Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
10390/2007-2
Relator: JORGE LEAL
Descritores: EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
LEGITIMIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/22/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: PROVIDO
Sumário: I – No processo de expropriação vigora o princípio da legitimidade aparente dos interessados, segundo o qual a entidade expropriante não está obrigada a averiguar exaustivamente quem são os autênticos titulares dos direitos que incidem sobre o imóvel a expropriar, podendo dirigir-se tão só a quem como tal figure nas inscrições predial e fiscal, sem prejuízo de, ao longo do processo expropriativo, se se constatar desconformidade com a realidade, se proceder à correspondente correcção.
II – Não estando demonstrado nos autos o óbito da pessoa que figura no registo predial como titular do prédio a expropriar, a entidade expropriante não pode brandir o princípio da legitimidade aparente para que se possa aceitar, sem mais, que a posição de expropriado seja ocupada por alegados herdeiros do titular inscrito.
III - A nomeação de curador provisório pressupõe que se apure, com razoável certeza, a verificação dos respectivos pressupostos, nomeadamente a de que é efectivamente desconhecido o paradeiro de interessados conhecidos, e/ou que existem outros interessados cuja identificação é desconhecida.
IV – Na fase judicial do processo de expropriação o juiz deve participar activamente no esforço de determinar quem tem legitimidade para intervir no processo na qualidade de expropriado.
(JL)
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO

Em 07.07.2006, nos Juízos Cíveis de Lisboa, o Município veio requerer em processo de expropriação litigiosa a adjudicação da parcela n° , composta de um terreno urbano com a área de 248 m2, sito , inscrito na matriz predial urbana da descrito na a Conservatória do Registo Predial, indicando como expropriados os herdeiros do proprietário inscrito, J, nomeadamente L, residente.

Alegou que a expropriação da referida parcela foi declarada de utilidade pública, com carácter de urgência, declaração essa publicada no D.R. nº 212 de 08.9.2004, II série. Foi efectuada a vistoria Ad Perpetuam Rei Memoriam, tendo a expropriante tomado posse administrativa da parcela e depositado o valor da indemnização arbitrada.

Distribuído o processo ao 4º Juízo Cível de Lisboa, foi proferido despacho ordenando que, a fim de se proceder à cabal identificação dos expropriados, a entidade expropriante juntasse assento de óbito do titular inscrito e assento de nascimento do interessado L, e ainda que esclarecesse se o referido L é o único herdeiro do titular inscrito e, em caso afirmativo, qual a relação de parentesco existente entre ambos; em caso negativo, quais os demais herdeiros e sua cabal identificação.

O M respondeu dizendo que não possuía os elementos solicitados pelo tribunal e requereu que o herdeiro do falecido proprietário, L, fosse notificado para os fornecer ao tribunal.

Deferido o requerimento, L indicou os nomes de seis herdeiros, sem concretizar as suas moradas e mencionando que dois deles são falecidos e um deles está “algures no Brasil”, e disse que não podia juntar certidão de óbito do seu pai, J, por este ter desaparecido na guerra de Angola há 33 anos e estar a aguardar resposta ao pedido por si feito ao Ministério Público para que fosse passada certidão da morte presumível do seu pai.

Notificada de tal resposta, a entidade expropriante requereu que o “expropriado” fosse notificado para prestar mais informações sobre os referidos herdeiros (morada e data e local da morte dos falecidos), pelo menos para se possibilitar o recurso à citação edital com um mínimo de elementos.

Em 13.6.2007 foi proferido despacho que, após indeferir o referido requerimento do Município, por entender que dos autos não resultava que L possuía mais elementos do que aqueles que havia fornecido, declarou “os herdeiros do proprietário inscrito, J, nomeadamente L, partes ilegítimas para prosseguirem nos autos” e, em consequência, determinou a sua absolvição da instância, e não adjudicou à Expropriante a referida parcela de terreno, em virtude de os supra citados não terem legitimidade para receberem a indemnização devida pela respectiva expropriação.

O M agravou desta decisão, tendo apresentado alegação em que formulou as seguintes conclusões:

1.- O M, na qualidade de expropriante, promoveu, na fase administrativa, todos os termos do processo expropriativo, v.g. a D.U.P. e sua publicação, o auto de vistoria, ad Rei Perpetuam Memoriam, a posse administrativa, a avaliação arbitral, e a sua notificação ao presumido proprietário, L, do herdeiro inscrito, J do terreno urbano, com a área de 248 m2, sito  inscrito na matriz sob o artigo e descrito .

2.- Remetido o processo a Juízo, veio o presumido herdeiro do proprietário inscrito, L, informar que existem outros herdeiros que se não conseguem localizar, nem identificar, com rigor, bem como informar que corre termos no Tribunal de Setúbal processo para declaração de morte presumida de seu pai, J, desaparecido em Angola, há cerca de 33 anos.

3.- Juntou, ainda, o herdeiro presumido, L, certidão de nascimento, dela se alcançando que nasceu em 17/2/1938 em Angola, sendo seu pai, J e seu Avô, J.

4.- 0 Tribunal "a quo", por douto despacho de fls. 147 a 151, declarou os herdeiros do proprietário inscrito, J, nomeadamente, L, partes ilegítimas, para prosseguirem nos autos, absolvendo-os da instância, não adjudicando a propriedade da parcela expropriada, ao expropriante, tudo nos termos do disposto no art. 9º., C.E., art°s. 288, n°.1, al. d), 494°., al. e) e 26° do C.P.C., não lhes reconhecendo legitimidade para receberem a indemnização devida, e ordenando o arquivamento do processo (art°. 9°. n°.3 e 51° do C.E.).

5.- Contudo, entende o M, que tal despacho violou a lei.

6.- Às expropriações, aplica-se o Código de Expropriações, como lei especial, e subsidiariamente, o Código Processo Civil e Código Civil.

7.- No processo expropriativo, vigora o princípio da legitimidade aparente, nos termos do disposto nos artigos 9º., n°.1, 2 e 3, 36°, n°. 4, 37°, n°5, 40º, n°1,2, 41°, n° 1, 2, 3, 4, 43°, n° 1, 2, 3, 51°, n°5, todos do C.E. e artigos 89°. a 98° C.Civil.

8.- Por via de tais comandos normativos, a entidade expropriante não se encontra obrigada a verificar se as pessoas constantes das inscrições prediais ou matriciais são as verdadeiras, actuais e únicas titulares dos direitos que incidem sobre o imóvel a expropriar.

9.- Nem a não participação dos verdadeiros titulares no processo expropriativo, por regra, não determina a inviabilidade deste, nem a anulação dos actos já realizados, salvo no caso de dolo ou culpa grave por parte da entidade expropriante;

10. - Mesmo, se o verdadeiro titular do direito em causa, só aparecer, após o processo ter terminado, tendo a indemnização sido paga ao titular aparente, o verdadeiro titular só poderá demandar o titular aparente para reivindicar a indemnização recebida.

11. - Tal procedimento tem justificação com a satisfação do interesse público, através do processo ablativo, bem como através do recurso ao Instituto da Curadoria Provisória, nos termos do disposto no artº. 41º, n°s. 2, 3, e 4 C.E. e artºs. 89° a 98° do Código Civil.

12. - Dada a ausência e desconhecimento dos interessados, herdeiros do proprietário inscrito, J deve ser nomeado seu curador provisório, o seu herdeiro, em termos sucessórios abstratos, seu neto, L, que foi notificado de todos os actos, na fase administrativa dos autos, pois, para além de elementares princípios de economia processual, ele tem todo o interesse na conservação dos bens (art°s. 92º., n°.1, do Código Civil).

13. - Os autos devem prosseguir, nomeando-se oficiosamente curador provisório, L, residente;

14. - A indemnização arbitrada, ou outra, a fixar, no Acórdão arbitral, nos termos do disposto no artº. 49°. C.E. só poderá ser atribuída pelo Tribunal, a final, a quem demonstrar ser titular, real, da propriedade, nos termos do disposto nos n°s. 3 e 4 do artº. 37° e 73°, ambos do C.E.

15.- 0 douto despacho recorrido violou o disposto nos artigos 9º, n°.1,2,3, 36 n°.4, 37°, n°.5, 40°, n°. 1 e 2, 41° n°.1,2,3,4, 43°, n°. 1,2,3, 51° n°. 5, todos do C.E., bem como o disposto nos artigos 89°. a 98° do Código Civil, pelo que deve ser revogado.

16. - Substituindo-se, por outro, que ordene o prosseguimento dos autos, nomeie oficiosamente um curador provisório, ao proprietário inscrito, desconhecido e ausente, ou seus herdeiros, presumidos, desconhecidos e ausentes, e ordene a adjudicação do bem expropriado ao M, fazendo-se, uma vez mais, Justiça.

Não houve contra-alegações.

O tribunal a quo sustentou a decisão recorrida.

Foram colhidos os vistos legais.

FUNDAMENTAÇÃO

A questão a apreciar neste recurso é se cabia à entidade expropriante identificar cabalmente os expropriados e se, não o tendo feito, isso determinava, como se entendeu na decisão recorrida, a absolvição da instância das pessoas inicialmente indicadas como expropriadas.

Resultam dos autos os seguintes

Factos

1. Visando a ligação viária Olaias/Paiva Couceiro, em Lisboa, o M promoveu a expropriação de um terreno urbano, com a área de 248 m2, sito .

2. O referido terreno está inscrito no registo predial, em nome de J, desde 1933.

3. Foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação da dita parcela de terreno, a qual foi publicada no D.R., II série, de 08.9.2004 (aviso nº 6762/2004, 2ª série).

4. Em 29.9.2004 foi efectuada a vistoria "ad Perpetuam Rei Memoriam” da parcela a expropriar.

5. Em 11.3.2005 o M tomou posse administrativa do aludido prédio.

6. Em 22.7.2005 o prédio foi avaliado pelos árbitros nomeados, os quais atribuíram-lhe o valor de € 51 000,00.

7. Em 11.4.2006 o Município depositou na Caixa Geral de Depósitos a quantia de € 51 000,00 (cinquenta e um mil euros), a título de indemnização fixada pelos peritos, devida pela aludida expropriação, à ordem do Juiz de Direito do Juízo Cível da Comarca de Lisboa, “em nome do expropriado L e outros, herdeiros de J”.

8. Ao longo da fase administrativa da expropriação a entidade expropriante sempre identificou os expropriados como sendo os “herdeiros de J” e, de entre eles, sempre identificou como herdeiro L, a quem efectuou as notificações relativas aos actos supra referidos.

9. L reclamou do auto de vistoria e formulou quesitos, apresentando-se sempre como “herdeiro de J”.

10. L é neto de J (certidão de fls 138 e 139).

11. Na sequência de notificação do tribunal ad quem para que juntasse aos autos certidão de óbito do seu pai, certidão da escritura de habilitação de herdeiros e nome e morada dos restantes herdeiros, L respondeu o seguinte:

Em resposta à v/ notificação, venho informar V. Exas que este assunto estava a ser tratado pelo M e a n/ advogada Dr.ª C, tendo o respectivo Município toda a informação sobre os restantes herdeiros e de certeza com todos os elementos necessários, pois eu desconheço as suas moradas:

- A – Falecido

- sua filha E – Falecida

- J – Lisboa – telef.

- V – Qta do Conde

- C – Algures no Brasil

- M – Cascais.

(…)

Quanto à certidão de óbito do meu pai, J, está neste momento a aguardar uma resposta ao meu pedido feito em Agosto de 2006, ao Ministério Público (Setúbal) Processo nº  para que seja passada certidão morte presumível visto ele ter desaparecido há 33 anos na guerra de Angola.”

O Direito

Nos termos do artigo 9º do Código das Expropriações (CE, aprovado pela Lei nº 168/99, de 18 de Setembro), “consideram-se interessados, além do expropriado, os titulares de qualquer direito real ou ónus sobre o bem a expropriar e os arrendatários de prédios rústicos ou urbanos” (nº 1). O nº 3 desse artigo esclarece que “são tidos por interessados os que no registo predial, na matriz ou em títulos bastantes de prova que exibam figurem como titulares dos direitos a que se referem os números anteriores ou, sempre que se trate de prédios omissos ou haja manifesta desactualização dos registos e das inscrições, aqueles que pública e notoriamente forem tidos como tais”.

Nos termos do artigo 40º, “têm legitimidade para intervir no processo [de expropriação litigiosa] a entidade expropriante, o expropriado e os demais interessados” (nº 1).

A intervenção de qualquer interessado na pendência do processo não implica a repetição de quaisquer termos ou diligências (art.º 40º nº 2).

O falecimento, na pendência do processo, de algum interessado só implica a suspensão da instância depois de notificada à entidade expropriante a adjudicação da propriedade e posse, esta no caso de não ter havido investidura administrativa (nº 1 do art.º 41º).

Havendo interessados incapazes, ausentes ou desconhecidos, sem que esteja organizada a respectiva representação, o juiz, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou de qualquer interessado, nomeia-lhes curador provisório, devendo para o efeito, no caso de o processo de expropriação ainda não se encontrar em juízo, determinar a sua remessa imediata, para o efeito de nomeação do curador (nºs 2 e 3 do art.º 41º do CE). A intervenção do curador provisório cessará logo que estiver designado o normal representante do incapaz ou do ausente ou passem a ser conhecidos os interessados cuja ausência justificara a curadoria (nº4 do artigo 41º).

A dúvida sobre quem são os titulares da indemnização fixada não obsta ao depósito da mesma, ficando porém o seu recebimento dependente de decisão provisória a proferir no processo em incidente que correrá por apenso (nºs 1 e do artigo 53º do CE). Enquanto não estiver definitivamente resolvida a questão da titularidade do crédito indemnizatório, não se procede a nenhum pagamento que dela dependa sem prestação de caução; a caução prestada garantirá também o recebimento da indemnização por aquele a quem, na respectiva acção, seja reconhecido definitivamente direito à mesma (artigos 53º nº 3 e 71º nº 3 do CE).

Nos termos do art.º 51º nº 1 do CE, a entidade expropriante deve remeter o processo de expropriação ao tribunal da comarca da situação do bem expropriado acompanhado de “certidões actualizadas das descrições e das inscrições em vigor dos prédios na conservatória do registo predial competente e das respectivas inscrições matriciais, ou de que os mesmos estão omissos”.

Conforme decorre das disposições mencionadas, no processo de expropriação vigora o princípio da legitimidade aparente dos interessados, segundo o qual a entidade expropriante não está obrigada a averiguar exaustivamente quem são os autênticos titulares dos direitos que incidem sobre o imóvel a expropriar, podendo dirigir-se tão só a quem como tal figure nas inscrições predial e fiscal, sem prejuízo de, ao longo do processo expropriativo, se se constatar desconformidade com a realidade, se proceder à correspondente correcção (neste sentido, cfr. acórdão da Relação do Porto, de 12.02.1998, CJ, tomo I, pág. 213; Rel. de Évora, 27.4.1995, tomo II, pág. 270; Rel. de Guimarães, 21.4.2004, internet, dgsi-itij, processo 700/04-2; Rel. de Lisboa, 26.6.1997, internet, dgsi-itij, processo 0013272; STJ, 14.11.2006, internet, dgsi-itij, processo 06A3328).

Sucede que, no caso dos autos, o titular inscrito é João Monteiro da Cunha. Porém, a entidade expropriante tem encarado como seus interlocutores no processo, na qualidade de expropriados, “herdeiros de J”, dos quais apenas identificou uma pessoa que se arroga essa qualidade, L, que tem intervindo no processo. Ora, a verdade é que nos autos não está documentado o óbito de J (demonstração essa que só poderá ser efectuada nos termos previstos no art.º 211º do Código do Registo Civil, conjugado com os artigos 1º nº 1 alínea o) e 4º desse Código). A data da inscrição predial, embora antiga (é de 1933), não o é de molde a que se possa afirmar categoricamente que está desactualizada, nomeadamente por o prazo de longevidade do ser humano o determinar.

Assim sendo, a entidade expropriante não pode brandir o princípio da legitimidade aparente para que se possa aceitar, sem mais, que a posição de expropriado seja ocupada por alegados herdeiros do titular inscrito. Por outro lado, a nomeação de curador provisório pressupõe que se apure, com razoável certeza, a verificação dos respectivos pressupostos, nomeadamente a de que é efectivamente desconhecido o paradeiro de interessados conhecidos, e/ou que existem outros interessados cuja identificação é desconhecida.

Foi isso que o tribunal a quo tentou esclarecer, primeiramente junto da entidade expropriante e depois junto do alegado interessado L. Este, em virtude de na notificação que lhe foi dirigida ter sido expressamente determinado que juntasse certidão de óbito do seu “pai” (por se supor que o notificando era filho do titular inscrito) veio dizer que o seu pai (que identificou como sendo J) havia desaparecido há 33 anos em Angola, estando a aguardar uma “certidão da morte presumível”. Continua, pois, por apurar, através dos meios probatórios legais, se a pessoa em cujo nome está inscrita a titularidade da propriedade do prédio expropriado faleceu ou não.

Está em causa a determinação de quem tem legitimidade para intervir no processo na qualidade de expropriado(s) (art.º 40º nº 1 do CE). A sua identificação, com activa participação do juiz, na fase judicial da expropriação, justifica-se num processo em que os expropriados são privados da propriedade e/ou da posse sem que tenham recebido ou mesmo sem que tenha sido fixada, em termos definitivos, a indemnização a que têm direito (artigos 15º nº 2, 51º nº 5, 52º, do CE).

Conforme se ponderou no acórdão da Relação de Évora, de 27.4.1995 (in Col. de Jur., ano XX, tomo II, pág. 270 e seguintes), “há sérios interesses do expropriado e demais interessados a proteger, que aconselham um papel activo, oficioso, do juiz, que este não tem noutras acções”. “Pode, de algum modo, dizer-se que, nesse processo, se esbate o papel de impulsionador e delimitador da acção que, em regra, cabe ao autor, não sendo este a definir, pelo menos nos termos absolutos em que comummente o faz, a relação jurídica controvertida, nos seus aspectos objectivos e subjectivos. O juiz pode, pois oficiosamente, chamar ao processo outros interessados que não tenham sido convocados pelo expropriante, assegurando-lhes a defesa dos seus direitos, designadamente no que respeita à fixação da indemnização, assim suprindo a inércia, erro ou negligência do expropriante e evitando que, por incompleta indicação por este dos interessados, a instância seja julgada extinta, por preterição de litisconsórcio necessário passivo. Tal extinção mostrava-se, aliás, bastante gravosa para os interessados, implicando pelo menos o protelamento da fixação de indemnizações e podendo, mesmo, na prática, deixar nas mãos do expropriante a reactivação do processo, através do chamamento dos demais interessados.

A entidade expropriante já afirmou que não dispunha de informações que lhe permitissem obter os elementos solicitados pelo tribunal a quo e sugeriu que o já referido L prestasse as pretendidas informações. O tribunal a quo acatou tal sugestão, só que, por lapso, não chegou a ser pedida àquele a certidão de óbito que se pretendia.

Haverá que repetir a diligência.

Efectuada tal diligência, admitindo que se comprova o falecimento de J e que o óbito ocorreu na pendência do processo, dir-se-á, em abstracto, ou seja, sem prejuízo de por alguma razão o tribunal a quo decidir de forma diversa, que apenas caberia suspender a instância, para habilitação de herdeiros, depois de ter sido notificada à entidade expropriante a adjudicação da propriedade do bem expropriado (nº 1 do artigo 41º do CE). Se ficar demonstrado que o óbito de J ocorreu antes da abertura do processo de expropriação, justifica-se a realização de diligências que permitam a identificação dos interessados/expropriados, em princípio herdeiros do titular inscrito, sendo certo que L, neto do titular inscrito e que se arroga a qualidade de seu herdeiro, apresenta-se como a pessoa mais apta a prestar as necessárias informações e não é certo que não lhe seja possível indicar ao tribunal outros elementos para além dos que já relacionou. Depois decidir-se-ia se é caso de nomear curador provisório, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 41º nºs 2 e 4 do CE, seguindo-se a decisão de adjudicação ao Município da propriedade do prédio expropriado.

DECISÃO

Pelo exposto, dá-se provimento ao agravo e consequentemente revoga-se o despacho recorrido e determina-se que na primeira instância seja proferido despacho notificando o referido L a fim de que junte aos autos certidão do óbito de seu avô J, devendo ainda, para o caso de se constatar que o óbito de J a ocorreu antes de 08.9.2004 (data da publicação da utilidade pública da expropriação), juntar certidão da declaração da morte presumida do seu pai J, certidão de óbito de A e de E (referidos no ponto 11 da matéria de facto supra) e mais elementos identificativos, nomeadamente morada completa, dos restantes “herdeiros” referidos no ponto 11 da matéria de facto.

Recurso sem custas.


Lisboa, 21.02.2008

Jorge Manuel Leitão Leal

Nelson Paulo Martins de Borges Carneiro

Ana Paula Martins Boularot