Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1936/15.0T8VFX-V. L1-1
Relator: ISABEL FONSECA
Descritores: RECTIFICAÇÃO DE REGISTO
REGISTO COMERCIAL
INDEFERIMENTO LIMINAR
COMUNICAÇÕES ELETRÓNICAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/09/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1.A pretensão formulada pelo requerente, representado por mandatária judicial, com vista ao reconhecimento dos vícios que aponta e consequente retificação ao registo comercial, só podia ser apresentada perante a entidade competente, a Conservatória do Registo Comercial, por qualquer das vias previstas no art. 45.º do Cód. do Registo Comercial (CRC), a saber, pessoalmente, pelo correio ou por via eletrónica (número 1).

2.Não tendo recorrente utilizado qualquer dessas vias, porquanto se limitou a remeter à Conservatória uma comunicação escrita por meio de mensagem eletrónica, consubstanciando uma transmissão por correio eletrónico (e-mail), que não se confunde com a transmissão por via eletrónica, regulada pela Portaria n.º 1416-A/2006 de 19-06, implicando a troca de documentos por meios eletrónicos através da internet, no endereço próprio mantido para esse efeito pela Direção-Geral dos Registos e do Notariado.

3.Não usando o procedimento legal previsto para a entrega/apresentação do pedido formulado e respetivos documentos de suporte, entende-se que a irregularidade apontada tem como consequência a rejeição da apresentação do pedido, nos termos do art. 46.º, n.º 1, alínea a do CRC, com o indeferimento liminar do requerimento.


Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam as Juízas da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa  


I.– RELATÓRIO


1.–FC apresentou na Conservatória de Registo Comercial de Lisboa requerimento, enviado para essa Conservatória por mensagem de correio eletrónico de 30-09-2022, provinda do endereço … @adv.oa.pt., com o seguinte teor:
“Exmºs Senhores
Muito agradecia que dessem entrada do presente requerimento de rectificação e documentos que seguem em anexo.
Com os m/melhores cumprimentos
ao dispor
MA”.

Um desses anexos constituiu requerimento em que se concluiu como segue:
“Assim, requer a V. Exa que decrete a nulidade dos 3 registos supra referidos supra porquanto foram registados com base em documentos insuficientes ou falsos e consequentemente cancelados os registos correspondentes à Inscrição 4 Ap. 16/20081117 referentes ao aumento de capital e alteração do pacto social; Inscrição 5 Ap. 200/20120320 referente à cessação de funções de membro de órgão social e Inscrição 6 Ap. 201/20120320 referente à mudança de sede, alteração do contrato de sociedade e designação de membro de órgão social, nos termos e para os efeitos do artigo 82.º do Código do Registo Comercial”.
Invoca, para fundamentar a sua pretensão, em síntese, que é sócio da sociedade DS Lda [ [1] ] verificando-se os seguintes vícios:
- Quanto à ata subjacente à Insc. 4, invoca a ausência da sócia ITMP, não obstante a declaração de presença em ata;
- Nos documentos subjacentes à Insc. 5, não consta procuração firmada pelos sócios alegadamente representados pelo sócio RM;
- Nos documentos subjacentes à Insc. 6, não consta procuração firmada pela sócia ITMP, alegadamente representada por terceiro.

Outro anexo reporta uma “procuração” pela qual o requerente constitui como sua procuradora a Drª MA, “a quem, com os de substabelecer, confere os mais amplos poderes gerais forenses em Direito permitidos”. Tal procuração está datada de 30-11-2022 [ [2] ].

2.–Esse requerimento foi objeto de decisão do Sr. Conservador, notificada ao requerente, por intermédio da respetiva mandatária, por comunicação de 19-10-2022, decisão com o seguinte teor:
“DECISÃO
(Rejeição de apresentação com enumeração de deficiências)
PROCESSO DE RETIFICAÇÃO

1.– O Pedido
A senhora Advogada Dra. MA, em representação de FC, com procuração junto aos autos pela qual lhe foram atribuídos poderes forenses gerais, solicita por email a instauração de processo de retificação na sociedade DS LDA - EM LIQUIDAÇÃO, pessoa coletiva número …, com vista à declaração pelo conservador da nulidade do registo lavrado pela inscrição 4 (ap. 16/20081117), pelo averbamento 1 à insc. 05 (ap. 200/20120320) e pela inscrição 6 (Ap. 201/20120320).
Dá conhecimento de que num dos apensos ao processo de insolvência da sociedade "D", um dos réus — a sociedade "ITM S.A." — alega não ter estado presente na assembleia geral realizada em 12.11.2008, titulada na ata n.º 18 que serviu de base ao registo de aumento de capital (insc.04), e que não se fez representar. Diz ainda que esta sociedade beneficia de um pacto de preferência das quotas dos outros dois sócios (insc. 02), razão pela qual sempre aquela sociedade deveria estar presente.
No que respeita ao averbamento de cessação de funções (av.01 insc. 05), alega ter sido apresentada a ata n. º 18 de 2012, situação que não pode ocorrer, porque não pode haver duas atas n.º 18 com quatro anos de diferença. Mais reporta que se diz em tal ata que a "D" é uma sociedade unipessoal por quotas, imprecisão insanável e que teria de ser corrigida;
Que o capital é de cento e nove mil setecentos e trinta euros quando o registo comercial já publicitava a essa data o capital social de trezentos mil euros; Que esteve presente o sócio RM - titular de uma quota de cento e setenta e um mil trezentos e oitenta euros - valor muito superior ao do capital social da empresa. Diz ainda que a sociedade ITMI acima identificada teria de ser representada pela "assinatura" do Conselho de Administração.
Finalmente, no que respeita ao registo constante da insc. 06 (mudança de sede, alteração de contrato e designação de gerente), entende que a ata 19 que serviu de base ao registo enferma de imprecisões e falsas declarações, nomeadamente quando nela se diz que a sociedade ITMI se encontraria representada por PR, sem que a mesma esteja assinada por si, mas apenas por RF e por ES, sem procuração junta à ata.
Conclui, dizendo que os registos foram lavrados com base em títulos nulos, falsos ou insuficientes e pede que o conservador declare a sua nulidade.

2.– O Procedimento.
O requerimento chegou à conservatória como anexo a um pedido de entrada do documento recebido por correio eletrónico, acompanhado de outros 5 anexos. Os documentos anexos foram impressos e encontram-se a instruir o processo de retificação, com exceção do primeiro anexo, identificado como "ePortugaI.gov.pt_Empresas.html", que não é suscetível de visualização útil. Supostamente devia ter sido indicado o código da certidão permanente da sociedade e não foi. Não obstante, imprimimos cópia de todos os registos lavrados na ficha eletrónica,
Ao procedimento foi atribuída a apresentação 114/20221004.

3.–Questões prévias
Os pressupostos processuais que a seguir identificaremos obstariam ao conhecimento da questão de mérito, não fora a circunstância do processo de retificação ser meio absolutamente inadequado para conhecimento das questões colocadas pelo recorrente e para resposta ajustada às pretensões. Por razões de celeridade processual e economia de meios, limitar-nos-emos a inventariar essas razões, sem prejuízo de a elas regressarmos no caso do indeferimento liminar que, afinal, será decidido se vier a ser contrariado em sede de impugnação.
O requerente FC é atualmente titular de duas quotas na sociedade visada no pedido, de acordo com os depósitos 3595 e 3596, ambos de 20171006. Tem, pois, interesse no pedido.

3.1-A interposição de retificação por meio eletrónico.
O primeiro pressuposto que diagnosticamos respeita à possibilidade de uso do correio eletrónico para dar entrada de um pedido de retificação de registo. Ao pedido de retificação se refere o artigo 84.º do CRCom e do seu n. º 1 consta a necessidade de especificação dos fundamentos do pedido e da identificação dos interessados. No n. º 2 do mesmo normativo prevê-se a junção dos meios de prova necessários e o pagamento dos emolumentos devidos.
Dispõe o artigo 45.º nº 1, do mesmo Código que a apresentação de documentos para registo pode ser feita pessoalmente, pelo correio ou ainda por via eletrónica, nos termos a regulamentar por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça. A regulamentação consta da Portaria n.º 1416-A/2006, de 19.06, pondo-se em evidência que no conjunto de funções que o sítio eletrónico garante (cf. art 3.º) prevê-se, designadamente, a autenticação dos utilizadores através de certificados digitais, a assinatura eletrónica dos documentos entregues bem como o pagamento dos serviços por via eletrónica.
Esse meio não foi utilizado razão pela qual não estão garantidos pressupostos de autenticidade de quem apresenta o pedido - qualidade que lhe garante legitimidade para o fazer - e de autenticidade dos documentos apresentados. A sorte do pedido não pode deixar de ser a de rejeição do pedido de retificação por impropriedade do meio usado — cf. art. 46.º n.º 1, a) do CRCom.
Sem necessidade de maior desenvolvimento, deve dizer-se que o DL n.º 16/2020, de 15.04, foi revogado e que o correio eletrónico simples deixou de ser meio adequado para promover retificações de registo; ainda assim, tenha-se presente que o legislador desse diploma sentiu necessidade de se assegurar de requisitos de autenticidade do requerente e dos documentos enviados, requisitos que ora não se verificam (cf. art 4.º).

3.2- A Representação
Parece-nos igualmente relevante que a procuração conferida à senhora advogada, da qual consta a atribuição de poderes forenses gerais, não é bastante para assegurar a representação do requerente no procedimento em curso. Dado que se trata de um ato que não está sujeito a patrocínio judiciário obrigatório, isto é, dado que não é um ato próprio da profissão forense, importa que a representação esteja assegurada por procuração com poderes especiais. Esta exigência legal também não se mostra cumprida.
Por isso mesmo se deixa à consideração da apresentante a eventual junção de procuração com poderes especiais para o processo de retificação, no caso de entender impugnar o presente despacho. 

3.3- O preparo
Pela retificação efetuada fora dos casos previstos nos artigos 85.º e 86.º do CRCom — como se nos afigura manifesto ser o caso - é devido o emolumento previsto na verba 6.1, do artigo 22.º do Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado, no valor de 250,00 €.
Este preparo é exigível, mesmo em caso de indeferimento liminar, caso em que o valor cobrado é devolvido, mas não na sua totalidade. Em caso de indeferimento liminar é devido valor igual ao da recusa que, conforme se prevê na verba 12 do mesmo art. 22.º, é de 50,00€.
A ausência de qualquer preparo constitui motivo de rejeição da apresentação, nos termos conjugados dos números l/b), 3, 5 e 8, do art 46.º do CRCom, constituindo o presente despacho notificação para efeitos do disposto no n.º 8 do art. 114.º do mesmo código. Vale isto por dizer   que não sendo pago o aludido valor, será o pedido recusado ao abrigo do disposto no artigo 46.% n.º 1, b) e n.º 8 do CRCom.

4.–Do indeferimento liminar
A factualidade exposta no requerimento, que aqui damos por integralmente reproduzida, e o consequente pedido de declaração de nulidade que se formula, assenta inquestionavelmente na falsidade dos factos ocorridos nas diversas assembleias gerais que deram origem às atas apresentadas nos diversos registos atrás identificados. Sem discutir o complexo conceito de falsidade, parece-nos evidente que quando se alega que o sócio X não esteve presente em determinada assembleia, que determinadas atas teriam de ser assinadas por F.. e por B... e não foram, que não há instrumentos de representação... e que ainda assim as deliberações foram aprovadas, o que se quer significar é que os documentos que serviram de base aos registos são falsos. Aliás, é esta a conclusão expressa pelo requerente quando qualifica de "falsas declarações" e de "falsos os títulos" que serviram de base aos registos,
Na verdade, o registo lavrado por transcrição (e todos eles o foram) é nulo se "for falso ou tiver sido lavrado com base em títulos falsos". É esta a determinação legal constante da alínea a), do n.º 1, do art. 22.º do CRCom.
De cada um dos documentos apresentados não perpassa a ideia de insuficiência do título para prova dos factos correspondentes. Quando se aponta para a inverdade factual do que ocorreu não se aponta para a insuficiência de título, mas para a falsidade do que em cada documento apresentado se dá por ocorrido.
Ora, de acordo com o n.º 3, do mesmo art 22.º do CRCom, "A nulidade do registo só pode ser invocada depois de declarada por decisão judicial com trânsito em julgado."
Por certo que não ignoramos o disposto no art.º 82.º do CRCom que permite a retificação de registos indevidamente efetuados que sejam nulos nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1, do artigo 22.º. Estes podem ser cancelados com o consentimento dos interessados ou em execução de decisão tomada neste processo se não estiver registada a ação de declaração de nulidade. A verdade é que se nos afigura em face do pedido e da causa de pedir que em causa está uma situação de falsidade documental e não de insuficiência de título.
Compreenda-se que a questão não é apenas registal e que para se chegar à conclusão da eventual falsidade documental que o requerente alega é necessário carrear a processo judicial próprio e a decisor com outras competências e meios que o conservador não tem, prova da mais variada espécie. Aliás, há presunções registais que, mesmo por acordo dos interessados, como a que está em causa, não podem ser destruídas senão por decisão judicial.
É por esta razão que entendemos ser manifesto que o pedido deverá ser indeferido liminarmente ao abrigo do artigo 88.º n.º 1 do CRCom, afigurando-se-nos inútil prosseguir com a tramitação prevista na lei se, ab initio, a sorte do pedido se apresenta inviável.

5.–Síntese
Por ora, as questões prejudiciais impõem decisão intercalar que é a seguinte:
a)-A sorte do pedido de retificação não pode deixar de ser a de rejeição por impropriedade do meio usado - cf. art. 46.º, n.º 1, a) do CRCom.
b)-Mantendo-se o propósito de conservar a instância aberta por via de impugnação do despacho anterior, convida-se a requerente a juntar:
b.l)-procuração com poderes especiais para o processo de retificação;
b.2)-fazer o preparo de 250,00 €, considerando-se notificada ao abrigo do n.º 8 do art. 114.º do CRCom
Deste despacho cabe impugnação a interpor nos termos conjugados dos artigos 46.º n.º 5, e 101.º e seguintes do CRCom.
Notifique-se a requerente”.
 
3.–Não se conformando, o requerente impugnou essa decisão junto do Tribunal de Primeira Instância, peticionando ao Sr. Conservador “que remeta a impugnação judicial para o tribunal judicial competente, nos termos do artigo 92.º do Código do Registo Comercial”, apresentando requerimento com o seguinte teor:
“Exmo. Senhor
Dr. Juiz de Direito do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa
 (…) vem, nos termos e para os efeitos do artigo 92.º do Código do Registo Comercial, apresentar Impugnação Judicial da decisão de rejeição da AP.114/2022.10.04, proferida pelo Senhor Conservador do Instituto dos Registos e do Notariado, o que faz nos termos, pelos factos e com os fundamentos seguintes:
1.-O ora requerente é sócio da Sociedade DS Lda. desde 06.10.2017, data em que adquiriu as quotas a A A, conforme resulta da certidão permanente da empresa. Código de acesso à certidão Permanente: 7476-1803-6350
2.-Esta sociedade foi primeiramente submetida a um Processo Especial de Revitalização que redundou em 2015 na sua insolvência, processo que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, no juiz 3 do Juízo de Comércio de Vila Franca de Xira sob o no de processo 1936/15.OT8VFX.
3.-Nesses autos correm diversos apensos, com as mais variadas pretensões.
4.-Acontece porém que num desses apensos, mais concretamente, no apenso G, o Réu ITMP um dos sócios da DS Lda, dirigiu um requerimento ao processo em 23.05.2022 referindo que não assinou a acta 18 da Assembleia Geral de sócios da DS Lda, nem assinou a alteração dos estatutos dessa sociedade, conforme documento que se junta sob o n01 e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
5.-Após ter obtido tal informação o requerente solicitou diversas certidões junto da Conservatória do Registo comercial do Barreiro a fim de se inteirar da forma como os registos desta sociedade foram feitos.
6-Assim, o requerente deparou -se com 3 registos que no seu entender são nulos, a saber:
a)-Insc.4 Ap. 16/20081117 referente ao aumento de capital e alteração do Pacto Social;
b)-Insc.5 Ap.200/20120320 referente à cessação de funções de membro do órgão social, e
c)-Insc.6 Ap.201/20120320 referente à mudança de sede, alteração do contrato de sociedade e designação de membro de órgão social.
7.-Com efeito, e relativamente ao registo constante da alínea a), foi entregue uma acta com o número 18 datada de 12 de Novembro de 2008, assim como o pacto social da empresa.
8.-Acontece porém, que na mesma consta ter estado presente nessa Assembleia, FM, LM e ITMI SA.
9.-Contudo o sócio ITMI, não esteve presente nessa Assembleia conforme o mesmo alegou nos autos de insolvência da D, nem da mesma consta que se tivesse feito representar, pois não se vislumbra nenhuma procuração. (Doc.2)
10.-Ademais, e como se pode facilmente constatar da leitura atenta da mesma, a referida acta está assinada apenas pelos dois sócios FM e LM e ainda por RM sócio acabado de integrar nessa mesma Assembleia da qual o sócio ITMI não participou.
11.-Este sócio tem um pacto de preferência sobre quotas, constante da inscrição 2 Ap.09/19980128 que refere: " em qualquer cessão, alienação ou oneração de quotas realizadas pelos sócios ou por eles autorizada. Até á dissolução da sociedade. Extracto da inscrição 2"
12.-Logo, não podia este registo ter sido efectuado porquanto este sócio não só não esteve presente na Assembleia como não se fez representar, inexistindo qualquer procuração e nome de outro sócio que suprisse tal ilegalidade.
13.-No tocante ao registo referido na alínea b) deste requerimento, onde se pretendia registar os seguintes actos: renúncia à gerência, mudança de sede e nomeação de gerente, também este enferrna de nulidade. (Doc.3)
14.-Para formalizar este registo foram apresentados 3 documentos, a saber uma acta, um documento particular intitulado renúncia à gerência" e o pacto social.
15.-A acta também está indicada como sendo a acta 18, porém de 2012, o que não pode acontecer, pois não é possível existirem duas actas com o mesmo número e com um espaço entre elas de 4 anos.
16.-Depois na susodita acta refere-se que a D é uma sociedade unipessoal por quotas, o que revela uma imprecisão insanável, pelo que tal imprecisão teria sempre que ser corrigida.
17.-Acresce que, é referido que o capital social é de cento e nove mil setecentos e trinta euros, quando o registo comercial nessa data, tem inscrito um capital social de trezentos mil euros.
18.-Mais consta dessa acta que se encontra presente o sócio RM, titular de uma quota no valor de cento e setenta e um mil trezentos e oitenta euros, valor muito superior ao capital social desta empresa e constante desta acta.
19.-Para além destas imprecisões refere-se ainda que o sócio RM representa os restantes sócios, contudo inexiste qualquer procuração desses sócios a delegar poderes para o efeito.
20.-Ademais, a representação do sócio ITMI tem sempre que ser assinada pelo Conselho de Administração.
21.-Assim, também este registo é nulo, devendo o mesmo ser rejeitado.
22.-No que respeita ao registo constante da alínea c) deste requerimento, procedeu-se à alteração da sede da sociedade. (Doc.4)
23.-Para o efeito foi junta a acta 19 que também enferma de imprecisões e falsas declarações, nomeadamente que o sócio ITMI se encontra representado por PR quando a acta não está assinada por si, apenas pelo RF e ES e também não se vislumbra qualquer procuração junta à acta.
24.-Ora, todos estes registos são nulos, pelas razões alegadas supra, pois tais registos foram lavrados com base num título nulo, falso ou insuficiente, vide a este respeito o artigo 22.º n.º 1 alínea b) do Código do Registo Comercial.
25.-Estão em causa interesses privados, públicos e de fé pública dos actos de registo. Pelo que e de acordo com o vertido no artigo 820 do Código do Registo Comercial, todos estes registos terão que ser considerados nulos alterando-se os mesmos para rejeitado.
26.-Por todos estes factos se requereu a retificação destes registos, solicitando-se a nulidade dos 3 registos referidos supra porquanto foram registados com base em documentos insuficientes ou falsos e que consequentemente fossem cancelados os registos correspondentes à Inscrição 4 Ap. 16/20081117 referente ao aumento de capital e alteração do pacto social; Inscrição 5 Ap.200/20120320 referente à cessação de funções de membro do órgão social, e Inscrição 6 Ap.201/20120320 referente à mudança de sede, alteração do contrato de sociedade e designação de membro de órgão social, nos termos e para os efeitos do artigo 820 do Código do Registo Comercial.
27.-Acontece porém, que o Senhor Conservador decidiu rejeitar o pedido de retificação por "impropriedade do meio usado", fundamentando o seu despacho com o artigo 46.º n.º 1 a) do Código do registo Comercial e da portaria no 1416-A/2006, de 19.12.
28.-Contudo, discorda o requerente de tal fundamento, porquanto a Portaria referenciada supra regula a promoção de actos de registo comercial online.
29.-Ora, este processo de retificação não pode ser feito online, nem os documentos que seguem em anexo têm que respeitar as exigências desta portaria, porque não são documentos que se enviam em anexo aos pedidos de registo online.
30.- Este tipo de justificação utilizada pelo Senhor Conservador não se aplica à presente situação, pelo que inexiste qualquer meio inapropriado. Ademais, os documentos juntos com o pedido são certidões emitidas pela Conservatória, basta fazer a confrontação dos mesmos para aferir da sua autenticidade.
31.-Ademais, a responsabilidade pelos registos compete ao conservador do registo cuja função primordial é verificar da viabilidade do pedido do registo, da legitimidade dos requerentes e do cumprimento das disposições legais aplicáveis, nos termos do artigo 470 do Código do Registo Comercial. Sendo igualmente da sua responsabilidade declarar o registo nulo quando existem fundamentos para o efeito como é o presente caso.
32.-Mas o Senhor Conservador ainda vai mais longe, colocando em causa a legitimidade e condição de advogada da mandatária do requerente, quando a mesma enviou o seu pedido através do email certificado pela ordem dos advogados.
33.-E razão para questionar, e se o pedido de retificação tivesse seguido via postal, o meio já seria próprio? Como se aferia da autenticidade dos documentos juntos e das credenciais da mandatária do Requerente?
34.-O pedido de retificação apresentado pelo requerente observou todos os requisitos necessários para ser deferido, com excepção do pagamento do preparo, mas que é sanável, atente-se que a mandatária do requerente recebeu um contacto telefónico da conservatória para fazer o pagamento correspondente aos 3 registos. Porém antes que o pagamento fosse feito, surgiu o despacho de indeferimento.
35.-Mas o Senhor Conservador também entendeu que a procuração apresentada pela mandatária do requerente " ...não é bastante para assegurar a representação do requerente...", posição com a qual se discorda, ademais, o Senhor Conservador refere ser uma exigência legal mas não faz referência a que lei, decreto lei, ou portaria ou artigo se refere.
Provavelmente, será com base num de tantos regulamentos internos que as conservatórias possuem mas que não se sobrepõe à Lei.
36.-Contudo, a procuração exigida foi alterada e junta para permitir a presente impugnação judicial.
37.-Por fim, do despacho consta ainda que dos documentos apresentados e que instruem cada um dos pedidos de registo não perpassa a ideia de insuficiência do título para prova dos factos correspondentes..."
38.-Ora, a insuficiência de tais documentos é tão óbvia e grosseira que não se percebe como foram os registos efectuados. Veja-se que para apresentação do pedido de retificação desses registos foram colocados entraves quanto à procuração apresentada pela mandatária do requerente, mas aquando da realização dos registos, quem os registou nem se preocupou com o facto de os ausentes não estarem representados por procuração, por exemplo, entre outras questões que supra se evidenciaram.
39.-Assim se requer que o despacho que se impugna seja substituído por outro que admita o pedido de retificação apresentado, seguindo-se os seus ulteriores termos”.

Junta procuração pela qual o requerente atribuiu poderes à mandatária “para instaurar junto da Conservatória do registo comercial de Lisboa, processo de retificação de registos respeitantes à sociedade DS Lda – em liquidação”. Tal procuração está datada de 28-10-2022.

Em 02-05-2023 o Tribunal proferiu decisão com o seguinte segmento dispositivo:
“IV.–Decisão final
Pelo exposto, julgo improcedente o recurso, mantendo a decisão recorrida.
Custas pelo Impugnante, sem prejuízo do apoio judiciário.
Valor: na ausência de indicação do Impugnante, e por apelo ao disposto no artigo 106.º do
Código do Registo Comercial, € 5 000,01.
Registe.
Notifique, também ao Sr. Conservador e ao Presidente do Instituto dos Registos e do Notariado, I.P., nos termos do artigo 106.º/2, do Código do Registo Comercial.
Transitado:
Comunique ao serviço de registo – artigo 107.º/1. a), do Código do Registo Comercial;
Devolva ao Impugnante a quantia depositada nos autos através de Documento único de cobrança.
 
4.–Novamente inconformado, o requerente/recorrente apresentou recurso para este Tribunal da Relação de Lisboa, apresentando alegações, com as seguintes conclusões:
1-Foi proferida sentença por este tribunal a quo” que julgou improcedente a impugnação judicial apresentada pelo recorrente da decisão do Senhor Conservador.
2- Alegou para o efeito que o recorrente não utilizou os meios admitidos por lei para apresentar o pedido de rectificação, ficando prejudicada a análise das outras questões suscitadas.
3-Ainda assim pronunciou-se sobre as mesmas.
4-E fê-lo para dizer que o recorrente não pagou os preparos, e que não há lugar a convite ao pagamento.
5-Mais adiantou que o recorrente invocou desconformidade entre o declarado nas actas subjacentes aos registos e o que efectivamente ocorreu, que alegou que alguns sócios não estavam presentes contrariamente ao que consta dos documentos e que estas anomalias não podiam ser apreciadas em sede de rectificação de registo.
6-Acontece porém, que no apenso G destes autos, um dos sócios da DS Lda, ITMI, dirigiu um requerimento ao processo em 23.05.2022 referindo que não assinou a acta 18 da Assembleia Geral de sócios da DS Lda, nem assinou a alteração dos estatutos dessa sociedade, conforme documento que se juntou.
7-Perante tal afirmação, o recorrente solicitou diversas certidões junto da Conservatória do Registo comercial do Barreiro, e verificou a existência 3 registos, nomeadamente: a Insc.4 Ap. 16/20081117 referente ao aumento de capital e alteração do Pacto Social; a Insc.5 Ap.200/20120320 referente à cessação de funções de membro do órgão social, e a Insc.6 Ap.201/20120320 referente à mudança de sede, alteração do contrato de sociedade e designação de membro de órgão social.
8-Constataram-se diversas irregularidades que não podiam ter sido olvidadas, nomeadamente que foi entregue uma acta com o número 18 datada de 12 de Novembro de 2008, assim como o pacto social da empresa e que dessa acta resulta ter estado presente nessa Assembleia, FM, LM e ITMI SA, quando este último veio a juízo informar que não esteve presente nessa Assembleia. Também não resulta que se tenha feito representar, pois inexiste qualquer procuração junta.
9-Ademais, e como se pode facilmente constatar da leitura atenta da mesma, a referida acta está assinada apenas pelos dois sócios FM e LM e ainda por RMsócio acabado de integrar nessa mesma Assembleia da qual o sócio ITMI não participou.
10-Acresce que, este sócio tem um pacto de preferência sobre quotas, constante da inscrição 2 Ap.09/19980128 que refere: “ em qualquer cessão, alienação ou oneração de quotas realizadas pelos sócios ou por eles autorizada. Até á dissolução da sociedade. Extracto da inscrição 2”
11-Logo, não podia este registo ter sido efectuado porquanto este sócio não só não esteve presente na Assembleia como não se fez representar, inexistindo qualquer procuração e nome de outro sócio que suprisse tal ilegalidade.
12-Quanto ao segundo registo referido na alínea b) onde se pretendia registar os seguintes actos: renúncia à gerência, mudança de sede e nomeação de gerente, também este enferma de nulidade, pois para formalizar este registo foram apresentados 3 documentos, uma acta, um documento particular intitulado “renúncia à gerência” e o pacto social.
13-Esta acta também está indicada como sendo a acta 18, porém de 2012, o que não pode acontecer, pois não é possível existirem duas actas com o mesmo número e com um espaço entre elas de 4 anos. Nessa acta refere-se que a D é uma sociedade unipessoal por quotas, o que revela uma imprecisão insanável, pelo que tal imprecisão teria sempre que ser corrigida.
14-Mais se refere que o capital social é de cento e nove mil setecentos e trinta euros, quando o registo comercial nessa data, tem inscrito um capital social de trezentos mil euros, assim como que se encontrava presente o sócio RM, titular de uma quota no valor de cento e setenta e um mil trezentos e oitenta euros, valor muito superior ao capital social desta empresa e constante desta acta.
15-Mas, para além destas imprecisões refere-se ainda que o sócio RM representa os restantes sócios, contudo inexiste qualquer procuração desses sócios a delegar poderes para o efeito.
16-Ademais, a representação do sócio ITMI tem sempre que ser assinada pelo Conselho de Administração. 
17-No que respeita ao registo constante da alínea c) deste requerimento, procedeu-se à alteração da sede da sociedade. Foi junta a acta 19 que também enferma de imprecisões e falsas declarações, nomeadamente que o sócio ITMI se encontra representado por PRquando a acta não está assinada por si, apenas pelo RF e ES e também não se vislumbra qualquer procuração junta à acta.  
18-O pedido de rectificação do recorrente foi indeferido, contudo o tribunal “ a quo” parece não se pronunciar sobre todos os fundamentos constantes dessa decisão, pois para além dos elencados por este tribunal, sobre os quais se pronunciou, também o Senhor Conservador indeferiu o pedido do ora recorrente porquanto o pedido não foi enviado por via eletrónica, pelo que não estavam garantidos pressupostos da autenticidade de quem apresenta o pedido (mandatária do recorrente) e dos documentos apresentados.
19-Assim como a Procuração apresentada pela mandatária do recorrente não lhe conferia poderes para representar o mesmo no processo de rectificação. E ainda que dos documentos apresentados não perpassa a ideia de insuficiência do título para prova dos factos alegados.
20-Ao apresentar o pedido de rectificação dos registos, o ora recorrente fê-lo ao abrigo do artigo 82º do Código do Registo Comercial, que permite a rectificação de registos indevidamente efectuados que sejam nulos nos termos das alíneas b) e d<9 do nº 1 do artigo 22º do Código do Registo Comercial.
21-Todos estes registos são nulos, pelas razões alegadas supra, pois tais registos foram lavrados com base num título nulo, falso ou insuficiente, vide a este respeito o artigo 22º nº 1 alínea b) do Código do Registo Comercial.
22-Por todos estes factos se requereu a rectificação destes registos, solicitando-se a nulidade dos 3 registos referidos supra porquanto foram registados com base em documentos insuficientes ou falsos.
23-A Portaria 1416-A/2006 de 19.12 regula a promoção de actos de registo comercial online. Contudo, este processo de retificação não pode ser feito online, nem os documentos que seguem em anexo têm que respeitar as exigências desta portaria, porque não são documentos que se enviem em anexo aos pedidos de registo online.
24-Esta justificação não se aplica à presente situação, pelo que inexiste qualquer meio inapropriado. Ademais, os documentos juntos com o pedido são certidões emitidas pela Conservatória, basta fazer a confrontação dos mesmos para aferir da sua autenticidade, jamais foram postos em causa.
25-Ademais, a responsabilidade pelos registos compete ao conservador do registo cuja função primordial é verificar da viabilidade do pedido do registo, da legitimidade dos requerentes e do cumprimento das disposições legais aplicáveis, nos termos do artigo 47º do Código do Registo Comercial. Sendo igualmente da sua responsabilidade declarar o registo nulo quando existem fundamentos para o efeito como é o presente caso.
26-O tribunal “a quo” fundamenta a sua decisão e cita um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, Proc. 832/18.3T8LSB.L1-2 de 8.11.2018, que nada tem a ver com a presente situação, antes sim com o modo como foi interposto um recurso hierárquico, assim como um parecer do Conselho Consultivo do IRN. 
27-Mas o tribunal “a quo” também refere como causa para não aceitação do pedido de rectificação, o facto de o pedido não ter sido assinado digitalmente.
28-O pedido foi apresentado através do email da mandatária, devidamente certificado pela ordem dos advogados. 
29-Ora, se o pedido tivesse sido feito via postal, como se iria aferir da autenticidade dos documentos juntos e das credenciais da mandatária do Requerente?
30-O pedido de rectificação apresentado pelo requerente observou todos os requisitos necessários para ser deferido, com excepção do pagamento do preparo, mas que é sanável, atente-se que a mandatária do requerente recebeu um contacto telefónico da conservatória para fazer o pagamento correspondente aos 3 registos. Porém antes que o pagamento fosse efectuado, surgiu o despacho de indeferimento. 
31-Mas o Senhor Conservador também entendeu que a procuração apresentada pela mandatária do requerente “… não é bastante para assegurar a representação do requerente…”, posição com a qual se discorda, ademais, o Senhor Conservador refere ser uma exigência legal mas não faz referência a que lei, decreto lei, ou portaria ou artigo se refere. E sobre esta questão o tribunal “a quo” nem se pronunciou.
32-Mas ainda assim, a procuração exigida foi alterada e junta conforme solicitado.
33-Por fim, do despacho consta ainda que dos documentos apresentados e que instruem cada um dos pedidos de registo “…. não perpassa a ideia de insuficiência do título para prova dos factos correspondentes…”
34-Ora, a insuficiência de tais documentos é tão óbvia e grosseira que não se percebe como foram os registos efectuados. Veja-se que para apresentação do pedido de rectificação desses registos foram colocados entraves quanto à procuração apresentada pela mandatária do requerente, mas aquando da realização dos registos, quem os registou nem se preocupou com o facto de os ausentes não estarem representados por procuração, por exemplo, entre outras questões que supra se evidenciaram.
35-Assim e atento o supra exposto, deverá a decisão da qual se recorre ser revogada e substituída por outra que ordene o prosseguimento dos autos.
Com tais fundamentos e demais de Direito, contando-se com o douto suprimento de V. Exas, deve ser dado provimento ao presente recurso e, assim, far-se-á a costumada
JUSTIÇA”

O Ministério Público apresentou contra-alegações, concluindo que:
“A sentença recorrida decidiu bem em julgar improcedente o recurso, mantendo a decisão do Sr. Conservador.
 O Tribunal “a quo” decidindo, como decidiu, interpretou correctamente os factos e aplicou, de forma adequada, o Direito, não violando quaisquer normas jurídicas, designadamente, as invocadas pelo Recorrente.
 Nestes termos, e nos que Vossas Excelências mui doutamente suprirão, não deixarão de negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar, integralmente a douta decisão recorrida, fazendo a acostumada JUSTIÇA”.
 
Cumpre apreciar.

II.–FUNDAMENTOS DE FACTO

O tribunal de 1ª instância deu por provado o seguinte facto:
O requerimento inicial da retificação foi enviado para a Conservatória através de mensagem de correio eletrónico de 30-09-2022, provinda do endereço … @adv.oa.pt.

III.–FUNDAMENTOS DE DIREITO

1.–O presente recurso incide sobre a decisão proferida pelo Tribunal de primeira instância que apreciou a impugnação judicial apresentada pelo recorrente [[3]], tendo por objeto decisão proferida pelo Conservador do Registo Comercial. Do regime enunciado no Código do Registo Comercial, diploma a que aludiremos quando não se fizer menção de origem, emerge que, em casos como o dos autos, a primeira instância funciona como tribunal de recurso, sendo ainda esta decisão passível de impugnação, como aqui acontece, para o Tribunal da Relação, como tribunal de última instância de recurso, nos termos do art. 106.º, nº1 e sem prejuízo do disposto no seu número 4 [[4]].
Sendo o objeto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – arts. 635.º e 639.º do CPC – salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito – art.º 5.º, nº3 do mesmo diploma.

No caso, impõe-se apreciar:
- Se o requerente efetuou o pedido de retificação de registo, tendo por objeto três inscrições, pela forma/procedimento adequado;
- Concluindo em sentido negativo, se se justifica analisar outros fundamentos de indeferimento, mormente por manifesta improcedência da pretensão formulada.

2.–Lê-se na fundamentação da decisão recorrida:
1–Da apresentação de requerimento inicial de retificação através de mensagem de correio eletrónico
Neste âmbito, alegou o Impugnante “29 – (…) este processo de retificação não pode ser feito online, nem os documentos que seguem em anexo têm que respeitar as exigências desta Portaria, porque não são documentos que se enviem em anexo aos pedidos de registo online.”. 
Analisando.
Estabelece o artigo 45.º/1, do Código do Registo Comercial:
“A apresentação de documentos para registo pode ser feita pessoalmente, pelo correio ou ainda por via electrónica, nos termos a regulamentar por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.”.
A apresentação por via eletrónica está regulamentada no artigo 2.º da Portaria n.º 1416-A/2006, de 19-12:
“A promoção online de actos de registo comercial e (…) fazem-se através do sítio na Internet com o endereço www.empresaonline.pt, mantido pela Direcção-Geral dos Registos e do Notariado.”.
O Impugnante não utilizou os meios admitidos por lei: fez uso de correio eletrónico. 
Alega o Impugnante que ao processo de retificação não se aplica o disposto no artigo 45.º do Código do Registo Comercial.
Não se alcança razão para excluir a retificação dos demais pedidos registrais. A unidade do sistema jurídico, princípio interpretativo previsto no artigo 9.º/1, do Código Civil, impõe solução contrária.
Neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, Processo: 832/18.3T8LSB.L1-2, 08-11-2018:
“(…) artigo 45.º, n.º 1, do mesmo Código, aí se prevendo que a apresentação de documentos para registo pode ser feita pessoalmente, pelo correio ou ainda por via eletrónica, nos termos a regulamentar por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.
Note-se, contudo, que “via eletrónica” e “correio eletrónico” não são sinónimos, sendo a referência a “via eletrónica” bem mais abrangente. Daí, aliás, a necessidade de regulamentação.
A Recorrente defende que essa regulamentação foi feita pela Portaria n.º 1416-A/2006, de 19 de dezembro.
Mas, como facilmente se alcança pela leitura da referida Portaria, a mesma não veio prever a apresentação de pedidos de registo por correio eletrónico. Na verdade, veio regular a promoção online de atos de registo comercial e a solicitação da certidão permanente através do sítio na Internet com o endereço www.empresaonline.pt, mantido pela (então) Direcção-Geral dos Registos e do Notariado.
Não está, pois, prevista a prática do ato em apreço (interposição de recurso hierárquico) através de correio eletrónico, mas apenas através de requerimento apresentado na Conservatória do Registo Comercial, pessoalmente ou por correio, aplicando-se ainda o disposto no art. 4.º do Regulamento do Registo Comercial.
Isto mesmo é referido na sentença recorrida e na decisão do Senhor Presidente do IRN. Esta última apoia-se no decidido no Pº R.Co 22/2008 SJC-CT e C.P. 73/2008 SJC-CT, referindo que «a unidade do sistema registral demanda que as vias de “apresentação” no serviço de registo sejam as mesmas, quer ao nível dos pedidos de registo quer ao nível das petições de impugnação das decisões registrais, donde resulta que não estando prevista a via da telecópia e do correio eletrónico para a apresentação de pedido de registo, no âmbito do registo comercial, também estas não serão admissíveis para a impugnação das decisões registrais».
Por sua vez, a sentença recorrida, cita o Parecer do Conselho Consultivo do IRN n.º 51/CC/2014, de 19 de setembro de 2014, atinente ao registo predial: “Se por um lado, a «unidade do sistema registal» continua a demandar que sejam as mesmas as vias de apresentação no serviço de registo dos pedidos de registo e dos requerimentos de impugnação das decisões registais, por outro lado, o recurso hierárquico ou a impugnação judicial interpõem-se por meio de requerimento (artigo 142.º, n.º 1, do CRP); consideram-se feitas com a apresentação das respetivas petições no serviço de registo (artigo 142.º, n.º 2, do CRP); e devem ser imediatamente anotadas no Diário (artigo 60.º do CRP), a seguir à anotação da recusa ou ao registo provisório, constante da ficha (artigo 148.°, n.° 1, do CRP). (...) só é admissível a apresentação de petições de recurso pessoalmente ou pelo correio por serem essas as formas de apresentação para registo (artigo 41.º-B do CRP) e cumprindo-se as regras da anotação da apresentação, pode garantir-se também a observância do princípio da prioridade.”- sublinhado nosso. (…)”. [Destaques da nossa autoria].
A imperatividade do elenco dos meios de apresentação previsto no artigo 45.º/1 foi recentemente explanada pelo legislador. 
O Decreto-Lei n.º 16/2020, de 15 de abril, estabeleceu normas excecionais e temporárias destinadas à prática de atos por meios de comunicação à distância, no âmbito da pandemia da doença COVID-19.
Consta do seu preâmbulo: “No que toca aos procedimentos e atos de registo, considerando as restrições vigentes em matéria de atendimento presencial, para os casos em que não exista a possibilidade de efetuar pedidos de registo online disponibiliza-se aos cidadãos mais um canal desmaterializado de atendimento dos serviços de registos assente no correio eletrónico.”.
Assim: “Os pedidos de registo civil, de veículos, comercial e predial que não possam ser efetuados online através do sítio na Internet do IRN, I. P., podem ser enviados para o endereço de correio eletrónico do respetivo serviço de registo, ou por outra via eletrónica que seja definida pelo conselho diretivo do IRN, I. P.” – artigo 4.º/1.
Todavia, “Os pedidos (…) são efetuados mediante requerimento assinado eletronicamente pelos intervenientes com recurso ao cartão de cidadão, à chave móvel digital ou a outra modalidade de assinatura eletrónica qualificada que, preferencialmente, cumpra os requisitos aplicáveis aos selos temporais qualificados.” – artigo 4.º/4.
No caso em apreço, o requerimento da apresentação não se mostra assinado eletronicamente. 
Ainda que se mostrasse assinado, não seria admissível, porquanto a vigência do diploma cessou em 30-06-2022.
Com efeito, determinou o artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 119-A/2021, de 22 de dezembro: “A vigência dos artigos 2.º, 4.º, 8.º a 11.º e 13.º a 15.º do Decreto-Lei n.º 16/2020, de 15 de abril, na sua redação atual, é prorrogada até ao dia 30 de junho de 2022.”. 
O Código do Registo Comercial prevê a rejeição da apresentação “Quando o requerimento não respeitar o modelo aprovado, quando tal for exigível;” – artigo 46.º/1, al. a).
A apresentação através de mensagem de correio eletrónico é anomalia processualmente anterior à não utilização do modelo aprovado.
Não deixará de lhe caber igual consequência legal, a da rejeição da apresentação.
Concluindo, mantemos a decisão recorrida”.
Concorda-se com o entendimento assim explanado, a propósito da primeira questão enunciada, impondo-se apenas algumas considerações, em nótula, ponderando as conclusões de recurso.
A pretensão formulada pelo requerente, com vista ao reconhecimento dos vícios que aponta e consequente retificação ao registo, só podia ser apresentada perante a entidade competente, a Conservatória do Registo Comercial, por qualquer das vias previstas no art. 45.º, a saber, pessoalmente, pelo correio ou por via eletrónica (número 1) [[5]].
No caso, a recorrente não discute, como nunca discutiu, que não utilizou qualquer dessas vias, porquanto se limitou a remeter à Conservatória uma comunicação escrita por meio de mensagem eletrónica, consubstanciando uma transmissão por correio eletrónico (e-mail), que não se confunde com a transmissão por via eletrónica, implicando a troca de documentos por meios eletrónicos através da internet, no endereço próprio mantido para esse efeito pela Direção-Geral dos Registos e do Notariado.
A remessa/apresentação por via eletrónica foi regulada pela Portaria n.º 1416-A/2006 de 19-06, conforme dispõe o seu art.1.º[[6]], implicando a utilização do sítio designando no art. 2.º [[7]]; nos termos do número 1 do art. 4.º (“[p]edido de actos de registo comercial online”), os interessados na promoção de atos de registo comercial online formulam o seu pedido e enviam, através do sítio na Internet a que se refere o artigo 2.º, os documentos necessários ao registo, designadamente, os documentos que legalmente comprovem os factos constantes do pedido de registo (alínea a) e os documentos comprovativos da sua capacidade e dos seus poderes de representação para o ato (alínea b), tendo em vista a posterior anotação dos pedidos pelo funcionário, de acordo com a ordem da respetiva receção (art. 5.º, n.º1).

Saliente-se que, nos termos do art. 3.º da Portaria “[f]unções do sítio”:
“O sítio deve permitir, entre outras que se mostrem necessárias, as seguintes funções:
a)-A autenticação dos utilizadores através de certificados digitais;
b)-A indicação dos dados de identificação dos interessados;
c)-O preenchimento electrónico dos elementos necessários ao requerimento do registo e ao pedido da certidão permanente;
d)-A entrega dos documentos necessários à apreciação do pedido de registo e ao suprimento de suas eventuais deficiências;
e)-A assinatura electrónica dos documentos entregues;
f)-O pagamento dos serviços por via electrónica;
g)-A recolha de informação que permita o contacto entre os serviços competentes e os interessados e seus representantes;
h)-A certificação da data e da hora em que o pedido de registo foi concluído;
i)-O acesso ao sítio na Internet onde se encontrem disponibilizadas as publicações legais”.
Funções estas que, evidentemente, não se mostram asseguradas pela transmissão por correio eletrónico [[8]].
Em suma, como bem concluiu o Sr. Conservador, o requerente não usou o procedimento legal previsto para a entrega/apresentação do pedido formulado e respetivos documentos de suporte.
Quid juris relativamente à cominação associada à constatação desse vício?
Entendemos que a irregularidade apontada tem como consequência, como o Sr. Conservador também considerou, a rejeição da apresentação do pedido, devendo subsumir-se a situação à tipologia prevista na alínea a) do número 1 do art. 46.º (“[r]ejeição da apresentação ou do pedido”), preceito que dispõe como segue:
1–A apresentação deve ser rejeitada:
a)-Quando o requerimento não respeitar o modelo aprovado, quando tal for exigível;
b)-Quando não forem pagas as quantias que se mostrem devidas;
c)-Quando a entidade objecto de registo não tiver número de identificação de pessoa colectiva atribuído”.
Nos termos do número 5 do mesmo preceito “[a] rejeição da apresentação ou do pedido deve ser fundamentada em despacho a notificar ao interessado, para efeitos de impugnação, nos termos do disposto nos artigos 101.º e seguintes, aplicando-se-lhe, com as devidas adaptações, as disposições relativas à recusa”.
Afigurando-se que existe alguma similitude com o que, no âmbito do processo civil, o legislador prevê para a recusa da petição inicial pela secretaria (cfr. os arts. 132.º, 144.º, n.º 7, 558.º e 559.º do CPC) e a recusa do requerimento executivo (cfr. os art. 724.º e 725º, nº 1, alínea a) do CPC) [[9]] casos em que o legislador estabeleceu expressamente a cominação processual aplicável à irregularidade verificada sempre que o procedimento utilizado pelo autor não tenha correspondência com alguns dos meios previstos pelo legislador, passando essa cominação pela rejeição do articulado [[10]].
Conclui-se que não tem fundamento a afirmação do recorrente vertida nas conclusões de recurso no sentido de que “este processo de retificação não pode ser feito on line” (cfr. as 23ª e 24.ª conclusões), nem se vislumbra razão que justifique o afastamento do regime enunciado na Portaria 1416-A/2006 de 19-12, sendo que o recorrente também não cuida de fundamentar as suas afirmações.
Saliente-se que o caso em apreço é mais grave do que aquele que estava em análise no acórdão proferido pelo TRL de 08-11-2018 [[11]] que a primeira instância convocou; discutia-se nesse aresto a possibilidade de interposição de recurso hierárquico da decisão do Conservador do Registo através de correio eletrónico, tendo-se concluído não ter suporte legal a pratica desse ato por correio eletrónico, com a consequente rejeição do recurso e, no presente caso, o que está em causa, em rigor, é aferir de procedimento alusivo à instauração de processo de retificação na Conservatória do Registo Comercial – e não, pois, a prática de ato em processo já pendente e em curso.
Em suma, pelo fundamento apontado, impunha-se o indeferimento liminar do pedido formulado, como aconteceu.

3.–Quer o Sr. Conservador, quer o Tribunal de primeira instância apreciaram, em termos subsidiários, outros fundamentos para o indeferimento, mormente a manifesta improcedência do pedido formulado, pelos fundamentos expostos nas decisões respetivas.
Entendemos que não se justifica essa apreciação de cariz subsidiário ponderando o juízo valorativo que presidiu ao indeferimento liminar: se o legislador considerou que o vício em causa – não apresentação do pedido por via do procedimento adequado e imposto por lei –  assume gravidade tal que justifica a imediata rejeição da apresentação do pedido, isso significa que a atividade do decisor não deve ir mais além, sob pena de se desvirtuar o princípio da celeridade e economia processual e da proibição da prática de atos inúteis: quaisquer considerações acrescidas sobre (outros) eventuais fundamentos de indeferimento consubstanciam pronúncia desnecessária.
Dai que sejam juridicamente irrelevantes as considerações vertidas pelo recorrente a esse propósito – cfr., nomeadamente, as conclusões 6ª a 22ª e 27ª a 34.ª.
*

Pelo exposto, decide-se julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, sem prejuízo de eventual benefício do apoio judiciário (art. 527.º, nº1 do CPC).
Notifique.


Lisboa, 09-04-2024


Isabel Fonseca
Manuela Espadaneira Lopes
Fátima Reis Silva


[1]Na sequência da declaração de insolvência da sociedade, por sentença proferida em 26-06-2015, transitada em julgado, foi proferido despacho, em 18-04-2023, determinando a apensação dos autos de recurso, vindos da Conservatória do Registo Comercial, ao processo de insolvência.
[2]Tudo conforme documentos enviados pela Conservatória do Registo Comercial por ofício de 13-02-2023, na sequência do despacho de 17-01-2023 que determinou que se [s]olicite à Conservatória do Registo Comercial que remeta a decisão sob recurso”.  
[3]Tendo o recorrente optado, diretamente, pela impugnação judicial, descartando, pois, a possibilidade que também tinha, de impugnação mediante a interposição de recurso hierárquico para o diretor-geral dos Registos e do Notariado.
[4]Artigo 106.º
“Recurso de sentença
1- Da sentença proferida podem sempre interpor recurso para a Relação, com efeito suspensivo, o impugnante, o conservador que sustenta, o presidente do Instituto dos Registos e do Notariado, I. P., e o Ministério Público.
2- Para os efeitos previstos no número anterior, a sentença é sempre notificada ao presidente do Instituto dos Registos e do Notariado, I. P.
3- (Revogado.)
4- Do acórdão da Relação não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível”.
[5]Artigo 45.º
“Anotação de apresentação
1- A apresentação de documentos para registo pode ser feita pessoalmente, pelo correio ou ainda por via electrónica, nos termos a regulamentar por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.
2- Os documentos apresentados pessoalmente são anotados pela ordem de entrega dos pedidos.
3- (Revogado.)
4- Os documentos apresentados pelo correio são anotados com a observação de «correspondência» no dia da recepção e imediatamente após a última apresentação pessoal.
5- A anotação dos documentos apresentados por via eletrónica, que ocorre apenas com a comunicação do pagamento das quantias que forem devidas, é efetuada pela ordem fixada pela portaria referida no n.º 1.
6- O pedido de registo por depósito não está sujeito a anotação de apresentação, sem prejuízo da aplicação das regras constantes nos números anteriores à ordenação dos pedidos”.
Sendo que a última alteração ocorreu com o Dec. Lei n.º 250/2012, de 23-11, que deu nova redação aos números 5 do art. 45.º e n.º 8 do art. 46.º.
[6]Artigo 1.º
“Objecto
A presente portaria regula:
a) A promoção online de actos de registo comercial;
b) A certidão permanente”.
[7]Artigo 2.º
“Designação do sítio
A promoção online de actos de registo comercial e a solicitação da certidão permanente fazem-se através do sítio na Internet com o endereço www.empresaonline.pt, mantido pela Direcção-Geral dos Registos e do Notariado”.
[8]Atente-se, ainda, ao disposto nos arts. 6.º (“[a]utenticação electrónica”), 7.º (“[c]ertificados digitais dos advogados, solicitadores e notários”) e 8.º ([a]ssinantura electrónica de documentos”).  
[9]Cfr., de igual forma, a Portaria n.º 280/2013, de 26-08 (com sucessivas alterações), que veio regulamentar a tramitação eletrónica dos processos nos tribunais judiciais (art. 1.º).
[10]Por essa razão entendemos não ser de ponderar a solução jurídica preconizada, no estrito âmbito dos processos judiciais, no acórdão do STJ de 05-03-2015, processo: 891/08.7TBILH.C1. S1 (Relator: João Trindade), acessível in www.dgsi.pt, como todos os demais a que aqui se fizer referência, assim sumariado:
“(…) II - Face ao regime legal decorrente do art. 150.º, n.ºs 1 e 2, do anterior CPC, na redacção introduzida pelo DL n.º 303/207, de 24-08, a apresentação de um requerimento de interposição de recurso através de correio electrónico, constitui uma mera irregularidade.
III - Trata-se de uma irregularidade susceptível de ser sanada, nomeadamente, através de convite a formular pelo juiz, para a parte vir regularizar a sua intervenção mediante a apresentação do acto através de uma das formas legalmente previstas no CPC.
IV - O indeferimento da possibilidade do recorrente ver apreciado o requerimento de interposição de recurso de apelação por si interposto, como consequência deste ter sido apresentado por correio electrónico, e sob a invocação de uma dificuldade inexplicável de acesso à plataforma Citius, atento o princípio constitucional de garantia de acesso ao direito previsto no art. 20.º da CRP, justificava que, no caso, fosse dada a possibilidade ao recorrente de vir praticar o acto por alguma das formas então legalmente admissíveis”.
Ou ainda, na mesma linha, no acórdão do TRL de 26-09-2017, processo: 6886/13.1TBALM.L1-1 (Relator: Rijo Ferreira), estando em causa a interposição de recurso de revista através de correio eletrónico, assim sumariado:
“I.–O correio electrónico não é meio adequado para apresentar acto processual escrito em juízo nem para proceder à notificação do mandatário da parte contrária.
II.–Contudo a utilização de tal meio para esses efeitos não implica a desconsideração de tal acto ou notificação tendo apenas como consequência a transferência integral para a parte que utilizou tal meio do risco da efectiva chegada da mensagem ao seu destinatário e do ónus de demonstração quer da recepção da mesma quer da fixação do momento em que ela ocorreu.
III.–A retirada do apoio judiciário por o beneficiário ter adquirido meios para suportar os encargos do pleito não decorre automaticamente do facto de ter sido negado um novo pedido de apoio judiciário, tendo de ser objecto de análise e decisão específica em procedimento autónomo para o efeito dirigido, com audição do interessado.
IV.–O tribunal superior não está obrigado a pronunciar-se no sentido de confirmar o despacho que admitiu o recurso, mas tão somente lhe assiste a faculdade de o alterar ou revogar”.
E no acórdão do TRL de 30-06-2022, processo: 4837/13.2TBALM-C.L1-8 (Relator: Teresa Sandiães), em que estava em causa a apresentação de articulado de oposição à penhora em ação executiva, através de correio eletrónico, assim sumariado:
“I–A inobservância do meio previsto para o envio de peças processuais não está cominada no regime legal aplicável.
II–O envio de peça processual por correio eletrónico, meio que não está expressamente previsto no CPC (nem na Portaria nº 280/2013), fora do âmbito de aplicação dos nºs 7 e 8 do artº 144º do CPC, não se insere em nenhuma das nulidades expressamente previstas na lei.
III–Assim, há que concluir que se trata de irregularidade que apenas se reconduzirá à nulidade inominada a que alude o artigo 195º, nº 1, do CPC, se for suscetível de influir no exame ou decisão da causa”.
[11]Proferido no processo 832/18.3T8LSB.L1-2 (Relatora: Laurinda Gemas).