Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5484/15.0T8FNC.L1-2
Relator: ONDINA CARMO ALVES
Descritores: REIVINDICAÇÃO
INEPTIDÃO DA PETIÇÃO INICIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/18/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPRCEDENTE
Sumário: (art.º 663º nº 7 do CPC)

1. A causa de pedir na acção de reivindicação estrutura-se na alegação de factos tendentes a provar: a) a aquisição originária do direito real invocado pelo autor ou, alternativamente, a presunção de posse ou do registo da aquisição, mesmo que derivada, da coisa; b) a ocupação ou esbulho da coisa por parte do réu.

2. Não pode atribuir-se aos elementos constantes da descrição predial a força da presunção legal de titularidade, prevista no artigo 7º do CRP, já que a força probatória do registo não se estende à definição das áreas, confrontações ou limites dos prédios cuja propriedade está inscrita.

3. Incidindo o litígio, não sobre a titularidade dos prédios em confronto, mas, mais especificamente, sobre a sua precisa delimitação física, em consequência de ambas as partes se arrogarem a propriedade de determinada parcela de terreno, situada na confluência dos prédios de que se reconhecem proprietários, haverá falta de causa de pedir, em caso de total omissão, na petição inicial, do facto essencial, consubstanciado no efectivo exercício de actos possessórios pelas autoras e seus antecessores, susceptível de conduzir à usucapião, actos esses que necessariamente englobam também a parcela de terreno cuja titularidade é controvertida.

4. A falta de alegação dos factos estruturantes da causa de pedir implica a ineptidão da petição inicial, o que acarreta a nulidade insuprível de todo o processo, constituindo excepção dilatória determinativa, ainda que oficiosamente, da absolvição dos réus do pedido, nos termos do disposto nos artigos 186º, nºs 1 e 2, alínea a), 196º, 1ª parte, 278º, nº 1, alínea b), 576º, nº 2, 577º, alínea b) e 578º, todos do Código de Processo Civil.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:

.
I. RELATÓRIO

MARIA ..., residente ………, e, TERESA ... residente ……, intentaram, em 02.10.2015, contra ROSA ..., e ANGELO ...., ambos residentes …., acção declarativa, com processo comum, sob a forma de processo ordinário, através da qual pedem:
1) Se declara que o prédio identificado em 1º e 2º, onde se inclui a parte de terreno com a área de 68 m2, é propriedade das Autoras;
2) Serem os Réus condenados a demolir as construções que edificaram na parcela de terreno das Autoras;
3) Serem os Réus condenados a restituir às Autoras essa parcela de terreno;
4) Serem os Réus condenados a abster-se de praticar quaisquer actos que impeçam ou diminuam a utilização, por parte das Autoras, dessa mesma parcela de terreno.

Fundamentaram, as autoras, a sua pretensão nos seguintes termos:
1. Na Conservatória de Registo Predial do Funchal, sob o n.º 00199 encontra-se inscrita a aquisição, por sucessão hereditária, a favor das Autoras, o seguinte prédio:
- Urbano, casa térrea coberta de telha, ……, com área total de 273 m2, área coberta 72,7 m2, área descoberta 200,2 m2, da Freguesia do Funchal …., Concelho do Funchal, confinando de Norte, Sul e Leste com ……
2. O referido prédio urbano, encontra-se inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo …, com área total do terreno de 273m2, e valor patrimonial tributário de € 35.360,00.
3. O direito de propriedade das aqui Autoras adveio-lhes por sucessão em consequência de partilha da herança, por óbito de Manuel ...., falecido no dia 1 de Fevereiro de 1989, que, por sua vez, o havia adquirido em Julho de1962, por escritura de compra e venda, exarada no dia 22 de Julho de 1963, a Manuel… e mulher, Maria José …, respectivamente, mãe e pai da Ré, ROSA ....
4. Por outro lado, na Conservatória de Registo Predial do Funchal, sob o n.º 48632 encontra-se inscrita a aquisição, por sucessão hereditária, a favor da Ré, o seguinte prédio:
- Urbano, situado ao Beco do Paiol, freguesia de São Pedro, com entrada pelo n.º 30 de polícia; consta de casa térrea coberta a telha, com seu logradouro e confronta: norte: Adelino …., sul- Lucília … e Henrique …, Leste – Gastar Oeste, Beco …. Está inscrito na matriz predial sob o artigo 2718 e tem o valor venal de 108000$00. Foi desanexado do descrito sob o n.º 21222 (Doc. nº 3).
5. Sendo que, o referido prédio urbano encontra-se inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo … com área total do terreno de 282m2, e valor venal de 108.000$00, correspondente a € 538,70.
6. A Ré, Rosa, adquiriu o direito de propriedade do supra referido prédio urbano, por sucessão, em consequência de partilha da herança, por óbito de Manuel .., também conhecido por Manuel .. e Manuel .., falecido no dia 14 de Agosto de 1969, e por óbito de Maria José, também conhecida por …., falecida no dia 19 de Abril de 1973.
7. Deste modo, o prédio urbano da Ré, ROSA ..., conforme resulta da respectiva Certidão, somente confronta a Norte com o prédio urbano das aqui Autoras (Doc. n.º 3).
8. Sendo que, o prédio urbano das Autoras confronta a Norte, Sul e Leste com o prédio urbano da Ré, descrito na Conservatória do Registo Predial do Funchal com o nº 48, com uma área de 282 m2 (Doc. nº 1).
9. Acontece que, e conforme resulta das certidões prediais, não obstante a área de terreno do prédio urbano das Autoras deter 273 m2 – e como tal, ser muito semelhante à área de terreno da Ré, que determina na certidão ser de 282 m2 - na realidade, a área de terreno ocupada pela Ré é muito superior à área das aqui Autoras Docs. nºs 4 e 5).
10. Sendo que, tal somente ocorre porque as Autoras tomaram conhecimento na presente data de que os Réus, abusivamente, apossaram-se de forma ilegítima de terreno pertencente às Autoras;
11. Em Julho do ano de 1962, Manuel ....., cônjuge da 2ª Autora e pai da 1ª Autora, adquiriu (com escritura pública de compra e venda, exarada no dia 22 de Julho de 1963) a Manuel .. e a Maria José (pai e mãe da 1ª Ré), pelo preço de 36750$00, uma porção de terreno e benfeitorias, situada no Beco …, freguesia de São .. desta cidade, medindo 245m2 (cerca de)- porção que confronta pelo norte, sul e leste com os vendedores e oeste com o dito Beco, é parte separada do descrito na Conservatória do Registo Predial desta Comarca sob o nº 21 ( e folhas 21 do Livro B- 57), e parte do inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo nº 39, sem rendimento atribuído (Doc. nº 6).
12. Pelo que, o negócio supra referido, foi celebrado entre os pais da Ré, e o pai e marido, respectivamente, das Autoras com conhecimento e na presença da aqui 2ª Autora, Teresa….
13. Sendo que, não obstante na escritura pública referir que adquiriram uma porção de terreno e benfeitorias medindo cerca de 245m2, a área em negociação, e que adquiriram em Julho de 1962 - ainda que a escritura pública tenha sido exarada no ano de 1963 -, era substancialmente superior, aproximadamente de 400m2.
14. Pelo que, quando o de cujus Manuel .. ...., com intervenção da 2ª Autora, numa fase prévia à celebração da escritura pública, negoceia a compra do terreno a Manuel .. e Maria José, tinha como área de aquisição cerca de 400m2 e não 245m2.
15. Deste modo, e uma vez que, a aquisição do referido terreno de construção, sito no Beco …, Freguesia de São .., destinava-se à construção da casa de morada de família do de cujus Manuel .. e de sua mulher, Teresa .., aqui 2ªAutora, deram entrada, junto da Câmara Municipal do Funchal, do respectivo projecto de licenciamento de obras (Doc. nº 7).
16. Assim sendo, no dia 12 de Julho de 1962, é requerido ao Sr. Presidente da Câmara Municipal do Funchal, pelo de cujus Manuel …., respectivamente, pai e marido das Autoras, a emissão de licença para construção de casa de habitação, pelo período mínimo de 180 dias, para concluir a obra- conforme documento n.º 7.
17. Pelo que, e uma vez concedida a Licença de Construção, o de cujus Manuel …, respectivamente, pai e marido das Autoras, iniciou a construção da casa de habitação.
18. Acontece que, e uma vez que, por motivos profissionais não era possível ao de cujus Manuel … e sua mulher, aqui 2ª Autora, acompanharem de perto a construção da casa de habitação, a mesma, desde a sua fase inicial até à sua conclusão, foi acompanhada pelo vendedor, o de cujus Manuel …, pai da 1ª Ré, que residia imediatamente ao lado.
19. Sendo que, por esse motivo, o de cujus Manuel …, respectivamente, pai e marido das Autoras, não presenciou a forma como o referido terreno foi delimitado.
20. Tendo, presumido, de boa-fé, que a referida delimitação tinha sido efectuada em conformidade com a área que havia adquirido de 400 m2.
21. Acontece que, a referida casa de habitação das Autoras foi sujeita a diversas obras de beneficiação, desde o ano de 1991.
22. Sendo que, a última obra de beneficiação ocorreu no ano de 2005, conforme projecto de obras de ampliação (Doc. nº 8).
23. Ora, no decorrer da elaboração do projecto de obras de ampliação, foi constatado pelo Senhor Arquitecto responsável, Rui…., que a área de terreno efetivamente ocupado pelas Autoras era inferior à área inicialmente existente, resultando tal afirmação, no confronto das medições efectuadas com a área descrita no projecto inicial, entregue na Câmara Municipal do Funchal, no ano de 1962 e as do projecto de ampliação em 2005 (Doc. nº 9).
24. O desfasamento de áreas referido no ponto anterior, apurado pelo Senhor Arquiteto, resultou do confronto das medições efectuadas no terreno (aproximadamente 205 m2) com a área descrita no projecto inicial, entregue na Câmara Municipal do Funchal, no ano de 1962 e as do projecto de ampliação em 2005 (273 m2) (Doc. nº 9).
25. Esta informação, veiculada pelo Senhor Arquiteto, permitiu, neste preciso momento, que as Autoras tomassem consciência de que, efetivamente, a propriedade onde actualmente residem não tinha os 400 m2, conforme o acordado na compra do terreno a Manuel …, em 1962, mas sim apenas uma área aproximada de 205 m2- ou seja, nem sequer os 273m2 possuem.
26. As Autoras, ao serem confrontadas com a mesma informação, facultada pelo Senhor Arquiteto, tomaram conhecimento, pela primeira vez, da discrepância de áreas entre o que é medido no terreno, e os diferentes documentos até então produzidos;
27. Aliás, de uma análise aos documentos já juntos, constata-se que a área da propriedade assume diferentes valores, ou seja: 273 m2 no projeto inicial entregue na Câmara Municipal do Funchal, em 12 julho de 1962; cerca de 245 m2 na Escritura, exarada em 22 julho de 1963; 245 m2 no Registo Predial, em 08 setembro de 1989 (em que ocorrera o óbito de Manuel ….);
28. Efectivamente, apesar de não refletir a área de terreno efetivamente comprada a Manuel… -400 m2-, o primeiro documento produzido a discriminar áreas foi o projeto inicial, entregue na Câmara Municipal do Funchal, a 12 de julho de 1962, onde consta área de terreno de 273 m2 e área de construção de 72,70 m2.
29. Tendo sido com base no referido projeto inicial entregue na Câmara Municipal do Funchal, em 1962 - que as Autoras tomaram a iniciativa de corrigir o respetivo Registo Predial e de proceder à retificação das áreas nas Finanças, o que determinou, consequentemente, um acréscimo do Imposto Municipal sobre Imóveis (Doc. nº 10).
30. Acresce que, a área ocupada abusivamente pelos Réus vai para além do que já supra vai exposto, uma vez que, a parcela de terreno que se situa a leste da residência das Autoras é parte integrante da propriedade destas.
31. Na realidade, e da visualização do documento nº 9 já junto, é claramente perceptível que a área de terreno, que se encontra a Leste do terreno das aqui Autoras, está ocupada, abusivamente, pelos aqui Réus.
32. Efectivamente, em Maio de 2013, os Réus tomaram a iniciativa de construir umas edificações, com um alpendre, na parcela de terreno que se situa a leste da residência das aqui Autoras, com o propósito de tomar posse da referida fracção de terreno.
33. Sem que as diversas interpelações das Autoras fizessem os Réus suspender de imediato as obras que iniciaram.
34. Ora, mesmo que as Autoras reivindiquem a propriedade de tal terreno como sendo sua, os Réus, prosseguiram – e prosseguem - com as construções, de forma premeditada para alterar a respectiva estrema, Docs. nºs 11 e 12).
35. Aliás, ainda que, por mera hipótese académica, não estivesse em causa a ocupação indevida de terreno pertencente às Autoras, sempre as referidas construções não respeitavam disposições legais que regulam os afastamentos entre edifícios.
36. Pelo que, a área das Autoras deveria estender-se até à ribanceira, situada a leste, atendendo a que, o prédio urbano da Ré, descrito com o nº 48632, tem a Norte a propriedade de Manuel …, não referindo que, confronta, igualmente, a Oeste com a propriedade de M… como, efectivamente, constata-se.
37. Aliás, não é necessário grandes conhecimentos topográficos para constatar, face à visualização dos documentos nºs 4 e 5, que a área ocupada pela aqui Ré é muito superior a 282m2.
38. E que a área ocupada pelas Autoras, é substancialmente inferior a 273m2.
39. A Ré ocupa, assim, abusivamente e sem qualquer título, a parcela de terreno mais a leste do prédio das Autoras que, corresponde, aproximadamente, a uma área em excesso de 195m2, que correspondente à área que falta à propriedade das Autoras para perfazer os 400 m2 - 205 m2 que atualmente possui acrescidos dos 195 m2 em falta-.
40. Aliás, as aqui Autoras nem a área de 273 m2 – conforme resulta da Certidão da Conservatória do Registo Predial detém uma vez que, na presente data só possuem 205 m2, estando em falta a área de 68 m2 às aqui Autoras.
41. Com tal ocupação abusiva, os Réus, impedem o acesso e utilização dessa parcela de terreno pelas Autores, legítimas proprietárias.
42. Sendo que, com as construções agora edificadas, os Réus põem em causa o direito de propriedade que as Autoras adquiriram por sucessão hereditária, por óbito de Manuel … ...., no dia 1 de Fevereiro de 1989, como únicas herdeiras, conforme escritura de habilitação de herdeiros, exarada a 30 de Agosto de 1989, e que até agora sempre exerceram de forma exclusiva.
Citados, os réus apresentaram contestação, em 11.11.2015, através da qual invocaram a excepção de caducidade da acção e a ineptidão da petição inicial, salientando que a acção de reivindicação implica uma situação de posse anterior que tenha sido ofendida o que não resulta dos autos, admitindo os autores que nunca tiveram posse sobre a parcela de terreno que pretendem reclamar. Impugnaram também os factos alegados pelas autoras.
Notificadas, as autoras responderam à contestação, através de articulado apresentado em 20.11.2015.
Por despacho de 30.05.2016 e após prévia audição das partes, foi fixada à acção, o valor de € 35.360,00, correspondente ao valor patrimonial do prédio sob o artigo 2541.

Em 01.10.2016 foi proferido o seguinte Despacho:
(…)
Considerando a posição das partes manifestada nos articulados, entende-se que estará arredada, para já, qualquer possibilidade de entendimento, pelo que atendendo as finalidades a que se destinava ao abrigo do disposto no artigo 593º, n.º 1 do Código de Processo Civil dispenso a realização da audiência prévia.
Ao abrigo do disposto no artigo 593º, n.º 2 do Código de Processo Civil importa proferir o seguinte despacho:
al. a): (despacho saneador)
(…)
Na sua oposição os réus ANGELO .... e ROSA ... vieram arguir a ineptidão da petição que deu origem a estes autos por desconformidade entre a causa de pedir e o pedido.
Para, tanto, referem, em síntese, que as autoras MARIA ... e TERESA … alegam que o prédio que lhes veio à posse por óbito do seu progenitor que o havia comprado ao pai da ré tinha a área de 400 m2 pelo que as autoras deveriam reclamar a diferença que são 155 m2 mas no pedido apenas pedem uma parcela de 68 m2.
Dirigido convite para o efeito vieram as autoras responder, concluindo pela improcedência da nulidade arguida alegando que referência aos 400 m2 apenas resulta da pretensão das quererem demonstrar que a área de negociação era superior à que adquiriram.
Apreciando:
Vieram as autoras formular os seguintes pedidos:
(…)
Ora as autoras configuram a presente ação como ação de reivindicação de propriedade.
Estas ações se encontram previstas no artigo 1311º do Código Civil e nas quais está em causa o direito de propriedade, a causa de pedir é consubstanciada pelo facto jurídico donde deriva o direito de propriedade que se invoca e reclama, ou, por outras palavras, e a final, o próprio título em que se funda o direito de propriedade invocado (cfr artigo 1316º do Código Civil).
Já quanto ao pedido, pode dizer-se que, na realidade, são dois os pedidos que integram e caracterizam esse tipo de ações: o reconhecimento do direito de propriedade, por um lado, e a restituição da coisa, por outro, sendo que hoje constitui entendimento praticamente pacífico de que o segundo contem implícito o primeiro, caso o mesmo não tenha sido formulado expressamente.
Verifica-se pois que sendo a causa de pedir é consubstanciada pelo facto jurídico donde deriva o direito de propriedade que se invoca e reclama – no caso a aquisição de um prédio com 400 m2 – e que se visa o reconhecimento do direito de propriedade e a restituição da coisa o pedido deveria ser o reconhecimento e restituição do direito de propriedade na sua plenitude, no caso, a porção de terreno equivalente à diferença entre os 400 m2 que foram negociados e a área que efetivamente está a ser ocupada pelas autoras (155m 2 – se tivermos em conta a área descrita no contrato de compra e venda; 127 m2 se tivermos em conta a área constante da matriz e registo predial ou 195 m2 se tivermos em conta o que efetivamente possuem).
Por outro lado sempre se dirá que as autoras não concretizam a localização exata da faixa de terreno que visam o reconhecimento: quando formulam o pedido apenas referem que tem a área de 68m2 e ao longo da petição inicial a concretização da sua localização limita-se à referência “A Ré ocupa, assim, abusivamente e sem qualquer título, a parcela de terreno mais a leste do prédio das Autoras que, corresponde, aproximadamente, a uma área em excesso de 195m2, que correspondente à área que falta à propriedade das aqui Autoras para perfazer os 400 m2 - 205 m2 que atualmente possui acrescidos dos 195 m2 em falta”.
Dispõe o artigo 186º, do Código de Processo Civil, na parte que nos interessa:
“1 – É nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial.
2 – Diz-se inepta a petição:
b) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir; (...).”
A petição inepta conduzirá, normalmente, à absolvição da instância no despacho saneador.
A nulidade de todo o processo constitui exceção dilatória que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância sendo de conhecimento oficioso do tribunal artigos 576º, n.ºs 1 e 2, 577º, al. b) e 578.º todos do Código de Processo civil.
Em conclusão, perante tal ineptidão cumpre referir que (no âmbito da anterior redação do Código de Processo Civil mas com atualidade): “A única situação de ineptidão da petição inicial que é passível de superação através de atuações processuais deriva expressamente do artigo 193.º, n.º 3 do Código de Processo Civil. As demais situações de ineptidão da petição inicial são insanáveis, não cabendo, pois, ao juiz empreender qualquer diligência no sentido da sua sanação nos termos do artigo 265º, nº 2 do Código de Processo Civil.” – cfr António Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, volume II, 3ª edição revista e atualizada, Almedina, pág, 65)
Em caso de ineptidão não pode ser proferido o despacho previsto no artigo 590º do mesmo diploma: não há que suprir a falta de pressupostos processuais nem de aperfeiçoar a petição inicial, pois que nem a nulidade decorrente da ineptidão é suprível nem a petição inepta por falta de causa de pedir carece de ser aperfeiçoada (não se pode aperfeiçoar o que não existe) – Acórdão do tribunal da relação do Porto, de 23.02.2006: JTRP00038871, www.dgsi.pt.
Entende-se pois, conforme acima exposto quanto à discrepância de áreas peticionados entre as que foram adquiridas e as que ora são reivindicadas, que no caso os factos alegados como causa de pedir estão em contradição com o pedido.

Consta, assim, do Dispositivo da Decisão, o seguinte:

Pelo exposto julgo verificada a exceção dilatória da nulidade de todo o processo por ineptidão da petição inicial ocasionada por falta de causa de pedir, a qual é de conhecimento oficioso, o que se declara, e em consequência absolvo os réus da instância (186º, n.ºs 1 e 2 al. b), 576º, n.ºs 1 e 2, 577º, al. b) e 578.º todos do Código de Processo civil).
Custas pelas autoras (artigo 527º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).
Registe e notifique.

Inconformadas com o assim decidido, as autoras interpuseram recurso de apelação, em 31.10.2016, relativamente à aludida decisão.

São as seguintes as CONCLUSÕES das recorrentes:
i. Por douta Sentença proferida no âmbito do Processo n.º5484/15.0T8FNC, que correu termos pela Instância Local do Funchal, Secção Cível – J3, no Tribunal da Comarca da Madeira, foi julgada verificada a excepção dilatória da ineptidão da Petição Inicial, alegadamente ocasionada por falta de pedir e, bem assim, pelo facto de supostamente as aqui Autoras, ora Recorrentes, não concretizarem a exacta localização da faixa de terreno relativamente à qual visavam o reconhecimento.
ii. Não assiste, contudo e com o devido respeito, razão ao douto Tribunal de 1.ª Instância, desde logo – e no que respeita à causa de pedir –, resulta evidente que a acção foi instaurada como sendo uma acção de reivindicação de propriedade e, como tal, resulta manifestamente evidente que o que está em causa é o direito de propriedade.
iii. Assim sendo, a causa de pedir é consubstanciada pelo facto jurídico de onde deriva o direito de propriedade que se invoca e reclama, sendo o pedido assente, por um lado, no reconhecimento do direito de propriedade e, por outro lado, na restituição dessa mesma propriedade, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 1311.º do Código Civil.
iv. Ora, as ora Recorrentes, alegaram – e comprovaram – a existência de um direito real de propriedade e peticionaram, de forma expressa, o reconhecimento judicial do mesmo, bem como a condenação dos Réus, ora Recorridos, a "reconhecer e aceitar esse direito”
v. Da causa de pedir e do pedido apresentados pelas Recorrentes, só se poderá inferir que nos encontramos perante uma acção de reivindicação e, nunca, que estamos perante uma acção de simples restituição de posse, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 1278.º do Código Civil.
vi. As Autoras, ora Recorrentes, tal como alegam devidamente – de forma clara e inequívoca – na sua Petição Inicial, pretendem o reconhecimento do seu direito real de propriedade ilegitimamente ocupada pelos aqui Recorridos e, consequentemente, a restituição dessa parcela de terreno.
vii. Deste modo, quando as aqui Autoras, ora Recorrentes, referem a área de 400m, pretendem, tão-só, demonstrar que a área em negociação era superior àquela que adquiriram, não resultando, assim, qualquer confusão nestes Autos.
viii. Aliás, as aqui Recorrentes, ao longo da sua Petição Inicial, contextualizaram – de forma expressa e objectiva – os factos, como não poderiam deixar de fazer, até porque a aquisição do terreno remonta ao ano de 1962, por escritura de compra e venda exarada no dia 22 de Julho de 1963, celebrado entre os pais da aqui Ré e o marido e pai, respectivamente, das aqui Recorrentes.
ix. Assim sendo – e salvo melhor opinião – nunca este enquadramento dos factos poderia ser considerado como uma manifesta desconformidade entre a causa de pedir e o pedido e, consequentemente, ser a Petição Inicial ser julgada inepta, por falta de causa de pedir, quando tudo o que as ora Recorrentes fizeram foi melhor esclarecer e fundamentar o seu pedido e causa de pedir, conforme as exigências de elaboração e apresentação de uma Petição Inicial.
x. As aqui Recorrentes expuseram os factos que constituem a causa de pedir e as razões de Direito que servem de fundamento à acção, tendo formulado o respectivo pedido, tudo em conformidade com o disposto no artigo 552.º do Código de Processo Civil, com a epígrafe “Requisitos da Petição Inicial”.
xi. Além do mais, os aqui Recorridos, na sua Contestação, apesar de arguirem a ineptidão da petição inicial – o que fizeram sem qualquer fundamento, como bem sabem –, interpretaram convenientemente a Petição Inicial das Autoras, ora Recorrentes, uma vez que deduziram defesa e apresentaram prova através da douta Contestação, o que não se pode deixar de alegar para os devidos efeitos legais.
xii. Efectivamente, ao longo da Contestação, os aqui Réus, ora Recorridos, confessam a aquisição do aludido terreno em discussão, no ano de 1962 e, bem assim, a referida porção de tal terreno, admitindo, inclusivamente, no seu artigo 17.º da douta Contestação que “a diferença entre a área vendida e a área constante do projecto de construção apresentado para a casa das AA tem a ver com esse pequeno «lapso» que incluiu naquela área da passagem que todos sabiam que não tinha sido vendida, não obstante a respeitarem como tal”.
xiii. Ou seja, o entendimento dos aqui Recorridos, sobre a causa de pedir das Recorrentes é de tal ordem alcançado na sua perfeição, que aqueles juntam fotocópias do mapa da cidade, emitidas pela Câmara Municipal do Funchal, de forma a “justificar” a delimitação da área de terreno, os respectivos limites e configuração.
xiv. Por outro lado, é falso que as Recorrentes não tenham logrado identificar a faixa de terreno relativamente à qual visavam o reconhecimento, uma vez que juntaram as plantas e o Relatório elaborado por Perito, para o efeito.
xv. Acresce que, igualmente, os Recorridos alcançaram a que parcela de terreno as Autoras, ora Recorrentes, se referiam atendendo a que justificam no artigo 16.º da sua Contestação que “esse recorte ficou a dever-se à existência de uma passagem nesse exacto local que servia ao poço de rega de toda propriedade e, por isso, o Manuel .. recusou a vender esse pequeno local (…)”.
xvi. Ora, dúvidas não existem de que os Réus, ora Recorridos, alcançaram, perfeitamente, os factos que lhe eram imputados e que consubstanciavam a causa de pedir e, bem assim, compreenderam na sua perfeição a localização da parcela de terreno reivindicada pelas aqui Recorrentes, pelo que, jamais poderá proceder a ineptidão da Petição Inicial, por não ter aplicabilidade no caso concreto, o que não se pode deixar de alegar para os devidos efeitos legais.
xvii. Dispõe o artigo 186.º do Código de Processo Civil, com a epígrafe “ineptidão da petição inicial” que “1 - É nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial. 2 - Diz-se inepta a petição: a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir; b) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir; c) Quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis. 3 - Se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial. 4 - No caso da alínea c) do n.º 2, a nulidade subsiste, ainda que um dos pedidos fique sem efeito por incompetência do tribunal ou por erro na forma do processo”.
xviii. Ora, a ratio da carência do entendimento do pedido e da causa de pedir, traduz-se na necessidade de ser assegurado, de modo cabal, o exercício do contraditório da contraparte, permitindo, deste modo, que se consiga defender por excepção ou impugnação – conforme, aliás, sucedeu in casu, já que os ora Recorridos apresentam a sua Contestação, defendendo-se por ambas as vias–, referindo-se aos factos alegados na Petição Inicial, com tal conhecimento que jamais poderia ter sido considerada procedente a invocada excepção de ineptidão da petição inicial.
xix. É que, como doutrina Alberto dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, vol II, p. 379 "Se, apesar da obscuridade ou ambiguidade do pedido ou da causa de pedir, o réu pode elaborar a sua contestação, isso quer dizer que lhe foi possível interpretar de certa maneira o pedido ou a causa de pedir; tudo está agora em saber se a interpretação dada pelo réu é exacta ou, noutros termos, se o sentido atribuído ao pedido ou à causa de pedir corresponde fielmente aquilo que o autor quis exprimir (...) Se, ouvido o autor, este declarar que a sua petição tem o sentido que o réu lhe atribuiu, a obscuridade ou confusão fica desfeita. O pedido ou a causa de pedir passará a ter, por acordo das partes, a significação e o alcance expresso na contestação".
xx. Ora, a petição inicial apresentada num processo judicial contém três partes essenciais:1º- O preâmbulo, onde se identificam as partes e se aponta a forma do processo; 2º- A narração, onde se explanam os fundamentos de facto e de direito da acção e, 3º- A conclusão, onde se formula o pedido, ou seja, onde se precisa qual é a providência que o autor solicita ao tribunal, o "efeito jurídico pretendido pelo autor”.
xxi. A este propósito o Prof. Antunes Varela e M. Bezerra e Sampaio Nora, in Manual de Processo Civil, p. 234 e nota 1, precisam que "o pedido é o meio de tutela jurisdicional pretendido pelo autor (o reconhecimento judicial da sua propriedade sobre determinada coisa; a entrega ou restituição dessa coisa; a condenação do réu numa prestação de certo montante; etc.)" e, ainda, que "o pedido deve ser formulado na conclusão da petição, não bastando que apareça acidentalmente referido na parte narrativa dela. O autor deve no final do arrazoado, dizer com precisão o que pretende do Tribunal - que efeito jurídico quer obter com a acção".
xxii. Assim, uma vez mais se alega que não pode ser julgada inepta uma Petição Inicial nos termos da qual os Recorridos alcançaram, perfeitamente, a causa de pedir e o pedido, conforme se verifica no caso sub judice, até porque matéria da excepção da ineptidão da petição inicial vertida na Contestação é composta, tão-só, por sete artigos – sendo certo, note-se, que a matéria de excepção vem elencada em conjunto com uma outra alegada excepção da caducidade, não fazendo os aqui Recorridos qualquer distinção entre ambas, pelo que nem sequer deveriam tais excepções serem consideradas, por manifesta violação do disposto no artigo 572.º, alínea c) do Código de Processo Civil, o que não se pode deixar de alegar, para os devidos efeitos legais;
xxiii. Sendo que, a impugnação que sucede é composta por trinta e sete artigos, o que revela que os Réus, ora Recorridos, alcançaram – e bem –quer o pedido, quer a causa de pedir, nestes Autos.
xxiv. Nesta conformidade, atente-se, desde logo ao douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 14.02.2002, Agr. n.º4199/01-7.ª.
xxv. Efectivamente, verificando-se que o teor da contestação, de uma forma ou de outra, manifesta que os Recorridos compreenderam, na sua perfeição, a pretensão das Autoras, ora Recorrentes, não podendo o Tribunal a quo ter julgado inepta a Petição Inicial das Recorrentes e, ao abrigo do disposto no número 3 do artigo 186.º do Código de Processo Civil, tão pouco poderia tal douto Tribunal absolver os Réus da instância.
xxvi. Aliás, assim julga o Supremo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão datado de 01.10.2003, no âmbito do Processo n.º02S3742, ao alegar que, “Desde que haja contestação, o juiz não pode, por força do disposto no nº. 3 do artº. 193 do CPC, julgar inepta a petição por falta de indicação da causa de pedir ou do pedido se chegar à conclusão de que o réu na contestação interpretou correctamente a dita petição (ouvindo para tanto o autor, se necessário) e isto quer o mesmo réu tenha ou não suscitado a questão da ineptidão. IV - Verificando-se que o R. apreendeu e compreendeu a pretensão indemnizatória da A. considerando como efectuado correspondente pedido, não é possível, absolver o R. da instância quanto a este pedido por ineptidão da petição inicial.”
xxvii. E bem assim, considera aquele douto Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça que jamais a ineptidão da petição inicial poderá ser julgada uma vez que, “(…)Se a petição inicial não foi liminarmente indeferida e o réu veio a contestar, verificando-se que interpretou convenientemente o pensamento do autor, esta sua actividade supre a ineptidão por falta de indicação do pedido ou da causa de pedir ou a ininteligível formulação daquele ou desta, de modo que nem o autor fica prejudicado no pedido, nem o réu no exercício do contraditório.”.
xxviii. Nesta conformidade, quando muito – o que apenas se concebe por mera hipótese académica – haveria lugar ao convite ao aperfeiçoamento da Petição Inicial apresentada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 590.º do Código de Processo Civil, ao abrigo dos princípios da colaboração, boa-fé e economia processuais – o que representa um poder-dever do Juiz que deverá ser utilizado sempre que se pretender evitar a inutilização da actividade processual –,
xxix. Mas nem sequer é esse o caso, já que os Recorrentes compreenderam o significado da Petição Inicial e as questões suscitadas na mesma, relativamente às quais se pronunciaram, apresentando, assim, a sua defesa, conforme supra alegado e que melhor decorre destes Autos.
xxx. Dispõe o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 25.11.11, no âmbito do Processo n.º99/10.1TBMTL-E1, que apenas perante a falta absoluta – e não a mera escassez, o que, esclareça-se, nem sequer é o caso – ou ininteligibilidade da causa de pedir é que podem gerar a ineptidão da petição inicial, ficando sanada a potencial nulidade, caso o Réu venha impugnar, na sua Contestação, a factualidade que vem alegada pelo Autor, tal como sucedeu no caso sub judice.
xxxi. Também não poderia o douto Tribunal a quo decidir-se pela contradição entre o pedido e a causa de pedir, porquanto, além de tudo o que supra vai exposto, a verdade é que, quer a Doutrina, quer a Jurisprudência, interpretam e aplicam a contradição a que alude a alínea b) do número 2 do artigo 186.º do Código de Processo Civil, no sentido da incompatibilidade lógica entre o facto invocado pelo Autor como sendo a base da sua pretensão jurídica – isto é, a causa de pedir –e o efeito jurídico que pretende alcançar – ou seja, o pedido–.
xxxii. Ora, com o devido respeito, in casu, não se verifica qualquer incompatibilidade lógica entre a causa de pedir e o pedido!
xxxiii. Resulta evidente que, se o alegado na Petição Inicial é compreensível –como é, aliás, tendo sido alvo da respectiva resposta por parte dos Recorridos –, traduzindo-se, assim, numa sequência que, em termos lógicos e racionais, conduz ao pedido formulado – como conduz, efectivamente –, então não é possível afirmar-se que a Petição Inicial apresentada pelas ora Recorrentes é inepta, em virtude de uma contradição entre a causa de pedir e o pedido formulado.
xxxiv. Ora, para que a Petição Inicial possa considerar-se inepta, ao abrigo da alínea b) do número 2 do artigo 186.º do Código de Processo Civil, não basta a simples desconformidade, sendo, sim, necessário que o pedido esteja em flagrante oposição com a causa de pedir e tal flagrante oposição não sucede no caso concreto, conforme resulta evidente, mas não se pode deixar de alegar, para os devidos efeitos legais.
xxxv. Na verdade, a discrepância de valores que vai vertida na Petição Inicial, é apresentada propositadamente e não porque existe qualquer contradição entre o pedido e a causa de pedir, em conformidade com o que supra vai exposto e, bem assim, com o que melhor se explana, nos artigos 24.º, 25.º, 34.º e 39.º da Petição Inicial das ora Recorrentes:
xxxvi. Ora, conforme ensina o Prof. Alberto dos Reis, in ob cit., p. 380, “o que está na base do texto legal é esta ideia: se o réu pôde contestar, é porque atribuiu à petição determinado sentido; importa averiguar se esse sentido corresponde ao que o autor pretendeu exprimir; se corresponde, não há fundamento para declarar inepta a petição."
xxxvii. Deste modo, e em qualquer dos casos, desde que haja contestação, o juiz não pode, por força do disposto no nº. 3 do artº. 193º do CPC, julgar inepta a petição inicial por falta de indicação da causa de pedir ou do pedido se chegar à conclusão de que o réu na contestação interpretou correctamente a dita petição – conforme se verificou in casu, atendendo a que, não só, os aqui Réus contestaram com conhecimento da situação concreta, como confessam a aquisição do aludido terreno em discussão, no ano de 1962 e, bem assim, a referida porção de tal terreno, conforme resulta de forma explícita nos artigos 16.º e 17.º da douta Contestação- .
xxxviii. Assim, face a tudo o que supra vai exposto e, bem assim, face à doutrina que se explanou, não é possível absolver os Réus da instância quanto este pedido por ineptidão da petição inicial.
Pedem, por isso, as apelantes, a revogação da decisão recorrida, devendo ser substituída por outra que não absolva os Réus da instância.
Os réus não apresentaram contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO

Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação das recorrentes que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Assim, e face ao teor das conclusões formuladas a solução a alcançar pressupõe tão somente apurar:
Ø DA INEPTIDÃO DA PETIÇÃO INICIAL

III . FUNDAMENTAÇÃO
A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Com relevância para a decisão a proferir, importa ter em consideração a alegação factual referida no relatório deste acórdão, cujo teor aqui se dá por reproduzido.

B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Insurgiram-se as autoras contra a decisão recorrida por considerarem que a petição inicial por elas apresentada não padecia do vício de ineptidão, por falta de causa de pedir, conforme se entendeu na 1ª instância.

Vejamos se lhes assiste razão.

Como é sabido, a ineptidão da petição inicial traduz-se numa nulidade insanável de conhecimento oficioso, nos termos do artigo 196º do CPC, que só ocorre se se verificar alguma das circunstâncias enunciadas no artigo 186.º CPC,

Estatui o artigoº 186º do CPC:
1. É nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial.
2. Diz-se inepta a petição:
a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir;
b) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir;
c) Quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis.
3. Se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial.

Como esclarece ANSELMO DE CASTRO, Direito Processual Civil Declaratório, V. II, Almedina, 1982, 219-220 “com a figura processual da ineptidão da petição inicial visa-se, em primeiro lugar, evitar que o juiz seja colocado na impossibilidade de julgar correctamente a causa, decidindo sobre o mérito, em face da inexistência de pedido ou de causa de pedir, ou de pedido ou causa de pedir que se não encontrem deduzidos em termos inteligíveis (…). Propõe-se ainda impedir se faça um julgamento sem que o réu esteja em condições de se defender capazmente, para o que carece de conhecer o pedido contra ele formulado e o respectivo fundamento”.

Refere, por outro lado, RODRIGUES BASTOS, Notas ao CPC, Vol. I, 3ª ed., 253, “...A p.i. há-de expor um facto jurídico (causa de pedir) e tirar dele, como conclusão, um efeito de direito, que o autor impetra lhe seja reconhecido (pedido). Se não se formula qualquer pedido ou se não se expõe a causa de pedir, ou se se faz aquela formulação, ou esta exposição em termos incompreensíveis, só materialmente se poderá falar em p.i., porque substancialmente é evidente que o não é. Tal peça jurídica, com falta desses requisitos, não se mostrará apta a reproduzir, em Juízo, o litígio – daí a sua ineptidão.”

Face ao preceituado no artigo 581º, nº 4, do C.P.C. pode definir-se causa de pedir como sendo o acto ou facto jurídico, simples ou complexo, de que deriva o direito que se invoca ou no qual assenta o direito invocado pelo autor e que este se propõe fazer valer.

Tem-se em vista não o facto jurídico abstracto, tal como a lei o configura, mas um certo facto jurídico concreto, conciso e preciso, cujos contornos se enquadram na definição legal.

Quanto à alínea a) do citado artigo 186º do CPC é manifesta a dificuldade em manter uma linha de separação entre a ineptidão da petição e a inviabilidade ou improcedência. Pode considerar-se que, se se formula um pedido com fundamento em facto aduzido e inteligível, mas que não pode ser subsumido no normativo invocado, o caso é de improcedência e não de ineptidão.

Tem sido, na verdade, defendido na jurisprudência que a insuficiência ou incompletude do concreto factualismo consubstanciador da causa petendi, não fulmina, desde logo, de inepta a petição, apenas podendo contender, em termos substanciais, com a atendibilidade do pedido.

Por outro lado, uma petição prolixa não é o mesmo que uma petição inepta e causa de pedir obscura, imprecisa ou inadequada, não é o mesmo que causa de pedir ininteligível.

Já salientava ALBERTO DOS REIS, Comentário, 2º, 372, que: importa não confundir petição inepta com petição simplesmente deficiente... . Quando a petição, sendo suficiente quanto ... à causa de pedir, omite factos ou circunstâncias necessários para o reconhecimento do direito do autor, não pode taxar-se de inepta; o que então sucede é que a acção naufraga”.

É que, como refere este autor, “Podem dar-se dois casos distintos: a) a petição ser inteiramente omissa quanto ao acto ou facto de que o pedido procede; b) expor o acto ou facto, fonte do pedido, em termos de tal modo confusos, ambíguos ou ininteligíveis, que não seja possível apreender com segurança a causa de pedir. Num e noutro caso a petição é inepta, porque não pode saber-se qual a causa de pedir”.

Entende-se nesta conformidade, que haverá falta de indicação da causa de pedir determinante da ineptidão quando falte a indicação dos factos invocados para sustentar a pretensão submetida a juízo, ou tais factos sejam expostos de modo tal que, seja impossível, ou, pelo menos, razoavelmente inexigível, determinar, qual o pedido e a causa de pedir – cfr. a título meramente exemplificativo Acs. do STJ de 30.04.2003 (Pº03B560) e de 31.01.2007 (Pº 06A4150), acessíveis em www.dgsi.pt.

Este entendimento enquadra-se, é certo, com o estatuído no nº 3 do citado artigo 186º do CPC., já que mesmo que o réu, na contestação, invoque a falta ou ininteligibilidade do pedido ou da causa petendi – o que pode indiciar uma certa imperfeição, prolixidade, confusão ou incompletude da petição - tal invocação não é atendível se se concluir que ele, não obstante tais deficiências, compreendeu a pretensão do autor e as consequências que dela se pretende retirar.

Porém, como bem se concluiu no Ac. R.L. de 01.06.2010 (Pº 405/07.6TVLSB.L1-7), a idoneidade do objecto da acção implica a indicação e inteligibilidade da causa de pedir e do pedido, bem como a existência de um nexo lógico formal entre aqueles dois termos da pretensão, mais se esclarecendo que não se verificará tal idoneidade quando:

a) não seja indicado qualquer efeito-prático jurídico pretendido;

b) seja indicado um efeito pretendido em termos ininteligíveis ou tão vagos que, mesmo com o recurso aos fundamentos da acção, não permitam formular qualquer juízo de mérito positivo ou negativo;

c) não sejam alegados os factos estruturantes da causa de pedir;

d) sejam alegados meros conceitos de direito ou factualidades abstractas que não permitam sequer reconduzir o julgado a uma situação de facto real, em termos de evitar mais tarde a repetição de causas idênticas;

e) seja alegada uma mole de factos sem qualquer leitura possível, positiva ou negativa, na óptica do pedido (ininteligibilidade de facto), ou que não permitam descortinar um quadro normativo aplicável (ininteligibilidade de direito), nomeadamente quando, tratando-se de causa de pedir complexa, esta se mostre de tal modo truncada que não se divise como dali possa decorrer o efeito pretendido;

f) ocorra uma relação de exclusão formal recíproca entre a causa de pedir invocada e o pedido, entre duas causas de pedir ou entre vários pedidos cumulados, que se traduza num dizer ou desdizer simultâneos.

Assim, e verificada qualquer uma das elencadas situações, designadamente a falta de alegação dos factos estruturantes da causa de pedir, o objecto da acção será manifestamente inidóneo para uma apreciação de mérito, implicando a ineptidão da petição inicial, reconduzível a uma nulidade insuprível de todo o processo, o que constitui excepção dilatória determinativa, mesmo oficiosamente, da absolvição do réu da instância.

Como é sabido, a nossa lei consagra a teoria da substanciação, segundo a qual o objecto da acção é o pedido, definido através de certa causa de pedir, que se reconduz aos factos de onde emerge o direito do autor – v. JOSÉ LEBRE DE FREITAS, Acção Declarativa Comum, À Luz do Código de Processo Civil de 2013, Coimbra Editora, 41-46.

A causa de pedir tem, portanto, de ser concretizada ou determinada, consistindo em factos ou circunstâncias concretas e individualizadas, não carecendo forçosamente de ser qualificada juridicamente - embora o deva ser - bastando ao autor narrar factos, cabendo ao julgador a respectiva e necessária qualificação jurídica.

O fundamento da acção aqui em apreciação radica no reconhecimento do direito de propriedade das autoras sobre determinado prédio que identificaram, no qual se inclui uma parte de terreno com a área de 68 m2, que os réus alegadamente ocupam e nele erigiram construções, pretendendo as autoras a condenação dos réus a restituírem às autoras tal parte do terreno e a demolirem as aludidas construções.

Trata-se, portanto, de uma acção real, mais precisamente de uma acção de reivindicação, cuja causa de pedir reside no facto jurídico de que deriva o direito real – nº4 do artigo 581º do CPC – ou seja, nos factos jurídicos concretos constitutivos do alegado direito das autoras.

A causa de pedir na acção de reivindicação é complexa, consistindo não apenas na titularidade ou nos factos constitutivos do direito, mas também na situação de desconformidade na relação com a coisa, a que a entrega deve pôr termo.

Tem, pois, de se entender que, o que individualiza a acção de reivindicação, é a concomitância de dois requisitos ao nível do pedido: o do reconhecimento do direito de propriedade do autor e o da restituição da coisa, a acatar pelo demandado, simples possuidor ou detentor. Contudo, nada impede que, na acção de reivindicação, aos dois indicados pedidos se acrescentem outros pedidos acessórios, desde que caibam nesse tipo de acção.

Para
JOSÉ DIAS FERREIRA, Código de Processo Civil Anotado, Tomo I, 1897, 5 (anotação ao artigo 2º) são reais todas as acções que derivam quer da propriedade perfeita quer dos diferentes elementos que a constituem e que tem por objecto o direito à coisa sem obrigação pessoal por parte do réu”.

E, como refere ANSELMO DE CASTRO, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. I, Almedina, 1981, 208, “nas acções reais o facto jurídico (de que deriva o direito real) não é simplesmente o acto translativo da propriedade para o autor da acção. Por definição, a acção real, de que é paradigma a reivindicação, supõe que nenhum vínculo pessoal liga o autor ao réu, por força do qual, e independentemente de a propriedade da coisa pertencer ou não autor, lhe incumba a obrigação de restituir ou entregar. Sendo assim, o acto translativo em si mesmo não é título que se imponha ao réu mas somente na medida em que com os actos translativos anteriores, e em última análise por posse conducente à prescrição, portanto posse durante o prazo necessário, invistam o autor no direito de propriedade ou domínio invocados”.

Daí que este tipo de acção se tem de estruturar na alegação de factos tendentes a provar:
a) a aquisição originária do direito real invocado ou, alternativamente, a presunção de posse ou do registo da aquisição, mesmo que derivada, da coisa;
b) a ocupação ou esbulho da coisa por parte do demandado.

E, embora nem sempre seja fácil, importa distinguir no substrato factual da causa de pedir, os factos estruturantes da causa de pedir, dos factos que, muito embora essenciais à procedência da acção, não se mostram todavia imprescindíveis à caracterização da causa de pedir. A ausência de alegação dos primeiros, implica a ineptidão de petição inicial, ao passo que a ausência dos demais configura uma petição deficiente, susceptível de dar lugar a um despacho de aperfeiçoamento.

Para o êxito de uma acção real deverá, desde logo, o autor alegar os correspondentes factos estruturantes que permitam levar à prova do invocado direito de propriedade sobre a coisa, i.e., terá que alegar factos que permitam demonstrar a aquisição desse direito real de propriedade.

Acresce que a demonstração da titularidade do direito de propriedade deve fazer-se pela prova do facto jurídico constitutivo do mesmo, o que implica a demonstração da aquisição originária desse direito, ou então a prova de factos que a lei reconheça como suficientes para presumir a existência dessa titularidade: – a posse (artigo 1268º, nº 1, do Código Civil ) e o registo (artigoº 7º do C.R.Predial) .

Como regra, é insuficiente a invocação de uma forma de aquisição derivada por não ser constitutiva do direito de propriedade, mas somente translativa desse direito, a menos que se comprove que o direito já existia no transmitente.

A alegação e, consequente prova do direito, deve ser feita pelo autor, não bastando justificar a própria aquisição, sendo portanto necessário provar o
dominium auctoris ou usucapião, como forma de aquisição originária.
A usucapião é uma das formas de aquisição originária, nomeadamente do direito de propriedade, cuja verificação depende de dois elementos: a posse (corpus e animus) e o decurso de certo período de tempo, variável consoante a natureza móvel ou imóvel da coisa, e as características da posse.

Com efeito, o artigo 1287º do Código Civil estatui que a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação.

A usucapião deriva, pois, de dois elementos nucleares, a posse, pública e pacífica e o decurso do tempo, correspondendo a um modo de aquisição originária de direitos reais, pela transformação em jurídica de uma situação possessória duradoura no direito real correspondente.

Posse, segundo o disposto no artigo 1251º do Código Civil, consiste no poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real.

É caracterizada por via de dois elementos característicos: o “corpus” e o “animus”. O primeiro elemento traduz-se na materialidade de facto: exercício efectivo de poderes materiais sobre a coisa, actuação de facto correspondente ao exercício do direito. O segundo elemento consiste na convicção do detentor de que está a exercer o direito de propriedade, ou seja, a intenção de exercer um direito real sobre a coisa como seu titular.

E, o facto de a lei exigir o “corpus” e o “animus” para efeito de haver posse implica, consequentemente, que o possuidor terá de provar a existência desses dois elementos.

É certo que a prova do dominium auctoris pode não ser necessária quando o autor beneficie da presunção legal de propriedade, como a resultante do registo.

É que, como decorre do preceituado no artigo 7.º do Código do Registo Predial que, “O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define”.

As presunções são ilações que a lei ou o julgador retira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido - artigo 349.º do C.C.

A presunção legal decorrente do artigo 7º do Código do Registo Predial é uma presunção do direito e, quem tem a seu favor a presunção de um determinado direito não tem que fazer prova desse direito. Trata-se de uma presunção legal juris tantum, que pode ser ilidida, mediante prova em contrário, uma vez que no caso a lei o permite - artigo 350.º do Código Civil.

Mas, como desde há muito é entendimento unânime na doutrina e na jurisprudência, que a força probatória do registo não se estende à definição das áreas, confrontações ou limites dos imóveis cuja propriedade se encontra inscrita no registo – v. a título meramente exemplificativo, Acs. do STJ 29.10.1992, BMJ 420, 590, de 11.05.1993, C.J./STJ, T. II, 95, de 23.09.2004 (Pº 04B2324) e de 11.02.2016 (Pº 6500/07.4TBBRG.G2.S3), estes últimos acessíveis em www.dgsi.pt.

É certo que, in casu, as autoras não colocam verdadeiramente em causa a titularidade dos prédios em confronto – o das autoras e o dos réus – incidindo o litígio, mais propriamente, sobre a sua precisa delimitação física, em consequência das autoras se arrogarem a propriedade dessa determinada parcela de terreno, confusamente identificada, mas que se situará na confluência dos prédios que pertencerão, respectivamente, às autoras e aos réus.

Resulta, pois, que não será controvertida a propriedade ou titularidade dos prédios em si mesmos, mas apenas a propriedade de uma determinada faixa de terreno, ainda que de forma pouco claramente identificada, confinante aos imóveis em causa, cuja titularidade as autoras sustentam se integrar no prédio de que são titulares, estando aqui em causa, como se disse, não uma acção de demarcação, mas ao invés, uma acção de reivindicação.
Sucede, no entanto, que num litígio com a especificidade do dos presentes autos não é possível resolver a questão da propriedade desta parcela em litígio através da simples invocação da presunção legal de propriedade assente no teor da descrição registal.

É, assim evidente, que se mostra imprescindível a alegação, e subsequente prova, do efectivo exercício de actos possessórios, por banda das autoras e dos seus antecessores, cujo ónus às autoras compete, susceptíveis de conduzirem à usucapião, actos esses que incidiram também sobre a parcela de terreno cuja titularidade é controvertida – v. a propósito, o anteriormente citado Ac. STJ de 11.02.2016.

Ora, a factualidade alegada na petição inicial não sofre apenas de ambiguidade ou equivocidade no que concerne à devida identificação da faixa de terreno aqui em causa, quer quanto à sua localização e extensão – o que sempre poderia ser susceptível de eventual aperfeiçoamento – mas sofre também, e sobretudo, da completa omissão dos imprescindíveis factos estruturantes da causa de pedir, concernentes na pratica de actos possessórios das autoras e dos seus antecessores, quer sobre a totalidade da área do prédio que se encontra inscrito no registo a favor das mesmas, mas essencialmente sobre a parcela reivindicada, logo, alvo de litígio, sendo certo que a omissão da alegação de qualquer acto integrador da prática de actos possessórios sobre a referida parcela física de terreno, foi invocada, embora de forma parca e pouco clara, pelos réus, no artigo 6º da sua contestação.

Nestes termos, forçoso é concluir que a petição inicial apresentada pelas autoras sofre, não só de ambiguidade ou equivocidade na factualidade invocada, mas sofre, fundamentalmente, da total ausência de alegação da aludida factualidade indispensável à caracterização da causa de pedir, o que implica a ineptidão da petição inicial, reconduzível numa nulidade insuprível de todo o processo, e que constitui excepção dilatória determinativa, ainda que oficiosamente, da absolvição dos réus da instância, nos termos dos artigos 186º, nºs 1 e 2, alínea a), 196º, 1ª parte, 278º, nº 1, alínea b), 576º, nº 2, 577º, alínea b) e 578º, todos do Código de Processo Civil.

Destarte, improcede a apelação, mantendo-se a absolvição dos réus da instância constante da decisão recorrida.

As apelantes serão responsáveis pelas custas respectivas nos termos do artigo 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.

IV. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.

Condenam-se as apelantes no pagamento das custas respectivas.

Lisboa, 18 de Maio de 2017
Ondina Carmo Alves - Relatora
Pedro Martins
Lúcia Sousa