Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | EDUARDO DE SOUSA PAIVA | ||
| Descritores: | RECURSO DE CONTRAORDENAÇÃO INADMISSIBILIDADE DE RECURSO SANÇÃO ACESSÓRIA OBJECTO DO RECURSO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/20/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | RECLAMAÇÃO | ||
| Decisão: | NÃO PROVIDA | ||
| Sumário: | Sumário (da responsabilidade do Relator): I. Em recurso de contraordenação, só é admissível recorrer para a Relação da sentença ou despacho judicial que aplique coima superior a €248,40 ou sanção acessória, pelo que, tratando-se de condenação em coima não superior àquele valor, o recurso admissível é restrito à parte da decisão que aplicou sanção acessória. II. Sendo o recurso admissível, apenas, na parte da sanção acessória, a parte da decisão recorrida que confirmou a aplicação da coima, tendo para o efeito confirmado a qualificação jurídica dos factos praticados pelo arguido como contraordenação, sendo insuscetível de recurso para a Relação, transitou em julgado. III. Vale por dizer que, a legalidade de tal decisão, na parte irrecorrível, por assim ser, está subtraída do âmbito do presente recurso. IV. Deste modo, só a específica aplicação da sanção acessória (à transitada em julgado qualificação jurídica da conduta como contraordenação e consequente aplicação da correspondente coima), pode ser sindicada pela Relação, pelo que, os fundamentos do recurso, na parte recorrível, se devem dirigir direta e exclusivamente ao segmento decisório referente à confirmação (pelo Tribunal de Comarca) da aplicação da sanção acessória pela autoridade administrativa. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa. I. RELTÓRIO AA, arguido nos presentes autos, veio reclamar para a conferência da decisão sumária que rejeitou (em parte, por inadmissibilidade legal e, na outra parte, por manifesta improcedência), o recurso por si interposto para esta Relação. Argumenta, para tanto, que nas alegações do seu recurso o fundamento específico para atacar a sanção acessória tinha sido a falta de norma incriminadora, ou seja, a ausência de norma de direito sancionatório que preveja, como contraordenação, a sua conduta, pelo que tinha dado integral cumprimento ao disposto no artº 412º, nº 2 do Código de Processo Penal. Concluiu pedindo que seja proferido acórdão a apreciar o mérito do recurso por si interposto. * O Ministério Público junto desta Relação, notificado da reclamação, nada disse. *** Importa decidir se o recurso interposto pelo arguido deve ser rejeitado. Não o sendo, se deve ser revogada a sentença recorrida, que confirmou a aplicação ao arguido da sanção acessória de perda da coluna amplificadora de som. * Após os vistos, foram os autos à conferência. *** II. FUNDAMENTAÇÃO A. Da decisão reclamada. A decisão sumária reclamada, na parte em que fundamentou a rejeição do recurso, tem o seguinte teor: «Atendendo às conclusões apresentadas, o recorrente pretende que seja reapreciada a legalidade da sua condenação pela prática da contraordenação p. e p. pelos arts 30º, 32º, e 47.º, n.º 1, al. i), do D.L. nº 310/2002, por em seu entender, a factualidade provada não preencher os elementos típico de tal ilícito e por falta de competência do Presidente da Junta de Freguesia para apreciação da responsabilidade contraordenação do arguido. Termina pedindo a sua absolvição e a devolução da coluna apreendida. O recurso interposto deve ser rejeitado, em parte por a decisão recorrida ser irrecorrível e noutra parte por ser manifesta a sua improcedência, pelas razões que passamos a expor. Dispõe o artº 73º, nº 1 do D.L. nº 433/82, regendo sobre a admissibilidade de recurso das decisões judiciais proferidas no seu âmbito que, “pode recorrer-se para a Relação da sentença ou do despacho judicial proferidos nos termos do artigo 64º quando: a) For aplicada ao arguido uma coima superior a (euros) 249,40; b) A condenação do arguido abranger sanções acessórias; (…)” Resulta desta norma que, quando for aplicada coima não superior a €249,40 e sanção acessória, a decisão judicial não admite recurso na parte em que aplicou a coima, apenas admitindo na parte em que condenou em sanção acessória. Vale por dizer que, a legalidade da condenação pela contraordenação (designadamente quanto às suscitadas questões da falta de preenchimento dos elementos típico de tal ilícito e da falta de competência do Presidente da Junta de Freguesia), como pressuposto da aplicação da coima, por inadmissibilidade de recurso para a Relação, é matéria coberta pelo trânsito em julgado da decisão judicial proferida pelo Tribunal de Comarca. Em tal caso, o recurso admissível é restrito às questões atinentes exclusivamente à sanção acessória, designadamente a sua aplicabilidade àquela coima e, sendo de dosimetria variável (o que não acontece no caso), a sua medida concreta. Por outro lado, no âmbito deste processo, o Tribunal da Relação só pode decidir em sede de recurso de questão apreciada no Tribunal de Comarca, pelo que, não pode conhecer ex novo (ou seja, em primeira instância) de questão que não tenha sido apreciada anteriormente (pela primeira instância), sob pena de violação do princípio do duplo grau de jurisdição e de extravasar o âmbito da sua competência em sede de recurso. É o que acontece com a suscitada questão da alegada falta de competência da autoridade administrativa para apreciação da responsabilidade contraordenacional do arguido. Trata-se de matéria que devia ter sido -mas não foi - suscitada (e atempadamente) junto do Tribunal de Comarca e seria a decisão proferida sobre tal questão que esta Relação podia apreciar em sede de recurso, e só em sede de recurso. Não devia, pois, o recurso ter sido admitido, exceto quanto às questões atinentes exclusivamente sanção acessória aplicada, impondo-se, aqui e agora, rejeitá-lo, em conformidade com as disposições conjugadas dos arts 417º, nº 6, 420º, nº 1, al. b), e 414º, nº 2 do Código de Processo Penal. No que concerne à pretensão do recorrente de que lhe seja restituída a coluna de som apreendida, pela revogação da decisão recorrida, na parte em que o condenou na sanção acessória de perda de tal coluna, não encontramos alegado no recurso interposto (nem na motivação, nem nas conclusões) qualquer fundamento a atacar especificamente a aplicação da sanção acessória. Vale por dizer que, nesta parte, não encontramos no recurso interposto o mais ténue indício do cumprimento do disposto no artº 412º, nº 2 do Código de Processo Penal, o que deixa o recurso, nesta parte, sem objeto, tornando-o manifestamente improcedente. No caso, os elementos em falta não constam, nem das conclusões, nem das alegações, o que torna inadmissível a formulação de um convite ao seu aperfeiçoamento, em ordem ao suprimento das falhas detetadas na impugnação recursiva da matéria de direito. Nos termos do artº 417.º, n.º 3 do Código de Processo Penal, só é admissível o aperfeiçoamento das conclusões desde que os elementos em causa (e em falta nas conclusões) constem das alegações. Na verdade, não constando os elementos em falta, nem sequer das alegações/motivação, um convite ao aperfeiçoamento implicaria permitir ao recorrente ampliar o objeto do recurso e o seu âmbito, o que equivaleria a conceder-se um novo prazo para recorrer, o que contende com o caráter perentório do respetivo prazo e não está incluído no âmbito do direito ao recurso (cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 259/2002 de 18/06/2002, in DR, IIª Série, de 13/12/2002, e nº 140/2004, de 10/03/2004, in DR, IIª Série, de 17/04/2004). Improcede, deste modo, e de forma manifesta, este segmento do recurso.» * B) Da apreciação da reclamação Defende o reclamante que, ao invocar que a sua conduta não é prevista e punida como contraordenação, está a atacar especificamente a sanção acessória que lhe foi aplicada e a dar integral cumprimento ao disposto no artº disposto no artº 412º, nº 2 do Código de Processo Penal. Vejamos Nos termos do artº 417º, nº 8 do Código de Processo Penal, cabe reclamação para a conferência, entre outros casos, quando o recurso tenha sido rejeitado por decisão sumária do relator. Conforme se refere no Ac. do TRL de 10/10/2024 (proferido no processo nº 9366/22.0T8LRS.L1) “com as alterações introduzidas no CPP pela Lei nº 48/2007, no que ao paradigma dos recursos respeitou, o legislador eivado do objetivo de racionalizar o funcionamento dos tribunais superiores, maxime promovendo uma maior intervenção dos juízes que os compõem a título singular, determinou um funcionamento dos tribunais de recurso em trinómio- decisões da competência do relator, em conferência e em audiência – e sem que se verifique uma qualquer relação hierárquica entre estes níveis de decisão (entre si diferenciados e independentes)”, pelo que, a “possibilidade de reclamação para a conferência (…), por natureza e definição, assumindo-se tal procedimento como meio de controlo da legalidade da decisão sumária proferida (e não como direito a uma dupla apreciação do recurso), não se bastará com a mera manifestação de discordância do recorrente e/ou com a reiteração dos fundamentos aduzidos no recurso interposto. Ao invés, imporá uma motivação nova, com argumentário dirigido à decisão sumária prolatada”. Ora, no caso, a reclamação não acrescente qualquer argumento novo não tido em conta na referida decisão sumária ou sequer capaz de abalar minimamente os fundamentos daquela. Efetivamente, do próprio texto da reclamação e do seu cotejo com o conteúdo da decisão sumária se conclui, sem grande esforço, que o argumentário da reclamação não tem a virtualidade de abalar os fundamentos da decisão reclamada, tanto quanto ao âmbito da inadmissibilidade do recurso interposto, como quanto à ausência de fundamentos específicos do recurso relativamente à parte em que este é admissível. Assim, sendo admissível o recurso, apenas na parte da sanção acessória, a parte da decisão recorrida que confirmou a aplicação da coima, tendo para o efeito confirmado a qualificação jurídica dos factos praticados pelo arguido como contraordenação, sendo insuscetível de recurso para a Relação, transitou em julgado. Vale por dizer que, a legalidade de tal decisão, na parte irrecorrível, por assim ser, está subtraída do âmbito do presente recurso. Deste modo, só a específica aplicação da sanção acessória (à transitada em julgado qualificação jurídica da conduta como contraordenação e consequente aplicação da correspondente coima), pode ser sindicada por este Tribunal, pelo que, os fundamentos do recurso, na parte recorrível, se devem dirigir direta e exclusivamente ao segmento decisório referente à confirmação (pelo Tribunal de Comarca) da aplicação da sanção acessória pela autoridade administrativa. Ora, argumentar que a conduta do arguido não constitui contraordenação é pretender a reapreciação, pelo Tribunal da Relação, do segmento decisório que não admite recurso e é não atacar especificamente o segmento decisório que é recorrível, o que leva à conclusão de que, na parte recorrível, o recorrente não deu cumprimento ao disposto no artº 417º, nº 3 do Código de Processo Penal. Mantêm, assim, validade e plena efetividade, os fundamentos da decisão sumária, pelo que improcede a reclamação. Ora, face à improcedência da reclamação e mantendo-se o indeferimento do recurso, fica prejudicado o conhecimento deste. *** III. DECISÃO Pelo exposto, acordamos em negar provimento à reclamação, confirmando a decisão sumária proferida. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) UC. * Lisboa, 20 de novembro de 2025 Os Juízes Desembargadores, Eduardo de Sousa Paiva Maria do Carmo Lourenço Ana Paula Guedes |