Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
10046/2005-6
Relator: CARLOS VALVERDE
Descritores: ARRESTO
INTERVENÇÃO PROVOCADA
INTERVENÇÃO ESPONTÂNEA
REGISTO DA PROVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/03/2005
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I - Quer a intervenção provocada (por ter sido citado para deduzir oposição), quer a intervenção voluntária (por ter desencadeado a fase da oposição) do requerido no processo asseguram o contraditório e, por isso, não se justifica o registo da prova na sequência da oposição supervenientemente por este deduzida, a não ser nos termos gerais em que ele é admitido, isto é, quando, com vista à instrução de eventual recurso da decisão factual (arts. 690º-A e 712º, 1, a) do CPC), qualquer das partes o requeira.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

Jordijoia - Sociedade Comercial e Industrial de Ourivesaria, Ldª, requereu no 2º Juízo Cível do Tribunal de Família e Menores e Juízos Civeis de Sintra providência cautelar de arresto contra (A), providência que veio a ser decretada, após a inquirição das testemunhas arroladas pela requerente, com a gravação dos respectivos depoimentos.

Notificada a decisão à requerida, veio esta deduzir oposição.

No decurso da inquirição da 2ª das testemunhas arroladas em sede de oposição, a requerida, constatando que os depoimentos das testemunhas não estavam a ser gravados, alegou que tal constituía irregularidade processual susceptível de influenciar a decisão da causa e arguiu a respectiva nulidade, que veio, após audição da parte contrária, a ser indeferida, na consideração de que aquele registo de prova não tinha sido atempadamente requerido.

Retomada a inquirição das testemunhas, veio, a final, a ser julgada improcedente a oposição e mantida a providência de arresto decretada.

Inconformada quer com a decisão que indeferiu a nulidade arguida, quer com a decisão final da oposição, de uma e outra a requerida interpôs recurso de agravo para este Tribunal, suscitando nas conclusões de ambos os recursos a questão única de saber se, tendo sido obrigatoriamente gravados os depoimentos prestados na audiência da providência, o mesmo será de observar na audiência da oposição.

Não foi produzida contra-alegação e o Sr. Juíz manteve as suas decisões.

Quid iuris?

Com a reforma processual de 95, na hipótese, como é caso, da providência ter sido decretada sem a prévia audiência do requerido, pode este reagir agravando da respectiva decisão ou deduzir oposição, sobrando-lhe tão só a primeira via, ou seja a do recurso, nos termos gerais do direito, quando ouvido antes do decretamento da providência (artº 388º, 1, a) e b) do CPC).

A oposição tem como função específica a demonstração de que não são verdadeiros os fundamentos de facto em que assentou o decretamento da providência ou a determinação da redução desta, por excessiva, permitindo-se ao requerido, com vista a tais desideratos, trazer à valoração novos factos ou meios de prova não valorados anteriormente pelo tribunal, o que poderá encontrar justificação no facto do legislador encarar com alguma desconfiança as decisões proferidas na ausência de contraditório, "tendo em conta a maior falibilidade dos juízos assim emitidos, em contraposição com o maior grau de segurança susceptível de ser alcançado quando ambas as partes são levadas a prestar o seu contributo para a descoberta da verdade.

Naturalmente são mais frequentes as situações de injustiça material que podem resultar de procedimentos cautelares decididos sem audiência contraditória do que aquelas que são fruto da comparticipação de ambas as partes, cada uma introduzindo elementos capazes de influir na decisão do tribunal aquando da formação da convicção" (Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, III vol., 2ª ed., pág. 252).

E o mesmo, aliado à ideia de que o contraditório, a posteriori, só é efectivo se o requerido puder dispor de todos os elementos que levaram ao decretamento da providência, à sua revelia, vale para justificar a imposição da gravação obrigatória da prova oralmente produzida, sempre que não exista contraditório prévio.
Todavia, é ainda na ponderação destas mesmas razões que será de concluir que já não haverá lugar à automática e necessária gravação dos depoimentos prestados na sequência da oposição superveniente deduzida pelo requerido, sem que isso possa envolver a violação do princípio da igualdade processual das partes (artº 3º-A do CPC), por a posição do requerido não ser equiparável numa e noutra fase processual e o que se quer proteger com a gravação oficiosa dos depoimentos aquando da primeira diligência, como resulta do texto da lei (artº 386º, 4 do CPC) é claramente o interesse do requerido ausente - para repudiar posteriormente o valor probatório dos depoimentos já produzidos ou para , eventualmente, responsabilizar as testemunhas ou o requerente quando tenham agido com a intenção de o prejudicar - e já não o interesse do requerido interventor no processo, submetido, tal como acontece com o requerente nos casos em que o requerido é chamado ao processo cautelar, à regra geral da solicitação formal da gravação, quando pretendida (arts. 384º, 3 e 304º, 3 do CPC).
Quer a intervenção provocada (por ter sido citado para deduzir oposição), quer a intervenção voluntária (por ter desencadeado a fase da oposição) do requerido no processo asseguram o contraditório e, por isso, não se justifica o registo da prova na sequência da oposição supervenientemente por este deduzida, a não ser nos termos gerais em que ele é admitido, isto é, quando, com vista à instrução de eventual recurso da decisão factual (arts. 690º-A e 712º, 1, a) do CPC), qualquer das partes o requeira (neste sentido, o Ac. desta Relação de 15-4-99, CJ, XXIV, II, 107, Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 261, Lebre de Freitas e outros, Código de Processo Civil Anotado, II, págs. 34 e sgs. e Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, pág. 281).
Posto isto e revertendo para o caso dos autos, não tendo a agravante requerido na oposição que deduziu a gravação dos depoimentos das testemunhas que arrolou, a oralidade da audiência, ao contrário de se constituir como irregularidade processual, impunha-se como o procedimento mais consentâneo com a lei adjectiva ( cfr. arts. 304º, 3 e 4 e 522º-B do CPC).
Por isso, a improcedência do recurso da decisão a este respeito prolatada pelo tribunal a quo, o que arrasta, porque totalmente dependente do êxito deste, como reconhece a própria agravante, a improcedência do recurso interposto da decisão que manteve a providência.

Pelo exposto, acorda-se em negar provimento a ambos os agravos.

Custas pela agravante.

Lisboa, 03-11-2005

Carlos Valverde
Granja da Fonseca
Roger de Sousa