou sobre as mesmas matérias não impedia que fosse realizada a Assembleia Geral de (...) pois não há qualquer norma que o impeça ou que dê prevalência às primeiras deliberações, em detrimento das segundas.

A A. veio responder à excepção de caducidade do direito de acção, alegando que não estamos perante uma acção tendente à impugnação de deliberações relativas à eleição dos corpos gerentes, porquanto na assembleia geral de onde as mesmas emanaram não foi eleito qualquer corpo gerente, pelo que o prazo para exercer o seu direito de acção é o prazo de 20 dias previsto na 1.ª parte do artigo 164.º, n.º 2 do CPT desde o conhecimento das deliberações e este só aconteceu após 26 de Abril de 2021, na sequência de contactos com outros associados, pelo que a acção foi instaurada dentro do prazo legalmente previsto.

Apresentados os articulados o Mmo. Juiz a quo julgou-se habilitado a conhecer da oposição à providência decretada nos termos do artigo 372.º, n.º 3 do Código de Processo Civil sem necessidade de produção de prova, e terminou a sua decisão com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, julgando procedente a Oposição, decide-se REVOGAR a decisão cautelar tomada por este tribunal no dia 07-05-2021, através da qual se determinara a suspensão imediata de todas as deliberações tomadas na assembleia geral extraordinária do BBB de (...).”

1.2. A A., inconformada interpôs recurso desta decisão e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: 
(...)
1.3. Respondeu o R. recorrido pugnando pela improcedência do recurso e concluindo a sua peça alegatória do seguinte modo:
(...)

1.4. O recurso foi admitido por despacho de 8 de Junho de 2022, afirmando-se que o mesmo não tem efeito suspensivo da decisão impugnada. 

1.5. Recebido o processo neste Tribunal da Relação, e resolvida a questão da falta de indicação do valor da acção, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.

Notificados recorrente e recorrido, nenhum deles se pronunciou quanto ao referido douto parecer do Ministério Público. 
                                                                                            
Colhidos os vistos e realizada a Conferência, cumpre decidir.

2. Objecto do recurso

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal são as seguintes:
1.º – da caducidade do direito de acção;
2.º – da falta de alegação de factos que densifiquem o conceito de "dano apreciável" relativamente às deliberações tomadas.

3. Fundamentação de facto 

Os factos a atender para a decisão foram considerados indiciados pelos documentos juntos aos autos e fixados pelo tribunal da 1.ª instância nos seguintes termos:
a.- No dia 19-03-2021, pela co-presidente da mesa da assembleia geral, …, foi convocada uma assembleia geral extraordinária do BBB para o dia …, com os seguintes pontos da ordem de trabalhos:
«1. Aprovação da alteração estatutária com vista à eleição da 1" Direção Nacional do …;
2. Anulação/ratificação das eleições regionais do … de … e do respetivo Conselho Fiscal;
3. Marcação da data de eleições para a P' Direção …, 40 dias após a aprovação dos novos Estatutos no Boletim de Trabalho e Emprego;
4. Aprovação das contas do Conselho Diretivo Regional do Norte;
5. Apreciação da impugnação das eleições na Zona Norte … e …), para o triénio 2021/2023, no cumprimento do art.° 72.° e para os efeitos previstos na alínea e) do art.° 34.°, ambos dos Estatutos;
6. Ações judiciais intentadas e a intentar;
7. Aprovação das contas do …, no cumprimento do disposto no art.° 34.°, alínea i) dos Estatutos;
8.Alteração estatutária, cuja proposta, obrigatoriamente aprovada pelo …, conforme plasmado no art.° 42.°, al. b) dos Estatutos, seja remetida a todos os associados, com, pelo menos, 20 dias de antecedência, para debate e cumprimento do dever de informação aos associados.»
b. Na dita assembleia geral de …., foram tomadas as deliberações que constam da respetiva ata cuja cópia está junta a fls.27 verso a 29 destes autos e que se dá aqui por reproduzida;
c. Em 20-03-2021, o associado …, invocando o disposto no art.° 173.°, n.° 3 do Código Civil, convocou uma assembleia geral extraordinária do BBB para o dia …, conforme doc. de fls. 24 verso e 25, com os seguintes pontos da ordem de trabalhos:
«1. Apreciação da impugnação das eleições na Zona Norte (… e …), para o triénio 2021/2023, no cumprimento do art.° 72.° e para os efeitos previstos na alínea e) do art.° 34.°, ambos dos Estatutos;
2. Ações judiciais intentadas e a intentar;
3. Aprovação das contas do ..., no cumprimento do disposto no art.° 34.°, alínea i) dos Estatutos;
4. Alteração estatutária, cuja proposta, obrigatoriamente aprovada pelo …, conforme plasmado no art.° 42.°, al. b) dos Estatutos, seja remetida a todos os associados, com, pelo menos, 20 dias de antecedência, para debate e cumprimento do dever de informação aos associados.»
d. Na dita assembleia geral extraordinária de 10-04-2021, foram tomadas as deliberadas que constam da ata n.° 8, cuja cópia se encontra a fls. 29 verso a 31, e que se dá aqui por integralmente reproduzida e na qual foi deliberado, além do mais, o seguinte:
«PONTO UM Entrou-se de imediato no ponto um da ordem de trabalhos, tendo pedido a palavra os associados … (n.° …), …(n.° …), … (n.° …) e …es (n. °…)
Todas as intervenções sobre os recursos/impugnações apresentadas à mesa da  Assembleia Eleitoral …, referiram as diversas irregularidades e desconformidades com a lei e os Estatutos, que se encontram melhor exemplificadas nos documentos divulgados com a convocatória da presente …., e disponibilizados no respetivo sítio oficial do ... na internet, concluindo pela ilegalidade das eleições e para os órgãos sociais da zona norte do ... (… e …).
Após as intervenções dos associados supramencionados a Mesa recebeu as seguintes propostas:
1 - Foi proposto pela associada n.° … …
Dar provimento aos respetivos recursos/impugnações e anular as eleições para os órgãos sociais da zona norte do ..., nos termos do art.° 72°, dos Estatutos do ..., e admitir à eleição para o … e … da zona norte do ..., a Lista B, afastando-se a Lista A do ato eleitoral, por os seus constituintes se encontrarem suspensos de toda atividade sindical conforme informação prestada aos associados aqui presentes.
Colocada a votação esta proposta foi a mesma aprovada por unanimidade.
Ill - Foi proposto pelo associado n.° …, …:
1- Marcação do ato eleitoral para os órgãos sociais da zona norte do ..., o …., doravante … e o …, para o dia … de 2021.
2- Face à vacatura de lugares no … e à inoperacionalidade do mesmo e sendo impossível a sua substituição, o processo eleitoral deve ser preparado e executado pelo … legalmente constituído.
Colocada a votação esta proposta foi a mesma aprovada por unanimidade.
PONTO DOIS – (…) propôs que fossem intentadas, assim que possível, as ações judiciais que ainda falta intentar, nomeadamente a do transporte de valores, a do abono para falhas e as respeitantes aos concursos, às carreiras e aos vencimentos.
Colocada a votação esta proposta foi a mesma aprovada por unanimidade.
PONTO TRÊS – (…) Assim e tendo em conta as explicações prestadas este ponto não foi abordado.
PONTO QUATRO – (…) Após debate foi colocada a votação a proposta que o … apresentou, tendo sido aprovada por unanimidade alterar-se a redação dos estatutos nos termos daquela proposta, cuja publicação no BTE deve ser promovida imediatamente, revogando-se por ilegais todas as alterações efetuadas anteriormente a esta data.
(…)
Apresenta-se a proposta para deliberação imediata, de todos os custos desta …., com suporte documental, serem suportados, na íntegra, pelo …. do … atentos os fundamentos invocados, por uma questão de elementar justiça e, sobretudo, por os associados subscritores terem sido ‘obrigados’ a substituírem-se aos órgãos sociais competentes para a convocação desta Assembleia geral extraordinária do ….
Colocada a votação esta proposta foi a mesma aprovada por unanimidade.»
                                                                                                               *

4. Fundamentação de direito
                                                                                                                *

4.1. Da caducidade do direito de acção

A ora recorrente instaurou a presente acção, prevista no artigo 164º, do Código de Processo do Trabalho, requerendo do mesmo passo a providência cautelar prevista no artigo 168º, do mesmo Código de Processo do Trabalho.

A decisão sob recurso foi proferida na sequência da oposição do ora recorrido, ao abrigo do disposto no artigo 372º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil.

E considerou que a A., ora recorrente, não observou o prazo de 15 dias relativamente às deliberações atinentes ao Ponto Um da ordem de trabalhos da Assembleia Geral sob escrutínio, por entender serem estas referentes à eleição de corpos gerentes.

Quanto às demais deliberações tomadas na assembleia geral extraordinária de (...), considerou que não dizem respeito a eleições para corpos gerentes, pelo que o prazo para a instauração da acção em que se pede a sua invalidade é o previsto na primeira parte do n.º 2 do art.º 164.º do CPT, ou seja, 20 dias a contar da data em que o interessado teve conhecimento das deliberações, mas antes de passados 5 anos sobre estas, mas, uma vez que A. devia alegar e convencer o tribunal, logo na petição inicial, de que teve conhecimento da deliberação há menos de vinte dias, o que não fez, também caducou o direito de pedir a declaração de nulidade das restantes deliberações. Acrescentou que, quanto às deliberações dos Pontos Dois e Quatro da ordem de trabalhos, a A. não densificou na petição inicial que da sua execução pode resultar dano apreciável.

A recorrente, por seu turno, defende que nenhuma das deliberações respeita à eleição de corpos gerentes, mas, ao invés, à anulação de tais eleições, não tendo resultado da mencionada assembleia qualquer deliberação de eleição de corpos gerentes, que aí não  foram eleitos, não sendo objecto da acção a impugnação de deliberações tendentes à “destituição” de órgãos legitimamente em funções, por intermédio da anulação de eleições.

Vejamos.

Nos termos do preceituado no artigo 164.° do Código de Processo do Trabalho:
"1 - As deliberações e outros atos de órgãos de instituições de previdência, associações sindicais, associações de empregadores ou comissões de trabalhadores viciados por violação da lei, quer de fundo quer de forma, ou violação dos estatutos podem ser declarados inválidos em ação intentada por quem tenha interesse legítimo, salvo se dos mesmos couber recurso.
2 - A ação deve ser intentada no prazo de 20 dias, a contar da data em que o interessado teve conhecimento da deliberação, mas antes de passados 5 anos sobre esta; se, porém, a ação tiver por fim a impugnação de deliberações relativas à eleição dos corpos gerentes, o prazo é de 15 dias e conta-se sempre a partir da data da sessão em que tenham sido tomadas essas deliberações.
3 - A petição inicial da ação deve ser acompanhada de documento comprovativo do teor da deliberação ou, não sendo possível, do oferecimento da prova que o requerente possuir a esse respeito.”
Resulta do disposto neste preceito que a acção de impugnação a que se reporta deve iniciar-se nos 20 dias subsequentes à “data em que o interessado teve conhecimento da deliberação”, mas sempre antes de passados 5 anos sobre esta – 1.ª parte do n.º 2. Mas, quando a acção visar a “impugnação de deliberações relativas à eleição dos corpos gerentes”, o prazo é reduzido para 15 dias, e é contado sempre, não já da data do conhecimento dessas deliberações, a “partir da data da sessão em que tenham sido tomadas essas deliberações” – 2.ª parte do n.º 2.

Cremos ser pacífico que o prazo de propositura da acção de impugnação de deliberações de Assembleias Gerais de associações sindicais é um prazo de caducidade, como resulta do confronto desta norma com o disposto no n.° 2, do artigo 298.°, do Código Civil, segundo o qual “[q]uando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição”. Assim, o autor tem o ónus de instaurar a acção observando os indicados prazos, sob pena de caducidade do direito a impugnar os actos enunciados no artigo 164.º do CPT.

Tal como se afirmou no Acórdão da Relação de Lisboa de 29 de Setembro de 2021 proferido no âmbito da presente providência cautelar, no caso a caducidade foi estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes pelo que, nos termos do artigo 303.° do Código Civil[1], mostra-se vedado ao tribunal apreciá-la oficiosamente, necessitando, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público.

No caso vertente a caducidade foi invocada pelo R. na oposição que deduziu à providência cautelar, pelo que nada obsta a que da mesma se conheça (ao invés do que sucedia à data da prolação daquele aresto).

A questão que se coloca consiste em saber se o prazo de 15 dias previsto na 2.ª parte do n.º 2, do artigo 164.º do Código de Processo do Trabalho se aplica à impugnação da deliberação constante do Ponto Um da ordem de trabalhos da … em causa.

Em tal Ponto Um – que na ordem de trabalhos se encontrava identificado como “Apreciação da impugnação das eleições na Zona Norte (… e …), para o triénio 2021/2023, no cumprimento do art.° 72.° e para os efeitos previstos na alínea e) do art.° 34.°, ambos dos Estatutos” – foi deliberado por unanimidade:
- anular as eleições para os órgãos sociais da zona norte do ..., nos termos do art.° 72°, dos Estatutos do ...,
- admitir à eleição para o … e … da zona norte do ..., a Lista B,
- afastar a Lista A do acto eleitoral, por os seus constituintes se encontrarem suspensos de toda actividade sindical,
-  marcar o acto eleitoral para os órgãos sociais da zona norte do ..., o (… e o …, para o dia 22 de Maio de 2021, e
- que o processo eleitoral seja preparado e executado pelo … (…).

Sendo este, em suma, o conteúdo da deliberação quanto ao Ponto Um da ordem de trabalhos, é patente, a nosso ver, que o mesmo se enquadra no conceito de “deliberações relativas à eleição de corpos gerentes” enunciado no artigo 164.º, n.º 2, 2.ª parte do Código de Processo do Trabalho.

Como resulta patente da alínea d) dos factos provados, em que se reproduz o resultado da deliberação, ao se decidir “anular as eleições para os órgãos sociais da zona norte do ...” está a deliberar-se sobre a eleição do “corpo gerente” da Zona Norte na medida em que os órgãos em causa são órgãos do Sindicato tal como se mostram elencados no artigo 31.º dos Estatutos do BBB – ...[2].

Se se anula a eleição de um corpo gerente – os órgãos sociais da zona norte do ... – naturalmente a deliberação é relativa à sua eleição.

E o mesmo acontece com a deliberação que convoca a eleição dos corpos gerentes, com a que admite à eleição anulada uma lista (a lista B), bem como com a que afasta do processo eleitoral uma outra lista (a lista A).

É a este propósito relevante o seguinte comentário de José Joaquim Oliveira Martins[3] ao artigo 164.º do Código de Processo do Trabalho, também citado na decisão sob censura: “Quando a ação visar a “impugnação de deliberações relativas à eleição dos corpos gerentes” (e não a impugnação dos “atos eleitorais” propriamente ditos, a que se aplica o Art. 164º-B deste Código, mas antes das várias deliberações relativas às mesmas, como a deliberação que as convocou ou a que admitiu ou não as várias listas candidatas), esse prazo é reduzido para 15 dias, e é contado sempre, não já da data do conhecimento dessas deliberações, a “partir da data da sessão em que tenham sido tomadas essas deliberações” – n.º 2, 2.ª parte (para impedir que uma destas entidades possa ver declarada inválida, muito tempo passado, uma deliberação que esteve na base da eleição dos “corpos gerentes”, o que poderia ter consequências graves na atividade da mesma e afetar também a validade dos atos praticados entretanto por esses “corpos gerentes”)”.

A simples leitura da acta da … permite afirmar, a nosso ver sem margem para dúvida, que as deliberações nela adoptadas quanto ao Ponto Um da Ordem de Trabalhos, vg. a de admitir e não admitir listas candidatas, mas também as demais relacionadas com a marcação do acto eleitoral e com decidir a entidade a quem cabe a sua preparação e execução, são deliberações “relativas à eleição dos corpos gerentes” do Sindicato ora recorrido.

Não tem relevo o facto de não ter resultado da mencionada … uma deliberação de eleição de corpos gerentes. É de notar que a previsão da 2.ª parte, do n.º 2, do artigo 164.º, do CPT não pode dizer respeito à impugnação de actos eleitorais propriamente ditos, pois essa matéria está regulada no artigo 164.º-B do mesmo Código (que estabelece dever a acção ser instaurada pelo vencido no prazo de 10 dias a contar da mesma ou do conhecimento da irregularidade, se posterior). Como bem diz o Mmo. Juiz a quo, falece este argumento da A. quando pretende afastar a aplicação do prazo de 15 dias a contar da data da Assembleia Geral, porque nesta não foi eleito qualquer corpo gerente.

Assim, no que concerne às deliberações relativas ao Ponto Um da ordem de trabalhos da Assembleia Geral, tendo em consideração que a mesma teve lugar em (...), o prazo de 15 dias previsto no artigo 164.º, n.º 2 do Código de Processo do Trabalho completou-se em … 2021 [o anterior dia 25 de Abril foi feriado nacional e coincidiu com um domingo – vide o artigo 279.º, alínea e), do Código Civil], pelo que, quando em 03 de … de 2021 foi instaurada a acção, com o pedido de suspensão de eficácia do acto agora em apreciação, o direito de impugnar aquelas deliberações já havia caducado.

No que diz respeito às demais deliberações adoptadas na Assembleia Geral extraordinária de (...), consubstanciam-se as mesmas, em suma, no seguinte:
- as deliberações sobre o Ponto Dois da ordem de trabalhos dizem respeito a acções judiciais a intentar;
- sobre o Ponto Três não foi tomada qualquer deliberação;
-quanto ao Ponto Quatro, foi aprovada uma alteração aos estatutos.
- deliberou-se ainda que os custos (com suporte documental) com a preparação e realização da assembleia de (...) fossem suportados pelo ….

Nenhuma delas, pois, diz respeito a eleições para corpos gerentes, pelo que o prazo para a instauração da acção em que se pede a sua invalidade é o previsto na primeira parte do n.º 2 do art.º 164.º do CPT, ou seja, 20 dias a contar da data em que o interessado teve conhecimento das deliberações, mas antes de passados 5 anos sobre estas.

Não acompanhamos a decisão sob recurso quando a mesma afirma que a A. devia alegar e convencer o tribunal, logo na petição inicial, de que teve conhecimento da deliberação há menos de vinte dias, o que não fez, apenas o vindo a fazer a resposta que apresentou à oposição do R., daqui concluindo que também caducou o direito de pedir a declaração de nulidade das restantes deliberações.

É certo que a A., ora recorrente nada disse na petição inicial quanto ao momento em que conheceu as deliberações impugnadas, alegando apenas na resposta à oposição (documentada a fls. 73 e ss. deste recurso em separado), que aquelas deliberações ingressaram no domínio da sua cognoscibilidade após 26 de Abril de 2021, na sequência de contactos com outros associados.

Mas, a nosso ver, era este o momento adequado para o fazer pois, não sendo a excepção da caducidade aqui em causa de conhecimento oficioso, a invocação da caducidade competia ao R., em sede de oposição, onde deve concentrar toda a sua defesa, vg. por excepção peremptória, como resulta do disposto nos artigos 571.º a 574.º e 576.º, n.ºs 1 e 3 e 579.º, do Código de Processo Civil. À A., na petição inicial, cabia-lhe expor os factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção, ou seja, a causa de pedir [artigo 552º, nº 1, al. d), do Código de Processo Civil], não tendo a obrigação de, desde logo, alegar os factos necessários a refutar a verificação de uma excepção peremptória que, então, desconhecia se o R. ía – ou não – deduzir.

Pelo que sobre a ora recorrente não impendia a obrigação de, logo na petição inicial, alegar que teve conhecimento da deliberação há menos de vinte dias, devendo reconhecer-se-lhe razão quanto a este fundamento.

Nesta conformidade, e salvo o devido respeito, não podia o tribunal a quo, nesta fase da providência, considerar verificada a caducidade do direito de acção de impugnação das deliberações da …. de (...) que não se compreendem no Ponto Um da ordem de trabalhos. Para decidir a questão da caducidade do direito da A. de impugnar estas deliberações, deveria o tribunal a quo ter ordenado a prossecução do processo para a produção da prova necessária a aferir da data do conhecimento da A. quanto a tais deliberações.

É de confirmar a decisão recorrida quanto à revogação da providência por se verificar a caducidade do direito de impugnar as deliberações da … de (...) adoptadas relativamente ao Ponto Um da ordem de trabalhos, mas já não sufragamos a sua afirmação de se considerar verificada a caducidade do direito de acção quanto às demais deliberações da mesma …..
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4.2. Da falta de alegação de factos que densifiquem o conceito de "dano apreciável"

Tal não significa, contudo, que por outro motivo não se devesse considerar o tribunal a quo habilitado a conhecer da oposição à providência decretada também quanto a tais deliberações, sem necessidade de produção de prova.

Com efeito, nos termos do preceituado no artigo 168.º do Código de Processo do Trabalho, se na petição inicial o autor requerer a suspensão de eficácia dos actos ou disposições impugnados, deve demonstrar que “da sua execução pode resultar dano apreciável”.

Ora, se quanto às deliberações adoptadas a propósito do Ponto Um da ordem de trabalhos a A. alegou factos susceptíveis de integrar este conceito, alegando expressamente haver “periculum in mora”, já quanto às demais nada alega susceptível de densificar o conceito de "dano apreciável".

Com efeito, a A. alegou na sua petição inicial que em fundamento do pedido de suspensão da eficácia das deliberações da …, o seguinte: “35º- A suspensão de eficácia das deliberações tomadas na …. de …  justifica-se pelo facto de existir o periculum in mora. 36º- Uma vez que, neste momento, já se encontra designado o próximo dia … para realização de novo acto eleitoral para o …, isto é, um acto que não poderá realizar-se, uma vez que de acordo com o aprovado na …de ….2021, os Dirigentes eleitos para o …. estão legitimamente mandatados. 37º- Acresce, ainda, que a …do dia …, foi indevidamente convocada, já que os subscritores que solicitaram a sua marcação tiveram pleno conhecimento que existia já uma … agendada desde … de 2020. 38º- O primeiro subscritor …. apenas reuniu as assinaturas dos demais Associados para a marcação da …. do dia …, pelo facto de a Lista (da qual fazia parte) candidata ao … não ter sido admitida por uma clara violação dos Estatutos, concretamente o disposto no artigo 65º, nº 3, dos Estatutos. 39º- Ou seja, a lista da qual fazia parte o supra referido associado, foi excluída do acto eleitoral, uma vez que não cumpria com o número mínimo de subscritores, elencado nos estatutos. 40º- No entanto, o referido subscritor, com a realização da …. que convocou e, consequentemente, as deliberações aí aprovadas, conseguiria/conseguiu obter o resultado que pretendia /pretende, ou seja, a anulação da eleição do … e, assim, poder ser novamente candidato, com a marcação do novo acto eleitoral. 41º- Ademais as restantes deliberações já haviam sido discutidas e aprovadas na …. do dia …, facto este que, obviamente, impede que procedam as deliberações da …. do dia ….. 42º- Acresce, ainda, que o … do ..., na pessoa dos Dirigentes do … compactuaram com esta atuação lesiva ao bom nome do .... 43º- Nesta senda e conforme se constata da acta (…) foi aprovada a deliberação de anulação do acto eleitoral do … e, por via disso, já foi marcado novo acto eleitoral para o próximo dia … de 2021 (…). 44º- Assim é que, se a deliberação cuja suspensão se pretende com a presente demanda, for levada a cabo, o ... ficará prejudicado, na medida em que os Dirigentes eleitos para o … verão o seu mandato findar por uma clara violação dos estatutos e da lei”.

Ou seja, como bem diz o Mmo. Juiz a quo, quanto às deliberações da A… não relativas às eleições para os corpos gerentes, a petição é totalmente omissa no que tange à demonstração de que, da sua execução, poderia resultar dano apreciável para a A., requisito que o artigo 168.º do CPT exige para que o juiz decrete a suspensão imediata da eficácia das deliberações.

Logo, a suspensão da eficácia das deliberações tomadas quanto aos Pontos Dois e Quatro da ordem de trabalhos – não referimos o Ponto Três pois quanto ao mesmo nada foi deliberado, pelo que nada haveria a suspender –, também não pode ser decretada por falta de alegação de factos que densifiquem o conceito de "dano apreciável" advindo da sua execução, neste ponto não merecendo censura a decisão do tribunal a quo.
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4.3. Em suma, ainda que não acolhendo na sua plenitude a fundamentação da decisão sob escrutínio, deve confirmar-se o seu veredicto final, improcedendo a apelação.
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4.4. Porque a recorrente ficou vencida as custas serão por si suportadas (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil). Mostrando-se paga a taxa de justiça e não havendo encargos a contar neste recurso que, para efeitos de custas processuais, configura um processo autónomo (artigo 1.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais), a condenação é restrita às custas de parte que haja.
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5. Decisão
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Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso.
Condena-se a recorrente nas custas de parte que haja.



Lisboa, 12 de Outubro de 2022




(Maria José Costa Pinto)
(Manuela Bento Fialho)
(Sérgio Almeida)



[1]Segundo o qual a caducidade “é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo, se for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes” (n.º 1) e, se for “estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes, é aplicável à caducidade o disposto no artigo 303.º” (n.º 2).
[2]De acordo com o artigo 31.º dos Estatutos do BBB – …, publicados no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 47, de 22 de Dezembro de 2013, são Órgãos do …: a) A assembleia geral; b) O conselho directivo nacional; c) O conselho fiscal e d) Os conselhos directivos regionais.
[3]Vide José Joaquim Fernandes Oliveira Martins, in Código de Processo do Trabalho Anotado e Comentado - Os Processos Laborais na Prática Judiciária, Coimbra, 2020, p.222.