Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
52/23.5YUSTR.L1-PICRS
Relator: CARLOS M. G. DE MELO MARINHO
Descritores: CONTRA-ORDENAÇÕES
LEI DE IMPRENSA
AUTORIA
PESSOA COLECTIVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/06/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: SENTENÇA CONFIRMADA
Sumário: I.  O Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro que institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo estabelece uma ambição de efectividade, ou seja, visa que as afirmações normativas atinjam todas as finalidades inerentes à sua criação, evitando os resultados considerados como portadores de desvalor;
II. Permitir a impunidade de uma miríade de comuns e materiais actos diários de comunicação destituídos de assento em prévia deliberação social específica ou assunção formal (que são esses a generalidade dos que a Lei de Imprensa pretende controlar, como se vê, por exemplo, na norma de referência no caso apreciado, ou seja, no n.º 1 do art.º 28.º da mencionada Lei), seria violar essa noção de efectividade;
III. Admitir o resultado em virtude da aplicação de semântica restritiva e deixar o ilícito em terra de ninguém, sem responsabilidade da pessoa colectiva por omissão de deliberação orgânica e intervenção formal, bem como dos agentes pessoas singulares por não actuação para si e em seu próprio nome e benefício individual mas num quadro de prestação laboral presidido por concretas instruções orientadas para a consecução das finalidades da pessoa colectiva está, seguramente, nos antípodas do anúncio de busca de efectividade na conformação de actos e actividades, justificativa da submissão ao regime geral de mera ordenação;
IV. No que tange à lei de imprensa, torna-se seguro, da análise da proibição, que o que se pretende, «in casu», é obviar à veiculação de publicidade encoberta, dissimulada ou subliminar que leve o leitor a confundir mensagens parciais e economicamente orientadas para a obtenção de lucro ou vantagem com informação isenta, equidistante e direcionada para a transmissão de referências o mais aproximadas possível da realidade;
V. Esta teologia não é compatível com uma noção orgânica de autoria, já que conduziria à rarefação do controlo e punição de contados e escassos casos de intervenção formal deixando, na prática, os cidadãos e consumidores quase totalmente desprotegidos;
VI. Se o que se quer é ser eficaz e evitar um resultado susceptível de ser produzido através de uma publicação, há que obviar a todos os efeitos ilícitos efectivamente gerados pela pessoa colectiva, quer esta actue formalmente através dos seus órgãos sociais e nos termos de disposições estatutárias e legais, quer utilize uma qualquer das suas «manus», designadamente agentes, empregados e prestadores que efectivamente corporizem a intervenção desse ente no sector relevante e versem no ilícito que se quis evitar.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção de Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:
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I. RELATÓRIO                  
OBSERVADOR ON TIME, S.A., com os sinais identificativos constantes dos autos, impugnou judicialmente decisões proferidas pela ENTIDADE REGULADORA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL (doravante também referida por ERC) que lhe impôs sanções pela prática de infracções à Lei de Imprensa.
O Tribunal «a quo» descreveu os contornos da acção e as suas principais ocorrências processuais até à sentença nos seguintes termos:
Processo n.º 52/23.5YUSTR:
1. OBSERVADOR ON TIME, S.A. (doravante também “Observador”) veio impugnar judicialmente a decisão proferida pela ENTIDADE REGULADORA  PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL (ERC) no processo de contraordenação n.º  EDOC/2020/1257 que a condenou por violação do disposto no artigo 28.º, n.º 2, da Lei de Imprensa (LI) no pagamento de uma coima de €2.500 (dois mil e quinhentos euros), pela prática, a título doloso, da contraordenação prevista e punida pelo artigo 35.º, n.º 1, alínea b), do mesmo diploma legal.
Processo n.º 87/23.8YUSTR:
2. No processo supra referenciado, apensado aos presentes autos por despacho proferido na sessão de julgamento realizada no dia 01.06.2023 (cf. ref.ª 417395) o Observador veio impugnar judicialmente a decisão proferida pela ERC no processo de contraordenação n.º EDOC/2021/9027 que a condenou no pagamento de uma coima de €2.000 (dois mil euros), por violação, a título doloso, do disposto no artigo 26.º, n.º 6, da Lei de Imprensa.
3. Em ambos os recursos, a Arguida pede a sua absolvição e subsidiariamente a aplicação de uma coima.
4. Procedeu-se à realização da audiência de julgamento com observância das normas legais.


Foi proferida sentença que decretou:
126. Em face de todo o exposto, julgo os recursos improcedentes, na totalidade (processo n.º 52/23.5YUSTR) e em parte (processo n.º 87/23.8YUSTR) nos seguintes termos:
a. Indefiro as nulidades Arguidas;
b. Condeno a Arguida pela prática, a título doloso, de uma contraordenação previstas e punida pelos artigos 28.º, n.º 2, e 35.º, n.º 1, alínea b), ambos da Lei de Imprensa no pagamento de uma coima no montante de €2.500 (dois mil e quinhentos euros) (processo n.º 52/23.5YUSTR);
c. Condeno a Arguida pela prática, a título doloso, de uma contraordenação previstas e punida pelos artigos 26.º, n.º 6, e 35.º, n.º 1, alínea b), ambos da Lei de Imprensa no numa admoestação (processo n.º 87/23.8YUSTR).

É dessa sentença que vem o presente recurso interposto por OBSERVADOR ON TIME, S.A., que alegou e apresentou as seguintes conclusões:
A. A Recorrente recorre da sua condenação na pena de multa de €2.500 pela alegada prática dos factos em causa nos presentes autos 52/23.5YUSTR, cuja sentença padece de vários vícios;
B. Deve ser corrigido, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 380º do CPP, aplicável ex vi pelo artigo 41º do RGCO, o erro constante do ponto 3 do relatório da sentença recorrida, uma vez que a Recorrente pediu a absolvição, ou se assim não entendesse, que fosse aplicada a pena de admoestação e não a aplicação de coima como foi consignado;
C. O artigo 1º do Código Penal (CP), aplicável ex vi pelo artigo 32º do RGCO, consagra o princípio da legalidade e estabelece que só pode ser punido criminalmente, por facto descrito e declarado passível de pena, por lei anterior ao momento da sua prática, não sendo possível o recurso à analogia;
D. O nº 4 do artigo 35º da LI, prevê que, pelas contraordenações previstas nesse diploma legal, respondem as entidades proprietária da publicação, que deram causa à infração, mas, para tal é necessário que estejam preenchidos todos os elementos objectivos e subjectivos;
E. O nº 2 do artigo 7º do RGCO, prevê que as pessoas colectivas serão responsáveis pelas contraordenações praticadas pelos seus órgãos, no exercício das suas funções, contudo a sentença proferida, fez uma interpretação extensiva e inconstitucional desse dispositivo legal;
F. Em primeiro lugar, violou o disposto no artigo 9º do CC;
G. A sentença proferida no ponto 17. aplicou a corrente que invoca ser seguida pela jurisprudência, “no sentido de interpretar extensivamente o artigo 7.º, n.º 2, do RGCO, “passando de um modelo de imputação orgânica para um modelo de imputação funcional, em que o sentido da expressão “órgão no exercício de funções” usado no artigo 7º do RGCO é entendido como incluindo os trabalhadores ao serviço da pessoa colectiva ou equiparada, desde de que actuem no exercício das suas funções ou por causa delas, exceto quando actuem contra ordens expressas ou em seu interesse exclusivo.”;
H. O certo é que, conforme consta do acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional 370/2023, em 7/06/2023, que se pronunciou sobre outra matéria, mas quanto à interpretação de normas, refere: “Assim se justifica que nem mesmo os erros e falhas do legislador possam ser corrigidos pelo intérprete contra o arguido”;
I. Verifica-se que se está perante uma interpretação inconstitucional do nº 2 do artigo 7º do RGCO, por violação, nomeadamente, dos artigos 20º, 29º e 32º da CRP, ao entender-se que a referência a “órgãos no exercício das suas funções”, permite incluir os trabalhadores ao serviço da pessoa colectiva ou equiparada, desde de que actuem no exercício das suas funções ou por causa delas, exceto quando actuem contra ordens expressas ou em seu interesse exclusivo;
J. A condenação da Recorrente extravasa o âmbito do nº 2 do artigo 7º do RGCO, pelo que deve esta ser absolvida;
Se assim se não entender,
K. Mesmo que fosse possível tal entendimento, o que não se concebe, o certo é que a decisão administrativa não indicou que os factos tenham sido praticados pelos trabalhadores ao serviço da Recorrente, que estes tivessem actuado no exercício das suas funções ou por causa delas, exceto quando actuem contra ordens expressas ou em seu interesse exclusivo;
L. Não foi comunicada à Recorrente, qualquer alteração de factos;
M. Mas, o ponto 23. da sentença proferida, com referência aos pontos 5.3 a 5.17, 5.18 a 5.21, depreende, sem suporte na letra dos mesmos, que: “Daqui decorre estarem em causa factos praticados no desenvolvimento da actividade desta publicação, que pertence à Arguida, pelo que os factos respectivos não poderiam deixar de ter sido praticados por trabalhadores da Arguida no exercício das suas funções, por sua conta, em seu nome e no seu interesse”, sem tal matéria conste do teor dos mesmos;
N. Uma vez a sentença recorrida não pode acrescentar factos que suportem a condenação, que não tenham sido mencionados na decisão administrativa, a mesma é NULA, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 379º do CP, aplicável ex vi pelo artigo 41º do RGCO;
O. A publicação do artigo foi feita com “mancha de cor diferente da usada em conteúdos editoriais”, como determina a alínea b) do ponto 4. da Directiva 1/2009, tem a indicação de que a autoria do texto é do OBSERVADOR LAB e o conteúdo é patrocinado por JLL, acompanhado do respectivo logotipo;
P. Ou seja, foram cumpridos os requisitos previstos no artigo 28º da LI e em especial o exigido pela Directiva 1/2009, sobre publicidade em publicações periódicas, quanto ao princípio da identificabilidade e da separação;
Q. A Recorrente actuou, de boa fé, com a consciência de que cumpria o exigido, pelo que agiu em erro sobre a ilicitude, previsto no artigo 17º do CP;
R. E, erro sobre elementos do tipo e sobre a proibição, o que afastaria a ilicitude do facto ou a culpa do agente, excluindo o dolo, nos termos do nº 2 do artigo 8º do RGCO;
S. O que implica a absolvição da Recorrente, com todas as consequências legais;
Se assim se não entender, o que por mera cautela se admite,
T. O nº 1 do artigo 18º do RGCO, determina que a determinação da medida da coima se faz em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou;
U. O artigo 35º da LI não qualifica a contraordenação como grave, a Recorrente não tem antecedentes contraordenacionais e não agiu com culpa;
V. Ao contrário do invocado na sentença recorrida, a situação financeira de uma sociedade não resulta do capital social, mas sim pelos resultados apurados;
W. Pelo que, face à diminuta gravidade da contraordenação, se ela existiu, da inexistência de culpa, a situação económica da Recorrente, estão preenchidos os requisitos legais previstos no artigo 51ºdo RGCO, em vez de ser aplicada uma coima, deveria ser aplicada, quanto muito, uma admoestação;
X. Nesta conformidade, a douta sentença violou o disposto nos:
Artigo 28º e 35º da Lei de Imprensa
Artigo 7º, 8º, 32º, 41º, 51º e 58º do Regime Geral das Contraordenações Artigo 9º do Código Civil
Artigos 1º e 17º do Código Penal
Artigo 283º e 379º do Código de Processo Penal
Artigos 20º, 29º e 32º da Constituição da República Portuguesa
Deve, por todo o exposto, e conforme supra explanado, ser revogada a sentença proferida, ordenando-se a absolvição da Recorrente, ou se assim se não entender, ser revogada a pena de coima no valor de € 2.500, aplicando a pena de admoestação.

A ERC respondeu às alegações de recurso concluindo:
 A) O Conselho Regulador da Entidade Demandada, no âmbito do processo de contraordenação n.º 500.30.01/2019/22, adotou a Deliberação n.º ERC/2022/428 (PUB-NET-PC), de 28/12/2022, que condenou o Observador ao pagamento de uma coima de € 2.500 (dois mil e quinhentos euros), pela prática, a título doloso da contraordenação prevista e punida pelos artigos 28.º, n.º 2 e artigo 35.º, n.º 1, alínea b) da LI, na sequência de falta de identificação de conteúdo publicitário, na publicação com o título “Casas portuguesas, com muitas certezas”.
B) Não satisfeito, a 03 de fevereiro de 2023, o Observador, aqui Recorrente, impugnou judicialmente da Deliberação n.º ERC/2022/428 (PUB-NET-PC), processo que deu origem aos presentes autos.
C) No dia 09/06/2023, o Tribunal a quo proferiu Sentença, que concluiu pela prática, a título doloso, de uma contraordenação prevista e punida pelos artigos 28.º, n.º 2, e 35.º, n.º 1, alínea b), ambos da LI, tendo o condenado o Observador no pagamento de uma coima no montante de €2.500 (dois mil e quinhentos euros), confirmando a decisão administrativa da Entidade Demandada.
 D) Permanecendo insatisfeito, o ora Recorrente interpôs Recurso da referida Sentença, que melhor analisaremos de seguida.
Da Resposta ao Recurso apresentado
E) A Recorrente começa por alegar que a Sentença proferida padece de erro ao decidir pela aplicação de coima no montante de €2.500 (dois mil e quinhentos euros), apesar de a Recorrente, aquando da impugnação judicial, tivesse somente pedido a absolvição ou – caso assim se não entendesse – a aplicação de pena de admoestação. A argumentação do Observador a este respeito não tem qualquer cabimento e é demonstrativa da falta de conhecimento, por parte do Recorrente, dos poderes de cognição do Tribunal. Conforme delimita o quadro legislativo do RGCO, a impugnação judicial não se fica só pelo controlo da decisão administrativa recorrida, consubstanciando, na verdade, um julgamento dos factos e subsunção desses ao direito, podendo desta análise resultar o arquivamento do processo com a absolvição do arguido, a manutenção ou alterar a condenação (vide também a este respeito, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 15/05/2019, proc. n.º 3003/14.4EAPRT.P1). É, por isso, descabida a argumentação do Recorrente no sentido de que a Sentença padece de “erro manifesto” (ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 380º do CPP, aplicável ex vi pelo artigo 41º do RGCO), sendo de improceder o recurso, quanto a esta parte.
F) Segue, o Recorrente considerando que o facto de que ser proprietária de uma publicação, não implica, de per si, qualquer responsabilidade, tendo o Tribunal realizado uma interpretação extensiva e inconstitucional ao artigo 7.º, n.º 2 do RGCO violando o disposto artigo 9.º do CC e dos artigos 20.º, 29.º e 32.º da CRP. Uma vez mais, não cabe razão ao Recorrente, tendo particular relevo para o que aqui se discute o vertido entre os pontos 7 a 29 da Sentença recorrida no qual fica explicado, atento o Parecer da Procuradoria-Geral da República n.º 11/2013, a jurisprudência do TC (Ac. TC nº 395/2003, de 22.07) e a jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa no âmbito de processos como o n.º 172/20.8YUSTR, n.º 141/21.0YUSTR, n.º 213/20.9YUSTR e o n.º 67/22.0YUSTR o porquê de se interpretar extensivamente o artigo 7.º, n.º 2, do RGCO. Mais, 
G) O Acórdão n.º 370/2023, de 7/06/2023 e proferido no âmbito do processo n.º 174/22 (mobilizado pelo Recorrente para fundamentar a sua argumentação de inconstitucionalidade da interpretação extensiva do artigo 7.º, n.º 2, do RGCO) tem que ver com a constitucionalidade das interpretações feitas nesse processo dos artigos 119.º, n.º 1 e 374.º, n.º 1, do Código Penal e do artigo 18.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de julho (lei determina os crimes de responsabilidade que titulares de cargos políticos cometam no exercício das suas funções). Sendo que o trecho transcrito pelo Recorrente é retirado de um outro Acórdão do Tribunal Constitucional (Acórdão n.º 183/2008 – apesar da errada identificação feita pelo Recorrente), que versa igualmente sobre a constitucionalidade de interpretações dos mesmos artigos do Código Penal e do artigo 18.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de julho, não tendo manifestamente nada que ver interpretação do disposto no n.º 2, do artigo 7.º, do RGCO, não devendo ser de entender no caso sub judice. Não permanecem, por isso, quaisquer dúvidas: o Observador é responsável, à luz do disposto no artigo 7.º, n.º 2, do RGCO, pelos factos praticados pelos seus trabalhadores, no exercício das suas funções e no seu interesse, em seu nome e/ou por sua conta, incluindo-se aqui os funcionários da área de Branded Content, responsáveis pela elaboração do artigo publicado no desenvolvimento da atividade do Recorrente, por um departamento do Recorrente (cf. alínea d), o) e p) dos factos provados, da Sentença recorrida). Neste sentido, andou bem o Tribunal a quo ao proceder a uma interpretação extensiva do artigo 7.º, n.º 2, do RGCO, não sendo essa, de modo algum, inconstitucional.
H) Segue, o Observador, a sua cadeia argumentativa alegando que a Sentença recorrida padece de nulidade, nos termos do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 379º do CP, aplicável ex vi pelo artigo 41º do RGCO, por acrescentar factos não mencionados na decisão administrativa, em particular: o facto de os trabalhadores ao serviço do Observador terem atuado (aquando da redação e publicação do artigo em crise) no exercício das suas funções ou por causa delas. Não é verdade, por vários motivos. Mas, antes de os conhecermos, será de notar que o faremos considerando que o Recorrente incorreu num lapso de escrita e, na verdade, pretendia referir-se à alínea b) do nº 1 do artigo 379º do CPP, sendo nesse pressuposto que por ora responderemos.
I) Ao contrário do que pretende fazer crer o Recorrente, a Sentença recorrida em nada alterou o elenco de factos provados da decisão condenatória proferida no âmbito do processo judicial, sendo que a última frase do ponto 23 da Sentença é retirada dos pontos 5.3. a 5.21 da Deliberação impugnada, devendo também quanto a este ponto improceder a argumentação do Recorrente. O que sucedeu no último parágrafo do ponto 23 da Sentença é a conclusão, do Tribunal a quo, em face da completa fundamentação factual da decisão condenatória administrativa.
 J) Caso assim se não entenda – o que se admite, sem conceder, por mera cautela de patrocínio – e que se considere que a última frase do ponto 23 da Sentença consubstancia um novo facto, ainda assim este não comporta uma alteração substancial dos factos que para efeitos dos artigos 358.º e 359.º, do CPP. E não significa porque o final do ponto 23 da Sentença é uma mera decorrência dos pontos 5.3. a 5.21 da Deliberação impugnada, não significando uma diferença de identidade, de grau, de tempo ou espaço, que transforme o quadro factual descrito na Deliberação impugnada em outro diverso, ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos essenciais, ou materialmente relevantes de construção e identificação factual, e que determine a imputação de crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis.  Tanto assim é que o Tribunal a quo decidiu manter a factualidade apurada e sanção fixada na decisão final do processo de contraordenação.
K) Além disso, sempre será necessário recordar o já anteriormente aludido no subtítulo a. que antecede: a decisão administrativa que aplica uma coima em processo de contraordenação não consubstancia uma verdadeira e própria sentença, nem é qualificada como tal pela lei, razão pela qual não tem de obedecer ao mesmo grau de formalismo exigido para aquela última. Nesse sentido, a especificação feita pelo Tribunal no final do ponto 23 da Sentença resulta de uma exigência acrescida de clarificação a que a Sentença judicial está sujeita e que não vincula a decisão condenatória da Entidade Demandada.
L) Atento a transcrita jurisprudência do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 07/02/2023 e proferido no âmbito do processo n.º 118/22.9T8VLS.L1-5, o final do ponto 23 da Sentença poderá igualmente ter resultado clara para o tribunal na sequência da produção de prova em audiência de julgamento, da não havendo lugar à alegada nulidade da Sentença recorrida.
M) Por tudo o quanto se expôs, deverá igualmente ser julgada improcedente a argumentação da Recorrente no sentido de que a Sentença da primeira instância padece de nulidade nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 379º do CPP.
N) De seguida, o Recorrente vem alegar que os elementos objetivos e subjetivos necessários para a Arguida ser responsável pela contraordenação imputada, uma vez que foram cumpridos os requisitos previstos no artigo 28º da LI e em especial o exigido pela Diretiva 1/2009, sobre publicidade em publicações periódicas e o Observador atuou, de boa-fé, com a consciência de que cumpria o exigido, pelo que agiu em erro sobre a ilicitude, e em erro sobre elementos do tipo e sobre a proibição, o que afastaria a ilicitude do facto ou a culpa do agente, excluindo o dolo – o que implica a absolvição do Recorrente.
O) A respeito desta questão, remetemos para os pontos 45 e 46 da Sentença recorrida, dos quais resultou claro que, em face da prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento, o Observador tinha a consciência de que o artigo em causa não estava devidamente identificável como sendo publicidade.
P) De facto, é também entendimento da ERC que se o Recorrente tivesse errado na interpretação da Diretiva e da LI, tinha-se bastado (para a identificação do artigo como publicidade) com a utilização de uma mancha de cor diferente da usada em conteúdos editoriais (no caso, o fundo cinzento para o artigo em causa) ao invés de ter indicado o patrocinador do artigo (com a menção “conteúdo patrocinado por JLL”, acompanhado com o respetivo logótipo), sendo certo que optou então por, conscientemente, não incluir no artigo a referência expressa à palavra “Publicidade” ou às letras “PUB”, conforme impõe o n.º 2, do artigo 28.º, da LI.
Q) Não é plausível que, para correta e completa identificação do conteúdo publicitário, bastasse o fundo cinza e a menção “Observador Lab”, muito pelo contrário: expressão “Observador Lab” não alerta os leitores para a natureza publicitária do artigo em causa – exatamente por não existir qualquer associação semântica entre esta expressão e o conceito de publicidade. Mais grave ainda é o facto de a peça em causa pertencer à secção de “Economia”, o que pode levar os leitores a pensarem erroneamente que se trata de um artigo jornalístico de atualidade económica. Todo este enquadramento serve para concluir que, de facto, não era plausível que os jornalistas da redação do Recorrente não se tivessem apercebido na imperatividade de identificar, de forma legal, o artigo em causa.
R) Assim, ao contrário do que parece pretender fazer parecer, o Recorrente atuou com dolo ao optar por usar a expressão “Observador Lab” em vez da palavra “Publicidade” ou das letras “PUB”, as quais identificariam imediata e facilmente o artigo como sendo promocional.  O Recorrente representou a ilicitude da conduta, bem sabendo que a expressão “Observatório Lab” não substitui semanticamente a expressão “publicidade”, facto este de conhecimento notório e comum para qualquer falante de língua portuguesa, tendo representado também a possibilidade de os leitores não perceberem facilmente que estavam perante um conteúdo publicitário e confundirem-no com um texto jornalístico e atuou conformando-se com esse resultado. Não é plausível que o Observador desconhecesse o preceituado na LI, já que, por um lado, se trata de legislação que o tem como destinatário específico e, por outro, o Recorrente tem largos anos de experiência e recursos bastantes, por forma a garantir que os seus colaboradores são capazes de acautelar o cumprimento da obrigação de identificação clara dos conteúdos publicitários e da sua separação face aos textos jornalísticos. Por tudo o quanto se expôs, andou bem o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão de Santarém, ao decidir que o artigo em causa consubstanciava publicidade redigida que não era imediatamente identificável, pelo que carecida de ser identificada conforme preceitua o n.º 2, do artigo 28.º, da LI, não merecendo, por isso, qualquer censura. Nestes termos, improcede o argumentado pelo Recorrente no que respeita o erro sobre a ilicitude, erro sobre elementos do tipo e sobre a proibição.
S) Caso assim não se entenda – o que se admite, sem conceder, por mera cautela de patrocínio – e se considere que não existiu dolo por parte do Recorrente (vindo a Sentença de primeira instância a ser revogada ou anulada nos termos do disposto no n.º 2, do artigo 76.º, do RGCO) a conduta deste sempre será sancionada a título de negligência, nos termos do disposto na b), do n.º 1 e no n.º 6 e 7, todos do artigo 35.º, por violação do n.º 2, do artigo 28.º, todos da LI.
T) Por fim, e subsidiariamente, o Observador alega que, atendo o facto de artigo 35º da LI não qualificar a contraordenação como grave e a falta de antecedentes contraordenacionais, deverá a coima aplicada ser substituída por admoestação.
U) A este respeito, não merecem qualquer censura os pontos 119 a 123, da Sentença recorrida, concordando-se em pleno com a suficiência, adequação e necessidade da aplicação de coima no montante de €2.500,00, porquanto as razões de prevenção geral e especial, o desvalor da conduta e a sua gravidade, assim como o facto de Observador a não mostrar qualquer arrependimento militam nesse sentido.
V) No mais, sempre será de reiterar que, subjacentes à norma violada preocupações de tutela dos direitos dos consumidores, que pretendem garantir que o leitor não confunda um conteúdo comercial com uma peça de cariz informativo, não esperando assim a isenção e o tratamento editorial que estão presentes num texto noticioso – o que, manifestamente não era possível no artigo em crise, por conta da atuação ilegal do Observador
W) A atuação do Recorrente assume particular gravidade na medida em que coartou ao leitor médio a possibilidade de optar ou não por artigos de cariz publicitário, impondo publicidade não identificada junto a conteúdos informativos.
Nestes termos, não merecendo a Sentença recorrida qualquer censura quanto a este respeito, sempre será de manter a condenação em coima no montante que já havia sido aplicado pela Recorrida e posteriormente confirmado pela primeira instância.

Também o Ministério Público respondeu ao recurso concluindo:
A - O evidente lapso de escrita do ponto 3 do relatório da sentença quando o Tribunal indica como peticionado subsidiariamente na impugnação a condenação em coima, quando a Recorrente havia peticionado subsidiariamente à absolvição a sanção de admoestação não tem qualquer efeito na decisão, tanto mais que o douto TCRS nos pontos 114 a 119, páginas 48 a 50 da sentença, enunciou especificadamente os motivos porque não podia acolher a pretensão da Recorrente na sanção de admoestação quanto à contraordenação p.p. artigos 28.º/2 e 35.º/1/b da Lei de Imprensa – processo 52/23.5YUSTR,
B – O douto Tribunal fundamentou amplamente as razões por que a contraordenação deveria ser imputada à arguida conforme se pode ler nos pontos 110 a 112 da sentença, páginas 47 e 48, C – O douto TCRS efetuou adequada interpretação dos artigos 7.º/2 do RGCO e do artigo 35.º/4 da LI, tudo em conformidade com a Jurisprudência maioritária, não contendo tal interpretação normativa qualquer violação ao artigo 9.º do CC, nem violação aos artigos 20.º, 29.º e 32.º da CRP,
D - … O n.º 2 deste artigo 7.º do RGCO preceitua que as pessoas coletivas ou equiparadas serão responsáveis pelas contraordenações praticadas pelos seus órgãos no exercício das suas funções. Ao aludir a órgãos a norma aparentemente consagra o “modelo de imputação orgânica: só os actos dos órgãos cometidos no exercício das suas funções responsabilizam a pessoa colectiva”
E - … Contudo, este modelo é inequivocamente restritivo e conduz a um resultado que certamente não foi pretendido pelo legislador ao estipular, como princípio, a responsabilidade das pessoas coletivas. Tal efeito consiste em “criar uma enorme lacuna de punibilidade quanto a infracções que podem revestir assinalável gravidade social”5 e foi posto em evidência pelo Tribunal Constitucional, no acórdão nº 395/2003, de 22.07, a propósito da interpretação do art.º 7º do RJIFNA, segundo a qual na expressão “órgãos ou representantes” se incluíam também os agentes de facto,
F - … Para além disso, o referido modelo orgânico foi afastado por inúmeros diplomas especiais relativamente a contraordenações e é mais restritivo do que aquele que foi consagrado no artigo 11º do Código Penal (CP), não havendo razões para que as regras de imputação, no ilícito de mera ordenação social, tido como menos grave, sejam mais exigentes.
G - … são descortináveis diversas definições legais de “órgão”, consoante os fins concretamente visados pelo diploma em que as mesmas se inserem … Na perspetiva material da atividade dos entes coletivos (por contraposição à perspetiva da sua estrutura organizatória) – que é aquela que releva a propósito da imputação de condutas individuais a uma pessoa coletiva –, pode entender-se o órgão como o indivíduo cuja atuação é imputada ao ente coletivo. Estando em causa uma conduta correspondente a uma declaração de vontade, é evidente que as regras estatutárias sobre os processos deliberativos internos tendem a assumir maior relevância (cfr. a mencionada definição legal constante do artigo 20.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo). Mas, tratando-se de simples atuações materiais, nada obsta a que a imputação se fundamente com base numa atuação em nome do ente coletivo e no seu interesse (representante) ou na circunstância de o mesmo indivíduo dispor no âmbito de tal ente de autoridade ou de uma posição de liderança para controlar a respetiva atividade”
H - … Na mesma linha, exarou-se no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12.10.2022, processo n.º 67/22.0YUSTR, Juiz 3 deste Tribunal7, que a palavra «órgão» deve ser lida “como referida a estrutura que actue pela visada no «mundo» dos factos ou do Direito”.
I - … Pelas razões expostas, partilha-se a corrente seguida pela jurisprudência que cremos ser maioritária8 e pelo Parecer da Procuradoria-Geral da República nº 11/2013, publicado no Diário da República, 2ª série, nº 178, de 16.09.2013, no sentido de interpretar extensivamente o artigo 7.º, n.º 2, do RGCO, “passando de um modelo de imputação orgânica para um modelo de imputação funcional, em que o sentido da expressão “órgão no exercício das funções” usado no artigo 7º do RGCO é entendido como incluindo os trabalhadores ao serviço da pessoa coletiva ou equiparada, desde que atuem no exercício das suas funções ou por causa delas, exceto quando atuem contra ordens expressas ou em seu interesse exclusivo”.
J - … isto não pressupõe necessariamente a identificação da pessoa singular que praticou os factos. Basta, conforme se exarou no acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 10.11.2020, processo n.º 3638/18.6T8CSC.L1-5, “que se estabeleça um nexo causal entre [a pessoa coletiva] e o acto ilícito e se não prove a exclusão da sua responsabilidade. Isto é, tudo se reconduz a uma questão de facto, no constatar que é possível imputar a ilicitude e a culpa a uma conduta da recorrente, qualquer que tenha sido o actor ou actores individuais”. Veja-se o mesmo sentido e a título de exemplo o acórdão do TRL de 23.02.2021, no processo nº 172/20.8YUSTR, Juiz 1 deste Tribunal, o acórdão do TRL de 01.06.2022, no processo n.º 141/21.0YUSTR, Juiz 2, deste Tribunal, o acórdão do TRL de 01.06.2021, no processo n.º 213/20.9YUSTR, Juiz 3, deste Tribunal e o acórdão do TRL de 12.10.2022, no processo n.º 67/22.0YUSTR, Juiz 3, deste Tribunal9. Pronuncia-se no mesmo sentido o Parecer da Procuradoria-Geral da República nº 11/2013, publicado no Diário da República, 2ª série, nº 178, de 16.09.2013.
K - O que se mostra crucial é que não haja dúvidas no sentido de que a conduta foi executada por uma das pessoas singulares que, nos termos do modelo aplicável, é suscetível de responsabilizar a pessoa coletiva. Tal certeza pode decorrer da configuração dos factos objetivos, designadamente quando estão em causa atos praticados no desenvolvimento da atividade da pessoa coletiva e no âmbito dos serviços por si prestados. Nestas situações, não é necessário identificar a ou as concretas pessoas singulares que deram um contributo co causal para a verificação da infração para concluir que os factos não podiam deixar de ter sido praticados por uma das pessoas singulares que é suscetível de responsabilizar a pessoa coletiva “
L - A Recorrente não aduz qualquer argumento, legal, jurisprudencial ou doutrinário que contrarie a interpretação que o TCRS faz do artigo 7.º do RGCO e que se funda em jurisprudência maioritária.
M - A douta sentença não modificou a matéria de facto provada da decisão administrativa, não contendo nulidade nos termos do disposto no artigo 379.º/1/b do CPP,
N – O mencionado ponto 23 da sentença está no contexto do conhecimento das questões prévias, tem como pressuposto de facto os factos provados da decisão impugnada e o mais é uma inferência desses factos provados como resulta da mera leitura dos segmentos 23 e 24 da sentença, tendo o douto TCRS concluído que os factos provados na decisão não poderiam deixar de ter sido praticados por trabalhadores da Arguida no exercício das suas funções, por sua conta, em seu nome e no seu interesse.
O - As conclusões O a R contém impugnação de facto proibida pelo artigo 75.º do RGCO, pelo que deverão ser desconsideradas.
P – Encontra-se demonstrado na douta sentença que:
“83. Pelas razões expostas, considera-se que o artigo em causa consubstanciava publicidade redigida e não era imediatamente identificável, pelo que tinha de ser identificado através da palavra 'Publicidade' ou das letras 'PUB', em caixa alta, no início do anúncio. O que não foi feito, pelo que estão verificados todos os elementos objetivos da contraordenação imputada.
84. Quanto aos elementos subjetivo e culpa decorre da factualidade dada como provada nas alíneas u) a w) dos factos provados que não se verifica qualquer erro sobre elementos do tipo e/ou sobre a proibição, tendo a Arguida agido com dolo eventual (cf. artigo 14.º, n.º 3, do Código Penal, ex vi artigo 32.º, do RGCO) e com culpa.”
Q - A douta sentença, nos pontos 114 a 123, contém ampla discussão onde o TCRS demonstra a desadequação da reação sancionatória com admoestação e de forma ampla e fundada, de acordo com os factos provados e os critérios legais atinentes à escolha e medida da sanção, justifica a coima concreta.
R – As conclusões de recurso surpreendem–se infundadas, sem apoio legal, jurisprudencial ou doutrinário.
Impõe-se assim concluir que o recurso de OBSERVADOR ON TIME SA deve ser julgado totalmente improcedente e manter-se na íntegra a douta sentença recorrida.

Foi aposto visto pelo Ministério Público junto deste Tribunal.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
São as seguintes as questões a avaliar:
1. Deve ser corrigido, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 380.º do Código de Processo Penal, aplicável ex vi pelo artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro que institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo (RGCO), o erro constante do ponto 3 do relatório da sentença recorrida, uma vez que a Recorrente pediu a absolvição, ou se assim não entendesse, que fosse aplicada a pena de admoestação e não a aplicação de coima como foi consignado?
2. A sentença impugnada fez uma interpretação inconstitucional do n.º 2 do artigo 7.º do RGCO, por violação dos artigos 20.º, 29.º e 32.º da CRP, ao entender que a referência a “órgãos no exercício das suas funções”, permite incluir os trabalhadores ao serviço da pessoa colectiva ou equiparada, desde de que actuem no exercício das suas funções ou por causa delas, excepto quando actuem contra ordens expressas ou em seu interesse exclusivo, sendo que a condenação da Recorrente extravasa o âmbito do n.º 2 do artigo 7.º do RGCO ?
3. A sentença recorrida acrescentou factos que não foram mencionados na decisão administrativa, pelo que a mesma é nula, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 379.º do Código Penal, aplicável ex vi pelo artigo 41º do RGCO?
4. Porque a publicação do artigo foi feita com “mancha de cor diferente da usada em conteúdos editoriais”, tem a indicação de que a autoria do texto é do OBSERVADOR LAB e o conteúdo é patrocinado por JLL, acompanhado do respectivo logotipo, a  Recorrente actuou de boa fé, com a consciência de que cumpria o exigido, agindo em erro sobre a ilicitude e erro sobre elementos do tipo e sobre a proibição a Recorrente deveria ter sido absolvida?
5. Porque o artigo 35.º da «LI» não qualifica a contraordenação como grave, a Recorrente não tem antecedentes contra-ordenacionais, não agiu com culpa e a sua situação financeira o justifica, deveria ter sido imposta apenas uma admoestação?

II. FUNDAMENTAÇÃO
Fundamentação de facto
Vem provado que:
Identificação da Arguida:
a. A Arguida é uma empresa jornalística, conforme inscrição n.º 223905 na Unidade de Registos da ERC.
b. A Arguida é proprietária da publicação periódica “Observador”, inscrita sob o n.º 126302 na base de dados da Unidade de Registos da ERC desde 2012.
c.  A “Observador” é uma publicação periódica em suporte digital, de informação geral, de âmbito nacional e com periodicidade diária, in https://www.observador.pt/.
Factos relativos ao processo n.º 52/23.5YUSTR:
d. No dia 23 de fevereiro de 2018 a publicação “Observador” publicou um artigo em https://www.observador.pt/ com o título “Casas Portuguesas,  com muitas certezas”, consultável na hiperligação https://www.observador.pt/2018/02/23/casas-portuguesas-com-muitas-certezas/, conforme cópia do artigo junta de fls. 87 a fls. 89 dos presentes autos.
e. A peça é identificada como sendo da autoria da “Observador Lab”.
f. É referido que o conteúdo é patrocinado pela “JLL”.
g. O artigo pertence à secção “Economia”, como se verifica na imagem infra.



h. A referida peça, cuja cópia consta a fls. 87 a 89, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor, inclui o identificativo da secção (“Mercado Imobiliário”), o título “Casas portuguesas, com muitas certezas”, uma introdução que diz “O setor imobiliário é, cada vez mais, uma alternativa, para quem procura investir. O país continua na moda e as casas, em Portugal, uma forma de rentabilizar um investimento” e desenvolvimento, que começa com os seguintes dois parágrafos: “Nunca se venderam tantas casas, e tão caras, em apenas um ano, desde que há registos em Portugal. Dizer que o país está na moda é hoje um lugar comum. Mas está, e, segundo todas as previsões, continuará a estar. Temos boa comida, benefícios fiscais para estrangeiros e, muito importante, segurança. Estes fatores, entre outros, fazem deste o país ideal para assentar arrais ou destino de eleição para uma viagem. Impulsionado pelo turismo e pelos prémios internacionais que o país tem vindo a somar, a área do imobiliário em ativos imobiliários em Portugal está no radar dos investidores estrangeiros, que procuram o país como destino de investimento comercial, turístico, para morar ou trabalhar (…)”.
i. O artigo, com onze parágrafos, incide sobre o mercado imobiliário, contém referências à atividade da empresa JLL, que atua no setor imobiliário, e ocupa quatro parágrafos com a sua história, evolução e resultados.
j. São feitas referências à empresa JLL nos parágrafos sete a dez, ocupando a totalidade do texto, da seguinte forma: – Parágrafo sete: «Uma das consultoras mais antigas, em Portugal, é a JLL. Tem mais de dois séculos de história e está presente no país desde 1997. A história da Jones Lang La Salle começou em 1783, em Londres, com a criação da Jones Lang Wooton (JLW) & Sons. Hoje, dois séculos depois, é uma consultora internacional de referência». – Parágrafo oito: «Durante os últimos 20 anos, a empresa alcançou uma posição de liderança no mercado imobiliário português, e atravessa um dos seus melhores momentos de sempre, com um crescimento anual superior a 30% nos últimos dois anos». – Parágrafo nove: «A JLL tem atualmente serviços imobiliários 360.º para todos os segmentos [...]». – Parágrafo dez: «Recentemente, a consultora cresceu [...]». – Parágrafo onze: «O Segmento prime do mercado residencial em Portugal tem sido, para a consultora [...]. Atualmente a empresa tem mais de 3.000 unidades [...]».
k. Na peça em apreço, verifica-se que existe a menção à marca “JLL”.
l. O artigo versa essencialmente sobre as características e serviços da marca “JLL”.
m. O artigo contém onze fotografias, não surgindo a identificação de autor, todas de imóveis para venda ou arrendamento pela “JLL”, da seguinte forma: – Fotografia 1 e 7: edifício “Building” (a primeira não tem identificação); – Fotografia 2: São Nicolau – Optylon Capitol; – Fotografia 3: Entreposto; – Fotografia 4: Palácio Sotto Mayor; – Fotografia 5: Buenos Aires — Lisboa; – Fotografia 6: Alexandre Herculano 41 — Lisboa; – Fotografia 8: Liberdade 12; – Fotografia 9: Lagoas Park; – Fotografia 10: Heron Castilho; – Fotografia 11: Aliados 007 — Porto.
n. O artigo publicado no dia 23 de fevereiro de 2018 pela publicação “Observador”, em https://www.observador.pt/, com o título “Casas Portuguesas, com muitas certezas” não se encontra identificado como publicidade.
o. “Observador Lab” é «a marca que representa a área de Branded Content do Observador. Com o intuito de dar voz às marcas de forma exímia e diferenciadora no mercado, o Observador Lab trabalha as marcas através de diferentes formatos que se traduzem em artigos, vídeos, webinares,  conferências, infografias, entre outros», como consta no sítio eletrónico do “Observador”.
p. A área de Branded Content não é um órgão da Recorrente, mas um departamento da Arguida com trabalhadores.
q. O Observador Lab é uma secção autónoma da área editorial e com uma direção distinta, identificada no site com a seguinte menção: “OBS Lab é a marca que representa a área de Branded Content do Observador. Damos voz às marcas. Contamos histórias. Criamos experiências.”
r. Quando se acede à secção de “Economia” na página eletrónica do jornal “Observador”, os artigos do Observador Lab aparecem juntamente com as outras notícias, e as únicas diferenças gráficas face aos outros textos são o fundo cinza e a indicação “Observador Lab” (ver como exemplo a imagem infra).



s. No texto de qualquer conteúdo do Observador Lab aparece a indicação do seu patrocinador.
t. O artigo com o título “Casas Portuguesas, com muitas certezas” foi elaborado pela área de conteúdos publicitários (a equipa do “Observador Lab”), não tendo existido qualquer intervenção da redação editorial do jornal “Observador”.
u. Ao publicar o artigo com o título “Casas Portuguesas, com muitas certezas”, a Arguida previu a possibilidade de o leitor não conseguir distinguir, de forma clara e imediata, os conteúdos publicitários dos conteúdos informativos, não podendo divulgar tais conteúdos nos termos em que o fez, conformando-se com tal possibilidade, com consciência da ilicitude da sua conduta.
v. Pela sua atividade enquanto empresa jornalística, com atividade regular desde 2012, a Arguida conhece o regime decorrente da Lei de Imprensa.
w. A Arguida praticou os factos descritos de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
x.         A Arguida não revela arrependimento, no sentido em que não interiorizou o desvalor da sua conduta.
Factos relativos ao processo n.º 87/23.8YUSTR:
y. Os jornalistas S.. e J…, em finais de 2018 e início de 2019, efetuaram uma investigação jornalística sobre casos de abusos na igreja.
z. Para o que, consultaram diversos processos judiciais que correram, ou corriam, em vários tribunais, entrevistaram várias fontes e exerceram o contraditório.
aa. Um dos casos investigados e noticiados, foi publicado a 28 de Fevereiro de 2019, sob o título “Padre de … teve um filho de uma catequista. Ela era menor quando a relação começou”, conforme se pode ler em https://observador.pt/especiais/padre-de...l-teve-um-filho-de-uma-catequista-ela-era-menor-quando-a-relacao-comecou/
bb. Nessa data, o Padre visado não exerceu o direito de resposta.
cc. Face à gravidade dos factos noticiados, foi aberta uma investigação, conforme foi relatado na notícia publicada no dia 1 de março de 2019, sob o título “Abusos sexuais. Igreja abre investigação a padre de … que teve     relação           com menor”, que se pode ler em https://observador.pt/2019/03/01/abusos-sexuais-igreja-abre-investigacao-a-padre-de...l-que-teve-relacao-com-menor/
dd. Nessa notícia dava-se conta que: “Um dia depois de o Observador noticiar que o padre H… começou um relacionamento com uma catequista quando esta tinha 14 anos, diocese de …confirmou abertura de uma investigação.”
ee. No dia 26 de fevereiro de 2021, foi publicada a notícia sob o título “Padre de … investigado por abuso sexual demite-se do sacerdócio. Papa Francisco já autorizou saída da Igreja”, cuja cópia consta a fls. 15 a 26 dos autos, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor.
ff. Nessa notícia relata-se que: “Diocese de… investigou o padre H… na sequência de uma reportagem do Observador sobre o caso. Bispo de … confirma que o sacerdote se demitiu. Caso na justiça já prescreveu. O padre católico português H…, sobre quem a diocese de … abriu em 2019 uma investigação por abusos de menores na sequência de uma reportagem do Observador sobre o caso, abandonou o sacerdócio com autorização do Papa Francisco, segundo confirmou esta sexta-feira ao Observador o bispo de ….”
gg. Cada uma das menções indicadas - “abriu em 2019 uma investigação” e “reportagem do Observador sobre o caso” -, tinha um link para notícias  anteriores, pois, como é habitual, fez-se o enquadramento, com as notícias anteriormente publicadas e sobre as quais o visado nada disse.
hh. Em 16 de março de 2021, invocando o disposto nos artigos 24.º e seguintes da Lei de Imprensa, H… remeteu um texto relativo ao exercício de um direito de resposta e de retificação sobre a dita peça jornalística de 26 de fevereiro de 2021, no qual expôs ao periódico “Observador” a sua contraversão às referências de que aí é alvo, cuja cópia consta a fls. 27 a fls. 30 dos autos, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu conteúdo.
ii. O texto de resposta foi rececionado pelo “Observador” em 17 de março de 2021.
jj. Em 13 de abril de 2021, H… apresentou recurso junto da ERC contra a publicação periódica “Observador” com fundamento em denegação do seu direito de resposta, o qual culminou na Deliberação ERC/2021/173 (DR-NET) do Conselho Regulador, de 8 de junho de 2021.
kk. Por força desta Deliberação, o “Observador” publicou o texto de resposta de H… em 8 de julho de 2021, conforme cópia que consta a fls. 42 a fls. 51 dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor.
ll. Imediatamente a seguir ao texto de resposta, o “Observador” inseriu uma «Nota Editorial - Breve anotação ao direito de resposta e de retificação com o estrito fim de apontar inexatidões e erros de facto», cuja cópia consta a fls. 51 a fls. 54 dos autos, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor.
mm. O teor da referida nota é o seguinte: «Em relação à frase “As mesmas [notícias] são fruto de fontes anónimas” (…) Denúncias e fontes “anónimas” e “próximas” valem o que valem”: O trabalho do Observador sobre este caso não foi feito apenas com base em fontes “anónimas” e “próximas”, ao contrário do que o próprio H… tenta dar como certo. A fonte da principal suspeita — e também a mais grave — está claramente identificada: é o processo no qual o antigo pároco foi investigado, a propósito de uma denúncia que referia um outro caso, que também envolveria a existência de uma criança, mas nascida ainda de uma menor. Nesse processo, enquanto procuravam indícios da denúncia inicial, os inspetores esbarraram na existência de “M…”, uma mulher já adulta, mãe de uma criança registada no nome de H… — a tal catequista e alegada vítima da reportagem do Observador. Chamada também pela PJ, essa mulher foi clara: “Questionada, refere que manteve um relacionamento amoroso com H…, à data pároco nas freguesias de… e…. Quando iniciou este relacionamento tinha catorze anos de idade”, escreveu a Polícia Judiciária. Além disso, o trabalho conta com várias outras fontes identificadas — incluindo da diocese de … e do próprio bispo. Em relação à frase “Uma denúncia anónima que também não o foi”: O processo consultado pelo Observador foi aberto a partir de uma denúncia anónima recebida pela inspetora S…. É na sequência dessa queixa que H… é chamado a prestar declarações na PJ. É certo que os investigadores sabiam quem tinha feito a denúncia, mas a queixa foi feita sob anonimato e a sua identidade nunca é referida no processo. Mais importante do que isso: essa denúncia não se refere à história contada pelo Observador — a de uma relação que o padre terá começado com uma adolescente ainda menor e com quem, já adulta, teve um filho —, mas sim a um outro caso em que H… também teria tido uma criança de outra mulher, mas quando esta era ainda menor. Ao longo do direito de resposta, o ex-padre mistura várias vezes as duas histórias, como se se tratasse do mesmo caso, para, assim, apontar supostos erros dos jornalistas. Em relação à frase “Uma ‘história iniciada em 2002’ que, afinal ‘M…’ não confirma”: H… tenta fazer crer que a alegada vítima — referida pelo Observador com o nome fictício de “M…” — desmentiu a história publicada em fevereiro de 2019, o que não corresponde à verdade. No texto é dito de forma clara que “o Observador tentou falar com M…, que recusou prestar quaisquer declarações sobre o caso”. Não falar não é nem confirmar nem desmentir. Mais à frente, H… cita uma parte do despacho de arquivamento para dizer que “a própria denunciante acaba por formalmente não assumir a denúncia inicialmente alvitrada”. Essa referência do procurador do Ministério Público não diz respeito, porém, a “M…”, a alegada vítima, como o ex-padre faz parecer, mas sim à pessoa que, não querendo ser identificada, fez a denúncia que deu origem ao processo (e que era relativa a um outro caso). Apesar de ter comunicado as suas suspeitas, a denunciante, como explica o magistrado, não quis assumir formalmente que o então padre teria abusado sexualmente de uma menor. Em relação à frase “Existe denunciante identificada, que foi ouvida no inquérito, bem como as testemunhas que apresentou e que o inquérito foi arquivado, mas não por prescrição”: A mesma confusão entre as duas pessoas e os dois casos diferentes é usada aqui de forma enganadora. H… diz que “facilmente se conclui que existe denunciante identificada, que foi ouvida no inquérito”, mas não há no processo qualquer indicação de que a pessoa que apresentou a denúncia inicial fosse a mulher com quem o ex-padre teve um filho, e que só foi encontrada pela PJ através de um pedido de informações ao Instituto de Registos e Notariado. Além disso, no trabalho publicado em fevereiro de 2019 o Observador diz duas coisas: que o processo que investigou a denúncia de que H… tinha tido um filho de uma menor foi arquivado por falta de indícios; que o outro caso em que os inspetores esbarraram, ao encontrarem “M…”, não seguiu para julgamento porque já tinha prescrito. Foi isso que efetivamente aconteceu, segundo o processo consultado pelo Observador. Em relação à frase “Os autores da publicação dizem que consultaram o processo. Não creio”: A consulta do processo pelos jornalistas do Observador foi feita no dia 7 de fevereiro de 2019, nas instalações do Ministério Público de …, que acedeu ao pedido de consulta feito por requerimento formal. Isso mesmo se percebe pelas várias referências ao processo que são feitas ao longo do trabalho contestado por H…. Em relação à frase “Fala-se em ‘mistérios’ e ‘probabilidades’ próprios de quem se deita a adivinhar”: No trabalho do Observador, em nenhum momento são referidas as palavras “mistério” ou “probabilidade”. Em relação à frase “Houve uma investigação criminal que foi arquivada; houve uma investigação canónica que também foi arquivada”: A investigação canónica, feita pela Igreja, foi arquivada, mas essa afirmação precisa de contexto e de informações que são omitidas por H…; A investigação da Igreja foi aberta um dia depois da publicação da reportagem do Observador; Enquanto decorreu essa investigação, e numa altura em que prestava serviço numa paróquia no C…, H… foi suspenso por ordem da diocese de …, que lhe ordenou que regressasse a Portugal; Segundo o bispo de …, num email enviado ao Observador, o caso “já está concluído porque a pessoa em questão pediu a redução ao estado laical que já foi concedida pelo Papa Francisco”. Ou seja, o processo foi arquivado porque, entretanto, H… pediu para deixar de ser padre, antecipando-se ao fim da investigação, que seguramente determinaria o seu afastamento — é isso que a lei canónica prevê para estes casos de padres que têm filhos».
nn. O texto de resposta de M… tem, 1076 (mil e setenta e seis) palavras, de fls. 43 a fls. 56 dos presentes autos e a nota de direção acima transcrita tem 987 (novecentos e oitenta e sete) palavras.
oo. A Arguida, enquanto entidade proprietária da publicação periódica «Observador», não interferiu na investigação jornalística sobre crimes de abuso sexual na Igreja Católica portuguesa levada a cabo pelos jornalistas S… e J…
 pp. A elaboração e a decisão de publicação da nota de direção a acompanhar o texto de resposta de H… foi do diretor da publicação periódica «Observador», M….
qq. M… afirma que é um «contrassenso» um jornal ter de publicar um direito de resposta cheio de «incorreções de facto».
rr. M… afirma que o texto de resposta de H… estava «cravejado de inexatidões e erros de facto» e por isso, a nota da direção «sendo breve, não podia ser mais curta do que é».
ss. M… afirma que, para cumprir o dever de informar, e tratando-se de um assunto tão grave como o abuso sexual de menores, o jornal tinha a necessidade de, na nota da direção, esclarecer os leitores sobre todas as inexatidões e erros da réplica de H….
tt. M… afirma que «o conceito da lei da breve nota seja indeterminado porque as circunstâncias são importantes», pois a lei conferiu elasticidade à dimensão da nota de direção, em vez de estabelecer um limite de palavras, como fez com o texto de resposta.
uu. Ao publicar uma nota de direção com 987 (novecentos e oitenta e sete) palavras a acompanhar um texto de resposta de 1076 (mil e setenta e seis) palavras, com o objetivo de retificar todas as incorreções que considerava existir na referida réplica, a Arguida representou a possibilidade de publicar uma nota de direção extensa, que retirasse relevo ao texto de resposta, sendo que apenas lhe era permitido publicar uma breve anotação, conformando-se com tal resultado, com consciência da ilicitude da sua conduta.
vv. Pela sua atividade enquanto empresa jornalística, com atividade regular desde 2012, a Arguida tem presente o regime decorrente da Lei de Imprensa.
ww. A Arguida praticou os factos descritos de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
xx. O texto de resposta continha as inexatidões apontadas na Nota Editorial.
yy. A Arguida não revela arrependimento.
Outros factos:
zz. A Arguida não possui antecedentes contraordenacionais.
aaa. No ano de 2021, a Arguida obteve em vendas de bens e serviços o montante total de € 6.542.167,68, teve um resultado líquido negativo no montante de -464.263,87 e apresentou um capital próprio no valor de €1.723.879,13.

O Tribunal «a quo» declarou não haver factos não provados com relevo para a decisão da causa.

Fundamentação de Direito
1. Deve ser corrigido, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 380.º do Código de Processo Penal, aplicável ex vi pelo artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro que institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo (RGCO), o erro constante do ponto 3 do relatório da sentença recorrida, uma vez que a Recorrente pediu a absolvição, ou se assim não entendesse, que fosse aplicada a pena de admoestação e não a aplicação de coima como foi consignado?
O vertido nas alegações e conclusões que geraram a formulação desta questão não tem qualquer relevo no presente recurso já o afirmado pelo Tribunal «a quo» que não integra a decisão, mas, apenas, a descrição das principais ocorrências processuais anteriores à prolação da sentença em sede do vulgarmente denominado «relatório».
No entanto, tendo em consideração o disposto no n.º 2 do art.º 380.º do Código de Processo Penal, sempre se dirá que existe, efectivamente, um lapso do Tribunal «a quo» na descrição do pedido impugnatório incidente sobre a decisão administrativa, ainda que sem quaisquer efeitos no decidido por o definido não se mostrar desfocado por qualquer ambiguidade na apreciação do pedido, como se vê, com clareza, nos pontos 114 a 119 da sentença criticada, em que se apreciou a eventual justificabilidade da imposição de uma admoestação no que tange à infracção por referência à qual subsiste o presente recurso.
Aliás, bem se vê, quanto ao ilícito que não surge já referenciado nesta impugnação judicial, que é claro que o Tribunal não só sabia que tinha sido pedida a fixação de uma admoestação como a impôs efectivamente. Por isso a Arguida não recorreu nesse âmbito.
Estamos, pois, perante um verdadeiro «preciosismo» processual situado nos limites da violação do princípio da economia processual que, por tal razão, apenas merece uma resposta breve e simples: elimine-se o resultado do lapso; substitua-se o vocábulo «coima» por «admoestação» no ponto 3 da decisão judicial posta em crise.

2. A sentença impugnada fez uma interpretação inconstitucional do n.º 2 do artigo 7.º do RGCO, por violação dos artigos 20.º, 29.º e 32.º da CRP, ao entender que a referência a “órgãos no exercício das suas funções”, permite incluir os trabalhadores ao serviço da pessoa colectiva ou equiparada, desde de que actuem no exercício das suas funções ou por causa delas, excepto quando actuem contra ordens expressas ou em seu interesse exclusivo, sendo que a condenação da Recorrente extravasa o âmbito do n.º 2 do artigo 7.º do RGCO ?
O presente recurso vem restringido pela Recorrente à fixação em primeira instância da «pena de multa de €2.500 pela alegada prática dos factos em causa nos (…) autos 52/23.5YUSTR».
A Impugnante pretende ter ocorrido a violação do princípio da legalidade vertido nos art.º 1.º do Código Penal (CP), aplicável ex vi do artigo 32.º do RGCO, norma que prescreve que «1 - Só pode ser punido criminalmente o facto descrito e declarado passível de pena por lei anterior ao momento da sua prática».
O regime pré-existente assim referenciado era o efectivamente aplicado pelo Tribunal «a quo», a saber, os «artigos 28.º, n.º 2, e 35.º, n.º 1, alínea b), ambos da Lei de Imprensa» (aprovado pela Lei n.º 2/99, de 13.01).
O primeiro tinha, à data da prática ilícita declarada, o seguinte conteúdo:
Artigo 28.º
Publicidade
1 - A difusão de materiais publicitários através da imprensa fica sujeita ao disposto na presente lei e demais legislação aplicável.
2 - Toda a publicidade redigida ou a publicidade gráfica, que como tal não seja imediatamente identificável, deve ser identificada através da palavra 'Publicidade' ou das letras 'PUB', em caixa alta, no início do anúncio, contendo ainda, quando tal não for evidente, o nome do anunciante.
3 - Considera-se publicidade redigida e publicidade gráfica todo o texto ou imagem cuja inserção tenha sido paga, ainda que sem cumprimento da tabela de publicidade do respectivo periódico.

Constava do segundo:
Artigo 35.º
Contra-ordenações
1 - Constitui contra-ordenação, punível com coima:
a) De 100000$00 a 500000$00, a inobservância do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 15.º, no artigo 16.º, no n.º 2 do artigo 18.º, nos n.ºs 2 e 3 do artigo 19.º e no n.º 1 do artigo 26.º;
b) De 200000$00 a 1000000$00, a inobservância do disposto nos n.ºs 2 a 6 do artigo 26.º, no n.º 2 do artigo 28.º,bem como a redacção, impressão ou difusão de publicações que não contenham os requisitos exigidos pelo n.º 1 do artigo 15.º;
c) De 500000$00 a 1000000$00, a inobservância do disposto no artigo 17.º;
d) De 500000$00 a 3000000$00, a não satisfação ou recusa infundadas do direito de resposta ou de rectificação, bem como a violação do disposto no n.º 4 do artigo 27.º e no artigo 34.º
2 - Tratando-se de pessoas singulares, os montantes mínimos e máximos constantes do número anterior são reduzidos para metade.
3 - As publicações que não contenham os requisitos exigidos pelo n.º 1 do artigo 15.º podem ser objecto de medida cautelar de apreensão, nos termos do artigo 48.º-A do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro.
4 - Pelas contra-ordenações previstas no presente diploma respondem as entidades proprietárias das publicações que deram causa à infracção.
5 - No caso previsto na parte final da alínea b) do n.º 1, e não sendo possível determinar a entidade proprietária, responde quem tiver intervindo na redacção, impressão ou difusão das referidas publicações.
6 - A tentativa e a negligência são puníveis.
7 - No caso de comportamento negligente, os limites mínimos e máximos das coimas aplicáveis são reduzidos para metade.

A operação de aferição do preenchimento dos elementos objectivo e subjectivo do ilícito deve atender com segurança ao conceito de autoria das pessoas colectivas ou equiparadas, enunciado no n.º 2 do art.º 7.º nos seguintes termos:
(…)
2 - As pessoas colectivas ou equiparadas serão responsáveis pelas contra-ordenações praticadas pelos seus órgãos no exercício das suas funções.

Neste âmbito, porque de uma operação de subsunção dos factos ao Direito se trata, importa ter sempre presente a factualidade cristalizada.
Estamos, nos autos, perante publicações indistintas, não devidamente identificadas como publicidade, mas efectivamente publicitárias no que tange à sua essência e conteúdo, emanadas do denominado «Observador Lab» que, demonstrou-se, constitui «um departamento da Arguida com trabalhadores» (vd., sobretudo, o ponto «p» da fundamentação de facto).
Neste domínio, são relevantes três linhas analíticas orientadas para a resposta às seguintes questões:
a. O que pretendeu o legislador ao estabelecer o regime geral contra-ordenacional e o sistema específico de mera ordenação social na área da imprensa?
b. Quais seriam os resultados, para o sector que se quis disciplinar, potencialmente emergentes do acolhimento da tese da Recorrente, brandida nos autos?
c. O que disse já o Tribunal Constitucional sobre esta matéria e justifica-se ainda questionar a constitucionalidade de uma interpretação não estritamente literal e semântica do art.º 7.º do RGCO?

a. O que pretendeu o legislador ao estabelecer o regime geral contra-ordenacional e o sistema específico de mera ordenação social na área da imprensa?
Quanto à primeira questão, um dado de relevo emerge, de imediato, do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro que institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo. Com efeito, o ponto n.º 2 dessa parte lógica do apontado diploma estabelece uma ambição de efectividade, ou seja, de que as afirmações normativas atinjam todas as finalidades inerentes à sua criação, evitando os resultados considerados como portadores de desvalor.
Neste âmbito, permitir a impunidade de uma miríade de comuns e materiais actos diários de comunicação destituídos de assento em prévia deliberação social específica ou assunção formal (que são esses a generalidade dos que a Lei de Imprensa pretende controlar, como se vê, por exemplo, na norma de referência no caso apreciado, ou seja, no n.º 1 do art.º 28.º da mencionada Lei), seria violar essa noção de efectividade.
Permitir o resultado em virtude da aplicação de semântica restritiva e deixar o ilícito em terra de ninguém, sem responsabilidade da pessoa colectiva por omissão de deliberação orgânica bem como dos agentes pessoas singulares por não actuação para si e em seu próprio nome e benefício individual mas num quadro de prestação laboral presidido por concretas instruções orientadas para a consecução das finalidades da pessoa colectiva está, seguramente, nos antípodas do anúncio de busca de efectividade na conformação de actos e actividades, justificativa da submissão ao regime geral de mera ordenação.
No que tange à lei de imprensa, torna-se seguro, da análise da proibição, que o que se pretende, «in casu», é obviar à veiculação de publicidade encoberta, dissimulada ou subliminar que leve o leitor a confundir mensagens parciais e economicamente orientadas para a obtenção de lucro ou vantagem com informação isenta, equidistante e direcionada para a transmissão de referências o mais aproximadas possível da realidade.
Esta teologia não é compatível com a pretendida restrição orgânica, já que conduziria à rarefação do controlo e punição de contados e escassos casos de intervenção formal deixando, na prática, os cidadãos e consumidores quase totalmente desprotegidos.
Se o que se quer é ser eficaz e evitar um resultado susceptível de ser produzido através de uma publicação, há que obviar a todos os efeitos ilícitos efectivamente gerados pela pessoa colectiva, quer esta actue formalmente através dos seus órgãos sociais e nos termos de disposições estatutárias e legais, quer utilize uma qualquer das suas «manus», designadamente agentes, empregados e prestadores que efectivamente corporizem a intervenção desse ente no sector relevante e versem no ilícito que se quis evitar. Na feliz expressão de Saragoça da Mata, apontada na decisão do Tribunal da Relação de Lisboa citado no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 395/2003, relevariam os actos sempre que surgisse «uma actuação no lugar de outrem, não só nos casos em que a instituição é representada por um dirigente, mas em todos os casos em que ela, instituição, se patenteia, seja quem for que a represente», sendo, da mesma forma, esclarecedora referência aos ensinamentos de André Vitu, aí vertida, no sentido de que a responsabilização das pessoas colectivas «permite atingir, não só os indivíduos que actuam física e intencionalmente, como também os “guarda ventos” atrás dos quais se abrigam e nos quais depositam os meios materiais propícios à acção».
No âmago da questão analisada, no sentido do que se vem expendendo e justamente no que se reporta aos fins, mostra-se muito importante, pela sua adequação e por constituir chave imprescindível para o esclarecimento da problemática subjacente o afirmado pelo Tribunal Constitucional no mesmo aresto jurisprudencial nos termos que ora se enunciam: «... a interpretação acolhida é adequada às finalidades do sistema punitivo em causa, sob pena de, ilibando a pessoa colectiva de responsabilidade por crimes praticados, em seu nome e em seu proveito, por seus representantes “reais” só pelo motivo de estes não ostentarem título jurídico que os permita qualificar como representantes “formais”, se criar uma enorme lacuna de punibilidade quanto a infracções que podem revestir assinalável gravidade social. Ora, perante mais do que uma interpretação possível da lei, é de presumir que o legislador tenha querido a mais adequada aos fins da sua intervenção» e «O ente colectivo não será responsabilizado por factos de terceiro, mas sim por factos praticados por um elemento da sua organização, actuando em seu nome e no seu interesse e sem desrespeitar ordens ou instruções de “quem de direito”».
É importante, nesta vertente, ainda que sem focagem específica quer no regime geral das contra-ordenações quer no emergente da Lei de Imprensa, o facto de o legislador, em algumas áreas do Direito de mera ordenação social ter verbalizado expressamente o afastamento do modelo restritivo, estritamente orgânico, de autoria.

b. Quais seriam os resultados, para o sector que se quis disciplinar, potencialmente emergentes do acolhimento da tese da Recorrente, brandida nos autos?
A resposta a esta questão entrevê-se já no dito quanto à pergunta anterior e é muito nítida no caso em apreço. Caso não fosse sancionada, a Visada Recorrente continuaria a praticar ilícito grave sem possibilidade de resposta do sistema que quis vedar a sua conduta, publicando publicidade encoberta a pretexto que eram os seus empregados e não ela quem fazia a publicação.
Trata-se de resultado não só violador da referida pretensão de efectividade mas também iníquo, assimétrico face a quem fosse punido por idênticos resultados, a jurídico porque desenharia um sistema normativo sem protecção coactiva e institucionalizadora de severos riscos e amplos alçapões para os cidadãos, os consumidores, a economia e a sociedade.
Trata-se, assim, de resultado a afastar alijando-se, com tal finalidade, a interpretação proposta pela Recorrente conducente à institucionalização do ilícito e da entropia.

c. O que disse já o Tribunal Constitucional sobre esta matéria e justifica-se ainda questionar a constitucionalidade de uma interpretação não estritamente literal e semântica do art.º 7.º do RGCO?
Resulta claro, da decisão do Tribunal Constitucional acima referida, a rejeição do modelo orgânico de génese histórica (cf. o dito a esse propósito no acórdão sob menção) mas destituído de adequação à intervenção legislativa que se pretendeu realizar no sector apreciado.
Tal decisão é equilibrada, convincente, não suscita particulares dúvidas.
O resultado por si obtido tem reverberação na jurisprudência comum invocada pelo Ministério Público e pela ERC.
É inafastável, à luz dos resultados obtidos na senda analítica percorrida, que, se o legislador não quis o resultado, então também não quis dizer o que se atribui ao por si afirmado, logo não sendo possível reconhecer como correspondendo ao «pensamento legislativo» o pretendido na impugnação judicial, justamente (por força do estatuído no n.º 1 do  art.º 9.º do Código Civil que assim, não só não foi violado, como a Recorrente pretendeu, como nega qualquer razão à Impugnante).
Tendo-se atingido um resultado superior, mais justo, tecnicamente mais sustentado e sustentável, mais concretizador das finalidades normativas e mais eficaz na  interdição das práticas às quais se quis obviar, não se divisa razão aceitável e sólida que milite no sentido pretendido no recurso, não sendo convincente, seguramente, a paixão pela literalidade em que parece assentar a tese de sinal contrário.
Nem se diga que se colocam problemas de constitucionalidade particularmente ao nível dos princípios da legalidade e do seu associado princípio da tipicidade já que, como se vê do percurso analítico realizado, é susceptível de ser imediatamente percebido por qualquer pessoa singular ou colectiva que a actuação em nome de outrem, ou seja, sem a qualidade de terceiro, sempre convoca a responsabilidade do representado. É algo claro, lógico, simples, compreensível por qualquer cidadão e extraível da experiência quotidiana.
Não se colocam, pois, problemas de constitucionalidade, designadamente à luz do estabelecido no n.º 1 do  art.º 29.º (por existir segura e clara norma punitiva prévia  não assumindo qualquer sentido, sequer, a possibilidade de ser compreendida a invocação da violação dos direitos de aceder ao Direito e a uma tutela jurisdicional efectiva (consagrados no art.º 20.º), da mesma forma não se justificando a genérica invocação de desrespeito de qualquer garantia de processo penal, para os efeitos do  art.º 32.º (como os restantes invocados neste parágrafo, da Constituição da República Portuguesa).
Contrariamente ao alegado, a condenação respeita o estabelecido nos invocados art.ºs 28.º e 35.º da Lei de Imprensa, os art.ºs 7.º, 8.º, 32.º, 41.º, 51º. e 58.º do RGCO, o art.º 9.º do Código Civil, os art.ºs 1.º e 17.º do Código Penal, os art.ºs 283.º e 379.º do Código de Processo Penal e os art.ºs 20.º, 29.º e 32.º da Constituição da República Portuguesa.
É muito clara, face ao enunciado, a necessidade de responder negativamente à questão principal proposta e agora apreciada.

3. A sentença recorrida acrescentou factos que não foram mencionados na decisão administrativa, pelo que a mesma é nula, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 379.º do Código Penal, aplicável ex vi pelo artigo 41º do RGCO?
Os pontos K a L das conclusões de recurso, situados na génese desta questão, espelham, sobretudo, confusão analítica já que misturam subsunção com fundamentação fáctica.
Ao contrário do pretendido, no ponto 23 da sentença não se aditou qualquer facto, antes se fez ponderação de factos provados para daí extrair conclusões fácticas relevantes para a avaliação de questão prévia.
Não se materializa a base circunstancial em que assenta a pergunta.
A resposta que se lhe impõe dar é, consequentemente, também negativa.

4. Porque a publicação do artigo foi feita com “mancha de cor diferente da usada em conteúdos editoriais”, tem a indicação de que a autoria do texto é do OBSERVADOR LAB e o conteúdo é patrocinado por JLL, acompanhado do respectivo logotipo, a  Recorrente actuou de boa fé, com a consciência de que cumpria o exigido, agindo em erro sobre a ilicitude e erro sobre elementos do tipo e sobre a proibição a Recorrente deveria ter sido absolvida?
Com a alegação que gerou esta pergunta, a Recorrente o que tentou realmente fazer foi questionar os factos provados e sustentar a demonstração de outros de sinal oposto, que mais lhe convinham, o que lhe era vedado pelo n.º 1 do art.º 75.º do RGCO.
De forma antagónica com o sustentado, antes se provou que:
«w. A Arguida praticou os factos descritos de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei».
«x. A Arguida não revela arrependimento, no sentido em que não interiorizou o desvalor da sua conduta».

É ilegal o neste âmbito sustentado e pretendido no recurso.
Improcede claramente esta vertente da impugnação judicial.
5. Porque o artigo 35.º da «LI» não qualifica a contraordenação como grave, a Recorrente não tem antecedentes contra-ordenacionais, não agiu com culpa e a sua situação financeira o justifica, deveria ter sido imposta apenas uma admoestação?
A medida punitiva de admoestação é apenas permitida, no que se reporta ao ilícito apreciado, em situações de reduzida gravidade e culpa, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 51.º do RGCO.
Quanto à culpa, os factos provados transcritos a propósito da questão anterior revelam gravidade no domínio subjectivo, o que é confirmado pelos termos do presente recurso, que acrescentam ao conhecimento da firmeza da intenção de prevaricar que já se conhecia face ao demonstrado, a noção da incapacidade da Arguida de interiorizar o desvalor da conduta e a necessidade de a ela obstar futuramente, com tentativa de desresponsabilização a todo o custo, invocação de tese conducente à imobilização do sistema punitivo, arguição de factos não provados, proposta ilegal de não atendimento ao fixado mediante instrução e invocação, quanto à  admoestação, do que era patente e meridianamente cognoscível como sendo insustentável.
No que tange à gravidade do ilícito, bastariam à Recorrente uma leitura atenta da estrutura do n.º 1 do art.º 35.º da Lei da Imprensa e das diversas molduras punivas abstractas aí contidas para entender que os valores sancionatórios envolvidos não espelham ligeireza nem punição residual e de escasso pendor coercivo. Antes estamos diante de sanções muito relevantes que patenteiam a forma como o legislador viu os ilícitos, ou seja, a sua consciência da gravidade dos ilícitos a que havia que obstar.
Não há a menor dúvida de que – pelas suas consequências, pelo condicionamento da liberdade individual dos cidadãos, efeitos perversos na concorrência e no mercado e desvalor intrínseco do engano subreptício materializado pela apresentação de publicidade como notícia – estamos perante ilícito grave e nunca de escassa gravidade.
Não tem a menor adequação a pretensão de imposição de uma mera admoestação.
Não tem, pois, sempre salvo o respeito devido, qualquer sentido o invocado e ora convertido em questão.
É também negativa a resposta que se dá a esta derradeira pergunta, o que determina, em conjugação com as respostas anteriores, a total improcedência do recurso.

III. DECISÃO
Pelo exposto, julgamos improcedente a impugnação judicial apreciada e, em consequência, negando-lhe provimento, confirmamos a sentença impugnada.
Custas pela Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4,5 UCS.
*
Lisboa, 6 de Setembro de 2023
Carlos M. G. de Melo Marinho
Rute Alexandra da Silva Sabino Lopes
Ana Mónica Carrasqueiro Mendonça Pavão