Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
232/11.6JELSB.L1-5
Relator: NETO DE MOURA
Descritores: TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTE
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
PREVENÇÃO GERAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/17/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: Iº Para a suspensão da execução da pena de prisão não basta um juízo de prognose positivo relativamente ao comportamento futuro do arguido exigindo-se, ainda, que a suspensão da execução não comprometa uma das finalidades precípuas da pena, qual seja a protecção de bens jurídicos;
IIº A pena de prisão efectiva deve ser a regra para os crimes que se posicionam no segmento da criminalidade mais gravosa, especialmente os crimes contra as pessoas e, em geral, os que integram a designada “criminalidade violenta” e “criminalidade altamente organizada”, na qual se inclui o tráfico de estupefacientes, que mais consequências nefastas têm para a paz social;
IIIº As fortes exigências preventivas, sobretudo as de prevenção geral, que o crime de tráfico de estupefacientes suscita não ficam, adequada e suficientemente, satisfeitas com a simples ameaça da pena e isso justifica que, normalmente, as penas de prisão sejam efectivas;
IVº Nos casos em que o tráfico se traduz no transporte do produto pelos ditos “correios de droga”, nem por isso são menores as necessidades de prevenção, mesmo que estejam em causa indivíduos recrutados nos estratos sociais mais baixos da população, com dificuldades económicas e que se prestaram, ocasionalmente, a transportar o produto estupefaciente;
Vº Em relação a agente que, contra a promessa do pagamento de €6.000, transportou cocaína com o peso de 1.382,79 gr., por via aérea, desde o Brasil, onde a recebera de individuo não identificado, até Lisboa, onde se encontrava em trânsito para a Bélgica, com intenção da aí entregar esse produto a indivíduo também não identificado, são prementes as necessidades de prevenção geral, o que aliado à ausência de “razões muito ponderosas” que afastem essas exigências, justifica que se afaste a hipótese de suspensão da execução da pena de 4 anos e 6 meses de prisão;
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa

I - Relatório

No âmbito do processo comum que, sob o n.º 232/11.6 JELSB, corre termos pela 4.ª Vara Criminal de Lisboa, mediante acusação do Ministério Público, foi o arguido A... submetido a julgamento em tribunal colectivo, acusado que estava da prática de um crime de tráfico de estupefacientes e o terceiro da prática de um crime de tráfico de estupefacientes.
Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, por acórdão de 19.01.2011 (fls. 253 e segs.), foi decidido:
A) condenar o arguido A... pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes previsto e punível pelo art.º 21.º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão;
B) condenar o arguido na pena acessória de expulsão do território nacional, com interdição de regresso, durante cinco anos;
C) condenar o arguido nas custas do processo, com três UC´s de taxa de justiça;
D) declarar perdidas a favor do Estado as substâncias estupefacientes e a mochila apreendidas.
Inconformado, o arguido interpôs recurso da decisão para este Tribunal da Relação, concluindo assim a respectiva motivação (em transcrição integral):
1. O arguido vem condenado a 4 anos e 6 meses de prisão pela prática do crime de tráfico de estupefacientes.
2. O arguido não concorda com tal decisão porquanto considera estarem preenchidos os pressupostos formais e materiais para a suspensão da execução da pena.
3. Relativamente aos pressupostos formais os mesmos enquanto preenchidos porquanto o arguido confessou integralmente os factos de que vinha acusado.
4. Não possui condenações averbadas em Portugal, tendo referido de livre e espontânea vontade que já foi condenado e cumpriu pena por furto, sendo certo que se tal crime tivesse sido praticado em Portugal a pena não iria além da multa, como é costume nos nossos tribunais.
5. O arguido só aceitou fazer o transporte porquanto encontrava-se numa situação económica e pessoal bastante fragilizada e que perante a oportunidade de ganhar dinheiro para se estabilizar pessoalmente, deixou-se levar pela necessidade e aceitou fazer um transporte de estupefacientes, o qual não tinha como destino Portugal.
6. Tendo também ficado ainda provado que é intenção do arguido arranjar emprego assim que saia da prisão e refazer a sua vida.
7. Sendo certo que mesmo preso o arguido tem trabalhado e estudado, demonstrando não ser ocioso.
8. Quanto aos pressupostos materiais, ou seja, se a censura do facto e a ameaça de cumprimento de pena de prisão são suficientes para afastar o arguido da criminalidade, entende o arguido também estarem preenchidos.
9. O arguido demonstrou perante o colectivo do Douto Tribunal “a quo” o seu arrependimento, embaraço e vergonha por ter cometido tal crime e por ter colocado a sua mãe numa situação de vergonha.
10. O arguido confessou que apenas aceitou o transporte por causa da sua situação económica, sendo necessário ter em conta que o arguido é romeno, país que tem sérias dificuldades económicas que potenciam estas situações, porquanto as pessoas vivem desesperadas.
11. O relatório social do arguido demonstra a sua força de vontade em trabalhar e estudar, algo que pretende manter quando sair da prisão.
12. O arguido referiu em tribunal que não tem qualquer intenção de voltar a praticar qualquer crime e tal pode ser verificado pelo seu bm comportamento na prisão, não se envolvendo em qualquer problemática.
13. Ademais entende o arguido, seguindo a posição de parte da jurisprudência, que não cabe ao tribunal definir ou participar em estratégias de prevenção e combate à criminalidade e
14. que se o legislador pretende-se que as penas para este tipo de crime não pudessem ser suspensas na sua execução, então teria feito tal salvaguarda aquando o alargamento para os 5 anos.
15. O arguido foi um simples correio de droga, não é o produtor, nem o vendedor e muito menos consumidor, constando do seu relatório que não possuía qualquer adição.
16. Ademais se o fundamento é proteger e manter a segurança do povo, também os crimes de roubo deveriam ser punidos com pena de prisão efectiva, mesmo quando os arguidos são primários.
17. Ora se é prática comum no nosso país suspender esses tipos de crime quando os arguidos são primários, não obstante o medo e insegurança que geram na sociedade, também o deverá ser o tráfico de estupefacientes, dado que é menos visível aos olhos da sociedade.
18. Sendo o arguido primário neste tipo de crime, deverá a pena que lhe foi aplicada ser suspensa na sua execução, conforme previsto no artigo 50º nº 1 do Código Penal, fazendo V. Ex.as, Venerandos Juízes Desembargadores, a costumada justiça”.
*
Na 1.ª instância, a digna Magistrada do Ministério Público apresentou resposta, que conclui nos seguintes termos:
1. “O acórdão recorrido condenou o arguido em pena justa e adequada aos factos e à culpa, tendo em conta as finalidades preventivas.
2. A pena aplicada ao arguido não deverá ser suspensa na sua execução, atenta a gravidade do ilícito criminal em apreço, que põe em causa a ordem e tranquilidade públicas, o que impõe exigências de prevenção acrescidas, geral, e também especial, em razão da situação pessoal do arguido, que é cidadão estrangeiro sem qualquer ligação a Portugal, por falta de verificação dos pressupostos do artº 50º do Código Penal.
Neste sentido: Ac. do STJ de 10 de Fevereiro de 2010 proferido no proc. 217/09.2 JELSB.S1 citado no acórdão proferido no proc. 78/10.9 JELSB pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 23 de Setembro de 2010.
3. Pelo exposto deverá negar-se provimento ao presente recurso, mantendo-se o douto acórdão recorrido”.
*
Admitido o recurso e já nesta instância, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, acompanhando a posição tomada pela Magistrada do Ministério Público na 1.ª instância, foi de parecer que o recurso não merece provimento.
*
Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal.
*
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.
*
II – Fundamentação
O recorrente não impugna a decisão sobre a matéria de facto, não questiona o seu enquadramento jurídico-penal e aceita a medida da pena aplicada.
Insurge-se contra a decisão, apenas, na medida em que o condenou em pena de prisão efectiva, quando, na sua perspectiva, a pena devia ter sido suspensa na sua execução.
Visto que são as conclusões pelo recorrente extraídas da motivação do recurso que, sintetizando as razões do pedido, recortam o thema decidendum (cfr. artigos 412.º, n.º 1, e 417.º, n.º 3, do Cód. Proc. Penal, e acórdão do STJ de 27.05.2010, www.dgsi.pt/jstj), a nossa atenção centrar-se-á na única questão a decidir: se estão verificados, no caso, os pressupostos da suspensão da execução da pena de prisão.
*
Para uma correcta decisão, mesmo que limitada à questão equacionada, é fundamental conhecer a factualidade em que assenta a condenação proferida, pelo que aqui se reproduzem os factos que o tribunal recorrido deu como provados:
Factos provados
1. No dia 11 de Julho de 2011, cerca das 7.05 horas, o arguido desembarcou no Aeroporto de Lisboa, no voo TP 170 proveniente de Brasília, no Brasil, encontrando-se em trânsito para Bruxelas, na Bélgica.
2. Em seguida, e nas instalações do Aeroporto de Lisboa, foi seleccionado para fiscalização da sua pessoa e bagagem.
3. No decurso da operação, verificou-se que o arguido trazia consigo no forro de uma mochila uma embalagem de cocaína, com o peso líquido total de 1 382,79 gramas.
4. O arguido A... tinha ainda consigo: - Um talão de embarque aéreo para o percurso Lisboa-Bruxelas em seu nome para o dia 11 de Julho de 2011, - Várias folhas relativas ao itinerário de viagem com o trajecto Madrid - Rio de Janeiro – Madrid – Brasília – Lisboa -Buxelas.
5. O produto estupefaciente acima referido, que o arguido tinha consigo, havia-lhe sido entregue no Brasil, por indivíduo de identidade não apurada para que transportasse aquela substância desde esse país, passando por Portugal, indo-a entregar em Bruxelas, na Bélgica, a terceiro indivíduo não identificado.
6. O arguido tinha conhecimento de que transportava consigo cocaína, assim como da natureza estupefaciente dessa substância e mesmo assim, com o único intuito de auferir proventos pecuniários quis fazê-lo.
7. Agiu livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era criminalmente punida por lei.
Mais se provou:
8. Confessou integralmente os factos e mostrou-se arrependido.
9. Acordou o transporte do produto estupefaciente apreendido, com o qual iria receber a quantia de € 6 000,00.
10. Na altura atravessava difícil situação económica.
11. O arguido não tem condenações averbadas em Portugal e não lhe são conhecidos outros processos pendentes.
*
Já não suscita qualquer divergência ou objecção o entendimento de que a suspensão da execução da pena não é uma faculdade de que o juiz pode, ou não, usar, mas antes um poder-dever, isto é, um poder vinculado. Por isso que a decisão do tribunal, qualquer que ela seja, exige uma fundamentação específica, devendo explicitar as razões do juízo de prognose (positivo ou negativo) que formule quanto ao comportamento futuro do condenado (cfr., entre outros, os acórdão do STJ, de 20.02.2003, CJ/Acs STJ, 2003, T. I, 206, e de 11.02.2010, www.dgsi.pt/jstj, e o acórdão do TRL de 27.01.2010, www.dgsi.pt/jtrl; jurisprudência que acolhe a doutrina de Figueiredo Dias, “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, 1993, p. 341-342), constituindo a falta de pronúncia expressa uma nulidade que é de conhecimento oficioso, nos termos do art.º 379.º, n.ºs 1, al. c), e 2, do Cód. Proc. Penal (cfr. acórdão do STJ, de 20.02.2008, www.dgsi.pt/jstj).
O tribunal a quo fundamentou longa e proficientemente a decisão de denegar a suspensão da execução da pena de prisão, nos seguintes termos:
“Para além de a medida da pena não poder exceder 5 anos, a suspensão da pena de prisão, nos termos dessa disposição legal, só é admissível se se verificar uma dupla condição: poder formular-se um juízo favorável quanto ao comportamento futuro do agente; e ser a suspensão suficiente para assegurar as finalidades da punição.
Quanto ao primeiro aspecto, são claramente insuficientes os elementos de facto recolhidos para se poder concluir que a “simples censura do facto” desviará o recorrente (certamente, quis-se dizer arguido ou agente) de futuras práticas criminosas, nomeadamente da mesma natureza, tendo em conta o percurso de vida instável do arguido, o seu comportamento anterior, a motivação do facto e a intensidade do dolo. O arguido não tem antecedentes criminais em Portugal, constando todavia do relatório social, aceite pelo arguido, a referência a duas condenações em prisão efectiva que cumpriu. Do relatório social consta que o arguido revela um percurso instável, havendo permeabilização às influências externas que lhe condiciona o percurso. Sucede que na perspectiva da prevenção geral positiva, no tocante à demonstração da validade das normas jurídicas violadas e à tutela das normas que elas visam proteger, tem de concluir-se que não se mostrar prefigurada a supra aludida situação de prognose favorável ao arguido. Acresce que se tratou de um transporte de uma quantidade significativa de cocaína por um denominado correio, pelo que se postulam acentuadas razões de prevenção geral de intimidação.
Na verdade, é quanto à garantia da salvaguarda das finalidades da punição que os obstáculos à suspensão são maiores. Não que, pela sua natureza, o crime de tráfico de estupefacientes imponha a efectividade das penas dos infractores. Nenhuma imposição legal estabelece essa consequência. Em abstracto, nenhum impedimento decorre da natureza do crime.
Simplesmente, há que avaliar, caso a caso, a verificação do requisito legal acima exposto: se a suspensão é suficiente para assegurar as finalidades, especialmente as preventivas, das penas.
Ora, o transporte intercontinental de estupefacientes, pela difusão rápida e eficiente das drogas junto dos mercados que abastecem os consumidores, constitui uma conduta especialmente danosa, cuja perseguição se mostra essencial para dificultar (tendencialmente cortar) a circulação das drogas e o abastecimento daqueles mercados.
A suspensão da pena, normalmente, não satisfará essas exigências preventivas e, por isso, normalmente as penas de prisão são efectivas. O que não significa que possam ocorrer circunstâncias especiais que imponham solução diferente.
No caso dos autos, nenhuma especificidade se verifica que permita concluir que a suspensão da pena não ponha em crise a prevenção geral ou especial.
Na verdade, sempre que um Estado enfraquece a sua reacção contra condutas como a do arguido, logo aumenta a respectiva prática. São igualmente fortes as exigências de prevenção geral de integração nos crimes de tráfico de estupefacientes.
Assim, a suspensão da execução da pena de prisão em casos de tráfico de estupefacientes, em que não ocorrem razões muito ponderosas, como não ocorrem no caso dos presentes autos, seria atentatório da necessidade estratégica de nacional e internacional de combate a este tipo de crime, faria desacreditar as expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada e não serviria os imperativos de prevenção geral.
Por outro lado, importa não olvidar que o “correio” é uma peça importante no mercado de estupefacientes. É através dele que, a determinado nível, se processa a circulação de estupefacientes, sendo, por isso, peça relevante no acesso às drogas pela generalidade dos consumidores. É ele que assume um papel intermédio no circuito da distribuição, contribuindo de forma determinante para a difusão alargada de drogas tal como hoje ela se faz. Os chamados “grande e médio traficantes precisam de montar o seu circuito de distribuição para levar a cabo o seu objectivo e dele fazem parte, não sendo dispensáveis, tanto os “correios” como os “dealers de rua”. Assim, se no domínio da culpa, pode ser muito mais diversificada, ao nível da ilicitude não se afigura a ideia que se pretende ser aceite pelo chamado senso comum de que o “correio” ou mesmo o “dealer de rua” são sempre figuras secundárias no negócio de estupefacientes – cfr. quanto a este aspecto, o Ac. da R.L. de 01.04.2008 (Des. Gomes da Silva), C.J. XXXIII, 2º, 140, que em parte transcrevemos.
Assim, tudo ponderado, entende-se que os factos provados e atinentes à personalidade, condições de vida, e comportamento do arguido após a prática do delito, não assumem qualquer relevo para fundamentarem um juízo de prognose favorável à suspensão da execução da pena, na vertente da prevenção especial e, bem pelo contrário desaconselham totalmente a sua aplicação. A considerável quantidade de cocaína que lhe foi apreendida e a motivação do facto, em nada permite fazer um juízo de prognose favorável e concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição e o facto do arguido ser um “correio” não atenua a culpa do mesmo, já que o transporte da droga a troco de remuneração pecuniária é tão ou mais grave que a sua venda directa (cfr. neste sentido, o Acórdão do SJ, de 19/02/97, proferido no Procº nº 1049/96, 3ª secção). Acresce, ainda, que exigências especiais fazem-se sentir neste caso e reclamam pena efectiva privativa da liberdade considerando que o ilícito criminal em causa constitui actividade criminosa de difícil controlo, consubstanciada no recrutamento, pelas redes internacionais criminosas, de indivíduos com dificuldades na vida, a nível familiar e económico. Em todo o percurso do tráfico assume particular relevo o seu transporte, como forma de assegurar a introdução, quer no mercado nacional, quer no mercado comunitário, de avultadas quantidades de drogas, que possibilitam o consumo a milhares de pessoas. Além disso, Portugal tem vindo a assumir um particular relevo quer como ponto de passagem de tráfico de estupefacientes para outros países comunitários, quer como destino final da droga transportada.
Tal facto coloca uma responsabilidade acrescida quer na prevenção, quer na repressão de tal tipo de criminalidade, não podendo as instâncias jurisdicionais deixarem de dar uma resposta claramente dissuasora de forma a evitar o tráfico de estupefacientes.
Daí que se tenha de concluir que, neste caso, a simples censura do facto e a ameaça da prisão não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, motivo pelo qual não se suspende a execução da pena de prisão”.

Decorre do trecho da sentença transcrito que a decisão do tribunal assenta em dois pontos fundamentais: a impossibilidade de formular um juízo de prognose favorável relativamente à conduta futura do arguido e a suspensão da execução da pena, no caso, frustraria as finalidades da punição.
O recorrente discorda do juízo de prognose negativo formulado pelo tribunal, apoiando a sua divergência nos seguintes argumentos (conclusões 3.ª, 4.ª, 5.ª, 9.ª, 10.ª, 11.ª, 13.ª, 14.ª e 15.ª):
§ confessou integralmente os factos de que vinha acusado;
§ não tem condenações averbadas em Portugal, tendo referido de livre e espontânea vontade que já foi condenado e cumpriu pena por furto;

§ só aceitou fazer o transporte porque encontrava-se numa situação económica e pessoal bastante fragilizada e, perante a oportunidade de ganhar dinheiro para se estabilizar pessoalmente, deixou-se levar pela necessidade e aceitou fazer um transporte de estupefacientes, o qual não tinha como destino Portugal;

§ demonstrou perante o Colectivo o seu arrependimento, embaraço e vergonha por ter cometido tal crime e por ter colocado a sua mãe numa situação de vergonha;

§ o arguido é romeno, país que tem sérias dificuldades económicas que potenciam estas situações, porquanto as pessoas vivem desesperadas;

§ já demonstrou a sua força de vontade em trabalhar e estudar, algo que pretende manter quando sair da prisão;

§ entende o arguido, seguindo a posição de parte da jurisprudência, que não cabe ao tribunal definir ou participar em estratégias de prevenção e combate à criminalidade;

§ se o legislador pretende-se (sic) que as penas para este tipo de crime não pudessem ser suspensas na sua execução, então teria feito tal salvaguarda aquando o alargamento para os 5 anos;

§ o arguido foi um simples correio de droga, não é o produtor, nem o vendedor e muito menos consumidor;

O juízo de prognose de que aqui se fala nada mais é que uma previsão sobre o comportamento futuro do arguido, ou seja, trata-se de saber se, tendo em conta a sua personalidade, as suas condições de vida, a conduta anterior e posterior ao facto punível e as circunstâncias deste, é possível concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, sobretudo se bastarão para afastar o arguido da criminalidade, pois é esta a finalidade precípua do instituto da suspensão Como afirma o Professor Figueiredo Dias, Ob. Cit., 343, é na “prevenção da reincidência” que se traduz o “conteúdo mínimo” da ideia de socialização. .
Há que dizer que a posição do recorrente tem arrimo em alguma jurisprudência, segundo a qual «a execução das penas de prisão fixadas em medida não superior a 5 anos, deve ser suspensa quando o condenado seja primário e tenha confessado os factos», pois que «às penas de prisão aplicadas por crimes de tráfico de droga, sobretudo tratando-se dos chamados “correios de droga”, devem aplicar-se exactamente os mesmos critérios de suspensão da execução da pena» (acórdão do TRL, de 14.01.2010; Relator: Des. João Abrunhosa de Carvalho; acessível em www.dgsi.pt).
Aliás, alguns dos argumentos esgrimidos pelo recorrente são retirados do citado acórdão, como se pode constatar pela seguinte passagem:
«Quanto à prevenção geral, a jurisprudência que se opõe à suspensão da execução deste tipo de penas, acentua particularmente o seu papel “… na repressão ao crime de tráfico de estupefacientes tendo em vista a tutela dos bens jurídicos com referência à vida de jovens e estabilidade familiar e a saúde e segurança da comunidade, como expressivamente decorre do objectivo nacional estratégico referido na Resolução de Conselho de Ministros 46/99, de 26-05. Nisto se incluem "os correios internacionais de droga" – que fazem correr o risco de transformar Portugal – para além de uma plataforma giratória que de alguma forma já é – como um off-shore europeu do comércio transatlântico da cocaína” e que a “…necessidade estratégica nacional e internacional de combate a esse tipo de crime, faria desacreditar as expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada e não serviria os imperativos de prevenção geral”.
Não podemos concordar com esta argumentação porque, por um lado, não compete aos tribunais definir ou participar em estratégias de prevenção e combate à criminalidade, uma vez que tal matéria é da competência da Assembleia da República, do Governo, do Ministério Público e dos Órgãos de Polícia Criminal, nos termos do disposto nos art.ºs 165º/1-b), c) e d), 198º/1-b), 202º e 219º/1 da CRP, no art.º 1º/1 da Lei 53/2008, de 29/08, e nos art.ºs 1º, 4º, 7º, 11º e 12º da Lei 17/2006, de 23/05. Por outro lado, sendo o legislador, certamente conhecedor das penas que os tribunais vinham aplicando aos condenados por tráfico de droga, na modalidade conhecida como “correio de droga”, nos termos do art.º 21º do DL 15/93, de 22/01, situando-se muitas delas entre os 3 e os 5 anos de prisão, por ocasião da última reforma do Código Penal, optou por alargar a possibilidade da suspensão da execução das penas de prisão até aos 5 anos, sem fazer qualquer ressalva relativamente a este tipo de crimes. Há, pois, que concluir que o legislador quis que às penas de prisão aplicadas por tráfico de droga se aplicassem os mesmos critérios que aos restantes crimes, para aferir da possibilidade de suspensão da sua execução, nos termos do disposto no art.º 9.º do CC”.
Trata-se de jurisprudência, claramente, minoritária e que contraria orientação firme da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, segundo a qual, nestes casos, “…é de afastar a suspensão da execução da pena, pois as finalidades da punição, designadamente as exigentes finalidades de prevenção geral, não poderão ser adequadamente realizadas pela simples censura do facto e ameaça da punição, uma vez que as condições de vida da recorrente, não permitem, formular um juízo de prognose favorável, e pela natureza do crime a simples ameaça da prisão não assegura, de forma adequada e suficiente, as exigências fortes de prevenção geral (acórdão do STJ, de 13.01.2011; Relator: Cons. Henriques Gaspar) No mesmo sentido, entre outros, o acórdão do STJ, de 09.12.2010, disponível em www.dgsi.pt (Relator: Cons. Maia Costa), também citado na decisão recorrida..
Assim é mesmo nos casos em que o tribunal supremo baixa, e por vezes substancialmente (como aconteceu no caso do acórdão de 16.03.2011, disponível em www.dgsi.pt; Relator: Cons. Santos Carvalho, em que a pena de 5 anos e 3 meses de prisão foi reduzida para 3 anos), a pena aplicada, fixando-a num patamar que não ultrapassa o limite até ao qual é possível a aplicação do instituto aqui em causa, mas afasta a suspensão da execução da pena, como é abundantemente ilustrado no acórdão do mesmo STJ, de 29.06.2011 (www.dgsi.pt; Relator: Cons. Raul Borges).
É óbvio que, ao aumentar o limite da pena de prisão (dos 3 anos para os 5 anos) dentro do qual é possível a suspensão da execução (constituindo seu pressuposto formal), o legislador pretendeu alargar o âmbito de aplicação da pena de substituição, mas não é menos evidente que não se pretendeu tornar menos exigente o pressuposto substantivo da sua aplicação e que não foi a pensar, especificamente, nos crimes de tráfico de estupefacientes (que no citado acórdão desta Relação de Lisboa se diz serem frequentemente punidos com penas de prisão situadas entre 3 e 5 anos) que o legislador de 2007 fez essa opção de política criminal.
Que aos casos em que são aplicadas penas de prisão por crimes de tráfico de droga se aplicam os mesmos critérios que para os demais crimes para aferir da possibilidade de suspensão da sua execução, é outra evidência.
Ao contrário do que transparece do texto do referido aresto desta Relação (de que destacámos o trecho acima transcrito) a orientação firme do Supremo Tribunal de Justiça nesta matéria não repousa na ideia de que o crime de tráfico de estupefacientes, pela sua natureza, impõe a efectividade das penas de prisão para quem o pratica. Aliás, tanto quanto sabemos, ninguém perfilha essa tese.
Nenhum preceito legal estabelece essa consequência e pode dizer-se que, em abstracto, e quanto a esse aspecto, nenhum impedimento decorre da natureza do crime.
A questão que se coloca é bem diferente e consiste em saber se para a suspensão da execução da pena basta um juízo de prognose positivo relativamente ao comportamento futuro do condenado, ou seja, um juízo favorável à sua reintegração na sociedade e se a ameaça da pena será suficiente para o afastar da criminalidade.
A resposta a esta questão só pode ser uma: é exigência incontornável que a suspensão da execução não comprometa uma das finalidades precípuas da pena, qual seja a protecção de bens jurídicos.
O entendimento que tem prevalecido na jurisprudência é o de que, nestes casos, a aplicação da pena de substituição não satisfaz aquele conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico Cfr., entre outros, o acórdão do STJ, de 30.04.2008 (CJ/Acs STJ, XVI, T. II, 222). .
Se a pena privativa da liberdade surge sempre como a última “ratio” do nosso sistema punitivo É o que decorre do seguinte trecho do preâmbulo do Dec. Lei n.º 48/95, de 15 de Março (que, recorde-se, operou a primeira grande reforma do Código Penal de 1982): “A pena de prisão – reacção criminal por excelência – apenas deve lograr aplicação quando todas as restantes medidas se revelarem inadequadas, face às necessidades de reprovação e prevenção”. , tal não significa que não haja casos em que só essa pena é adequada a satisfazer os fins da punição.
A pena de prisão efectiva deve ser a regra para os crimes que se posicionam no segmento da criminalidade mais gravosa, especialmente os crimes contra as pessoas e, em geral, os que integram a designada “criminalidade violenta” e “criminalidade altamente organizada”, na qual se inclui o tráfico de estupefacientes, que mais consequências nefastas têm para a paz social Uma evidência mais: é bem certo que não compete aos tribunais “definir ou participar em estratégias de prevenção e combate à criminalidade” (citado acórdão do TRL, de 14.01.2010), mas os tribunais não podem abdicar da irrenunciável função de garantir que a pena é adequada às necessidades de tutela dos bens jurídicos e de reafirmação da validade das normas jurídicas violadas. , como, de resto, se reconhece na exposição de motivos do já citado Dec. Lei n.º 48/95, de 15 de Março.
Como observa A. Lourenço Martins (“Medida da Pena – Finalidades – Escolha, Abordagem Crítica de Doutrina e de Jurisprudência”, Coimbra Editora, 1.ª edição, 259) na análise que faz da jurisprudência do STJ, a finalidade da prevenção geral é invocada para, não só apoiar a severidade das penas por crimes de tráfico de estupefacientes, mas também para fundamentar a denegação da suspensão da execução da pena.
As fortes exigências preventivas, sobretudo as de prevenção geral, que o crime de tráfico de estupefacientes suscita não ficam, adequada e suficientemente, satisfeitas com a simples ameaça da pena e isso justifica que, normalmente, as penas de prisão sejam efectivas.
No caso particular em que o tráfico se traduz, apenas, no transporte do produto pelos ditos “correios de droga”, nem por isso são menores as necessidades de prevenção Como se diz no acórdão desta Relação de Lisboa de 03.04.2008 (www.dgsi.pt), “a actuação do arguido como “correio de droga”, transportando uma quantidade muito significativa de droga induz um acréscimo de razões de prevenção geral de intimidação”, razão por que a pena de prisão efectiva “mostra-se indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização das expectativas comunitárias”., pois “o transporte intercontinental de estupefacientes, pela difusão rápida e eficiente das drogas junto dos mercados que abastecem os consumidores, constitui uma conduta especialmente danosa, cuja perseguição se mostra essencial para dificultar (tendencialmente cortar) a circulação das drogas e o abastecimento daqueles mercados” (citado acórdão do STJ, de 09.12.2010).
Apesar de, muitas das vezes, estarmos perante indivíduos recrutados nos estratos sociais mais baixos da população e com dificuldades económicas (e que não integram a organização que, normalmente, está por detrás da operação de importação e transporte da droga) e que se prestaram, ocasionalmente, a transportar o produto estupefaciente, não pode ignorar-se que se assiste a um crescimento imparável destes casos, como é assinalado na seguinte passagem do texto do acórdão do STJ, de 29.09.2011 (disponível em www.dgsi.pt; Relator: Cons. Souto Moura):
“O nosso país vem sendo, de há anos a esta parte, uma importante placa giratória de entrada na Europa de cocaína oriunda da América do Sul, situação a que importa pôr cobro.
A respeito do crime de tráfico de estupefacientes, do art. 21º do D.L. 15/93 de 22 de Janeiro, protagonizado pelos chamados “correios de droga”, analisámos com o apoio da Assessoria deste Supremo Tribunal, 221 acórdãos aqui lavrados, na sua esmagadora maioria, entre 2000 e 2010. Daqueles 221 processos, 202 respeitavam a “correios” que tinham sido condenados por tráfico de cocaína, o que corresponde a 90% dos casos.
Em 176 processos (dos 221), a droga era oriunda do Brasil (98) ou Venezuela (78), o que significa que 79% do total dos casos, respeitavam a cocaína vinda da América do Sul”.
De assinalar, ainda, o facto de “os tráficos de estupefacientes” serem “comunitariamente sentidos como actividades de largo espectro de afectação de valores sociais fundamentais, e de intensos riscos para bens jurídicos estruturantes, e cuja desconsideração perturba a própria coesão social, desde o enorme perigo e dano para a saúde dos consumidores de produtos estupefacientes, como por todo o cortejo de fracturas sociais que andam associadas, quer nas famílias, quer por infracções concomitantes, ou pela corrosão das economias legais com os ganhos ilícitos resultantes das actividades de tráfico. A dimensão dos riscos e das consequências faz surgir, neste domínio, uma particular saliência das finalidades de prevenção geral – prevenção de integração para recomposição dos valores afectados e para a afirmação comunitária da validade das normas que, punindo as actividades de tráfico, protegem tais valores” (citado acórdão do STJ, de 13.01.2011).
Por tudo isto são cada vez mais prementes as necessidades de prevenção geral (também negativa ou de intimidação), acentuando-se as exigências repressivas, em detrimento da reinserção social.
Sendo considerações de prevenção geral e de prevenção especial (de (res)socialização) que estão na base da aplicação das penas de substituição, o tribunal recusará essa aplicação “quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente” ou, não sendo o caso, a pena de substituição só não deverá ser aplicada “se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias” Professor Figueiredo Dias, “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, 1993, 333..
Vejamos se se verificam, no caso, as tais “razões muito ponderosas” que, superando as exigências preventivas, poderão justificar a suspensão da execução da pena, começando pela conduta do recorrente anterior e posterior ao facto.
Antes de mais, importa salientar que este factor só será relevante para a questão aqui equacionada se e na medida em que estiver conexionado com o facto e assim possa relevar para a determinação das exigências de prevenção, sobretudo de prevenção especial.
Se é certo que a existência de condenações anteriores constitui um índice de exigências acrescidas de prevenção, também se aceita facilmente que essa circunstância “não é impeditiva a priori da concessão da suspensão” Ainda, Figueiredo Dias, Ob.Cit., 344..
O recorrente acentua o facto de, em Portugal, “não ter averbadas condenações”, mas o contrário é que seria surpreendente, pois aqui não reside e, tanto quanto se sabe, foi a primeira vez que passou pelo nosso país. De resto, o facto, por si revelado, de já ter sofrido duas condenações em penas de prisão efectiva no seu país natal, embora não se saiba se os factos respectivos têm alguma ligação com o tráfico de estupefacientes, não abona a sua conduta pretérita.
A conduta posterior releva para este efeito sobretudo quando destinada a reparar o mal do crime e é aqui que entra como factor valorável a postura do arguido no âmbito do processo, nomeadamente quando contribui relevantemente para a descoberta da verdade e/ou quando, espontaneamente, confessa, total ou parcialmente, os factos e a confissão possa ser interpretada como indício de interiorização da censurabilidade do comportamento criminoso (e, portanto, um sinal de que não voltará a delinquir), e não como mera táctica processual.
A confissão dos factos é irrelevante, já que o arguido/recorrente foi detido em flagrante delito quando transportava a droga.
Quanto ao arrependimento, não resulta claro dos factos provados e da fundamentação probatória se é um arrependimento genuíno ou se é meramente verbalizado e, na primeira hipótese, em que actos e atitudes concretas se manifestou. Inequívoca manifestação de arrependimento existe quando o agente colabora com a investigação no completo esclarecimento dos factos, nomeadamente para apurar a quem se destinava a droga transportada, o que não foi o caso.
Por isso não nos parece que o provado arrependimento possa ser considerado um factor que releve significativamente a favor de um juízo de prognose positivo.
Consideremos agora a personalidade Neste segmento, importa, sobretudo, saber da sensibilidade à pena e da susceptibilidade de o agente ser por ela influenciado, circunstância que releva por via da culpa, mas também da prevenção. do arguido/recorrente.
O facto é incindível da personalidade do seu autor. Ora, sendo por demais conhecidas as devastadoras consequências (a nível pessoal, familiar e social) associadas ao tráfico de estupefacientes, não podemos deixar de considerar que revela qualidades da personalidade particularmente desvaliosas todo aquele que, como é o caso do arguido, age com soberana indiferença pelos riscos que criou com a sua actividade criminosa.
O traficante de estupefacientes só pensa nos proveitos materiais que lhe proporciona essa actividade. O que o motiva é sempre o dinheiro fácil, a ganância do lucro, a obtenção, sem esforço, de proventos, sendo-lhe indiferentes as consequências da sua conduta.
É essa a principal razão por que os traficantes dificilmente abandonam a actividade, pois a ânsia de ganhar mais e mais supera todos os riscos que correm. Por isso se diz, com propriedade, que não é difícil entrar nos meandros do tráfico de drogas. Difícil mesmo, é sair de lá.
Por isso é fraca a susceptibilidade de os traficantes serem influenciados pela pena e é grande a taxa de reincidência no crime de tráfico de estupefacientes.
O arguido/recorrente invoca a favor da sua pretensão o facto de só ter aceitado fazer o transporte da droga por se encontrar numa situação económica e pessoal bastante fragilizada e, perante a oportunidade de ganhar dinheiro para se estabilizar pessoalmente, deixou-se levar pela necessidade e acrescenta que o seu país (Roménia) tem sérias dificuldades económicas que potenciam estas situações, porquanto as pessoas vivem desesperadas.
Ora, o circunstancialismo que, segundo o próprio, levou o recorrente a entrar (se é que só agora o fez) nos meandros do tráfico de estupefacientes mantém-se, nada se alterou. Se ia receber € 6 000,00 (que é um valor muito significativo) pela tarefa de que foi incumbido, pode ser tentado a reincidir e a probabilidade de tal acontecer aumentaria exponencialmente se fosse suspensa a execução da pena, pois a mensagem que lhe seria transmitida era a de que vale a pena arriscar para ganhar uma tal quantia. E não seria o facto de revelar juízo crítico em relação ao seu comportamento ilícito que o iria inibir.
Aliás, o arguido revela-se um indivíduo imaturo e emocionalmente instável, característica que, aliada à “baixa consistência interna e dificuldade no controlo dos impulsos relacionados com a satisfação das necessidades mais imediatas com consequente diminuição da capacidade de antecipar situações que o coloquem em fragilidade”, bem como a sua permeabilidade face a influências externas, constituem factores de risco de assumpção de comportamentos anti-normativos.
Por aqui se vê que, ao contrário do que pretende o recorrente, são bem consistentes e ponderosas as razões que apontam no sentido da formulação de um juízo de prognose desfavorável à suspensão da execução da pena.
Banalizar a suspensão da execução da pena de prisão nos casos de prática do crime de tráfico de estupefacientes na formulação base do art.º 21.º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, constituirá, seguramente, um estímulo para os traficantes e redundará num enfraquecimento da confiança da comunidade na validade das normas jurídicas que a prática do crime veio pôr em crise.
Em conclusão, não merece censura a decisão recorrida que aplicou ao recorrente pena de prisão efectiva, afastando, assim, a suspensão da sua execução.

III – Decisão
Em face do exposto, acordam os juízes desta 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso de A... e confirmar o acórdão recorrido.

Por ter decaído, pagará o recorrente as custas do processo, fixando-se em cinco UC´s a taxa de justiça devida (artigos 513.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, 1.º, n.º 2, e 8.º, n.º 5, do Regulamento das Custas Processuais, sem prejuízo dos disposto na al. j) do n.º 1 do art.º 4.º do mesmo Regulamento).

(Processado e revisto pelo primeiro signatário, que rubrica as restantes folhas).

Lisboa, 17 de Abril de 2012

Relator: Neto de Moura;
Adjunto: Alda Tomé Casimiro;