Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
10669/15.6T8LSB-A.L1-6
Relator: CARLOS M. G. DE MELO MARINHO
Descritores: ACÇÃO EXECUTIVA
CAUSA DE PEDIR
EMBARGOS DE EXECUTADO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/05/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I.– A causa de pedir da acção executiva – com o sentido emergente do n.º 4 do art. 581.º Código de Processo Civil de facto(s) jurídico(s) do qual procede o pedido – corresponde ao título executivo e o único pedido em discussão, aí, é o de cobrança coerciva de quantia pecuniária determinada. São estes os exclusivos pedido e causa de pedir em apreço;

II.– Já no excerto declarativo de embargos de executado, o Embargante pede que não se reconheça força executiva ao título. Nesse quadro, para concretizar a sustentação da sua pretensão, aquele sujeito tem que invocar factos susceptíveis de abalar a vis executiva do documento dado à execução. São estes o pedido e a causa de pedir enxertados em sede declarativa;

III.– Ao defender-se nos embargos, o Embargado não acrescenta, pois, por razões técnicas e lógicas, qualquer novo pedido e nova causa de pedir. Tudo o que se discute é a sua pretensão executiva e respectiva sustentação (o título) e, de forma concorrente, o pedido e causa de pedir dos embargos invocados pelo Embargante;

IV.– Neste contexto processual, o Embargado, ao defender-se, ou seja, ao explicar a emergência do título e as suas razões de sustentação, não está a acrescentar qualquer causa de pedir antes está, apenas, a defender-se. É assim até porque não há pedido novo a fundar nem algo mais se discute que a causa de pedir da execução que é o título que se quer executar.

SUMÁRIO: (elaborado pelo relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 6.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.


I.–RELATÓRIO:                             


S..., com os sinais identificativos constantes dos autos, deduziu embargos de executado contra P..., neles também melhor identificado.

O Tribunal "a quo" descreveu os factos processuais relevantes, ocorridos até à sentença impugnada, nos seguintes termos:
S... veio, por apenso à execução para pagamento de quantia certa contra si instaurada por P..., deduzir embargos de executado nos quais peticiona a extinção da execução, alegando em síntese para o efeito que:
a)- Está a correr termos inquérito penal sobre a falsidade do título executivo pelo que a execução deverá ser suspensa por causa prejudicial;
b)- Desde 1997 o exequente, neto da executada, trata, por via da procuração que lhe foi outorgada pela executada na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito do seu marido, dos assuntos relativos aos prédios da herança, assinando a executada tudo o que seu neto lhe pedia, o qual movimentava a sua conta com autorização concedida pela executada;
c)- Em 2011 a executada residia em Santa Clara a Velha, sendo que na data em que foi supostamente exarada a escritura dada á execução a executada não compareceu nem esteve presente no cartório Notarial, tendo a executada a ideia de que por essa altura o seu neto compareceu em Santa Clara a Velha para assinar papeis muito urgentes, sendo certo que a assinatura atribuída á executada na escritura encontra-se no verso da folha, e o texto na face da folha da escritura, tendo sido exarada sem que na folha onde foi aposta existisse texto que dissesse que dizia respeito a documento notarial.
d)- O exequente pretende a usar a falsa confissão de divida da executada para, após o falecimento desta, puder apresenta-la como crédito seu sobre a herança da executada de que é única herdeira a mãe do exequente, com o propósito de vir a ficar com os prédios da herança de sua avó.
e)- Mas a partilha da herança de o seu avô obrigou-o a mudar de planos, instaurando a presente execução, pois a executada e a filha (mãe do exequente) comunicaram-lhe que por escritura pública tinham procedido a tal partilha e que por terem findado os poderes de administração da executada, na qualidade de cabeça de casal, sobre a herança, o contrato de arrendamento que a executada naquela qualidade havia assinado com o exequente e que teve por objeto uma parte de um dos prédios (2 andares) caducou, devendo o exequente restituir-lhes os dois andares.
f)- O exequente pretende ficar com a quota da executada conforme partilha, nos prédios;
g)- A Sra. Notária que exarou a escritura foi afastada do exercício das funções de notária por deliberação do Conselho de Notariado de 13.12.2010, pelo que nada data da escritura já não tinha competência para exercer;
h)- A alegada confissão de que receber por empréstimo a quantia de € 174.000,00 não dispensava a celebração da escritura pública para titular esse empréstimo, atento o valor do mútuo.
i)- Acresce que a escritura não refere a quem foi lido e explicado o seu conteúdo, não podendo valer como documento autêntico para prova da confissão de divida.
j)- O exequente nunca emprestou á executada a quantia de €174.000,00 referida na escritura;
k)- O exequente retirou quantias da conta bancária da executada, de valor superior a €40.000,00, as quais não se destinaram ao pagamento de empréstimo mas antes a reembolsá-lo do valor de €36.600,00 que havia pago numa acção executiva em que era executada a mãe;
l)- A quantia referida na escritura não vence juros.
Recebidos os embargos, o exequente apresentou contestação na qual pugna pela improcedência dos embargos e pela condenação da executada como litigante de má-fé em multa e indemnização a favor do exequente, em quantias a fixar em posterior fase processual.
Para tanto, opõe-se à suspensão da instância executiva fundada em existência de inquérito penal, e impugna a alegação da executada, reafirmando que esta esteve presente no Cartório Notarial para celebração da escritura dada á execução, onde celebrou simultaneamente uma procuração exarada com termo de autenticação e lida na sua presença, sendo que o facto de as assinaturas constarem do verso da folha resulta do facto de as 25 linhas de cada face (limite de linhas imposto para os documentos notariais) estarem ocupadas por texto; em 1997 a executada ficou gravemente doente, tendo estado internada vários meses, e por ser proprietária do imóvel em Lisboa e ter diversos inquilinos, passou a procuração junta á p.i. de embargos a favor do exequente para que este pudesse tratar dos assuntos referentes às rendas e demais assuntos relacionados com os inquilinos, sendo que os termos da procuração foram redigidos pelo advogado da executada, tendo também na sequência da doença da executada o exequente ficado com acesso às contas daquela, tratando também de tudo o que a executada, sua avó, precisava; o exequente liquidou muitas dívidas contraídas pela mãe do exequente garantidas por penhoras sobre o imóvel da avó/executada; quando a executada e filha lhe comunicaram a partilha da herança e a cessação do contrato de arrendamento, o exequente apercebeu-se de que não tencionavam proceder ao pagamento das dívidas para com ele e intentou as execuções; na data da celebração da escritura a Sra. Notária encontrava-se em pleno exercício de funções, sendo o ato válido, conforme parecer emitido pela Ordem dos Notários; a confissão de divida foi feita a pedido da executada, tendo o advogado desta estado também presente na escritura, cujo conteúdo foi lido e explicado á executada; o motivo da realização da escritura foi precisamente para formalizar o empréstimo e determinar as condições de pagamento, e a executada tem perfeito conhecimento de que esteve presente na escritura e lhe foi lido e explicado o conteúdo; o exequente emprestou ao longo dos anos quer á executada quer á filha (mãe do exequente) diversas quantias monetárias, que no caso da executada S..., perfizeram uma quantia superior a €174.000,00, tendo todavia ambas as partes fixado o valor em €174.000,00; tal divida teve origem no negocio de restauração que foi exercido pela filha da executada, o qual gerou muitas dividas, garantidas por avais e outras garantias pessoais prestados pela mesma e pela executada, das quais resultaram penhoras sobre o imóvel da Rua do N..., o qual garantia dividas de €70.000,00, dividas que foram pagas pelo exequente ao longo da década de 2000, tal como os respectivos juros, custas judiciais, etc, para que as penhoras fossem levantadas e fosse evitada a venda do imóvel, pagando também dividas por acordo, entre as quais uma de €21.150,00 de que era credora a Caixa Geral de Depósitos, pois quer a executada quer a filha não tinham condições económicas para pagar tais dividas; exequente e executada acordaram, após a escritura, que aquele fizesse levantamentos da conta da executada para pagamento da divida desta ao exequente, tendo o exequente levantado no total o valor de €40.000,00 que no requerimento executivo deduziu ao valor indicado na escritura; em 2012 o imóvel necessitou de obras, tendo a executada decidido que seriam realizadas através das entradas em dinheiro com o valor das rendas, tendo o exequente procedido ao pagamento de parte das obras, conforme instruções da sua avó, através da sua conta bancária, sendo que entre Março e Dezembro de 2012 foi despendido em obras uma quantia de cerca de €21.000,00, dos quais só €7000,00 foram pagos da conta da executada e os restantes pelo exequente; em Janeiro de 2014 a executada cancelou a autorização para que o exequente processe ao levantamento de quaisquer quantias da sua conta bancária; o empréstimo foi feito sem ser devido o pagamento de quaisquer juros desde que fosse pago pontualmente.
Foi, por despacho, considerado prejudicado o pedido de suspensão da instância executiva com base na existência de inquérito penal, face á suspensão da instância executiva entretanto decretada na sequência de prestação de caução.
Foi elaborado despacho saneador, fixados o objecto do litígio e os temas da prova.

Foram realizadas a instrução, a discussão e o julgamento da causa, tendo sido proferida sentença que decretou:
Pelo exposto, julgo os presentes embargos de executado parcialmente procedentes, declarando extinta a execução na parte tocante aos juros de mora peticionados no requerimento executivo (vencidos e vincendos), e determinando o prosseguimento da mesma quanto ao demais peticionado.

É dessa sentença que vem o presente recurso interposto por S..., que alegou e apresentou as seguintes conclusões e pedido:
1. A sentença recorrida decidiu os embargos com base numa relação material diferente da que consta no título executivo e foi invocada como causa de pedir na acção executiva.
Na verdade,
2. No requerimento executivo que apresentou, em 08-04-2015, o exequente alega como causa de pedir um empréstimo de 174.000,00€ que teria feito, em 25-02-2011, à executada e a seu pedido e que esta se comprometeu a pagar esse empréstimo, no prazo de um ano a contar de 25-02-2011.
3. E juntou, como título executivo, uma escritura de confissão de dívida datada, de 25 de Fevereiro de 2011, em que a executada, alegadamente, se confessou devedora ao exequente "da quantia de cento e setenta e quatro mil euros, que dele recebeu por empréstimo, pelo prazo de um ano, a contar de hoje.".
4. Na contestação de embargos apresentada, em 29-03-2016, veio dizer que a importância de 174.000,00€ era o valor fixado por acordo de várias dívidas da executada que ele exequente foi pagando ao longo da década de 2000 – vide arts. 22.º, 60.º, 62.º e 64.º da contestação dos embargos.
5. E que, após a celebração da escritura de confissão de dívida, ele Exequente e Executada teriam acordado que ele Exequente iria proceder a levantamentos mensais da conta bancária da Executada para iniciar o pagamento em prestações do valor em dívida para com ele – vide art. 66.º da contestação dos embargos.
6. É assim manifesto que o exequente alterou, de forma unilateral e sem o acordo da executada, a causa de pedir da acção executiva e os factos que a integram,
7. Pois de um empréstimo da quantia de 174.000,00€ que ele teria feito à executada, em 25-02-2011, afirmado no título e reafirmado no requerimento executivo, na contestação de embargos alega, como causa justificativa da dívida de 174.000,00€, o pagamento de dívidas da executada que o exequente teria feito, ao longo da década de 2000.
8. E se é indiscutível que, por aplicação do disposto no n.º 2 do art. 358.º do Código Civil, "A confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária ou a quem a represente, tem força probatória plena. ".
9. Também não é menos certo que a prova plena de "empréstimo de 174.000,00€" resultante de confissão extrajudicial feita em escritura é contrariada e "destruída" pela prova plena resultante da confissão judicial que o próprio exequente faz, na respectiva contestação de embargos, de 29-03-2016, ao declarar aí que a quantia de 174.000,00€ correspondia ao somatório "fixado por acordo" de várias dívidas da executada que o exequente teria pago, ao longo da década de 2000 – vide arts. 22.º, 60.º, 62.º e 64.º da contestação de embargos.
10. Uma vez que a confissão do exequente, na contestação de embargos, de 29-03-2016, é posterior à escritura, de 25-02-2011, e, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 358.º do Código Civil, "A confissão judicial escrita tem força probatória plena contra o confitente.".
11. E esses pagamentos de dívidas não podem ser considerados, como integradores de empréstimo, no sentido comum, (n)uma situação equivalente á que se verifica, por exemplo, no caso dos contratos de crédito ao consumo (o mutuário não recebe o dinheiro, sendo tal dinheiro entregue ao fornecedor do bem em beneficio do executado, facto que não retira á situação o carácter de empréstimo)." – vide 4.º parágrafo de fls 28 do ficheiro PDF que contém a sentença recorrida.
12. Pois o pagamento de dívida por terceiro, que não o devedor, é uma situação jurídica distinta e que nada tem a ver com um contrato de crédito ao consumo em que a instituição de crédito entrega ao fornecedor do bem ou do serviço o valor mutuado ao consumidor, 13. O que ocorre apenas numa única modalidade de contrato de crédito ao consumo que a alínea o) do art. 4.º do Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de Junho, designa, como contrato de crédito coligado.
14. E o contrato de crédito coligado apenas é legalmente admissível se ambos os contratos (o de crédito e o de compra e venda ou de prestação de serviços) constituírem objectivamente uma unidade económica .
15. No pagamento de dívidas, por terceiro, o terceiro que cumpre a obrigação não "empresta" o valor da dívida ao devedor.
16. Dado que, no pagamento de dívida por terceiro, não há qualquer mútuo ou concessão de crédito ao devedor, mas sim o cumprimento de uma obrigação por terceiro interessado ou não no cumprimento dessa obrigação – vide art. 767.º do Código Civil.
17. Podendo o terceiro que cumpre a obrigação ficar ou não sub-rogado nos direitos do credor, conforme se verificarem ou não os requisitos da sub-rogação previstos no art. 589.º e segs do Código Civil.
18. Por isso, o pagamento de dívidas do devedor por terceiro não pode ser, juridicamente, considerado, como um empréstimo que o terceiro faz ao devedor.
19. Ao ter considerado e qualificado, como empréstimos, os alegados pagamentos de dívidas da executada que o exequente diz ter feito ao longo da década de 2000, a sentença recorrida violou a norma do art. 1142.º do Código Civil que estabelece os requisitos essenciais do contrato de mútuo.
20. E bem assim a norma do n.º 1 do art. 767.º também do Código Civil que regula o pagamento de dívida por terceiro, como uma forma de cumprimento da obrigação e não como um empréstimo/mútuo.
21. E ao ter aceite e decidido com base na alteração da causa de pedir efectuada, pelo exequente, de forma unilateral e sem que a executada tivesse dado para tal o respectivo acordo, a sentença recorrida incorreu na violação da norma da n.º 1 do art. 265.º do CPC.
22. Por isso, a execução deve ser julgada extinta, por improcedente, e não deve prosseguir quanto ao demais peticionado no requerimento executivo, isto é, quanto ao pagamento da quantia de 134.000,00€,
23. Dado que o remanescente da quantia de 134.000,00€ não é o valor de empréstimo que tivesse sido feito à executada, em 25-02-2011, mas seria sim e alegadamento parte do "somatório" de dívidas da executada que o exequente teria pago ao longo da década de 2000.
Por mera cautela e sem prescindir,
24. Caso se admita a alteração da causa de pedir da execução para a de "pagamento de dívidas" da executada que o exequente alega ter feito na década de 2000, então a execução apenas deve prosseguir em relação ao valor das dívidas da executada de que exista prova nos autos de que foi o exequente que as pagou.
25. Pois, por força e em aplicação do disposto no n.º 1 do art. 342.º do Código Civil, cabe ao exequente demonstrar e comprovar quais as dívidas da executada, cujo pagamento foi por ele efectuado.
26. E embora a emissão de cheques pelo exequente sobre contas por ele tituladas, para pagamento de dívidas da executada, não demonstre, necessariamente e sem mais, que, de facto, tenha sido o exequente a suportar, no respectivo património, o sacrifício de tais pagamentos,
27. Uma vez que, de acordo com os Factos Provados sob os n.ºs 6 e 7, "6- A confiança que a executada depositava no exequente permitiu a este último aceder e movimentar a única conta bancária de que a executada foi e é única titular na agência do Calhariz, em Lisboa, da Caixa Geral de Depósitos com o n.º 2...." e "7 - Até ao início de Março de 2011, o exequente fazia levantamentos de dinheiro da referida conta bancária da executada, através de caderneta e/ou de cartão multibanco que tinha em seu poder e cujos números secretos sabia.",
28. E que há levantamentos de valores elevados, na conta da executada, e transferências feitas dessa mesma conta para o exequente, conforme melhor se discrimina e especifica na alegação do presente recurso que aqui se dá como reproduzida, que, no mínimo, indiciam que o pagamento de 21.150,00€ que o exequente fez, em 09-07-2010, à Caixa Económica Montepio Geral já tinha sido, por ele reembolsado, quando, em 25-02-2011, foi feita a escritura de confissão de dívida.
29. Para determinar quais as dívidas da executada que o exequente pagou, apenas poderão ser considerados os pagamentos que o exequente comprovou ter feito, através de documentos que o mesmo juntou aos autos com o requerimento que apresentou, em 23-01-2017, com a Referência Citius 2.....
30. Assim, a soma dos pagamentos de dívidas da executada, que o exequente efectuou ao longo da década de 2000 e que o mesmo comprovou ter feito, perfaz o total de 93.957,50€, dando-se aqui por reproduzidos os credores, valores, datas de pagamento e documentos comprovativos que já se especificaram e discriminaram na alegação do presente recurso.
31. No entanto, há disparidade entre os valores que a sentença recorrida considera que o exequente levantou da conta bancária da executada, respectivamente, no facto 27 e no facto 58.
Mas, além de tal disparidade,
32. O total dos valores que o exequente levantou da conta bancária da executada, após esta última lhe ter conferido autorização para a movimentar, a partir de 07-03-2011 e até 09-01-2014 – vide Facto Provado sob o n.º 8 – foi superior a qualquer dos valores indicados nos factos 27 e 58.
33. Pois esses valores perfazem o total de 64.050,00€, sendo, em 2011, no valor de 14.000,00€, em 2012, no valor de 27.650,00€ e, em 2013, no valor de 22.400,00€ - vide 1.º requerimento que a executada apresentou, em 07-12-2016, com a Ref.ª Citius 24308877 e os Docs. 7, 8 e 9 que a executada juntou com o 3.º requerimento que apresentou, em 07-12-2016, com a Ref.ª Citius 24309506.
Por outra parte,
34. Na acção executiva movida pelo exequente contra sua mãe, a correr termos na Comarca de Lisboa, Juízo de Execução de Lisboa-Juiz 3, sob o Proc. 4....., foi aí alegado, pela mãe do exequente, em sede de embargos de executado e em conformidade com o que a aqui executada já alegara, no art. 65.º da respectiva p.i. de embargos de executado, que o valor de 36.600,00€ já foi pago ao exequente, através dos levantamentos que o exequente fez, em 2012 e 2013, na conta bancária da aqui executada sua avó, e que totalizaram mais de 47.000,00€ - vide Facto Provado sob o n.º 27.
35. Assim, restam 27.450,00€ (64.050,00€ - 36.600,00€) para deduzir no total de 93.957,50€ das dívidas da executada pagas pelo exequente , ao longo da década de 2000.
36. Pelo que, a admitir-se a alteração da causa de pedir da execução movida contra a ora recorrente, a dita execução apenas deve prosseguir ou pelo valor 66.507,50€, que é a diferença entre o total das dívidas da executada pagas pelo exequente (93.957,50€) e o que sobeja (27.450,00€) da dedução da dívida da mãe do exequente nos levantamentos directos que o mesmo fez na conta bancária da aqui executada, entre 2011 e 2013 (64.050,00€ - 36.600,00€ = 27.450,00€).
37. Ou então pelo valor de 29.907,50€, caso se considere, por via da decisão do presente recurso, que o total de 64.050,00€ correspondente à soma dos levantamentos que o exequente fez na conta bancária da aqui executada sua avó, a partir de 07-03-2011 e até 09-01-2014, deve ser deduzido, no valor das dívidas da executada, pela totalidade (93.957,50€ - 64.050,00€ = 29.907,50€).
Ainda por cautela.
38. A sentença recorrida indica como fundamento da convicção da decisão da matéria de facto, que abrange 64 factos provados, todos os meios de prova admitidos e produzidos no processo, a saber prova por documentos, prova pericial, declarações de parte de exequente e executada e depoimentos das testemunhas.
39. Porém, com excepção dos factos relativos à questão da falsidade da escritura de confissão de dívida, a sentença recorrida não especifica, em relação aos demais factos que deu como provados, quais os concretos meios de prova que serviram de fundamento à convicção para os dar como provados.
40. E tal é, particularmente, notório com a prova documental, pois aí a sentença recorrida limita-se a enumerar todos os documentos que foram admitidos nos autos, como meios de prova, e que ultrapassam a centena, mas não especifica, em relação a qualquer dos 64 factos dados como provados, qual o concreto ou concretos documentos que serviram de fundamento para a prova determinado facto ou grupo de factos.
41. Esta "técnica" de fundamentar a decisão da matéria de facto, salvo melhor entendimento, viola a norma do n.º 4 do art. 607.º do CPC, dado que não permite sindicar se determinado facto ou grupo de factos deve ou não ser havido como provado, uma vez que não há referência ao concreto ou concretos meios de prova que terão sido decisivos para a convicção do juiz os dar como provados.
42. Pois não são as partes que terão de fazer um exercício de advinhação para fazer suposições sobre se este ou aquele documento ou se aquele outro meio de prova poderá ou não ter servido à convicção do juiz para o dar como provado.
Por outro lado,
43. Os factos provados do n.º 38 ao n.º 62 são uma "cópia transposta" da versão do exequente, como se comprova pelo confronto feito na alegação do recurso, entre o teor de cada um dos factos dados como provados, desde o n.º 38 até ao n.º 62, e o correspondente artigo da contestação de embargos do executado.
44. E o dar-se como provada a versão factual do exequente, sem o devido suporte nos meios de prova produzidos, viola a norma do n.º 1 do art. 342.º do Código Civil que faz recair sobre aquele que invoca um direito o ónus de provar os factos constitutivos do direito alegado.
45. Pois sobre os factos que a sentença recorrida deu como provados sob os n.ºs 38 a 62.º não incidiu qualquer prova, a não ser a narrativa/alegação que o exequente deles faz na respectiva contestação de embargos, secundada, em relação a alguns desses factos, que não a todos, pelas declarações de parte do exequente,
46. Ou então os depoimentos testemunhais que sobre eles foram prestados não referiram ou afloraram aspectos ou elementos de facto que constam desses mesmos factos dados como provados.
47. E viola também o princípio da igualdade das partes consagrado no art. 4.º do CPC, na medida em que, ao dar como provada a "versão" factual do exequente, cria-se, objectivamente, uma situação de desvantagem contra a parte contrária.
48. Assim, tendo presente o que consta dos Factos Provados sob os n.ºs 38 e 39 que reproduzem o alegado pelo exequente, nos arts. 29.º e 30.º da respectiva contestação de embargos, importa realçar o seguinte.
49. No depoimento da testemunha advogado Dr. M... C... não consta que a escritura de confissão de dívida tenha sido realizada a pedido da executada. Esta testemunha, no respectivo depoimento, limitou-se a dizer que esteve presente na escritura, tendo-se escusado a esclarecer, sob alegação de sigilo profissional, a pedido de que parte terá estado presente na escritura.
50. Em termos objectivos e salvo o devido respeito e melhor opinião, o depoimento da testemunha advogado Dr. M... C... não merece credibilidade pelas seguintes razões.
51. Em primeiro lugar, declarou ter "uma relação de amizade e profissional" com ambas as partes o que, objectivamente, constitui uma situação de conflito de interesses – vide acta de audiência de julgamento (continuação), de 03-05-2017, e respectivo depoimento gravado digitalmente no Habilus – Citius, nos termos da gravação, entre os 42m27s e a 47m58s;
52. Em segundo lugar, apesar de ter declarado que "se tivesse dado conta de qualquer coisa que prejudicasse a Sra. D. S... eu teria intervindo e alertado a Sra. D. S... para o facto" – vide respectivo depoimento gravado digitalmente no Habilus – Citius, nos termos da gravação, entre os 46m33s e a 47m58s – , não sabia se a executada D. S... sua cliente mais antiga tinha ou não condições para pagar o empréstimo no prazo de 1 ano – vide respectivo depoimento gravado digitalmente no Habilus – Citius, nos termos da gravação, entre os 56m00s e a 58m00s;
53. Em terceiro lugar, apesar de declarar ter estado presente na escritura de confissão de dívida, não são aí referenciadas quais as concretas dívidas da executada, respectivos montantes e em que datas teriam sido, alegadamente, pagas, pelo exequente. Isto, note-se bem, em total contraste e oposição, com o que consta na escritura da confissão de dívida da mãe do exequente feita também no mesmo Cartório, em 09 de Janeiro de 2012, e cuja cópia foi junta como DOC. 5 da petição inicial de embargos de executado;
54. Em quarto lugar, a instâncias do mandatário da executada, declarou não ter quaisquer dúvidas que foi a ex-notária M... quem fez a autenticação da procuração, junta como DOC. 1 com a contestação do exequente – vide respectivo depoimento gravado digitalmente no Habilus – Citius, nos termos da gravação, entre os 1h03m35s e a 1h04m58s – apesar de o termo de autenticação da dita procuração ter sido realizado por A..., colaboradora da ex-notária M... e não por esta última – vide termo de autenticação junto como DOC. 1 com a contestação do exequente.
55. Também o depoimento da ex-notária Dra. M... suscita fundadas dúvidas quanto à respectiva credibilidade.
56. Na verdade, ao ter sido perguntada, pela M.ma. Juiz, como procedeu em relação à escritura que constitui o título executivo, a mesma declarou que leu a escritura, explicou o seu conteúdo às partes e só depois de ter verificado se o texto continha ou não quaisquer erros é que o mandou imprimir, para depois ser assinado pelas partes – vide acta de audiência de julgamento (continuação), de 20-09-2017, e respectivo depoimento gravado digitalmente no Habilus – Citius, nos termos da gravação, entre o 1m04ss a 04m06ss.
57. Este iter procedimental torna incompreensível e não credível que a ex-notária Dr. M... não se tenha apercebido de que, na parte final da escritura, existe erro manifesto, quando aí é dito, pela própria notária, que "Verifiquei a identidade dos outorgantes, da primeira pela exibição dos seus cartões do cidadão números 01 302 330 6ZZ1 válido até 10/01/2014 e 10091584 1ZZ3 válido até 5/09/2014, emitidos pela República Portuguesa." .
58. E mais incompreensível e inverosímil se torna a falta de ressalva desse erro manifesto, para quem declarou, no respectivo depoimento, que, após ter lido e explicado o conteúdo da escritura às partes, a verificou, logo a seguir, para detectar quaisquer erros nela existentes e só depois a imprimiu para ser assinada, pelas partes.
59. Por outro lado, a ex-notária Dra. M... também não explicou, de forma minimamente convincente, por que é que, por um lado, na escritura que constitui o título executivo adoptou a fórmula que termina na última das 25 linhas da face da folha da escritura " Esta escritura foi lida e explicado o seu conteúdo.", sem indicar a quem foi lida a escritura e explicado o seu conteúdo; e, por outro, na escritura que constitui o Doc. 5 da petição de embargos, outorgada 09 de Janeiro de 2012, e em que intervieram o exequente e a sua mãe Maria …, a mesma ex-notária Dra. M... já declara que a mesma foi lida aos outorgantes e aos mesmos explicado o seu conteúdo: " Esta escritura foi lida aos outorgrantes e aos mesmos explicado o seu conteúdo." – vide Doc. 5 da p.i. de embargos; vide também respectivo depoimento gravado digitalmente no Habilus – Citius, nos termos da gravação, entre o 1m04ss a 35m06ss.
60. Com respeito ao que se deu como provado no FACTO n.º 39º, fica a dúvida de como é que a Executada poderia ter assinado a escritura de livre consciência, na plena posse das suas capacidades psíquicas e com perfeito conhecimento de que dívida se tratava, se, por um lado, na escritura, é declarado que, em 25-02-2011, ela recebeu do exequente a quantia de 174.000,00€ "por empréstimo, pelo prazo de um ano, a contar de hoje.", e, por outro, é o próprio exequente quem confessa, nos arts. 60.º, 61.º, 62.º e 64.º da respectiva contestação, que aquela quantia de 174.000,00€ era o somatário de várias dívidas da executada que o mesmo, alegadamente, pagou na década de 2000.
61. Ou seja, no Facto Provado sob o n.º 39, quando ai se diz que a executada assinou a escritura com perfeito conhecimento de que dívida se tratava, está a considerar-se que a executada estava ciente de que os 174.000,00€ lhe tinham sido emprestados, em 25-02-2011, e que os devia pagar, no prazo de um ano a contar daquela data ?
62. Ou aí está a considerar-se que a executada estava ciente de que o exequente lhe havia, alegadamente, pago várias dívidas ao longo da década de 2000 e cujo valor foi fixado, "por acordo", em 174.000,00€ ?
63. Estas questões não foram clarificadas, nem pelos depoimentos das testemunhas Dr. Me... ou Dra. M..., nem pela própria decisão e fundamentação da matéria de facto.
64. Em cumprimento do disposto na alínea d) do n.º 2 do art. 642.º do CPC, conjugado com a falta de indicação dos concretos meios de prova que serviram para dar como provados cada um dos FACTOS dados como PROVADOS, desde o n.º 38 até ao n.º 62, deve a Relação determinar que o tribunal de 1.ª instância fundamente a decisão de facto em relação a cada um desses factos dados como provados, especificando, de entre os meios de prova que constam dos autos, qual ou quais os que serviram de fundamento à convicção da M.mª Juiz para os dar como provados.

Termos em que, dando provimento ao presente recurso, Vas. Exas. devem:
1.º revogar a sentença recorrida por ter aceite e decidido com base na alteração da causa de pedir efectuada, pelo exequente, de forma unilateral e sem que a executada tivesse dado para tal o respectivo acordo, violando, dessa forma, a norma da n.º 1 do art. 265.º do CPC. e, consequência,
2.º julgar a execução improcedente e declará-la extinta quanto ao demais peticionado no requerimento executivo, isto é, quanto ao pagamento da quantia de 134.000,00€.

3.º Caso se admita a alteração da causa de pedir da execução para a de "pagamento de dívidas" da executada que o exequente alega ter feito na década de 2000, a execução deve prosseguir:
a)- ou pelo valor 66.507,50€, que é a diferença entre o total das dívidas da executada pagas pelo exequente (93.957,50€) e o que sobeja (27.450,00€) da dedução da dívida da mãe do exequente nos levantamentos directos que o mesmo fez na conta bancária da aqui executada, entre 2011 e 2013 (64.050,00€ - 36.600,00€ = 27.450,00€);
b)- ou pelo valor de 29.907,50€, caso se considere que o total de 64.050,00€ correspondente à soma dos levantamentos que o exequente fez na conta bancária da aqui executada sua avó, a partir de 07-03-2011 e até 09-01-2014 , deve ser deduzido pela totalidade no valor de 97.957,50€ correspondente à soma das dívidas da executada que foram comprovadamente pagas pelo exequente, ao longo da década de 2000.

Por último e para o caso de não se dar provimento a qualquer dos pedidos recursórios precedentes, devem Vas. Exas.:
4.º Em cumprimento do disposto na alínea d) do n.º 2 do art. 642.º do CPC, conjugado com a falta de indicação dos concretos meios de prova que serviram para dar como provados cada um dos FACTOS dados como PROVADOS, desde o n.º 38 até ao n.º 62, determinar que o tribunal de 1.ª instância fundamente a decisão de facto em relação a cada um desses factos dados como provados, especificando, de entre os meios de prova que constam dos autos, qual ou quais os que serviram de fundamento à convicção da M.mª Juiz para os dar como provados.

P... respondeu às alegações de recurso concluindo que:
A)- A douta sentença em apreço deve manter-se no posto em crise pela aqui Recorrente.
B)- Ora vejamos, quanto à questão em que a Recorrente entende que a Douta Sentença recorrida decidiu os embargos com base numa relação diferente da que consta no título executivo e foi invocada como causa de pedir na acção executiva, não assiste qualquer razão à recorrente nas suas alegações, como adiante se irá demonstrar.
C)- Com efeito, ao contrário do que a recorrente quer fazer crer, o Recorrido não apresentou qualquer versão dos factos e causa de pedir no requerimento executivo diferente da que apresentou na contestação aos embargos.
D)- Na verdade, a única causa de pedir apresentada pelo Recorrido ao longo do presente processo é a existência de um empréstimo do Recorrido à Recorrente, formalizado em 25-02-2011.
E)- Esse empréstimo foi concedido pelo Recorrido à Recorrente para pagamento de variadíssimas dívidas contraídas por esta e amplamente demonstrada nos presentes autos.
F)- Em virtude da Recorrente ter impugnado a veracidade da escritura, invocando a sua falsidade, o Recorrido viu-se obrigado a contraditar e a descrever os factos que originaram a realização da escritura e o motivo para a existência do empréstimo em causa nos presentes autos.
G)- Ou seja, não houve qualquer alteração ou ampliação da causa de pedir, uma vez que o empréstimo em causa é e sempre foi a única causa de pedir.
H)- Conforme se pode ler na página 22, segundo parágrafo, 3.ª a 7.ª linha da Douta Sentença: “Assim, apesar de não carecer de o fazer, por beneficiar prova plena, o exequente demonstrou a prática de actos concretos (pagamento de dívidas da executada; realização de obras em benefício da executada financiadas pelo exequente) susceptíveis de serem considerados como actos de empréstimo, por consistirem na disponibilização das respectivas quantias em benefício da executada.”
I)- Pretende apenas a Recorrente, com a sua prolixa argumentação, protelar o pagamento, sem que lhe assista qualquer razão, na sua pretensão.
J)- Quanto à questão da Recorrente entender que a execução apenas deve prosseguir em relação ao valor das dívidas da executada de que exista prova nos autos de que foi o exequente que as pagou, indicando dois valores possíveis para serem considerados como estando em dívida, mais se dirá.
L)- Em primeiro lugar, a Recorrente entende que a execução apenas deve prosseguir em relação ao valor das dívidas de que exista prova nos autos de que foi o exequente que as pagou, por considerar que cabe ao Recorrido demonstrar e comprovar quais as dívidas da Recorrente, que foram por ele pagas, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil.
M)- E isto porque a Recorrente entende que o Recorrido admitiu e confessou que não ocorreu qualquer empréstimo, mas sim a “fixação” do valor de várias dívidas da Recorrente, cujo pagamento foi por ele feito ao longo da década de 2000.
N)- Ou seja, apenas num mero jogo de palavras, a Recorrente pretende fazer crer a este Douto Tribunal que o Recorrido admitiu e confessou que não houve empréstimo.
O)- Ora, mais uma vez, salvo o devido respeito e melhor entendimento, tal afirmação é completamente descabida.
P)- Com efeito, o que está em causa e sempre esteve em causa é única e exclusivamente o empréstimo feito pelo Recorrido à Recorrente, conforme consta na escritura datada de 25-02-2011, ora em causa nos presentes autos e foi considerado provado no ponto 45 dos Factos Provados da Douta Sentença.
Q)- Na verdade, não pode restar qualquer margem para dúvidas, de que o empréstimo foi concedido para pagamento das dívidas da Recorrente, tendo esta em 2011, reconhecido e confessado a dívida que tinha para com o Recorrido, através da supra mencionada escritura de confissão de dívida.
R)- Pelo que, não houve qualquer inversão do ónus da prova, não cabendo ao Recorrente provar a existência da dívida, fazendo a escritura de confissão de dívida objecto do presente litígio prova plena da sua existência.
S)- Porém, alega a Recorrente que apenas podem ser considerados dívidas os pagamentos feitos pelo Exequente que se encontrem comprovados nos autos.
T)- Aliás, importa referir que a Recorrente nos seus embargos limitou-se a impugnar a existência da dívida, afirmando que nunca recebeu de empréstimo do Recorrido a quantia de 174.000,00 €.
U)- E que o valor que este retirou da conta bancária da Recorrente, que nos anos de 2012 e 2013 perfizeram mais de 47.000,00 €, destinavam-se – não a amortizar o valor da dívida nos presentes autos – mas a reembolsá-lo do valor de 36.600,00 € que o Recorrente havia pago, valor esse que se encontra a ser reclamado na acção executiva que sob o n.º 4421/17.1T8LSB, se encontra a correr pelo Juízo de Execução de Lisboa – Juiz 3.
V)- Pelo que, alegou que a dívida não existia e que a escritura de confissão de dívida tinha sido falsificada, num esquema “engendrado” entre o Recorrente e a notária, a Dr.ª M..., o que não logrou provar, por salvo o devido respeito sem completamente descabido para além de ofensivo da honra e respeito que são devidos ao Recorrente.
X)- Pretende agora, com a sua longa e prolixa argumentação, que os pagamentos que o Recorrido demonstrou nos autos terem sido feitos por si, em prol da Recorrente, não podem ser atendidos e sem ter feito qualquer prova - por a mesma não ser possível - alega que foram feitos pagamentos pela Recorrente, em data anterior à realização da escritura de 25-02-2011 em causa nos presentes autos – que têm de ser tidos em conta e descontados ao valor da dívida.
Z)- Por outro lado, com uma argumentação quase incompreensível e de má-fé alega que os levantamentos bancários efectuados pelo Recorrido serviram ou para pagar a dívida da sua mãe ou para pagar a dívida da ora Recorrente, deixando a este tribunal a escolha sobre qual o valor da dívida que os levantamentos bancários estariam a fazer.

AA)- Na verdade, o pedido de extinção da execução formulado pela Recorrente nos presentes embargos assentava apenas nas seguintes premissas:
1- A falsidade do título executivo;
2- A cessação da competência notarial de quem exarou a escritura pública junta como título executivo;
3- A falta de requisitos da escritura para valer como documento autêntico e atribuir valor probatório à confissão de dívida nela exarada;
4- A impugnação da dívida confessada.

BB)- Com efeito, conforme se pode ler na Douta Sentença: “ E assumindo os embargos, enquanto contra-acção, a natureza de uma verdadeira acção declarativa, (…) é sobre o embargante que recai o ónus de alegação e a prova da inexistência da causa debendi ou do direito do exequente através da enunciação dos respectivos factos que permitam esse objectivo.(…). O ónus da prova da inexistência da relação fundamental cabe ao executado”.
CC)- Resulta da prova produzida em julgamento que a Recorrente nunca fez qualquer prova da inexistência da dívida, pretendendo nesta fase utilizar argumentos que não logrou provar em sede de audiência de discussão e julgamento.
DD)- Pelo que, não poderá prevalecer a sua pretensão, conforme se deixa requerido.
EE)- Por fim, quanto à questão da Recorrente entender que a sentença recorrida, com excepção da questão da falsidade da escritura de confissão de dívida, não especifica em relação aos demais factos que deu como provados, quais os concretos meios de prova que serviram de fundamento à convicção para os dar como provados, violando desta forma o n,º 4 do artigo 607.º do Código de Processo Civil, pelo que deverá o douto tribunal a quo ser notificado para fundamentar a decisão de facto, mais se dirá.
FF)- Salvo o devido respeito e melhor entendimento, mais uma vez não assiste qualquer razão à Recorrente na sua pretensão, como adiante se tentará demonstrar.
GG)- Com efeito, o Douto Tribunal a quo formulou a sua decisão, na premissas que assentou o pedido de extinção da presente execução, e não nas premissas que a Recorrente pretende agora que sejam apreciadas, designadamente, que a execução apenas deve prosseguir em relação ao valor das dívidas da executada de que exista prova nos autos de que foi o exequente que as pagou.
HH)- Com efeito, na dedução dos seus embargos a Recorrente alega a inexistência da dívida e no presente recurso para além de a reconhecer apenas pretende que seja pago ao Recorrente o valor das dívidas de que exista prova nos autos que foi o Recorrente quem as pagou, numa completa inversão do ónus da prova.
II)- Na verdade, o Douto Tribunal a quo especificou em relação aos factos que deu como provados, quais os concretos meios de prova que serviram de fundamento à convicção para os dar como provados, de acordo com a premissas que estavam a ser objecto de discussão, conforme lhe era exigido.
JJ)- Destarte, porque assim e conforme o predito, é nosso entendimento que a Douta Sentença não merece qualquer censura, devendo manter-se no todo posto em crise pela aqui ora Recorrente,
 
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

São as seguintes as questões a avaliar:
1. Face à falta de indicação dos concretos meios de prova que serviram para dar como provados os factos compreendidos entre os n.ºs 38 e 62, deve-se determinar que o tribunal de 1.ª instância fundamente a decisão de facto em relação a cada um desses factos?
2. A sentença recorrida deve ser revogada «por ter aceite e decidido com base na alteração da causa de pedir efectuada, pelo exequente, de forma unilateral e sem que a executada tivesse dado para tal o respectivo acordo»?
3. A execução deve prosseguir apenas pelas quantias indicadas pela Recorrente no presente recurso?

II. FUNDAMENTAÇÃO.

Fundamentação de facto.
1. Face à falta de indicação dos concretos meios de prova que serviram para dar como provados os factos compreendidos entre os n.ºs 38 e 62, deve-se determinar que o tribunal de 1.ª instância fundamente a decisão de facto em relação a cada um desses factos?
O n.º 4 do  art. 607.º do Código de Processo Civil impõe que, na fundamentação da sentença, o juiz declare «quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção».

Da análise da fundamentação das respostas fácticas extraímos, desde logo, numa abordagem ainda que liminar, a sua extensão e detalhe. Verificamos, também, que o Tribunal «a quo» percorreu, de forma analítica e valorativa, os diversos meios instrutórios. Referiu as razões da formação da sua convicção e fê-lo com apelo à razão e inteligência do destinatário. Não ignorou a técnica e o valor distinto dos diversos meios demonstrativos. Quanto a estes meios, arrolou aqueles em que assentou a sua convicção. E fê-lo de forma exaustiva.

No que se reporta às ilações retiradas desses instrumentos demonstrativos, tem que se concluir que as mesmas foram indicadas pelo Tribunal que proferiu a decisão impugnada, de forma detalhada e explicativa, em termos que, apesar de criticados nas alegações de recurso em algumas das suas vertentes, não foram postos em crise nos termos exigidos pelo art. 640.º do Código de Processo Civil. Tais elementos de fundamentação abrangeram as diversas áreas objecto de instrução. Sobretudo, ficou bem clara a motivação de sustentação do núcleo em que assentou a decisão, a saber, a realidade da celebração da escritura e contexto justificativo de tal celebração, o que abrange, claramente, os factos referenciados como assentes sem fundamentação.

Particularmente, o Tribunal fundamentou de forma expressa e com o necessário detalhe «a prova da presença da executada embargante no Cartório Notarial da Dra. M... no dia 11.02.2011 para celebração da escritura dada à execução, da leitura do texto, na qual interveio de forma consciente» e da leitura e explicação do seu conteúdo. Recordou, bem, não ter sido feita a demonstração da respectiva falsidade.

A clara e detalhada motivação do núcleo que, por si só, definia o destino da acção e que está compreendido nos artigos invocados no recurso, afasta a bondade da tese aqui brandida.

O Tribunal «a quo» recordou, com adequação à instrução realizada, que:
demonstrada a celebração da escritura em que foram outorgantes quer a executada quer o embargante, nos termos qual a executada se confessou perante o exequente sua devedora relativamente á quantia de €174.000,00, que dele recebeu por empréstimo, verifica-se a existência de declaração extrajudicial confessória conforme previsto no art 358 nº2 do Código Civil, a qual tem força probatória plena contra o confitente. Tal acarreta desde logo que a inexistência da referida divida não possa ser demonstrada por meio de prova testemunhal - art 393 nº2 do CC. Ou seja: por via da confissão da divida pela embargante, o embargado beneficia de prova plena quanto á existência da divida, naquele valor e com aquele fundamento, não tendo sequer que justificar e demonstrar os concretos actos que deram origem á constituição do débito. Ainda assim, o embargante juntou aos autos documentação comprovativa de pagamentos, a que procedeu (confrontar declarações dos credores de que receberam as quantias e cópias dos cheques emitidos pelo exequente a favor dos credores), de dívidas da executada a terceiros, a fim de obviar á venda judicial do imóvel sito na Rua do N..., onerado com diversas penhoras que chegaram a garantir dívidas de pelo menos €70.000,00 (conforme resulta da analise das diversas cópias de certidões prediais do imóvel referentes a diversos momentos temporais). Ora, em termos de experiência comum, a entrega destes valores a terceiros é susceptível de ser considerado empréstimo (em sentido comum), não sendo exigível que para haver um empréstimo tenha que existir uma entrega directa de dinheiro ao beneficiário (veja-se o caso do credito ao consumo, no qual o dinheiro é entregue ao terceiro fornecedor e não ao beneficiário do crédito, facto que não lhe retira a natureza de empréstimo). O mesmo se diga quanto ao pagamento a que o exequente procedeu de obras realizadas no imóvel integrado na herança do seu avô, de que era cabeça de casal e co-herdeira a avó, ora executada – cf cheques emitidos a favor do empreiteiro que apresentou orçamentos em 2005, 2007 e 2008 (Fernando Pereira) -, tendo portanto o exequente financiado tais obras em benefício da executada, uma vez que pela respectiva natureza, conforme descritivo constante nos ditos orçamentos, as obras seriam necessárias, ou pelo menos, notoriamente susceptíveis de aumentar o valor do imóvel; e portanto mostra-se irrelevante que, enquanto arrendatário de parte do imóvel, o exequente delas usufruísse nessa qualidade, pois tal não retira a utilidade e o benefício das mesmas para a executada, utilidade e beneficio financiados pelo exequente. Assim, apesar de não carecer de o fazer, por beneficiar de prova plena, o exequente demonstrou a prática de actos concretos (pagamento de dividas da executada; realização de obras em beneficio da executada financiadas pelo exequente) susceptíveis de serem considerados como actos de empréstimo, no sentido comum do termo, por consistirem na disponibilização das respectivas quantias em benefício da executada.
Por sua vez, a executada não logrou apresentar prova documental (recorde-se que a testemunhal lhe está vedada pelo art 393º nº2 do CC) que demonstrasse a inexistência da divida confessada; efectivamente, mesmo o extracto bancário que apresentou por referência ao período de 2006 a 2011 apenas demonstra que naquela concreta conta bancária não deu entrada do valor correspondente á divida, o que não impede que possa ter entrado noutra conta da executada, ou mesmo naquela mas em período anterior, nem impede que o referido valor tenha sido disponibilizado de outra forma, designadamente através de pagamento de dívidas da executada ou de financiamento de obras em benefício daquela.
Não apresentou portanto a embargante prova documental que infirmasse a existência da divida. E mesmo a prova testemunhal que apresentou, sem se olvidar como acima se disse que dela não se pode socorrer – art 393 nº2 do CC-, não foi de molde a afastar a existência da divida, pois veja-se que a testemunha Maria ..., que esteve durante um largo período de tempo (desde 1996 a 2013) sem se relacionar com a executada e com o exequente, confrontada com a existência de várias dividas, apenas pôde afiançar o pagamento de uma delas, a divida hipotecária no valor de 15.000,00 contos, com meios alheios ao executado, o produto da venda de um imóvel – vinte mil contos-, desconhecendo em concreto a aplicação dos remanescentes 5000,00 contos; e a testemunha Daniel … reconheceu que desde pequeno ouve falar - designadamente nas discussões entre a avó e o Pedro -, nas dívidas da família, com origem na sua mãe (a testemunha M...) que acabavam por vincular também sua avó (a executada), mais descrevendo que o Pedro pagava as dividas e avó assumia o compromisso de lhe ir pagando com as rendas.
Relativamente às obras, as referidas testemunhas aludiram principalmente ao facto de as obras realizadas se centrarem sobretudo na parte do prédio de que o exequente era arrendatário, o que não afasta, como acima se disse, a respectiva utilidade e beneficio para a executada, que, conforme referiu o empreiteiro ouvido em julgamento, Fernando ..., esteve presente na primeira reunião consigo e foi muitas vezes á obra, tendo conversado consigo, referindo até a testemunha que foi ela quem adjudicou o trabalho (a testemunha Fernando R... também confirmou ter falado várias vezes com a executada sobre as obras que realizou, e ter-lhe sido transmitido pelo exequente que a executada é que decidia, mas uma vez que as obras realizadas por este último se reportem já a período posterior á escritura de confissão de divida, não pode portanto o respectivo financiamento ser considerado para efeitos da constituição da divida em causa nos presentes autos).
Portanto, mesmo que se pudesse socorrer da prova testemunhal, ainda assim a executada não lograria demonstrar a inexistência da divida confessada.
Em suma, a prova produzida nos autos confirmou no essencial a versão do exequente, a qual não foi infirmada por prova da parte contrária.

No contexto descrito, estamos bem longe da ausência de motivação invocada. Impõe-se responder negativamente à questão proposta, o que se faz neste momento.

Vem provado que:
1- A executada é viúva e, em 25-02-2011 tinha 87 anos de idade.
2- O seu neto e aqui exequente passou a ser procurador da executada, desde finais do ano de 1997, sendo então o aqui exequente solteiro e tendo então a executada 74 anos de idade.
3- Em 02 de Outubro de 1997, a aqui executada, então na qualidade de cabeça de casal da herança indivisa deixada por Ezequiel …., seu marido e avô materno do aqui exequente, conferiu a este último, através de procuração, os necessários poderes para administrar os prédios que faziam parte da referida herança e de que eram únicas herdeiras a aqui executada e a sua filha M... P... C... S... que é mãe do aqui exequente.
4- Da referida herança faziam parte os dois imóveis que o exequente nomeou à penhora na presente execução, isto é, - o prédio urbano sito na Rua … n.ºs 38 a 46 e na Travessa da … n.ºs 9 a 13, em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da extinta freguesia da Encarnação sob o artigo … e, actualmente, na freguesia da Misericórdia sob o artigo ..., e descrito na ..., sob o n.º 2.468; - e o prédio misto denominado "..." sito na freguesia de Santa Clara-a-Velha, concelho de O..., com parte rústica inscrita na respectiva matriz sob o artigo …, secção ..., e com a parte urbana inscrita na respectiva matriz sob o artigo ..., e descrito na Conservatória do Registo Predial de O... sob o n.º ....
5- Desde a altura em que lhe foi conferida a mencionada procuração (Outubro de 1997), o exequente passou a tratar de assuntos referentes aos mencionados prédios e, em particular, ao prédio urbano sito em Lisboa, dado o corte de relações que existiu durante vários anos entre a executada e a sua filha e mãe do exequente, M... P... C... S....
6- A confiança que a executada depositava no exequente permitiu a este último aceder e movimentar a única conta bancária de que a executada foi e é única titular na agência do Calhariz, em Lisboa, da Caixa Geral de Depósitos com o n.º …..
7- Até ao início de Março de 2011, o exequente fazia levantamentos de dinheiro da referida conta bancária da executada, através de caderneta e/ou de cartão multibanco que tinha em seu poder e cujos números secretos sabia.
8- E a partir de 07 de Março de 2011 e até 09-01-2014, a executada conferiu ao exequente, na referida conta, autorização para movimentar a mesma.
9- Em 2011, a executada encontrava-se a residir no sobredito prédio misto denominado ",,," sito na freguesia de Santa Clara-a-Velha, concelho de O....
10- A escritura dada á execução encontra – se exarada numa única folha, estando o texto da escritura impresso na face da folha e as assinaturas estão apostas no verso dessa mesma folha, no qual não há qualquer texto impresso ou marca de que essa página (verso da folha) é um documento elaborado em cartório notarial.
11- E a assinatura atribuída à executada aparece exarada na primeira linha do verso da folha da mencionada escritura.
12- Na parte final é dito "Verifiquei a identidade dos outorgantes, da primeira pela exibição dos seus cartões do cidadão números … e  …., emitidos pela República Portuguesa."
13- A expressão “da primeira” referida em 12 supra foi incluída na declaração por lapso da Sra. Notária.
14- A face da folha termina " Esta escritura foi lida e explicado o seu conteúdo.".
15- A Notária M... outorgou em 09 de Janeiro de 2012 a escritura identificada na p.i. como doc 5, cujo teor se dá integralmente por reproduzida, a qual terminou tal escritura nos termos seguintes: " Esta escritura foi lida aos outorgantes e aos mesmos explicado o seu conteúdo."
16- A situação económica de Maria ..., Mãe do exequente, nunca foi de modo a permitir-lhe dispor de quantias em dinheiro, o que era do conhecimento do exequente.
17- E com quem o exequente sempre teve mau relacionamento pessoal.
18- Por carta registada e com aviso de recepção, de 01 de Abril de 2015, que o exequente recebeu, em 07 de Abril de 2015, a executada e sua filha Maria … comunicaram-lhe que, através de escritura pública, de 27 de Março de 2015, tinham procedido à partilha dos prédios referidos no ponto 4 supra, nos termos que constam dessa mesma escritura e que também reproduziram na referida carta, cfr. Doc. 6 e Doc. 7 juntos pela embargante, cujo teor se dá por reproduzido.
19- Na referida carta, de 01-04-2015, a executada e sua filha também comunicaram ao exequente que, por terem findado com a partilha da herança indivisa de Ezequiel D... … os poderes legais de administração da respectiva cabeça-de-casal, o contrato de arrendamento que a executada, naquela qualidade, havia assinado com o exequente, em 02-11-2001, e que teve por objecto o 1.º andar esquerdo/frente e o 2.º andar do n.º ..., em Lisboa, em que se situa o prédio urbano mencionado no ponto 4 supra, caducou na data, de 27-03-2015, em que a partilha foi efectuada, por força do disposto na alínea c) do n.º 1 do art. 1051.º do Código Civil.
20- E que, por força do disposto no art. 1053.º do Código Civil, o exequente lhes deveria restituir os referidos andares, livres de pessoas e bens, em 28 de Setembro de 2015, isto é, decorridos seis meses sobre a verificação, em de 27 de Março de 2015, do facto que determinou a caducidade do contrato de arrendamento.
21- O executado, no dia em recebeu a carta junta como Doc. 6 a comunicar a partilha e a caducidade do arrendamento, ou seja, em 07-04-2015 outorgou procuração à respectiva mandatária e procedeu ao pagamento da taxa de justiça, tudo respeitante à presente execução, cfr. requerimento executivo e documentos com ele juntos.
22- Tendo o exequente instaurado a presente execução no dia 08 de Abril de 2015, cfr. data de entrada do requerimento executivo.
23- E por requerimento de 20-10-2015 apresentado na execução, o exequente veio pedir que "se proceda à adjudicação directa do mesmo imóvel ao Exequente, da quota-parte da Executada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 799.º n.º 1 e 3 do Código de Processo Civil, pelo valor dado à execução.".
24- Pelo seu requerimento de 20-10-2015 o exequente pretende obter 5/6 (cinco sextos) do prédio urbano na Rua do N..., n.ºs ... a ... e na Travessa da E... n.ºs ... a ..., em Lisboa, que é a quota-parte da executada pela quantia de 151.961,09€ que é o valor que o exequente deu à presente execução.
25- O prédio, cuja adjudicação directa pretende, tem um valor patrimonial tributário acima dos 450.000,00€.
26- No âmbito de processo disciplinar instaurado à notária Senhora Dra. M... por deliberação do Conselho do Notariado, de 13 de Dezembro de ..., a mesma foi condenada na pena de interdição definitiva do exercício das funções de notária, por despacho da Senhora Ministra da Justiça de ….
27- O exequente foi retirando para si quantias da conta bancária da executada que, nos anos de 2012 e de 2013, totalizaram mais de 47.000,00€.
28- No documento junto como título executivo consta que " A referida importância não vence quaisquer juros".
29- A executada esteve presente na escritura de confissão de dívida celebrada no dia 25 de Fevereiro de 2011 no Cartório Notarial da Dr.ª M....
30- Nesse mesmo dia, local e hora a Executada celebrou uma procuração exarada com termo de autenticação e lida na sua presença, conforme Doc. 1 junto pelo exequente e ora dado por reproduzido para todos os efeitos legais.
31- A parte da frente da folha escritura tem 25 linhas contadas desde a enunciação da escritura.
32- Para além do descrito em 2 supra, o Exequente ficou, para além do mais, com acesso à conta da executada, bem como ao cartão multibanco e à respectiva caderneta, para poder colmatar qualquer necessidade existente, designadamente, pagamentos, entre outros.
33- Além disso, o Exequente foi sempre quem tratou de todas as questões de que a sua avó precisava.
34- Foi o Exequente quem liquidou inúmeras dívidas contraídas pela Executada Maria ..., muitas das quais já se encontravam na fase de venda judicial de penhoras sobre o imóvel sito na Rua do N..., n.º ..., em Lisboa.
35- A Dr.ª M... ficou interdita, em definitivo, do exercício de funções de notária, por despacho de 16 de Maio de 2012, na sequência de processo disciplinar instaurado por deliberação de 13-12-2010.
36- Na data da escritura junta como Doc.1 à execução, a notária encontrava-se em exercício das suas funções e competências legais.
37- O Exequente solicitou à Ordem dos Notários um parecer sobre a actividade profissional da Notária, Dr.ª M..., Ordem a qual respondeu que, até à data da decisão disciplinar que interditou, em definitivo, para o exercício de funções notariais- ou seja, 16-05-2012- os actos praticados por esta são válidos.
38- A confissão de dívida que deu origem à presente execução foi feita a pedido desta e quem tratou de toda a documentação necessária para a sua instrução foi o seu advogado, Dr. Me....
39 -Tanto a Executada S.... como o seu advogado, Dr. Me..., estiveram presentes na escritura, tendo a Executada S... assinado a escritura de livre consciência, na plena posse das suas capacidades psíquicas e com perfeito conhecimento de que dívida se tratava.
40- Na mesma escritura foi lido e explicado o seu conteúdo à Executada S..., que ficou perfeitamente ciente das suas obrigações para com o Exequente.
41- O Exequente sempre tentou, quer com a Executada S... quer com a filha desta M..., que as mesmas procedessem extrajudicialmente ao pagamento dos valores em dívida que tinham para com ele, tendo inclusive sido feita uma reunião com os mandatários das partes para esse efeito, reunião essa que não veio a produzir qualquer solução nesse sentido.
42- Quando as Executadas notificaram o Exequente de que tinham procedido à celebração de partilha dos bens da herança, em que ambas ficaram na mesma proprietária dos imóveis, mas, em vez de em comum sem determinação de parte ou direito, agora na respectiva proporção legal e informaram o Exequente de que, por causa disso, se considerava resolvido o contrato de arrendamento celebrado em nos termos do artigo 1053.º do Código Civil, o Exequente apercebeu-se que a Executada não tinham qualquer intenção de proceder ao pagamento das quantias em dívida para com ele, pelo que decidiu proceder de imediato à instauração da execução, o que até então o Exequente sempre tinha tentado evitar, atendendo à relação familiar próxima existente entre as partes.
43- A Executada celebrou uma escritura pública em que se confessou devedora da quantia de 174.000,00 € ao Exequente, por lhe ter sido emprestada por este último a referida quantia.
44- O motivo para a realização da escritura foi precisamente para formalizar o empréstimo e determinar as suas condições de pagamento, designadamente que o mesmo teria de ser pago no prazo de um ano a contar da data da realização da mesma escritura.
45-O Exequente emprestou ao longo dos anos, quer à executada S... quer à filha M... diversas quantias monetárias, que, no caso da Executada S... perfizeram uma quantia superior a 174.000, 00 €, tendo porém ambas as partes acordado que o valor do empréstimo se fixasse em 174.000, 00€,
46- E, tendo procedido à sua formalização através da escritura de confissão de dívida datada de 25-02-2011.
47- A razão para o empréstimo de diversas quantias monetárias à Executada teve a ver com a circunstância de a Executada M..., que é filha da Executada S... e mãe do Exequente, ter tido, entre outros, um negócio na área da restauração nos anos 90, que lhe causou inúmeras dívidas, quer a fornecedores quer ao Fisco.
48- Apesar de as Executadas terem constituído uma empresa denominada “Praça das Flores-Restaurante Bar, Lda para exercerem a sua actividade, deram diversos avais pessoais, bem como outras garantias.
49- Tais dívidas tiveram como consequência a penhora dos bens próprios das Executadas, entre os quais o imóvel sito na Rua do Norte.
50- As penhoras realizadas sobre o imóvel referido supra garantiram quantias de, pelo menos, cerca de 70.000,00 €.
51- Ao longo da década de 2000 todas estas dívidas foram pagas pelo Exequente, acrescidas de juros, custas judiciais e demais quantias legalmente exigidas, para que as penhoras pudessem ser levantadas e evitar a venda judicial do imóvel.
52- O Exequente pagou inúmeras dívidas por acordo, entre as quais, uma dívida à Caixa Geral de Depósitos no montante de 21.150,00 € para desoneração da ora Executada como fiadora e desistência do respectivo processo executivo.
53- Quer a Executada S... quer a Executada Antónia não tinham quaisquer condições económicas para proceder ao pagamento das dívidas, uma vez que o valor das rendas do prédio sito na Rua do N..., em Lisboa era muito baixo e nenhuma delas tinha outros rendimentos suficientes para o efeito.
54- Pelo que só graças ao pagamento das dívidas pelo Exequente conseguiram manter o imóvel na sua posse e propriedade.
55- Exequente e a Executada acordaram após a celebração da escritura de confissão de dívida que o Exequente iria proceder a levantamentos mensais da conta bancária da Executada para iniciar o pagamento em prestações do valor em dívida para com ele.
56- O Exequente ficou autorizado pela Executada a ter acesso à sua conta bancária de 7 de Março de 2011 a 8 de Janeiro de 2014.
57- Em Agosto de 2011 a Executada começou a ter um maior rendimento, pois celebrou um novo contrato de arrendamento com a loja da Rua do N..., n,ºs ..., ... e ... em Lisboa, com um cabeleireiro por uma renda no valor de 3.000,00 € mensais.
58- O Exequente com a autorização da Executada procedeu ao levantamento de quantias monetárias, que no total perfizeram pelo menos a quantia de 40.000,00 €.
59- No ano de 2012 o imóvel necessitou de novas obras de reabilitação e foi decidido pela Executada S... que estas seriam realizadas através das entradas de dinheiro com o valor das rendas, tendo o Exequente procedido ao pagamento de parte das obras, conforme instruções da sua avó, aqui Executada, através da sua contra bancária.
60- Já em Maio de 2011 a Executada tinha enviado uma carta para o Exequente para que este verificasse com o inquilino, que tinha uma joalharia no imóvel, uma anomalia existente no locado, sito na Rua do N..., n.º ..., em Lisboa.
61- No período compreendido entre Março e Dezembro de 2012, foi despendido em obras uma quantia de cerca de 21.000,00 €.
62- Desses valores só 7000,00 € foram pagos através da conta bancária da Executada, tendo os restantes valores sido pagos pelo Exequente, para que a Executada pudesse ter rendimentos suficientes para prover à sua subsistência.
63- A Executada cancelou a sua autorização para o Exequente procedesse ao levantamento de quaisquer demais quantias na sua conta bancária em Janeiro de 2014.
64- O empréstimo foi feito sem ser devido o pagamento de quaisquer juros.

Fundamentação de Direito.

2. A sentença recorrida deve ser revogada «por ter aceite e decidido com base na alteração da causa de pedir efectuada, pelo exequente, de forma unilateral e sem que a executada tivesse dado para tal o respectivo acordo»?
Os embargos em que se gerou o recurso constituem um enxerto declarativo em acção executiva «para pagamento de quantia certa». A causa de pedir desta acção – com o sentido emergente do n.º 4 do art. 581.º Código de Processo Civil de facto(s) jurídico(s) do qual procede o pedido – corresponde ao título executivo (vd. neste sentido, LOPES-CARDOSO, Eurico, Manual da Acção Executiva, Imprensa Nacional Casa da Moeda, Lisboa, 1987, pág. 27). E o único pedido em discussão, aí, é o de cobrança coerciva de quantia pecuniária determinada. São estes os exclusivos pedido e causa de pedir em apreço.

Já no excerto declarativo, o Embargante pede que não se reconheça força executiva ao título. Nesse quadro, para concretizar a sustentação da sua pretensão, aquele sujeito tem que invocar factos susceptíveis de abalar a vis executiva do documento dado à execução. São estes o pedido e a causa de pedir enxertados em sede declarativa.

Ao defender-se nos embargos, o Embargado não acrescenta, pois, por razões técnicas e lógicas (a menos que pudesse adicionar reconvenção, aqui não plausível), qualquer novo pedido e nova causa de pedir. Tudo o que se discute é a sua pretensão executiva e respectiva sustentação (o título) e, de forma concorrente, o pedido e causa de pedir dos embargos invocados pelo Embargante.
Neste insofismável contexto processual, o Embargado, ao defender-se, ou seja, ao  explicar a emergência do título e as suas razões de sustentação, não está a acrescentar qualquer causa de pedir antes está, apenas, como se enunciou, a defender-se. É assim até porque não há pedido novo a fundar nem algo mais se discute que a causa de pedir da execução que é, como se vem referindo, o título que se quer executar.

Não tem, pois, qualquer sentido a tese brandida neste âmbito no recurso pelo que a mesma só pode ser rejeitada, como ora se faz.

3. A execução deve prosseguir apenas pelas quantias indicadas pela Recorrente no presente recurso?
Tornou-se patente, mediante fixação fáctica, a validade do título dado à execução. Ficou provado que «A Executada celebrou uma escritura pública em que se confessou devedora da quantia de 174.000,00 € ao Exequente, por lhe ter sido emprestada por este último a referida quantia».
Não logrou a Recorrente provar, como era seu ónus – cf. o n.º 2 do  art. 342.º do Código Civil – e se extrai nitidamente da fundamentação fáctica, factos «impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado».
Sob este tal inelutável contexto, nunca poderiam os embargos ter sido julgados procedentes, sequer em termos parciais como se propôs nas alegações que geraram a questão ora avaliada.
Responde-se negativamente ao perguntado. 

III.DECISÃO.
Pelo exposto, julgamos a apelação improcedente e, em consequência, confirmamos a sentença impugnada.
Custas pela Apelante.
*


Lisboa, 05.07.2018



Carlos M. G. de Melo Marinho (Relator)
Anabela Moreira de Sá Cesariny Calafate (1.ª Adjunta)
António Manuel Fernandes dos Santos (2.º Adjunto)