Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | 30/03/04 | ||
Descritores: | PRISÃO PREVENTIVA CONTUMÁCIA FUGA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 03/30/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
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Sumário: | Proferido o despacho a designar o julgamento e após declaração de contumácia é de manter a decisão que alterando a medida de coacção anteriormente fixada determinou a de prisão preventiva por o arguido se ter ausentado, encontrando-se em fuga, e ser manifesto o perigo de continuação da actividade criminosa. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na 5ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa: 1. No processo comum n.º 6314/02.8 TDLSB-A da 7ª Vara Criminal de Lisboa, na sequência da acusação deduzida pelo MºPº contra C. pela prática de dois crimes de abuso de confiança, um deles na forma continuada p.p. pelos art.ºs 205º, n.º1 e 4 b) e 30º, n.º2 CP foi proferido despacho que designou dia para julgamento. Não tendo sido notificado o arguido da acusação nem do despacho que designou da para julgamento, foi o mesmo declarado contumaz nos termos dos art.º s 335º e 337º CPP conforme decisão de fls.297 e ss. No mesmo despacho foi determinada a prisão preventiva do arguido, face à verificação do receio de fuga, por se ter ausentado para parte incerta, no estrangeiro, eventualmente de Espanha e do receio da continuação da actividade criminosa, perante a ficha policial de fls. 14 a 18, ilustrativa da sua ligação contínua a actos contra o património durante a década de 80 e início dos anos 90 e o indiciado cometimento dos referidos crimes de abuso de confiança em que estão em causa valores da ordem dos € 600.000,00 euros. Inconformado com esta decisão veio interpor recurso o arguido motivando-o com as conclusões: - O art.º 377º, n.º1 CPP não importa a reanálise da existência de pressupostos de prisão preventiva; - Foi promovido pelo MºPº, em Janeiro de 2003 e foi decidido pelo tribunal, em Maio de 2003, que a única medida de coacção que se deveria aplicar ao arguido era o TIR; - Quer no momento da promoção quer no momento da decisão já se sabia nos autos que o arguido estava ausente no estrangeiro, já dos autos constava o cadastro policial agora invocado e já nos autos estava definido quais os crimes de que era acusado o arguido ; - Inexiste qualquer alteração substancial que fundamente a alteração da decisão quanto à medida de coacção, não sendo a declaração de contumácia mais do que mera alteração formal do estatuto do arguido ; - Inexiste perigo de fuga ou fuga antes mera ausência do arguido, no uso do seu direito de livre circulação, ausência essa só efectivada após despacho de não acusação no inquérito em que prestara TIR e ausência essa irrelevante para efeitos de pressuposto de prisão preventiva por o arguido não ter conhecimento da continuação do processo após despacho de não acusação nem da acusação, proferida já quando estava ausente; - Inexiste perigo de continuação da actividade criminosa em face do certificado de registo criminal do arguido existente nos autos que infirma o invocado “cadastro policial “ em termos de só poder juridicamente concluir-se que a polícia registou diversas suspeitas que, sujeitas ao juízo dos tribunais se não concretizaram isto é o cadastro ilustra injustas acusações e suspeições a um inocente, como resulta do CRC: - A decisão recorrida violou manifestamente o disposto no art.º 204º, a) e c) CPP em que erradamente se fundamenta ; - Deve ser revogada a decisão e subsistir apenas a medida de TIR sem prejuízo da eventual detenção do arguido nos termos e para efeitos do disposto nos art.º s 336º, n.º2 e 337º, n.º1 CPP . Admitido o recurso com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo, respondeu o MºPº com as seguintes conclusões: - Nada obstando à reapreciação das medidas de coacção em qualquer altura do processo e - como a fixada se mostrou, no caso concreto, manifestamente inadequada e insuficiente para a prossecução do objectivo em vista - encontrando-se o arguido na situação prevista no art. 204º als. a) e c) do C.P.P. como decorre da tramitação do processo pois, - não só se colocou em situação de se eximir “ad eternum” à acção da Justiça como a clandestinidade a que se remeteu propicia a que se dedique, ou venha a dedicar-se, a uma actividade criminosa sendo certo que - o seu passado no País se pautou por um comportamento que levou à instauração de vários processos - bem e oportunamente andou o Sr. Juiz ao não se ter limitado a declará-lo contumaz e a aplicar-lhe a medida de prisão preventiva Logo, deve confirmar-se o despacho recorrido uma vez que a medida de coacção contestada é a que se mostra adequada e proporcional à personalidade do arguido e à situação sendo, também, a única que se mostra exequível. Neste Tribunal, a Exm.ª Sr.ª Procuradora Geral Adjunta pronunciou-se pela improcedência do recurso sem que fosse oferecida resposta a este parecer, nos termos e prazo do art.º 417º,n.º2 CPP. Colhidos os vistos legais procedeu-se a conferência. 2. O objecto de recurso, perante a delimitação dele feita a partir das conclusões da motivação, refere-se à apreciação das questões: - da inoportunidade da decisão ; - da inexistência de uma modificação dos pressupostos em que assentou a medida de coacção de TIR que vigorava e que foi alterada pela decisão recorrida ; - da falta de pressupostos da prisão preventiva. 2.1. Com interesse para a decisão, resulta dos autos que : O processo de inquérito que antecedeu a acusação supra mencionada teve origem em certidão extraída do inquérito n.º 15515/00.2 TDLSB que se iniciou com base em queixa deduzida, em 3.8.2000, por E., por factos então entendidos como susceptíveis de indiciarem “além do mais, a prática de crimes de burla e falsificação ocorridos em 1995/1996. O referido inquérito n.º 15515/00.2 TDLSB foi arquivado, relativamente aos crimes de burla e falsificação, tendo sido ordenada a extracção de certidão por os factos poderem integrar crime de abuso de confiança com vista à investigação respectiva a ser levada a cabo em outra secção dos serviços do MºPº, assim se dando início ao inquérito 6314/02.8 TDLSB-A. O arguido prestara TIR no âmbito do inquérito n.º 15515/00.2 (fls.81), em 7.3.2001. O arguido, notificado para prestar declarações no processo 15515 veio (em 7.3.2002, 15.3.2002 e 27.3.2002 contactar telefonicamente serviços da Polícia Judiciária informando que se encontrava no estrangeiro, nomeadamente em Hong Kong, comprometendo-se a contactar tais serviços assim que regressasse a Portugal. Não foi notificado do despacho de arquivamento referido que ocorreu em 19.4.2002. O arguido não foi notificado para qualquer termo do processo depois de instaurado o inquérito n.º 6314/02.8. Quer a acusação quer o despacho que designou dia para julgamento (datados respectivamente de Janeiro e de Maio de 2003) definiam o TIR como medida de coacção aplicável. Designado dia para julgamento, por dois crimes de abuso de confiança p.p. pelo art.º 205º, n.º4 al. b) e n.º1 do CP, um deles na forma continuada, não foi notificado o arguido pelo que se declarou o mesmo contumaz, determinando a sua prisão preventiva (fls. 21 e 24). 3. 3.1. Vem o recorrente suscitar a questão da não obrigatoriedade de ser reapreciada a situação processual do arguido em virtude ou na sequência da declaração de contumácia. O que determina a oportunidade não é a declaração de contumácia mas sim o que lhe subjaz, ou seja, o facto de o arguido se ter ausentado e de se ter colocado em situação de não poder ser notificado do despacho que designa dia para julgamento. Essa a realidade que justifica a consideração de ter existido uma alteração das exigências cautelares relativamente às que determinaram a anterior aplicação de outra medida de coacção. Também, nos termos do art.º 337º, n .º1 CPP, invocado pela decisão recorrida, “a declaração de contumácia implica a passagem de mandado de detenção para efeitos do n.º2 do artigo anterior (art.º 336º CPP) ou para aplicação da medida de prisão preventiva...”. A decisão recorrida ao referir que a declaração de contumácia importa a análise da existência de pressupostos para a prisão preventiva do arguido não significa senão a constatação do que consta do referido preceito legal para o qual remete sem que tenha só por si sido determinante da escolha e aplicação da referida medida de coacção. Esta só foi aplicada depois de ter sido constatada a existência de exigências cautelares que pela sua natureza, importância e grau determinaram a necessidade da referida medida. Independentemente de tais pressupostos existirem ou não, o que nos ocupará de seguida, a decisão recorrida não assentou numa qualquer exigência legal nem partiu da verificação de que a declaração de contumácia implicaria automaticamente a aplicação de prisão preventiva o que, a ter existido, violaria certamente o espírito e texto legal que aponta para a definição e determinação concreta dos pressupostos de facto e de direito de qualquer medida coactiva, em geral, e da prisão preventiva, em particular. Esta alegação é, pois, manifestamente improcedente. 3.2. As demais questões suscitadas pelo recorrente estão intimamente ligadas, reportando-se à apreciação de uma alteração das circunstâncias que determinaram a aplicação do TIR e da verificação concreta dos pressupostos da prisão preventiva, no caso. Pode o juiz alterar a medida de coacção inicialmente aplicada no âmbito de um processo, devendo ela ser mantida ou revogada ou substituída, sempre que se verificarem razões para tal. Tais razões podem estar relacionadas com a verificação de alguma das causas de extinção ou suspensão das medidas de coacção ou com verificação de alguma das causas de revogação ou substituição enumeradas no art.º 212º CPP . Estas últimas referem-se essencialmente à alteração das circunstâncias que determinaram a sua aplicação ou atenuação das exigências cautelares ou à verificação posterior da sua inaplicabilidade. As medidas de coacção devem ser imediatamente revogadas sempre que se verifique terem deixado de subsistir as razões que justificaram a sua aplicação ou terem sido aplicadas fora das hipóteses ou das condições previstas na lei e podem ser substituídas por outras menos graves sempre que se verificar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a sua aplicação ( art.º 212º,n.ºs 1 e 3 C.P.P.). Também o facto de ter sido inicialmente aplicada uma dada medida não impede que um reforço concreto das exigências cautelares, por alteração entretanto verificada de factos que demonstrem que essa medida era insuficiente para garantir as exigências cautelares previamente diagnosticadas, possa determinar a aplicação de medida mais gravosa, desde que esta se imponha como adequada e necessária para assegurar tal finalidade. Conforme resulta do Ac. Rel. Porto de 16.10.91, a decisão inicial relativa a medidas de coacção, atentas as contínuas variações do seu regime e condicionalismo, embora não seja definitiva será, no entanto, intocável enquanto não sobrevierem motivos que justifiquem a sua alteração, por estarem as medidas de coacção sujeitas à condição “rebus sic standibus”. No mesmo sentido se pronunciaram os Ac. da Rel. Porto de 18.11.92, C.ªJ.ª XVII, 255, de 3.2.93 e de 17.1.98, respectivamente nas C.J. 1993, 1º, 247 e BMJ 473º, 564, acerca da impossibilidade de reforma de decisão sobre prisão preventiva sem que tenham ocorrido alterações fundamentais da situação existente, não podendo o tribunal reformar “in pejus” a decisão anteriormente tomada. Resulta dos autos que o arguido prestou TIR, no âmbito do inquérito iniciado com base na queixa apresentada pela assistente, e que em resultado do seu estatuto de arguido e do TIR prestado tinha a obrigação, entre outras, de comparecer perante a autoridade competente sempre que para tal fosse notificado e de não mudar de residência nem dela se ausentar por mais de 5 dias sem comunicação da nova residência ou do local onde pudesse ser encontrado, factos de que estava ciente. Por razões administrativas, foi o inquérito arquivado quanto ao crime de burla mas a partir dele foi extraída certidão que, sob outro número e noutra secção dos serviços do MºPº, deu continuidade à investigação dos factos denunciados pela assistente mas com o objectivo de poderem estes vir a determinar a prática de crimes de abuso de confiança, conforme resultava da decisão de arquivamento. Todas as peças processuais constantes da certidão que esteve na origem da investigação pelo abuso de confiança pertenciam ao inquérito originário, entre as quais se conta o interrogatório do arguido, a sua constituição nessa qualidade com o estatuto de arguido, a prestação de TIR, decorriam do processo n.º 15551 E nem o arguido pode invocar que desconhecia que o processo prosseguira por outros crimes, posto que nada na decisão de arquivamento permitia retirar outra conclusão que não a de que a investigação prosseguiria contra ele, pelos mesmos factos, não por burla ou falsificação, mas pelos crimes de abuso de confiança. Acresce que o arguido não foi notificado da decisão de arquivamento ( certidão de fls. 57) pelo que não pode invocar agora que estaria convencido de que tinham cessado as obrigações decorrentes do seu estatuto de arguido e decorrentes do TIR que prestara e que, por via da certidão em que se integrava, se mantinha à semelhança do que acontecia no âmbito do anterior inquérito, uma vez que tudo o que constava da certidão passou a fazer parte integrante do presente inquérito, ao contrário do afirmado no despacho que designou dia para julgamento ao determinar a prestação de novo TIR aquando da notificação da decisão em causa. Se é certo que, como refere o recorrente, a acusação e o despacho que a recebeu já conheciam que o arguido se deslocara para o estrangeiro em Março de 2002, sem que isso tivesse só por si determinado uma alteração ou reforço das garantias cautelares, o que se conclui é que o arguido através das comunicações telefónicas referidas nos autos informava que se comprometia a comparecer assim que se encontrasse em Portugal. A sua ausência prolongada e por tempo indeterminado e a falta de propósito de cumprir as suas obrigações processuais e de se furtar à acção da justiça só ganharam consistência, confirmando-se plenamente perante a impossibilidade de notificação do arguido para o julgamento e perante a comprovada falta de vontade do arguido em submeter-se a julgamento e à acção da justiça. Comprovam-se agora pela sua atitude processual em que manifesta a sua falta de intenção de comparecer e de assumir as suas responsabilidades de arguido. Tendo ele beneficiado de um tratamento favorável que lhe permitiu faltar a tais obrigações, não pode argumentar que esse mesmo tratamento impediria agora a conclusão que houve uma real alteração das exigências cautelares, comparativamente com as inicialmente definidas nos autos, apoiadas em factos diversos ou num conhecimento processualmente insustentado dos factos existentes . Nada obsta à referida alteração, portanto, à alteração da sua situação processual decorrente da alteração de circunstâncias em que assentou a anterior definição da mesma. Nenhuma medida de coacção prevista no C.P.P., à excepção do T.I.R., pode ser aplicada se, em concreto, se não verificar : fuga ou perigo de fuga; perigo de perturbação do inquérito; perigo de perturbação da ordem e tranquilidade públicas ou de continuação da actividade criminosa. É o que decorre do art.º 204º C.P.P. que define os requisitos gerais de aplicação das medidas de coacção e, nos termos do disposto no art.º 202º, n.º1 al. a) C.P.P., estabelecem-se os casos em que pode ser imposta a prisão preventiva ao arguido. Esses pressupostos são : - haver fortes indícios da prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a três anos; e de - serem inadequadas e insuficientes as demais medidas para garantir as necessidades cautelares, reportadas aos perigos definidos no preceito do art.º 204º C.P.P.. Sendo a prisão preventiva a medida mais gravosa de entre as medidas cautelares previstas no C.P.P. só deve a mesma ser aplicada se, em concreto, se verificarem os perigos enumerados no art.º 204º C.P.P. e se, em concreto, essas exigências cautelares forem de tal modo prementes e insusceptíveis de serem garantidas por outras medidas cautelares menos gravosas e limitativas dos direitos do arguido. Só excepcionalmente deve ser aplicada a medida de prisão preventiva que tem carácter residual ou subsidiário, o que decorre do princípio constitucional consagrado no art.º 28º C.R.P.. Não se limitando a lei a falar em suficientes indícios, exigindo, para aplicação da mais gravosa das medidas de coacção, fortes indícios da prática de crime doloso punível com prisão de máximo superior a três anos, tem-se entendido que « (...) inculca a ideia da necessidade de que a suspeita sobre a autoria ou participação no crime tenha uma base de sustentação segura (...) que essa suspeita assente (...) em factos de relevo que façam acreditar que eles são idóneos e bastantes para imputar ao arguido essa responsabilidade (...) o que não invalida o entendimento de que a expressão utilizada pelo legislador (...) porventura não constituirá mais do que uma injunção psicológica ao juiz, no sentido de uma maior exigência na ponderação dos dados probatórios recolhidos acerca do crime assacado ao arguido...», in Simas Santos e Leal-Henriques, «Código de Processo Penal Anotado», Ed. Rei dos Livros, 2.ª edição, 1999, pp. 996/997. . Com efeito, nos termos conjugadamente prevenidos nos arts. 192.º n.º 2, 193.º, 197.º n.º 1, 198.º, 199.º e 200.º a 202.º, do CPP, é pressuposto da aplicação, nomeadamente, da prisão preventiva, além do mais – e para o que ao caso importa -, a existência de um «fumus comissi delicti», no sentido de que é sempre necessário que seja possível formular um juízo de indiciação da prática de certo crime. Como refere o Prof. Germano Marques da Silva, « No momento da aplicação de uma medida de coacção (...), que pode ocorrer ainda na fase do inquérito ou da instrução, fases em que o material probatório não é ainda completo, não pode exigir-se uma comprovação categórica da existência dos referidos pressupostos, mas tão-só, face ao estado dos autos, a convicção objectivável com os elementos recolhidos nos autos, de que o arguido virá a ser condenado pela prática de determinado crime». E adianta: «Nos casos em que a lei exige fortes indícios, a exigência é naturalmente maior; embora não seja ainda de exigir a comprovação categórica, sem qualquer dúvida razoável, é pelo menos necessário que, face aos elementos de prova disponíveis, seja possível formar a convicção sobre a maior probabilidade de condenação do que de absolvição.», in «Curso de Processo Penal», Ed. Verbo, 2.ª edição, 1999, pág. 240. Quando a lei fala em fortes indícios pretende exigir uma indiciação reforçada, filiada no conceito de provas sérias a que se referem V. Moreira e G. Canotilho, na «Constituição da República Portuguesa, Anotada», 3.ª edição, Coimbra, 1993, pág. 185. Assim, o primeiro pressuposto da aplicação da prisão preventiva é a existência de fortes indícios da prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a três anos (art.º 202º, al.a) C.P.P.). Atenta a fase processual – em que foi deduzida acusação recebida judicialmente - não se pode deixar de concluir pela forte indiciação dos factos integradores dos crimes imputados pelo MºPº na acusação. As medidas de coacção estão sujeitas aos princípios da legalidade, da proporcionalidade e adequação e da necessidade, enunciados nos art.ºs 191º e 193º C.P.P.. Estes princípios são uma emanação do princípio constitucional da presunção de inocência que impõe que “qualquer limitação à sua liberdade, anterior à condenação com trânsito em julgado, deva não só ser socialmente necessária como também suportável” (Castro e Sousa, in Jornadas de Direito Processual Penal, 150). Nenhuma medida, porque restritiva de direitos fundamentais, deve ser aplicada se não se revelar absolutamente necessária e a medida utilizada deve ser adequada a prosseguir os objectivos cautelares para que foi criada pela lei e deve ser proporcional ao fim visado, proibindo-se o excesso da medida relativamente aos fins obtidos. As medidas coactivas só devem ser usadas se estritamente necessárias e sempre no quadro legalmente estabelecido, com prioridade para as menos gravosas e desde que da sua aplicação não resultem inconvenientes graves para a prossecução do interesse processual em causa. A decisão recorrida apela à existência de receio de o arguido se furtar à acção da justiça, perante as circunstâncias que determinaram a declaração de contumácia do arguido. Com efeito, as circunstâncias já referidas e que demonstram a falta de cumprimento pelo arguido das suas obrigações processuais e as razões expostas que inculcam o forte receio de que o arguido se tenha ausentado para parte incerta do estrangeiro, revelando a personalidade demonstrada a partir dos factos que lhe são imputados e que fortemente se indiciam, o receio de continuação da sua actividade criminosa que se revela ser uma forma segura de angariação de rendimentos e para a qual ( indiciariamente) demonstrou forte aptidão e habilidade, fazem concluir pela necessidade da prisão preventiva como sendo a única medida susceptível de afastar os referidos receios que, no tocante ao receio de fuga, até já se confirmaram. A actuação do arguido contraria o que afirma acerca dos seus intentos de se submeter à acção da justiça ( se assim não fosse já se teria apresentado voluntariamente ) e só a sua prisão preventiva terá a virtualidade de, caso seja materialmente conseguida, fazer o arguido assumir as suas obrigações processuais. 3. Pelo exposto, acordam os juízes em manter a decisão recorrida. Custas pelo recorrente com t.j. fixada em 5 UC. Lisboa, 30/03/2004 Filomena Lima Ana Sebastião Pereira da Rocha |