Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
892/2006-6
Relator: FÁTIMA GALANTE
Descritores: ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
REGISTO DA ACÇÃO
REGISTO PREDIAL
TERCEIROS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/09/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: 1. Embora o prédio tenha que ser identificado com elementos que o distingam e caracterizem, essa identificação mínima não abrange uma descrição física rigorosa e pormenorizada do imóvel. O registo predial não tem como finalidade garantir os elementos de identificação do prédio. A presunção resultante da inscrição da aquisição do direito não abrange a área, limites, confrontações dos prédios descritos.
2. Apenas factos jurídicos, acções e decisões, que não propriamente direitos, podem/devem ser objecto de registo predial, sendo ainda que terão que constar de documentos legalmente comprovativos, o que não sucede com as áreas e confrontações dos imóveis descritos, cuja exactidão não passa pelo controlo (de legalidade) do conservador, que se limita a assegurar (e exigir), nos concelhos em que vigora o cadastro geométrico obrigatório, que a descrição do prédio venha a corresponder à inscrição matricial no mais aceitando/confiando nas declarações dos respectivos interessados.
3. Mesmo em casos de transmissão do direito substantivo, essa situação não provoca efeitos imediatos na legitimidade processual. Não sendo promovida a habilitação do cessionário do direito que é objecto o litígio judicial, o transmitente continua a deter legitimidade e a sentença produzirá efeitos na esfera jurídica do adquirente.
Decisão Texto Integral: ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
I - RELATÓRIO
F e mulher, M, demandaram J e mulher, A, M e marido, J, e J Ldª, alegando em síntese serem donos e proprietários de um prédio sitio na Póvoa de Penafirme, na comarca de Torres Vedras. Esse prédio confina com um outro, a poente, pertença dos 2º e 3º RR. em compropriedade.
Acontece que, em Julho de 1998, os primeiros RR., anteriores proprietários do prédio que confina com o seu, ergueram um muro de vedação sem que hajam respeitado a linha divisória dos prédios e ocuparam, com a sua conduta, uma faixa de terreno com 84 m2, não obstante a sua oposição e o facto dos terrenos estarem delimitados com marcos. Em 21 de Junho de 1999, os 1ºs RR. venderam aos 2º e 3ª RR, o prédio de que eram proprietários e estes, em Agosto de 2000, iniciaram a construção de vivendas geminadas no mesmo com base em projecto anteriormente licenciado e cujo processo teve início aquando da propriedade dos 1ºs RR.
Tal construção ocupou a faixa de terreno referida não obstante a mesma ser pertença dos AA. por sempre haver pertencido ao seu prédio tendo os anteriores proprietários do mesmo a ocupado desde há pelo menos 20 anos.
Esta ocupação impediu os AA. de fruírem a faixa bem como determinou a alteração de um projecto de licenciamento de vivenda e de aceder a uma futura garagem a construir nas traseiras da casa assim causando prejuízos que se cifram em 5.100.000$00, quantia que peticionam a título de indemnização.

Devidamente citados contestaram os RR. alegando que a faixa em questão é sua pertença por fazer parte integrante do seu prédio desde sempre.
Terminam pedindo a improcedência dos pedidos e reconvindo peticionando que se declare que a faixa é sua pertença.

Replicaram os AA. mantendo o alegado na petição e pugnando pela improcedência da reconvenção.

Treplicaram os RR. nada aditando de substancial.

O processo foi saneado tabelarmente e foram fixados os factos assentes e elaborada a base instrutória.
Instruído o processo e realizadas as pertinentes diligências de prova, incluindo perícia, houve lugar a julgamento com inspecção ao local e inquirição das testemunhas.
A final foram dadas as pertinentes respostas aos artigos da base instrutória, após o que foi proferida sentença que julgou a presente acção parcialmente procedente por provada e declarou que os AA. são os proprietários do prédio misto, composto de cultura arvense, vinha, árvores de fruto, juncal, eucaliptal, pinhal, casa de habitação, casa de arrecadação e adega, com a área total de 16 280 m2, sito em Póvoa de Além, estando a parte rústica inscrita na matriz sob o art. 25º, secção QQ e a parte urbana inscrita na matriz sob o art. 759º, freguesia de A.-dos-Cunhados, descrito na Conservatória do registo Predial de Torres Vedras sob o nº … a fls. … do Livro B-197, desanexado do nº … a fls. … do Livro B-69 e …. a fls. 138/vº, incluindo a faixa de terreno com 66 m2 que se encontra no interior do triângulo representado na planta de fls. 178 destes autos e cujos vértices são formados pelas letras A, B e C, planta e pontos que aqui se dão por reproduzidos, sendo os AA., assim, proprietários de tudo quanto existe a nascente da linha A-B referida na dita planta (até ao início da prédio situado a nascente e aqui não em causa).
Mais condenou os RR. a reconhecerem a propriedade dos AA. conforme declarada supra.
Condenou ainda os 2º e 3º RR. a procederem a expensas suas à demolição imediata das construções edificadas no prédio dos AA e referidas nos arts. 20º, 21º, 53º, 54º e 55º da p.i. e a proceder à restituição imediata aos AA. da faixa de terreno supra identificada.
No mais julgou o peticionado improcedente assim como totalmente improcedente a reconvenção.

Inconformado com a sentença, dela apelaram os AA., apresentando as seguintes conclusões:
1. O Tribunal a quo, ao condenar os 2° e 3° RR. a procederem a expensas suas à demolição imediata das construções edificadas no prédio dos A.A. e referidas nos arts. 20; 21; 53; 54 e 55 da p.i. e a proceder à restituição imediata aos A.A. da faixa de terreno identificada, praticou um acto inútil.
2. Sabia o Tribunal e os A.A., pelo menos desde 29 de Março de 2004, que o imóvel onde se integram as construções e os 66 m2 que os RR foram condenados a demolir e restituir, já não lhes pertence.
3. E no que aos AA. diz respeito, estes nada fizeram.
4. A presente acção, apenas e só, pode ter efeitos entre as partes, pois que a acção não foi registada na Conservatória do Registo Predial.
5. Os RR. não podem cumprir esta condenação, pois do imóvel, já não são proprietários, além de que a mesma, irá sempre esbarrar nos direitos terceiros, adquirentes do imóvel, e que nesta acção não são partes.
6. Deveria, assim o Tribunal "a quo" ter declarado a inutilidade superveniente da lide no que a este pedido diz respeito.
7. A sentença violou os arts. 3 n°1 e n°2; 271º n°l e 287º e) todos do C.P.Civil, devendo ser agora declarada a inutilidade superveniente da lide, quanto ao pedido de condenação dos 2º e 3º RR na demolição e restituição da área de 66 m2.

Foram produzidas contra-alegações que pugnaram pela manutenção da sentença nos termos que dela constam.

Corridos os Vistos legais,
Cumpre apreciar e decidir
Vistas as conclusões da alegação da recorrente, que, como é sabido, delimitam objectivamente o recurso, a questão que, desde logo importa apreciar e decidir é a de saber se no caso, face aos factos apurados e que não foram postos em causa, deve ser ou não declarada a inutilidade superveniente da lide, quanto ao pedido de condenação dos 2º e 3º RR na demolição e restituição da área de 66 m2 aos AA.

II – FACTOS PROVADOS
1. Os AA. são emigrantes na Alemanha, onde residem habitualmente (al. A da matéria de facto assente);
2. O prédio misto composto de cultura arvense, vinha, árvores de fruto, juncal, eucaliptal, pinhal, casa de habitação, casa de arrecadação e adega, com a área total de 16.280 m2, sito em Póvoa de Além, a parte rústica inscrita na matriz sob o artigo 25 secção QQ e a parte urbana inscrita na matriz sob o artigo 759 da freguesia de A-dos-Cunhados, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras sob o número … a fls. … do Livro B-197, desanexado do n.º … fls… v do Livro B-69 e 27 045 a fls. 138 v do Livro B-69, acha-se inscrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras, pela inscrição n.º …, a favor dos AA. (al. B da matéria de facto assente);
3. Prédio esse que os AA. adquiriram por escritura pública de compra e venda outorgada no 1º Cartório Notarial de Torres Vedras em 19 de Janeiro de 1977 e exarada de folhas 34 verso a folhas 36 verso do Livro B-58, em que são primeiros outorgantes Maria e outros, (1º outorgante) e pelos primeiros outorgantes foi dito que pela presente escritura e na qualidade em que outorgam e pelo preço de 200.000$00, que já receberam, vendem ao segundo outorgante, na qualidade em que intervém: Pelo preço de 170.000$00, um prédio misto constituído por casa de habitação com cinco divisões, casa de arrecadação, adega, terra de semeadura, vinha, árvores de fruto, juncal e pinhal, denominado “H…”, sito no Casal de Póvoa de Além, freguesia dita de A-dos-Cunhados, a confrontar do Norte com Lourenço dos Santos Crispim, do Nascente com Moisés Miranda, do Sul com herdeiros de T… e do Poente com D…, descrito na Conservatória do Registo Predial deste concelho sob parte dos números …, a fls. 80 verso do Livro B – 69 e …, a fls. 138 v.º do Livro B – 69, inscrito na matriz urbana respectiva sob o artigo 759, com o valor matricial de 4.860$00 e na matriz rústica respectiva sob o artigo 25 da Secção “QQ”, com o valor matricial de 32.220$00, sendo o valor matricial total de 37.080$00. Pelo segundo outorgante foi dito que aceita a presente venda. Pela terceira Outorgante foi dito que presta a sua outorga para inteira validade desta escritura (al. C da matéria de facto assente);
4. O prédio urbano sito em Póvoa de Além e constituído por lote de terreno para construção urbana com a área de 857 m2, a confrontar do Norte e Sul com caminho; de Nascente com JM…, de Poente com MJ…, inscrito na matriz sob o artigo 5487 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras sob o número 2681/920403 da freguesia de A-dos-Cunhados, desanexado do n.º 2061, acha-se registado através da inscrição G 2 – Ap. 01/20000710 a favor dos RR MM… e marido e da sociedade “J….” (al. D da matéria de facto assente);
5. O prédio urbano identificado na alínea anterior, foi adquirido por aqueles, mediante escritura pública de compra e venda outorgada no 2º Cartório Notarial de Torres Vedras em 21 de Junho de 2000 e exarada de folhas 67 a 68 do Livro de notas n.º 109-E, em que são primeiros outorgantes os aqui 1ºs RR., e segundos outorgantes os aqui 2ºs RR. e Pedro, que intervém na qualidade de sócio gerente e em representação da sociedade 3ª Ré, na qual, pelos primeiros outorgantes foi dito que pela presente escritura e pelo preço de 3.500.000$00, que já receberam, vendem à segunda outorgante e à sociedade representada pelo segundo outorgante, o seguinte: Prédio urbano composto de lote de terreno para construção com a área de 857 m2, sito no lugar de Póvoa d’Além, freguesia de A-dos-Cunhados, deste concelho, descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras, sob o número 2.681, da referida freguesia de A-dos-Cunhados, aí registado a favor dos vendedores, pela inscrição de aquisição G-1 e inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o artigo 5.487, com o valor patrimonial de 701.250$00. Pela segunda outorgante foi dito que aceita a venda, nos termos exarados. Assim o disseram e outorgaram. (al. E da matéria de facto assente);
6. O prédio urbano identificado na alínea anterior constitui actualmente um prédio distinto por ter sido desanexado em 3 de Abril de 1992 do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras sob o número 2601/920213 da freguesia de A-dos-Cunhados (al. F da matéria de facto assente);
7. A propriedade do referido prédio veio à titularidade dos RR por sucessão hereditária e partilha dos bens deixados por óbito de C, outorgada por escritura pública em 21 de Março de 1992, no 2º Cartório Notarial de Torres Vedras e exarada de fls. 54 v.º a 58 v.º, do Livro de notas número 121-A, bem como do documento complementar (al. G da matéria de facto assente);
8. A 3ª Ré, Lda”, tem sede na R…, acha-se matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Torres Vedras sob o número …, constando aí através da cota n.º 1 Ap. 12/870225, no que respeita a “Sócios e quotas” que são seus sócios A e J, cada um deles, com uma quota de 200.000$00, pertencendo a gerência a ambos os sócios; Pela cota n.º 2 Ap. 01/990514, acha-se registada a transmissão de quota de 200.000$00, em que figura como cessionário P e cedentes A e mulher. Pela cota 04 Av. 01 - Ap. 01/20000531, acha-se registada a cessação de funções do gerente A, por exoneração, em 23 de Junho de 1999 (al. H da matéria de facto assente);
9. Os prédios identificados nas alíneas B) e D), confrontam entre si, respectivamente, pelo lado Poente e Nascente (al. I da matéria de facto assente);
10. Os 1ºs RR. construiram um muro de vedação em cimento e tijolo, na parte confinante dos dois referidos prédios, com o comprimento de 56 metros, por 1 metro de altura e 12 cm de espessura, construção essa, que os AA. tiveram conhecimento nos primeiros dias de Julho de 1998 (al. J da matéria de facto assente);
11. A Câmara Municipal de Torres Vedras licenciou a obra (construção do referido muro) mediante o alvará de licença de construção n.º … (Processo n.º …) (al. L da matéria de facto assente);
12. Os 1ºs RR requereram em 20 de Outubro de 1998 a aprovação na Câmara Municipal de Torres Vedras de um projecto de construção de duas vivendas geminadas - Processo n.º …, a construir no prédio identificado nas anteriores als D) e F), o qual foi-lhes deferido tendo sido emitido o respectivo Alvará de Construção n.º … em seu nome, em 27-07-2000 (al. M da matéria de facto assente);
13. O referido Projecto de Construção tem como Técnico Responsável, A, Construtor n.º 936, pessoa já referida na supra alínea H) (al. N da matéria de facto assente);
14. Nos primeiros dias de Agosto de 2000, os RR Maria e a sociedade “J…”, por intermédio do seu empreiteiro A e seus trabalhadores, iniciaram os trabalhos de construção das mencionadas vivendas, procedendo à abertura dos caboucos (al. O da matéria de facto assente);
15. A estrema Norte/Sul entre os prédios identificados nas als. B) e D) estava delimitada por dois marcos:
- um a Norte, que ainda lá se encontra, colocado no ponto identificado pela letra A da planta cadastral junta a fls. 95 e planta do levantamento topográfico junta a fls. 178, cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos (art. 1º da base instrutória);
16. (…) e um outro a Sul, colocado no ponto assinalado pela letra B, das referidas planta cadastral e do levantamento topográfico (art. 2º da base instrutória);
17. (…) que entretanto desapareceu (art. 3º da base instrutória);
18. O ponto F da referida planta existe como estrema (art.ºs 4º e 5º da base instrutória);
19. O ponto F da planta corresponde ao final de um muro em alvenaria (art. 6º da base instrutória);
20. Os 1ºs RR construíram o muro identificado na al. J), com inicio a Norte no ponto correspondente ao marco ainda aí existente, (Ponto A da planta do levantamento topográfico) (art. 7º da base instrutória);
21. (…) construindo-o de Norte para Sul, em linha recta, de forma que no seu topo Sul o muro termina no ponto assinalado com a letra C da referida planta cadastral (art. 8º da base instrutória);
22. (…) situado a 3 metros para nascente do local onde se encontrava o marco identificado pela letra B da referida planta cadastral e do levantamento topográfico (art. 9º da base instrutória);
23. Com a construção do dito muro, os 1ºs RR ocuparam uma faixa de terreno do prédio referido em B), em forma de triângulo com uma área de 66 m2 (art. 10º da base instrutória);
24. (…) aproveitando a ausência dos AA., na Alemanha (art. 11º da base instrutória);
25. Nessa altura os AA., por intermédio do seu familiar e Solicitador F, contactaram o R J invocando que o referido muro estava a ser construído em terreno pertencente ao prédio identificado em B) (art. 12º da base instrutória);
26. (…) exibindo até cópia cadastral com a localização exacta dos prédios referidos nas als. B) e D) com a delimitação das estremas (art. 13º da base instrutória);
27. (…) e advertiu o mesmo Réu que não deveria abrir os caboucos e construir o referido muro (art. 14º da base instrutória);
28. A construção referida na al. M) ocupa parte da faixa de terreno do prédio referido em B), designadamente, na forma de triângulo com uma área de 66 m2, descrita no art. 10º (art. 18º da base instrutória);
29. Os AA., de imediato, contactaram o Técnico A, invocando que eram donos da aludida faixa de terreno, em forma de triângulo (art. 19º da base instrutória);
30. (…) e manifestaram-lhe a sua oposição à construção das moradias naquele local (art. 20º da base instrutória);
31. (…) tendo-lhes aquele respondido que os AA. tinham muito terreno e que não precisavam daqueles metros (art. 21º da base instrutória);
32. A parede nascente das referidas vivendas está implantada na faixa de terreno em forma de triângulo, descrito no ponto 10º (art. 35º da base instrutória);
33. (…) e corresponde à linha DE da planta do levantamento topográfico junta a fls. 178 (art. 36º da base instrutória);
34. (…) com o comprimento de 13, 80 metros (art. 37º da base instrutória);
35. (…) e que se encontra apenas a uma distância de 1,5 metros do muro referido na al. J) e paralelamente a este (art. 38º da base instrutória);
36. Desde 19 de Janeiro de 1977 e até Julho de 1998 os AA. e, antes destes, a N e, desde 22 de Maio de 1976, os herdeiros desta, sempre utilizaram a parte construída do prédio descrito em B), como arrecadação (art. 39º da base instrutória);
37. (…) aí guardando algumas velhas alfaias agrícolas (art. 40º da base instrutória);
38. (…) e colocando lenha, palha, e outros produtos agrícolas no terreno do seu logradouro (art. 41º da base instrutória);
39. (…) incluindo a faixa de terreno em forma de triângulo descrita no ponto 10º (art. 42º da base instrutória);
40. Os AA. mandaram proceder a limpezas e fresagem do dito prédio (art. 43º da base instrutória);
41. (…) incluindo na mencionada faixa de terreno em forma de triângulo (art. 44º da base instrutória);
42. (…) e emprestaram a António… e, anteriormente, ao pai deste, o terreno arável do referido prédio misto (art. 45º da base instrutória);
43. (…) incluindo, também, a referida faixa de terreno em forma de triângulo (art. 46º da base instrutória);
44. (…) que este cultivou, semeando batatas (art. 47º da base instrutória);
45. (…) plantando couves e outros produtos agrícolas (art. 48º da base instrutória);
46. (…) aí colocando alfaias agrícolas e outros objectos (art. 49º da base instrutória);
47. (…) limpando e cuidando das respectivas regueiras (art. 50º da base instrutória);
48. (…) procedendo à limpeza das ervas daninhas (art. 51º da base instrutória);
49. (…) e praticando todos esses actos em nome dos AA. e dos anteriores donos (art. 52º da base instrutória);
50. (…) sem a oposição de quem quer que fosse (art. 53º da base instrutória);
51. (…) com o conhecimento da generalidade das pessoas de Póvoa de Além (art. 54º da base instrutória);
52. (…) suportando as inerentes despesas à conservação e manutenção do dito prédio (art. 55º da base instrutória);
53. (…) ininterruptamente (art. 56º da base instrutória);
54. (…) incluindo a faixa de terreno em forma de triângulo (art. 57º da base instrutória);
55. (…) na plena convicção de serem os seus donos (art. 58º da base instrutória);
56. Desde Julho de 1998 até 21 de Junho de 2000, os AA., em consequência da conduta dos 1ºs RR., estiveram impedidos de dispor e utilizar para os fins a que se destina, o prédio identificado na al. B), em toda a sua área (art. 59º da base instrutória);
57. (…) designadamente, para efeitos de edificação e acessos ao seu logradouro, incluindo a referida faixa de 66 m2 (art. 60º da base instrutória);
58. Os AA. submeteram à Câmara Municipal um pedido de licenciamento de construção de moradia em 1997 e que no decurso do processo requereram a substituição da implantação da construção para local diverso do inicialmente proposto (art. 62º da base instrutória);
59. Os segundos e terceiros RR com a construção de parte de uma das suas vivendas também impediram os AA. de utilizar para os fins a que se destina, a totalidade da área do prédio indicado em B), designadamente, para efeitos de edificação e acessos ao seu logradouro (art. 65º da base instrutória);
60. A ocupação da faixa de terreno em forma de triângulo diminui a capacidade edificativa do remanescente do prédio (art. 66º da base instrutória);
61. Na parte mais estreita entre o muro e a construção existente no terreno dos AA. há 1,65 metros de espaço livre (art. 68º da base instrutória);
62. O muro existente foi construído no alinhamento do marco existente no lado norte dos prédios descritos nas als. B) e D) e de uma pedra enterrada existente a sul (art. 73º da base instrutória);
63. O alvará para licença de construção de moradia bifamiliar no terreno dos RR. é posterior á data que consta da cópia da sentença junta a fls. 117 e segs. (art. 81º da base instrutória).

III - O DIREITO
Na presente acção os AA. vieram pedir, além do mais, que fosse declarado que os AA. são proprietários da faixa e terreno sobre a qual os RR realizaram construções e que o prédio tem a configuração constante da planta cadastral junta aos autos pelos AA., que inclui a referida faixa de terreno sobre a qual foram efectuadas as edificações em causa. Mais pedem que os RR sejam condenados a proceder a expensas suas à demolição de tais construções.
Os RR., não colocando em causa a matéria de facto dada por assente, restringem o recurso ao pedido deduzido pelos AA., considerado parcialmente procedente, de acordo com o qual os RR foram condenados a procederem, a expensas suas, à demolição imediata das construções edificadas no prédio dos AA e a proceder à restituição da faixa de terreno identificada, por considerarem que, nesta parte, existe inutilidade superveniente da lide.
Argumentam, para tanto que, em 29 de Março de 2004, portanto já na pendência desta acção, os RR vieram juntar documentação bastante que demonstra que os RR já não são proprietários do prédio no qual se integra a área de 66 m2, que os AA. reclamam e onde se encontram as construções que os RR foram condenados a demolir.
Porém, não ficou provado que a área de 66 m2 tivesse feito parte integrante do terreno dos RR. Ao invés, o que se provou foi que a faixa de terreno em causa era parte integrante do terreno dos AA., pelo que aqueles terão construído em terreno alheio.
É, por isso, irrelevante para os autos que os RR tenham ou não alienado o seu terreno, na medida em que não está em causa o prédio de que eram proprietários, e do qual podiam livremente dispor, como, ao que consta, dispuseram.
Não se discute aqui quer a titularidade do prédio dos AA., quer a do prédio dos RR., mas sim a definição dos limites das respectivas propriedades: os AA afirmam que a estrema é num local e os RR. afirmam que é noutro.
Mas, como ficou provado, a configuração do terreno dos AA. coincide com a planta cadastral junta aos autos, dele fazendo parte a faixa de terreno em questão, com 66 m2.
É portanto indiferente para a solução do caso, que o prédio que confina com o dos AA, e que foi propriedade dos RR., tenha ou não sido alienado, certo como é que foram os RR. que levaram a cabo, na faixa de terreno que lhes não pertencia, na faixa de terreno propriedade dos AA, as construções cuja demolição foi ordenada a expensas suas.
Não se vê como possam os RR estar impedidos de cumprir a condenação, com fundamento no facto de já não serem proprietários do terreno confinante com o dos AA, ou serem afectados direitos de terceiros.
É que esses terceiros são estranhos à presente lide processual: não foram eles que edificaram as construções a demolir, nem são proprietários do terreno em que tais construções foram erigidas. Esse terreno é dos AA e são eles que pretendem seja reconhecido o seu direito, bem como a condenação dos RR na demolição das edificações que aí foram implantadas pelos RR, à custa destes.

2. Quanto ao registo
Argumentam ainda os Apelantes que a presente acção se encontra sujeita a registo pelo que não tendo sido registada não é oponível a terceiros, tendo apenas eficácia inter partes.
De acordo com o Código do Registo Predial vigente – aprovado pelo DL nº 224/84, de 6 de Julho a finalidade do registo predial é a de dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário (art. 1º), elencando-se, no seu art. 2º, e ao longo de várias alíneas, os factos sujeitos a registo, destacando-se, logo à cabeça, como sujeitos a registo “Os factos jurídicos que determinem a constituição, o reconhecimento, a aquisição ou a modificação dos direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, superfície ou servidão” (al. a)).
E sobre a epígrafe “Acções e decisões sujeitas a registo”, consagrou-se, no seu art. 3º, o seguinte: “1. Estão igualmente sujeitas a registo:
a) As acções que tenham por fim, principal ou acessório, o reconhecimento, a constituição, a modificação ou extinção de algum dos direitos referidos no artigo anterior;
b) As acções que tenham por fim, principal ou acessório, a reforma, a declaração de nulidade ou a anulação de um registo ou do seu cancelamento;
c) As decisões finais das acções referidas nas alíneas anteriores, logo que transitem em julgado.
“2. As acções sujeitas a registo não terão seguimento após os articulados sem se comprovar a sua inscrição, salvo se o registo depender da respectiva procedência.”.
Porém, e como refere a sentença recorrida, na esteira de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça firmada e que aí se cita (1), “…embora o prédio tenha que ser identificado com elementos que o distingam e caracterizem, a verdade, porém, é que essa identificação mínima não abrange uma descrição física rigorosa e pormenorizada do imóvel. O registo predial não tem como finalidade garantir os elementos de identificação do prédio”.
De acordo com a referida jurisprudência, a presunção resultante da inscrição da aquisição do direito não abrange a área, limites, confrontações dos prédios descritos.
Por isso, a presente acção não estava sujeita a registo na medida em que, como se afirma na sentença recorrida, “apenas factos jurídicos e acções e decisões, que não propriamente direitos, podem/devem ser objecto de registo predial, sendo ainda que tais factos registando "a se" terão que constar de documentos legalmente comprovativos. O que não sucede com as áreas e confrontações dos imóveis descritos, cuja exactidão não passa pelo controlo (de legalidade) do conservador o qual se limita a assegurar (e exigir), nos concelhos em que vigora o cadastro geométrico obrigatório, que a descrição do prédio venha a corresponder à inscrição matricial no mais aceitando/confiando nas declarações dos respectivos interessados”.

3. Do exposto resulta, ainda, que, contrariamente ao defendido pelos Apelantes, a sentença recorrida vincula igualmente terceiros, nomeadamente o adquirente do prédio confinante, atendendo ao disposto no art.271º, nº 3 do CPC.
Efectivamente deriva do estatuído nesse segmento normativo que a sentença “produz efeitos em relação ao adquirente, ainda que este não intervenha no processo, excepto no caso de a acção estar sujeita a registo e o adquirente registar a transmissão antes de feito o registo da acção”.
Mesmo em casos de transmissão do direito substantivo, essa situação não provoca efeitos imediatos na legitimidade processual. Ao invés, não sendo promovida a habilitação do cessionário do direito que é objecto o litígio judicial, o transmitente continua a deter legitimidade e a sentença produzirá efeitos na esfera jurídica do adquirente (2).
Só assim não seria se a presente acção estivesse sujeita a registo (e não está), se as construções a demolir tivessem sido efectuadas em terreno entretanto alienado (o que não se verifica) e, por último, se esse adquirente tivesse registado a (hipotética) aquisição antes do registo da acção (caso este fosse exigível).
Não é este o caso.
Não há aqui interesses de terceiros a proteger.
Não existiu, nem existe, portanto, qualquer fundamento para que se declare a inutilidade superveniente da lide, nem o tribunal praticou um acto inútil, ao condenar os RR a procederem a expensas suas à demolição das construções edificadas no prédio dos AA e identificadas nos autos, bem como a restituírem aos AA. a faixa de terreno que a estes pertence.
Destarte, improcedem as conclusões do recurso, impondo-se a confirmação da sentença recorrida.

IV – DECISÃO
Termos em que, julgando improcedente a apelação, confirma-se a sentença recorrida.
Custas pelos Apelantes.
Lisboa, 9 de Março de 2006.
(Fátima Galante)
(Ferreira Lopes)
(Manuel Gonçalves)



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1.-O Ac. STJ de 08.06.2000, Revista nº 399/00, 7ª Secção, "Sumários" 2000, pág. 217; Ac. STJ de 10.01.2002, Revista nº 3949/01, 7ª Secção, "Sumários" 2002, pág. 28; Ac. STJ de 24.01.2002, Revista nº 2672/01, 2ª Secção, "Sumários" 2002, pág. 40; Ac. STJ de 04.07.2002, Agravo nº 2014/02, 7ª Secção, "Sumários" 2002, pág. 249 (in www.stj.pt).

2.-Lebre de Freitas, Introdução do Processo Civil, 996, pag. 62.