Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5678/2007-7
Relator: ABRANTES GERALDES
Descritores: ACÇÃO EXECUTIVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/29/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: CONFLITO
Decisão: COMPETÊNCIA ATRIBUÍDA
Sumário: I- Considerada a redacção ao artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, que foi dada pelo DL 199/2003, de 10 de Setembro, a liquidação da sentença de condenação genérica proferida anteriormente a 15 de Setembro de 2003, ainda que não transitada em julgado, deve continuar a processar-se no âmbito da acção executiva em conformidade com o disposto no artigo 806.º do Código de Processo Civil (anterior redacção).
II- O novo regime aplica-se nos ou relativamente aos processos declarativos em que, até 15 de Setembro de 2003, não tivesse sido proferida sentença em 1ª instância.
II- Assim sendo, e porque no caso vertente a sentença exequenda é de 12 de Fevereiro de 2003, a competência para a tramitação da acção executiva, incluída a fase de liquidação, cabe ao Juízo de Execução e não à Vara Cível.

(SC)
Decisão Texto Integral: Conflito de competência nº 5678-07

I - FERNANDO […]
requer a resolução do conflito negativo de competência estabelecido entre
o 2º Juízo de Execução de Lisboa
e a
3ª Vara Cível de Lisboa
relativamente à liquidação de uma sentença condenatória da COMPANHIA de SEGUROS […] SA.

II – Elementos a ponderar:

- Em 12-2-03 foi proferida na 3ª Vara Cível sentença condenatória que apenas veio a transitar em julgado depois de ter sido proferido acórdão confirmatório pelo Supremo Tribunal de Justiça.

- O A. intentou acção executiva junto dos Juízos de Execução de Lisboa, enxertando nele o pedido de liquidação da condenação genérica.

- Todavia, o Mº Juiz do 2º Juízo de Execuções, 2ª Secção, proferiu despacho de indeferimento liminar com fundamento na incompetência em razão da matéria, entendendo que ao caso se aplicava já o novo regime processual introduzido pelo Dec. Lei nº 38/03, de 8-3.

- Instaurado o incidente de liquidação junto da 3ª Vara Cível, por apenso à acção declarativa onde fora proferida a sentença exequenda, o Mº Juiz declarou-se também materialmente incompetente, uma vez que, em seu entender, nos termos do art. 21º, nº 3, do Dec. Lei nº 38/03, na redacção introduzida pelo Dec. Lei nº 199/03, de 10-9, o novo regime da liquidação não é de aplicar aos processos em que, à data de 15-9-03, já tivesse sido proferida sentença.


III - Decidindo:
1. De acordo com a primitiva redacção do art. 21º do Dec. Lei nº 36/03, as alterações ao CPC (nestas se incluindo as que modificaram o regime da liquidação da sentença de condenação genérica) “só se aplicam nos ou relativamente aos processos instaurados a partir do dia 15 de Setembro de 2003”.

A redacção de tal preceito levou Lopes do Rego a defender, relativamente a sentenças de condenação genérica proferidas antes dessa data, que, para efeitos da sua liquidação, ainda que a execução fosse posterior, deveria “prevalecer a imediata aplicação do regime de liquidação no âmbito da acção declaratória finda, enxertando-se nela o incidente” previsto no nº 5 do art. 47º e no nº 2 do art. 378º do CPC (in “Requisitos da Obrigação Exequenda”, inserido no nº 7, de 2003, da Rev. Themis, sob o tema “A Reforma da Acção Executiva”, pág. 77).

Em face daquele preceito, tendo sido abolida, pelo novo regime, a possibilidade de enxertar a liquidação de sentença (que não dependa de mero cálculo aritmético) na própria acção executiva, e passando a vigorar a necessidade de proceder à liquidação incidental no âmbito da acção declarativa, ainda que depois do seu trânsito em julgado (art. 378º, nº 2, e 47º, nº 5, do CPC), a amplitude do preceito autorizava que se fizesse do regime legal a leitura que decorre da decisão do Mº Juiz do 2º Juízo do Tribunal de Execução.

2. Só que aquela norma transitória foi modificada pelo Dec. Lei nº 199/03, diploma em relação ao qual não se faz qualquer alusão na primeira decisão. A modificação foi, aliás, impulsionada precisamente pela necessidade de clarificar situações como as que os autos retratam.

Com a nova redacção dada ao preceito de natureza transitória, o esquema geral de aplicação da reforma da acção executiva ficou assim ordenado:

a) O novo regime executivo vigoraria apenas para as execuções instauradas depois de 15-9-03;
b) As normas relacionadas com a liquidação de sentenças de condenação genérica só se aplicariam nos ou relativamente aos processos declarativos em que, até 15-9-03, não tivesse sido proferida sentença em 1ª instância.

Ou seja, relativamente aos processos em que, em 15-9-03, já houvesse sentença de condenação genérica proferida em 1ª instância, ainda que não transitada em julgado, o novo regime da liquidação não seria aplicável, continuando a reger-se tais processos pelo direito anterior.

Daqui resulta que, apesar da entrada em vigor da revisão da acção executiva, a liquidação da sentença de condenação genérica que esteja naquelas condições deve fazer-se no âmbito da acção executiva, de acordo com a anterior redacção do art. 806º do CPC.

Por tal motivo, na Revista Themis, nº 9, de 2004, sob o tema “Reforma da Acção Executiva”, vol. II, Paulo Pimenta, num trabalho intitulado “Acções e Incidentes Declarativos na Dependência da Execução”, pág. 64, nota 16, afirma peremptoriamente que “o novo regime de liquidação de condenações genéricas é aplicável mesmo a processos declarativos instaurados antes de 15-9-03, desde que até esse momento não tivesse sido proferida a sentença em 1ª instância. Nos processos em que a decisão já estivesse proferida, o regime de liquidação é o anterior à reforma”.

Discorda-se, pois, do que, em sentido diverso, foi decidido no Ac. da Rel. de Coimbra, de 7-12-04 (www.dgsi.pt/jtrc).

IV- Em conclusão:

Face ao exposto, decide-se o conflito negativo de competência atribuindo a competência ao 2º Juízo de Execuções de Lisboa para a tramitação da acção executiva, incluindo a fase da liquidação ao abrigo do anterior regime.

Sem custas.
Notifique.

Lisboa, 29-6-07


António Santos Abrantes Geraldes