Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
98/22.0T9VFC.L1-9
Relator: CRISTINA SANTANA
Descritores: SINAL DE TRÂNSITO
ENTIDADE COMPETENTE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/26/2023
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: O desrespeito de um sinal de trânsito apenas pode ser considerado contraordenação quando se provar que o mesmo ali foi colocado pela entidade competente e após a necessária deliberação.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Decisão Sumária
I Relatório

1. Nos presentes autos de recurso de contraordenação, oriundos do Tribunal judicial da Comarca dos Açores, Juízo de Competência Genérica de Vila Franca do Campo, realizado julgamento, foi proferida decisão da qual se transcreve o dispositivo:

IV – DECISÃO:
Pelo exposto, julgo o recurso improcedente e, em consequência, decido manter a decisão do Coordenador do Serviço Coordenador dos Transportes Terrestres – Direção Regional das Obras Pública e Transportes Terrestres – Secretaria Regional das Obras Públicas e Comunicações – Região Autónoma dos Açores, que aplicou ao Arguido AA, coima no valor mínimo de 120,00 EUR (cento e vinte euros) e a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 (trinta) dias, pela prática da contraordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 21.º e 23.º alínea a) do Regulamento de Sinalização de Trânsito (doravante RST), aprovado em anexo ao Decreto Regulamentar n.º 22-A/98, de 01/10, na redação atualmente em vigor, e dos artigos 133.º, 138.º n.º 1, 140.º, 146.º alínea n) e 147.º n.º 2 do Código da Estrada (doravante, CE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, 03/05, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 09/12.
Condeno o Recorrente nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC, nos termos do artigo 8.º n.º 7 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais.
Notifique e deposite.
*
Ao abrigo do disposto nos artigos 160.º n.º 3 do Código da Estrada, fica desde já o Arguido notificado para proceder à entrega da carta de condução no SCTT ou na Secretaria deste Tribunal, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, após o trânsito em julgado da sentença, sob pena de, não o fazendo, incorrer na prática de um crime de desobediência, nos termos do disposto no artigo 348.º n.º 1 al. b) do Código Penal.
Vai ainda o Arguido advertido de que caso conduza veículos com motor durante o período de inibição incorre na prática de um crime de violação de proibições ou interdições, previsto e punido pelo art.º 353.º do Código Penal.
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Vila Franca do Campo, 20 de outubro de 2022

2. Inconformado com tal decisão, dela veio o arguido apresentar recurso.
Da motivação, extraiu as seguintes conclusões:
a) Vem o presente recurso interposto da circunstância de o recorrente não se conformar com a douta sentença proferido pelo Reverendíssimo Tribunal Judicial de Vila Franca do Campo, Juízo Local de Competência Genérica, Comarca de Açores, nos presentes autos, que veio a condená-lo na sanção de inibição de condução pelo período de 30 dias e subtração de 4 pontos no título de condução.
b) A contraordenação de que o arguido vem condenado reporta-se ao facto de, alegadamente, “circular com o citado veículo na referida via, não cumpriu com a indicação dada pelo sinal vertical B2- STOP” (ipsis verbis).
c) O ora recorrente, não se pode conformar, uma vez que o Tribunal “a quo” ao formar a sua convicção, decidiu em sentido contrário ao direito, no que concerne ao que entende o recorrente carecer o sinal violado de homologação/aprovação para que daí se retire o seu cumprimento e eventual procedimento coercivo em face da sua infração.
d) Resulta da sentença ora recorrida que é dado por provado que:
2. O referido sinal foi adquirido e colocado pela Câmara Municipal de Vila Franca do Campo, respeitando as formas, cores, inscrições, símbolos e dimensões, bem os materiais utilizados e as regras da respetiva colocação.
e) A questão que aqui se nos coloca, é que a prova produzida em audiência de julgamento, independentemente da apreciação que lhe for cometida, não é suficiente nem poderá conduzir sem mais à condenação do arguido na sanção acessória aqui posta em crise.
f) O Tribunal a quo dá como provado o facto 2., contudo ao perscrutar a sentença recorrida, não há especificação ou menção de que prova se socorreu o Julgador para dar como provado tal facto.
g) Apelou o recorrente alegando que o sinal B2 em crise não está homologado e como tal, não se provando encontrar-se aquele aprovado pela entidade competente, cessa o dever de obediência, até que seja reposta a validade formal do mesmo,
h) Que não se contende apenas em ter o formato, as cores e indicações similares a um sinal de trânsito daquela tipologia.
i) A fundamentação que o Tribunal a quo alicerça a sua convicção posiciona-se precisamente na presunção que o sinal foi colocado pela entidade competente para o efeito, ou seja, a Câmara Municipal de Vila Franca do Campo, entidade com jurisdição para o efeito.
j) Contudo e em sentido diverso, a alegação do recorrente não se colocou a esse nível, antes, se o sinal foi aprovado ou homologado pela entidade competente para o efeito,
k) A própria Câmara Municipal esclarece que não dispõe de qualquer documento de onde conste a aprovação do referido sinal.
l) Ora, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 21/98 de 3 de janeiro dispõe que: “A instalação de sinais de trânsito nas vias públicas só pode ser efectuada pelas entidades competentes para a sua sinalização ou mediante autorização destas entidades.” (sublinhado nosso).
m) Não está em causa a instalação do sinal ou a entidade competente para a instalação, mas antes o seu registo e aprovação.
n) A Edilidade não dispõe de qualquer comprovativo de aprovação e consequente homologação dos sinais nessa mesma data.
o) Mas ainda que assim não se entenda, a mesma Edilidade que diz ser entidade competente para o efeito, nem com a colocação dos sinais se procedeu à sua aprovação e homologação, carecendo tais sinais de cumprir tal requisito legal cumulativo, ficando-se por ter as cores, dimensões e formato de um sinal de trânsito B2, mas faltando a respetiva homologação que é o que gera obrigatoriedade coerciva do seu cumprimento, com o respetivo fundamento legal para punir o seu incumprimento.
p) Ora, as competências das entidades publicas são exercidas através de atos administrativos, os quais resultam de deliberações sejam camarárias ou do seu Presidente, conforme seja aquela a entidade competente para a decisão.
q) Por maioria de razão e de direito, os atos praticados pelas Câmaras Municipais ou seu Presidente estão fundamentadas em atos administrativos saídos de deliberações necessariamente reduzidas a escrito e sob forma legal, não havendo quanto a esta matéria discricionariedade.
r) Ora, de que serve dizer-se competente para a aprovação e não agir em conformidade com a obrigação legal de prever tal deliberação na forma escrita e legalmente adequada,
s) Não podemos perder de vista que cabe à entidade administrativa o ónus da prova no sentido de refutar tal alegação e oferecer prova para o efeito.
t) Recebida a impugnação judicial, a entidade administrativa não a alterou ou reviu, nem tão pouco se importou em certificar-se se efetivamente existe alguma deliberação camarária (independentemente da entidade orgânica competente para o efeito) a aprovar o referido sinal de trânsito.
u) Salvo o devido respeito não se apurou dos factos que a Câmara Municipal tenha aprovado, deliberado ou autorizado a colocação do sinal de trânsito, já que a mesma não o consegue de forma alguma o comprovar, conforme resulta da informação por esta prestada, datada nos autos de 01/09/2022.
v) Os sinais de trânsito de carácter impositivo, como são os que estabelecem prescrições e proibições, em que se enquadra o sinal de “stop” ou “paragem obrigatória no cruzamento ou entroncamento” (art.º 21º do regulamento acima referido, ali identificado sob a designação de “B2”), contêm uma ordem legítima imposta aos condutores.
w) Grosso modo, a Câmara Municipal afirma ter colocado os sinais, mas não oferece qualquer registo, sumula ou memória descritiva que o tenha feito,
x) De igual modo, protela-se competente para a aprovação do aludido sinal de trânsito, contudo não junta a deliberação de onde emana o ato administrativo que o instituiu.
y) Neste sentido os acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 30.10.2013 Proc.º208/13.9TBGDR.C1 e Tribunal da Relação do Porto de 11.04.2018, proc. N.º
 1930/17.6T9AVR.P1.
z) Mantendo-se a sentença recorrida, tal sugere que o ato de aprovar um sinal de trânsito para dar resposta a uma necessidade ou interesse público, bem como a sua colocação, será um ato totalmente discricionário, verbalmente empreendido,
aa) Sem que tal passe por uma deliberação camarária ou despacho do Presidente da Câmara, de acordo com o procedimento normal e característico de um qualquer outro procedimento.
bb) Verificando-se falta de fundamentação para a decisão, uma vez que não consta nos autos qualquer deliberação camarária, da Assembleia Municipal ou despacho do Presidente da Câmara que a prove o sinal contestado nos autos e delibere na sua colocação pela Câmara Municipal.
cc) Pelo que deverá ser dado por não provado o facto n.º 2 da sentença ora recorrida,
dd) E em consequência, absolvido o recorrente uma vez que não resulta provado com a consequente fundamentação, que o sinal em causa constasse de registo na entidade competente para a sua colocação e aprovação,
ee) Tão pouco nenhuma informação foi junta aos autos que esclareça quando foi colocado o sinal em causa, pelo que não se alcança como o Tribunal a quo dá por provado terem sido cumpridas todas as regras relativamente à sua colocação, se nem:
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, POR VIA DELE, SER REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA, E SUBSTITUIDA POR OUTRA QUE ABSOLVA O RECORRENTE DA PRÁTICA SANÇÃO DE INIBIÇÃO DE CONDUÇÃO A QUE FOI CONDENADO.
FAZENDO-SE, ASSIM, A ESPERADA JUSTIÇA

3.O recurso foi admitido a subir nos autos, de imediato e com efeito suspensivo.

4.O Digno Magistrado do Ministério Público na primeira instância apresentou a sua resposta em 17.11.2022.
Transcrevem-se as conclusões da resposta:
“1- Por sentença proferida nos presentes autos o douto Tribunal decidiu não conceder provimento ao recurso e, em consequência, manter a decisão do Coordenador do Serviço Coordenador dos Transportes Terrestres - Direção Regional das Obras Pública e Transportes Terrestres -Secretaria Regional das Obras Públicas e Comunicações - Região Autónoma dos Açores, que aplicou ao arguido AA, coima no valor mínimo de 120,00€ (cento e vinte euros) e a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 (trinta) dias, pela prática da contraordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 21.º e 23.º alínea a) do Regulamento de Sinalização de Trânsito (doravante RST), aprovado em anexo ao Decreto Regulamentar n.º 22-A/98, de 01/10, na redação atualmente em vigor, e dos artigos 133.º, 138.º n.º 1, 140.º, 146.º alínea n) e 147.º n.º 2 do Código da Estrada (doravante, CE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, 03/05, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 09/12.
2- O recorrente impugna a matéria de facto com base no erro de julgamento considerando que o Tribunal deu como provado que o sinal foi adquirido e colocado pela Câmara Municipal de Vila Franca do Campo, respeitando as formas, cores, inscrições, símbolos e dimensões, bem os materiais utilizados e as regras de colocação (facto n.º 2) e na sentença não consta indicada a prova que o tribunal se alicerçou para dar este facto como provado e discorda quanto à questão apreciada pelo douto tribunal relativa à falta de homologação do sinal de STOP pela Câmara Municipal e a falta de aprovação e instalação de sinais de trânsito por parte da Assembleia Municipal.
3- O tribunal a quo fundamentou a sua decisão discriminando os meios de prova que serviram de convicção ao mesmo para decidir manter a decisão administrativa e, em específico, quanto ao facto n.º 2 que o fez com base na informação prestada pelo Município de Vila Franca do Campo de fls. 45.
4- E na fundamentação de direito, invocou, que desconhece a existência de qualquer diploma ou norma que preveja que os sinais de trânsito tenham de ser homologados pelo Município, designadamente, através da Câmara Municipal
5- Que o ato físico de colocação de um sinal de trânsito não corresponde a qualquer ato jurídico-administrativo com eficácia externa da exclusiva competência da Assembleia Municipal e não se faz por decreto, diploma normativo ou deliberação.
6- Mas sim que se trata de um mero de ato de gestão, cuja competência pertence à Câmara Municipal, que cumprindo todas as disposições normativas supracitadas, o colocou ali de forma legítima.
7- Assim, e tendo sido o sinal de trânsito de STOP colocado na via pública, pela entidade competente e respeitando a legislação em vigor, o desrespeito pelo sinal corresponde a contraordenação, devendo o recorrente ser condenado pela prática da mesma.
8- Deste modo, verifica-se que a douta decisão procedeu à correcta determinação das normas legais e à sua acertada aplicação, não violou qualquer preceito e não merece reparo.
9- Face ao que antecede, consideramos que deve o recurso improceder, mantendo-se a sentença recorrida nos seus precisos termos.
Termos em que, e nos mais que V. Excelências doutamente suprirão, não se deverá dar provimento ao recurso interposto pelo arguido, assim se fazendo
JUSTIÇA!

5. Neste Tribunal foi aberta vista ao Mº Pº, tendo o Digno Procurador Geral Adjunto pugnado pela improcedência do recurso apresentado.

6. Notificado, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 417º nº 2 do CPP, o recorrente nada disse.

7 Após exame preliminar, entende-se que deve ser proferida decisão sumária, nos termos do disposto no artigo 417º, nº 6, al. d), do C.P.P..

                       
II. FUNDAMENTAÇÃO

1.
Conforme jurisprudência pacífica o Supremo Tribunal de Justiça – vide, por todos e dada a demais jurisprudência nele referida, Ac. de 28.4.99, CJ/STJ, 1999, tomo 2, página 196 -, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelos recorrentes da motivação apresentada, isto sem prejuízo do conhecimento oficioso das questões elencadas no art.º 410º, nº2, do C.P.P..
Como determina artigo 75º, nº2, do DL nº 433/82, de 27 de Outubro (RGCO), com as alterações introduzidas pelos DL nº 356/89, de 17.10, 244/95, de 14.9, e pela Lei nº 109/2001, de 24.12, nos recursos de decisões relativas a processos de contra-ordenações, a segunda instância apenas conhecerá da matéria de direito, não cabendo recurso das suas decisões.
A matéria de facto dada como provada apenas poderá ser alterada pela verificação da ocorrência de uma nulidade ou de um dos vícios de conhecimento oficioso - artigo 410º, nº 2 e 3, do C.P.P..

Assim, é a seguinte a questão a decidir:
Se inexistia o dever de obediência ao sinal.

2.
Sentença recorrida (transcrição na parte relevante):

= DECISÃO =

I - RELATÓRIO:

Por decisão do Coordenador do Serviço Coordenador dos Transportes Terrestres – Direção Regional das Obras Pública e Transportes Terrestres – Secretaria Regional das Obras Públicas e Comunicações – Região Autónoma dos Açores, datada de 13/05/2022 e referente ao Processo de Contraordenação n.º 601516, foi aplicada ao Arguido/Recorrente AA, com o número de identificação fiscal …, residente em Vila Franca do Campo, coima no valor mínimo de 120,00 EUR (cento e vinte euros) e a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 (trinta) dias, pela prática da contraordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 21.º e 23.º alínea a) do Regulamento de Sinalização de Trânsito (doravante RST), aprovado em anexo ao Decreto Regulamentar n.º 22-A/98, de 01/10, na redação atualmente em vigor, e dos artigos 133.º, 138.º n.º 1, 140.º, 146.º alínea n) e 147.º n.º 2 do Código da Estrada (doravante, CE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, 03/05, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 09/12.
*
Não se conformando com a decisão, veio o Recorrente impugná-la judicialmente, em conformidade com o disposto no artigo 59.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27/10, na redação atualmente em vigor (doravante designado por RGCO, Regime Geral das Contraordenações).
Para além de contestar os factos pelos quais vinha acusado, alegou, para tanto e em síntese:
- a nulidade da decisão administrativa, por dela não constar, de forma especificada e individualizada, os factos referentes aos elementos subjetivos da infração;
- a falta de homologação do sinal de STOP pela Câmara Municipal e a falta de aprovação e instalação de sinais de trânsito por parte da Assembleia Municipal;
- a incorreta localização do sinal de STOP;
- a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir, por se encontrarem preenchidos os requisitos consagrados no artigo 141.º do CE.
*
O Ministério Público apresentou os autos a juízo, nos termos do disposto no artigo 62.º do RGCO, não se opondo à decisão por simples despacho, conforme resulta do artigo 64.º do RGCO (fls. 29-33).
O Tribunal proferiu despacho que procedeu ao exame preliminar do recurso (fls. 35).

Procedeu-se a julgamento com observância das formalidades legais.

*
Da nulidade da decisão administrativa, por dela não constar, de forma especificada e individualizada, os factos referentes aos elementos subjetivos da infração:
O artigo 58.º n.º 1 do RGCO determina que a decisão que aplica a coima ou as sanções acessórias deve conter: a) a identificação dos Arguidos; b) a descrição dos factos imputados, com indicação das provas obtidas; c) a indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão; d) a coima e as sanções acessórias.
No que concerne à falta de qualquer um dos requisitos da decisão, o RGCO não estabelece qual a consequência processual daí a retirar. Contudo, considerando a doutrina e a jurisprudência à qual aderimos, o entendimento tem sido de que, em regra, a falta dos requisitos previstos no n.º 1 do artigo 58.º constitui uma nulidade da decisão, de harmonia com o preceituado nos artigos 374.º n.º 2 e 3 e 379.º n.º 1 alínea a) do CPP, ex vi artigo 41.º n.º 1 do RGCO – em igual sentido, ver Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, in “Contra-Ordenações Anotações ao Regime Geral”, 2.ª Ed., 2002, Vislis Editores, p. 334 e Ac. TR Coimbra de 11/11/2020, Relatora: Des. Maria José Nogueira, Proc. n.º 351/19.0T8MBR.C1.
Ora, da leitura integral e análise global da decisão administrativa, decorre de forma inteligível e compreensível a imputação ao Arguido da contraordenação a título negligente.
No conteúdo da decisão, em particular no ponto 6, o Exmo. Senhor Coordenador do S.C.T.T. fundamenta e explicita os factos imputados ao Arguido e as razões pelas quais considera que o mesmo praticou, a título negligente, a contraordenação em causa. Veja-se no referido ponto 6, onde consta: “Os factos descritos não permitem concluir que da conduta do(a) arguido(a), houvesse vontade livre e consciente de praticar a infração que lhe é imputada (dolo). Contudo, subsiste a negligência, porquanto não actuou com o cuidado que lhe era devido” (negrito nosso).
Neste conspecto, importa referir que as exigências de fundamentação da decisão da autoridade administrativa - no respeitante às contraordenações – hão de ser menos profundas que as relativas aos processos criminais; não se podem transformar as decisões das autoridades administrativas em verdadeiras sentenças criminais (neste sentido, cfr. Ac. TR Évora de 15/12/2016, Relator: Des. João Amaro, Proc. n.º 95/16.5T8GDL.E1).
Por outro lado, o fundamental é resultar inequivocamente do texto da decisão, considerada no seu todo, o elemento subjetivo considerado na decisão condenatória, não sendo imprescindível que a sua alegação conste exclusivamente na parte reservada aos factos provados – sufragando este entendimento, cfr. Ac. TR Coimbra de 11/11/2020, Relatora: Des. Maria José Nogueira, Proc. n.º 351/19.0T8MBR.C1, cujo texto se transcreve parcialmente: “Com efeito, se ainda nos parece possível conviver com a sua consideração para além do âmbito (da parte reservada) dos factos provados, posto que decorra inequivocamente do texto da decisão, considerado no seu todo, a forma de realização, ao nível da culpa, do ilícito (…)”.
Por conseguinte, encontrando-se satisfeitas as exigências de descrição factual do tipo subjetivo e tendo sido conferido ao Arguido o direito de defesa e contraditório em relação a este aspeto (aliás, como fizeram), improcede a alegada nulidade da decisão condenatória.
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Não ocorreram nem foram invocadas quaisquer outras nulidades, questões prévias ou incidentais que obstem ao conhecimento do mérito do recurso, mantendo-se válida e regular a instância.
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II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
2.1. Factos provados:
Com relevância para a decisão da causa, resultou provado que:
1. No dia 15/09/2021, pelas 22h50m, no local do cruzamento da Rua de Santo Amaro com a Rua Engenheiro Artur Canto Resende, da freguesia e concelho de Vila Franca do Campo, o Arguido AA conduzia o veículo automóvel ligeiro, com a matrícula ..., não cumprindo com a indicação dada pelo sinal vertical B2 – STOP aí colocado.
2. O referido sinal foi adquirido e colocado pela Câmara Municipal de Vila Franca do Campo, respeitando as formas, cores, inscrições, símbolos e dimensões, bem os materiais utilizados e as regras da respetiva colocação.
3. Com a conduta descrita, o Arguido revelou desatenção e irrefletida inobservância das normas de direito rodoviário, atuando com manifesta falta de cuidado e prudência que o trânsito de veículos aconselha e no momento se lhe impunha, bem sabendo que a conduta descrita é proibida e sancionada pela lei contraordenacional, não procedendo com o cuidado a que estava legalmente obrigado.
4. O Arguido efetuou o pagamento voluntário da coima que lhe foi aplicada no valor de 120,00 EUR (cento e vinte euros).
5. O Arguido não tem antecedentes contraordenacionais estradais.
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2.2. Factos não provados:
Inexistem factos por provar com relevância para a decisão da causa.
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2.3. Motivação da decisão de facto:
A convicção do Tribunal sobre os factos provados baseou-se na seguinte prova: no Auto de Contraordenação de fls. 1-C (o qual, até prova em contrário, faz fé sobre os factos presenciados pelo Autuante – cfr. art.º 170.º n.º 1, 2 e 3 do Código da Estrada), na Decisão de fls. 3-5, na informação prestada pelo Município de Vila Franca do Campo de fls. 45.
O Tribunal atendeu ainda às declarações do Arguido, o qual admitiu que não parou completamente o seu veículo automóvel, incumprindo assim o sinal vertical STOP (que obriga à paragem completa e cedência de passagem).
Por outro lado, o Agente da P.S.P. ... confirmou que presenciou os factos por se encontrar a fazer patrulha, tendo constatado que o Arguido manteve a mesma velocidade, nem abrandou, ao passar o cruzamento da Rua de Santo Amaro com a Rua Engenheiro Artur Canto Resende, desrespeitando o sinal vertical STOP que ali se encontra. Mais declarou que deu ordem de paragem e atuou de imediato o Arguido.
Por conseguinte, dúvidas inexistem para o Tribunal de que o Arguido não obedeceu ao sinal de paragem obrigatória STOP, valorando-se deste modo quer as declarações do Agente da P.S.P. (terceiro isento e sem qualquer interesse na causa), quer as próprias declarações do Arguido que não as infirmou (pelo contrário, confirmou parcialmente).
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:

O Arguido vem acusado da prática da contraordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 21.º e 23.º alínea a) do RST, aprovado em anexo ao Decreto Regulamentar n.º 22-A/98, de 01/10, na redação atualmente em vigor, e dos artigos 133.º, 138.º n.º 1, 140.º, 146.º alínea n) e 147.º n.º 2 do CE, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, 03/05, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 09/12.

Dispõem os artigos 21.º e 23.º alínea a) do RST o seguinte: “Artigo 21.º - Enumeração e significado dos sinais de cedência de passagem
Os sinais de cedência de passagem, representados no quadro XXIII, em anexo, são os seguintes: (…)
B2 - paragem obrigatória no cruzamento ou entroncamento: indicação de que o condutor é obrigado a parar antes de entrar no cruzamento ou entroncamento junto do qual o sinal se encontra colocado e ceder a passagem a todos os veículos que transitem na via em que vai entrar; (…)
Artigo 23.º - Sanções
Quem infringir as prescrições impostas pelos sinais de cedência de passagem é sancionado com coima de: a) (euro) 120 a (euro) 600, quando se trate dos sinais B1 e B2; (…)”.
Por outro lado, dispõe o artigo 146.º alínea n) do CE que: “No exercício da condução, consideram-se muito graves as seguintes contraordenações: (…) n) O desrespeito pelo sinal de paragem obrigatória nos cruzamentos, entroncamentos e rotundas;”.
O incumprimento do sinal vertical B2 STOP por parte de condutor corresponde a contraordenação muito grave, punível com coima de 120,00 EUR a 600,00 EUR, e ainda com pena acessória de 2 a 24 meses, conforme dispõem os artigos 138.º n.º 1 e 147.º n.º 2 do CE.
Finalmente, quanto ao elemento subjetivo, o artigo 133.º do Código da Estrada estabelece que “Nas contraordenações rodoviárias a negligência é sempre sancionada”, pelo que quer a conduta dolosa, quer a conduta negligente são igualmente puníveis.
No caso em apreço, provou-se que, no dia 15/09/2021 e no local do cruzamento da Rua de Santo Amaro com a Rua Engenheiro Artur Canto Resende, da freguesia e concelho de Vila Franca do Campo, o Arguido AA conduziu o veículo automóvel ligeiro, com a matrícula ..., não cumprindo com a indicação dada pelo sinal vertical B2 – STOP aí colocado.
Mais se provou que, com a conduta descrita, o Arguido revelou desatenção e irrefletida inobservância das normas de direito rodoviário, atuando com manifesta falta de cuidado e prudência que o trânsito de veículos aconselha e no momento se lhe impunha, bem sabendo que a conduta descrita é proibida e sancionada pela lei contraordenacional, não procedendo com o cuidado a que estava legalmente obrigado. Atuou, assim, de forma negligente.
Pelo exposto, encontram-se preenchidos os elementos objetivos e subjetivos da contraordenação p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 21.º e 23.º alínea a) do RST e dos artigos 133.º, 138.º n.º 1, 146.º alínea n) e 147.º n.º 2 do CE.
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Impõe-se ainda solucionar as questões suscitadas pelo Recorrente, no que concerne, por um lado, à invocada falta de homologação do sinal de STOP pela Câmara Municipal, à invocada falta de aprovação e instalação de sinais de trânsito por parte da Assembleia Municipal e à incorreta localização do sinal de STOP; e, por outro lado, da eventual suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir, por se encontrarem preenchidos os requisitos consagrados no artigo 141.º do CE.
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Da falta de homologação do sinal de STOP:
Invoca o Recorrente que não desrespeitou qualquer obrigação de paragem obrigatória, uma vez que o sinal de pagarem não se encontra devidamente habilitado para cumprir a sua função nesta via de trânsito municipal, quer porque deveria ter sido homologado pela Câmara Municipal, quer porque a competência para a aprovação e instalação de sinais de trânsito cabe à Assembleia Municipal, através da competente Comissão de Trânsito.
Cumpre apreciar e decidir.
Em primeiro lugar, refira-se que se desconhece qualquer diploma normativo que obrigue que os sinais de trânsito tenham de ser homologados pelo Município, designadamente, através da Câmara Municipal. Aliás, o Recorrente não invoca qual a norma donde retira tal conclusão.
Em segundo lugar, façamos uma breve análise à legislação em matéria de instalação e colocação de sinais de trânsito e respetiva evolução ao longo do tempo.
O artigo 5.º n.º 1 do CE estabelece que “Nos locais que possam oferecer perigo para o trânsito ou em que este deva estar sujeito a restrições especiais e ainda quando seja necessário dar indicações úteis, devem ser utilizados os respetivos sinais de trânsito”.
Acresce que o artigo 6.º n.º 1 do CE determina que “1 - Os sinais de trânsito são fixados em regulamento onde, de harmonia com as convenções internacionais em vigor, se especificam as formas, as cores, as inscrições, os símbolos e as dimensões, bem como os respetivos significados e os sistemas de colocação”.
O regulamento dos sinais de trânsito para que remete este preceito do Código da Estrada é o regime anexo ao Decreto Regulamentar n.º 22-A/98, de 01/10, que aprovou o Regulamento de Sinalização de Trânsito (RST).
No artigo 3.º n.º 1 e 2 do regime anexo, com a epígrafe “Competência para a instalação dos sinais” encontra-se estabelecido o seguinte:
“1 - A instalação de sinais de trânsito nas vias públicas só pode ser efetuada pelas entidades competentes para a sua sinalização ou mediante autorização destas entidades.
2 - Em caso de emergência, e com o objetivo de estabelecer o adequado ordenamento de trânsito, os sinais podem ser colocados pelas entidades competentes para a fiscalização do trânsito”.
A colocação de um sinal de STOP só pode, pois, ser efetuada pelas entidades competentes para a sua sinalização ou mediante autorização destas. Mais, em caso de emergência, os sinais podem ser colocados por qualquer entidade competente para a fiscalização do trânsito – o que se compreende, atendendo à importante função de segurança rodoviária que tais sinais desempenham, protegendo bens jurídicos pessoais e patrimoniais de relevo.
Por seu turno, dispõe o artigo 6.º n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23/02, na redação atualmente em vigor, o seguinte:
“1 - Compete à entidade gestora da via garantir a segurança e a sinalização das vias públicas. 2 - Para efeitos do disposto no presente diploma, entende-se por entidade gestora da via:
a) A Infraestruturas de Portugal, I. P.;
b) O município que detenha a respetiva jurisdição;
c) A entidade concessionária das autoestradas e outras vias objeto de concessão”.

Por outro lado, as entidades de fiscalização do trânsito encontram-se enunciadas no artigo 5.º do mesmo diploma legal.
A via de trânsito a que se alude nos autos é uma via de trânsito municipal do concelho de Vila Franca do Campo, razão pela qual o respetivo Município é a entidade gestora daquela via e, por força das normas supracitadas, a entidade competente pela sua sinalização rodoviária.
Sublinhe-se que, na redação inicial do Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23/02, o artigo 6.º n.º 2 dispunha que “2 - Para efeitos do disposto no presente diploma, entende-se por entidade gestora da via o Instituto de Estradas de Portugal ou a câmara municipal que detenha a respectiva jurisdição e ainda a entidade concessionária das auto-estradas e outras vias objecto de concessão de construção ou exploração”.
No caso em apreço, o Tribunal deu como provado que o sinal STOP em causa foi ali colocado pela entidade competente, isto é, pelo Município de Vila Franca do Campo, designadamente pela respetiva Câmara Municipal, conforme resulta da informação prestada pelo Município de Vila Franca do Campo de fls. 45 – em sentido idêntico, ainda que ao abrigo da legislação anterior, ver Ac. TR Porto de 14/06/2006, Proc. n.º 0612468, Relator: Des. Guerra Banha.
Não foi qualquer outra entidade, pública ou particular, que o colocou ali.
Donde, o desrespeito por tal sinal STOP corresponde a contraordenação, pois tal sinal de trânsito é legítimo e foi colocado pela entidade competente.
Em relação à alegada falta de aprovação e instalação de sinais de trânsito por parte da Assembleia Municipal, discorda-se do entendimento do Recorrente, ancorado no Ac. TR Coimbra de 30/10/2013, Proc. n.º 208/13.9TBGRD.C1, Relatora: Des. Isabel Silva.
Com efeito, aludindo a lei ao Município, coloca-se a questão de saber se a instalação dos sinais de trânsito são da competência do órgão executivo ou da competência do órgão deliberativo.
Ora, entendemos, com o devido respeito, que o ato físico de colocação de um sinal de trânsito não corresponde a qualquer ato jurídico-administrativo com eficácia externa da exclusiva competência da Assembleia Municipal [art.º 25.º n.º 1 alínea g) da Lei n.º 75/2013, de 12/09].
Colocar um sinal de trânsito não corresponde a um regulamento ou a uma postura municipal. Não se pode confundir os efeitos jurídicos que provêm do sinal [esses sim com eficácia externa por força dos artigos 21.º e 23.º alínea a) do Regulamento de Sinalização de Trânsito], do concreto ato de instalação/colocação dos mesmos. O ato físico de instalação dos sinais de trânsito não se faz por decreto, diploma normativo ou deliberação.
Pelo contrário, estamos perante um mero de ato de gestão, cuja competência pertence à Câmara Municipal, órgão executivo por excelência, tal como observa o Decreto-Lei n.º 44/2005 quando fala em “entidade gestora da via” e conforme dispõe o artigo 33.º n.º 1 alínea ee), que ora se transcreve: “1 - Compete à câmara municipal: ee) Criar, construir e gerir instalações, equipamentos, serviços, redes de circulação, de transportes, de energia, de distribuição de bens e recursos físicos integrados no património do município ou colocados, por lei, sob administração municipal”.
E este ato de gestão tem respaldo na lei, designadamente em todas as disposições normativas supracitadas, pelo que o mesmo foi ali colocado de forma legítima.
Finalmente, a incorreta localização do sinal STOP não constitui justificação para o seu não cumprimento. O que releva para se imporem aos condutores é que os sinais de trânsito sejam visíveis e legíveis, como resulta do disposto no artigo 13.º n.º 1 do RST. Condições que no caso se provou existirem, até porque o Arguido admitiu ter consciência de que havia ali um sinal STOP – em igual sentido, ver o Ac. TR Porto de 14/06/2006, já citado supra.
*
Por último, o montante da coima aplicada pelo S.C.T.T. (fixada no mínimo legal) mostra-se razoável e adequada às circunstâncias (atendendo sobretudo à ausência de antecedentes contraordenacionais do Arguido), satisfazendo as exigências de prevenção geral e especial e cujo valor é adequado e proporcional na responsabilização dos infratores e na prevenção do futuro cometimento da contraordenação em causa.
A aplicação da sanção da admoestação não é viável, nem oportuna nos presentes autos, atendendo a estarmos perante uma contraordenação muito grave [artigo 146.º alínea n) do Código da Estrada].
Também em relação à sanção acessória aplicada pelo período de 30 (trinta) dias (metade do previsto no artigo 147.º n.º 2 do CE para as contraordenações muito graves, devido à atenuação especial por força do artigo 140.º do mesmo diploma legal), tendo sido fixada no mínimo legal, mostra-se igualmente justa, proporcional e adequada ao caso concreto (atendendo à ausência de antecedentes contraordenacionais do Arguido e ao pagamento imediato da coima).
A aplicação da suspensão da execução da sanção acessória não é legalmente admitida, uma vez que a contraordenação em causa é qualificada pela lei como muito grave [artigo 146.º alínea n) do Código da Estrada], pelo que não pode ser suspensa (artigo 141.º n.º 1 do CE).
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Em face do exposto, nada há a apontar à decisão do S.C.T.T., pelo que deverá a mesma ser mantida na sua totalidade.
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 (…)”

3. Apreciando.

Como se refere na decisão recorrida:
“O artigo 5.º, n.º 1, do CE estabelece que “Nos locais que possam oferecer perigo para o trânsito ou em que este deva estar sujeito a restrições especiais e ainda quando seja necessário dar indicações úteis, devem ser utilizados os respetivos sinais de trânsito”.
E o artigo 6.º, n.º 1, do CE determina que “1 - Os sinais de trânsito são fixados em regulamento onde, de harmonia com as convenções internacionais em vigor, se especificam as formas, as cores, as inscrições, os símbolos e as dimensões, bem como os respetivos significados e os sistemas de colocação”.
O regulamento dos sinais de trânsito para que remete este preceito do Código da Estrada é o regime anexo ao Decreto Regulamentar n.º 22-A/98, de 01/10, que aprovou o Regulamento de Sinalização de Trânsito (RST).
No artigo 3.º n.º 1 e 2 do regime anexo, com a epígrafe “Competência para a instalação dos sinais” encontra-se estabelecido o seguinte:
“1 - A instalação de sinais de trânsito nas vias públicas só pode ser efetuada pelas entidades competentes para a sua sinalização ou mediante autorização destas entidades.
2 - Em caso de emergência, e com o objetivo de estabelecer o adequado ordenamento de trânsito, os sinais podem ser colocados pelas entidades competentes para a fiscalização do trânsito”.
In casu, apura-se que o sinal em causa foi colocado pela Câmara Municipal de Vila Franca do Campo.
Ora, informa a Câmara Municipal de Vila Franca do Campo, documento junto a fls 45, documento tido em conta na decisão recorrida, que colocação de sinais de trânsito é matéria da competência da Câmara Municipal e do seu Presidente e que o sinal em causa foi adquirido e colocado pela Câmara Municipal de Vila Franca do Campo mas que não existe registo cadastral.
Ora, como alega o recorrente, os actos praticados pelas Câmaras Municipais ou pelo seu Presidente estão fundamentados em actos, resultantes de uma deliberação e necessariamente reduzidos a escrito e sob a forma legal, não havendo quanto a esta matéria discricionariedade.
E, no caso, apesar de instada a tal, não juntou a Câmara qualquer documento comprovativo do registo, solicitação e autorização de colocação do sinal.
A colocação daquele sinal em concreto naquele concreto lugar tem que reflectir uma deliberação no sentido da adequação e necessidade de tal colocação. E, competia à Câmara a prova de tal, com vista a poder concluir-se pela legalidade do sinal, o que não fez.
É pressuposto objectivo do dever de obediência aos sinais de trânsito que estes sejam legítimos, só a estes é devida obediência e só a desobediência a estes constitui infracção.[1]
Em conformidade, terá o arguido que ser absolvido.


IV Decisão

Pelo exposto, julga-se provido o recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida e, em consequência, absolve-se o arguido da contra-ordenação que lhe vinha imputada.

Sem custas, dado o provimento.
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Lisboa, 26.6.2023

Consigna-se que a presente decisão foi elaborada e revista pela relatora.

Cristina Santana
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[1] No sentido de que apenas aos sinais de trânsito legítimos é devida obediência e só a desobediência a estes constitui contra-ordenação, vide, entre outros: Ac. TRP prc. 0612468 de 14.6.2006; Ac TRC e 30.10.2013, Proc 208/13.9TBGRD.C1; Ac TRP de 11.4.2018, Proc. 1930/17.6T9AVR.P1