Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1916/12.7TBPDL.L1-2
Relator: EZAGÜY MARTINS
Descritores: CONTRATO DE CRÉDITO AO CONSUMO
JUROS REMUNERATÓRIOS
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/04/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I - O Acórdão Uniformizador do Supremo Tribunal de Justiça, n.º 7/2009, de 25/3/09, mantém actualidade mesmo após a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 133/2009, de 2 de Junho, já que este diploma não veio alterar, substancialmente, o regime normativo com base no qual aquele Acórdão foi proferido.
II – Porém, desde que as partes, no âmbito da sua liberdade contratual, convencionem regime diferente do que resulta da mera aplicação do princípio definido no art.º 781º do Código Civil, deixa a doutrina de tal Acórdão de ser susceptível de aplicação ao contrato respetivo.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª Secção (cível) deste tribunal da Relação


I - Banco “AA”, S.A., antes denominado Banco “A”, S.A., intentou acção declarativa, com comum sob a forma sumária, contra “B” e mulher “C”, pedindo a condenação dos Réus, solidariamente entre si, a pagarem à A. €18.008,83, acrescidos de € 1.215,71 de juros vencidos até 24 de Julho de 2012, e de €48,63  de imposto de selo sobre estes juros e, ainda, os juros que sobre a quantia de € 5.264,27, se vencerem, à taxa anual de 18,516%, desde 25 de Julho de 2012 até integral pagamento, bem como o imposto de selo que à taxa de 4% sobre estes juros recair, os juros que  sobre a quantia de €12.744,56, se vencerem, à taxa anual de 18,51% desde 25 de Julho de 2012 até integral pagamento, bem como o imposto se selo que, à referida taxa de 4% sobre estes juros recair.

Alega, para tanto, que no exercício da sua actividade comercial, e por contrato celebrado por documento particular datado de 22 de Julho de 2010, emprestou aos Réus € 4.523,09, com juros à taxa de 14,516% ao ano, devendo, conforme acordado, a importância do empréstimo, os juros referidos, bem como o prémio de seguro de vida, serem pagos, através de transferência bancária, em 60 prestações mensais e sucessivas, sendo a primeira com vencimento em 10-09-2010 e as seguintes nos dias 10 dos meses subsequentes.
Mais sendo acordado entre a A. e RR. que em caso de mora sobre o montante em débito, a título de cláusula penal acrescia uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual, acrescida de quatro pontos percentuais.
E que “Em caso de não pagamento de três ou mais prestações sucessivas o Banco “A” poderá considerar vencidas todas as restantes prestações incluindo nelas os juros remuneratórios e demais encargos incorporados no montante de cada prestação mencionada nas Condições Específicas.”
Os RR. das prestações acordadas, não pagaram a 12ª, vencida em 10-08-2012, e as seguintes, vencendo-se então todas, no montante de € 110,74.
Posto o que a A. dirigiu carta ao R. comunicando-lhe a perda do benefício do prazo contratual.

Montando o total das prestações em dívida, relativamente a este contrato, a € 5.264,27, e os juros já vencidos sobre este quantitativo, a € 932,00, para além de € 37,28, de imposto de selo sobre esse montante de juros.

Para além disso mais concedeu a A. ao R. marido por contrato celebrado por documento particular datado de 08 de Janeiro de 2007, um empréstimo de € 20.800,00, destinados, segundo aquele, à aquisição de um veículo automóvel, com juros à taxa de 14,51% ao ano, devendo, conforme acordado, a importância do empréstimo, e os juros referidos, bem como a comissão de gestão, as despesas de transferência de propriedade, o imposto de selo de abertura de crédito e o prémio do seguro de vida, serem pagos, em 84 prestações, mensais e sucessivas, com vencimento a primeira em 10 de Fevereiro de 2007 e as seguintes nos dias 10 dos meses subsequentes, através de transferência bancária.
Sendo também quanto a este acordado que em caso de mora sobre o montante em débito, a título de cláusula penal acrescia uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual, acrescida de quatro pontos percentuais.
Por acordo, foi alargado o prazo de reembolso do empréstimo, de 84 para 115 prestações mensais e sucessivas, do montante de € 278,73 cada, a partir de 10 de Setembro de 2010, ou seja da 44ª e as restantes nos dias 10 dos meses imediatamente subsequentes.
Destas, não pagou o R. marido as 57ª a 66ª prestações vencidas aos 10 dias dos meses de Outubro de 2011 a Julho de 2012, no montante global de € 2.787,30.
Tendo-se então vencido, aos 10.07.2012, todas as demais (67º a 115ª).
Sendo devido, dessas outras, o capital nelas incluído, de € 9.957,26.
Montando os juros vencidos a € 213,02 – quanto às 57ª a 66ª prestações – e a € 70,69 – quanto às demais, e o imposto de selo sobre aqueles, a € 8,52 e €2,83, também respetivamente.

Este último empréstimo reverteu em proveito comum do casal – atento até o veículo referido se destinar ao património comum do casal dos RR. – pelo que a R. mulher e solidariamente responsável com o R. marido, pelo seu pagamento.
Citados, não contestaram os RR.

Seguindo-se a prolação de sentença que, considerando provados os factos articulados pela A. na sua petição inicial, julgou a “acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, condenando os Réus, “B” e “C”, a pagar à Autora, Banco “AA”, SA:
“a) € 3955,95, acrescidos de juros de mora, devidos desde a data do seu respectivo vencimento até definitivo e integral pagamento, calculados à taxa de 18,516%, assim como de imposto de selo a recair sobre esses juros, calculado à taxa de 4% (contrato nº ...6); e,
b) € 11469,06, acrescidos de juros de mora, devidos desde a data do seu respectivo vencimento até definitivo e integral pagamento, calculados à taxa de 18,51%, assim como de imposto de selo a recair sobre esses juros, calculado à taxa de 4% (contrato nº ...).”.

Inconformada, recorreu a A., formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões:
“1. A sentença recorrida violou o disposto no artigo 20° do Decreto-Lei 133/2009, de 2 de Junho, isto com referência ao primeiro contrato referido nos autos, o contrato ...6.
2. Na verdade o Acórdão do S.T.J. n° 7/2009, não é Lei no País e, aliás, é inaplicável a sua orientação aos contratos celebrados após a entrada em vigor do dito Decreto-Lei 133/2009, de 2 de Junho, cujo artigo 33°, n° 1, alínea a) expressamente revogou o Decreto-Lei 359/91, de 21 de Setembro.
3. O dito acórdão não é aliás Assento.
4. O artigo 2° do Código Civil foi revogado pelo n° 2 do artigo 4° do Decreto-Lei 239-A/95, de 12 de Dezembro.
5. E quanto ao segundo contrato dos autos, o contrato ..., a sentença recorrida violou a própria sentença que a orientação que dimana assim do dito Acórdão para Uniformização de Jurisprudência, tendo violado o disposto nos artigos 405° e 406° do Código Civil.
6. Termos em que deve conceder-se provimento ao presente recurso e, por via dele, revogar-se a sentença recorrida, substituindo-se a mesma por acórdão que condene os RR, ora recorridos, na totalidade do pedido, desta forma se fazendo
JUSTIÇA”.
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II – Cumpre decidir.
Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objeto daquele – vd. art.ºs 684º, n.º 3, 690º, n.º 3, 660º, n.º 2 e 713º, n.º 2, do Código de Processo Civil – são questões propostas à resolução deste Tribunal:
- se no tocante ao contrato n.º ..., o montante apurado na sentença recorrida,  relativamente ao capital das prestações antecipadamente vencidas, peca por defeito.
- se relativamente ao contrato n.º ...6 é devida a totalidade do montante das prestações antecipadamente vencidas.
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Considerou-se assente, na 1ª instância, e na síntese do alegado pela A. na sua petição inicial, a factualidade seguinte:
“- A A., no exercício da sua actividade, ajustou com os Réus um acordo ao abrigo do qual lhe emprestou a importância de € 4523,09;
- no âmbito deste acordo, foi fixado um juro à taxa nominal de 14,516%, assim como, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro fixada, acrescida de quatro pontos percentuais;
- mais foi ajustado que esta importância, assim como os juros, a comissão de gestão, as despesas de transferência de propriedade, o imposto selo e o prémio de seguro de vida, seriam pagos em 60 prestações mensais e sucessivas, no valor de € 110,74 cada, com a primeira a vencer-se em 10 de Setembro de 2010 e as restantes no dia 10 dos meses subsequentes;
- não foi paga a 12ª prestação, vencida a 10 de Agosto de 2011, assim como as 13ª e seguintes, vencendo-se, na data ora indicada, todas as restantes (sem prejuízo da entrega da quantia de € 161,99); por outro lado,
- ainda no exercício da sua actividade, ajustou com o Réu um acordo ao abrigo do qual lhe emprestou a importância de € 20800,00, para financiamento da aquisição de um veículo automóvel, marca e modelo ‘BMW 320D’, matrícula 00-00-AR;
- no âmbito deste acordo, foi fixado um juro à taxa nominal de 14,51%, assim como, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro fixada, acrescida de quatro pontos percentuais;
- mais foi ajustado que esta importância, assim como os juros, a comissão de gestão, as despesas de transferência de propriedade, o imposto selo e o prémio de seguro de vida, seriam pagos em 84 prestações mensais e sucessivas, com a primeira a vencer-se em 10 de Fevereiro de 2007 e as restantes no dia 10 dos meses subsequentes;
- na sequência do acordado entre as partes, o número de prestações, a partir de 10 de Setembro de 2010 (44ª prestação), passou para 115, cada uma no valor de 278,73;
- não foi paga a 57ª prestação, vencida a 10 de Outubro de 2011, assim como as 58ª e seguintes, vencendo-se, na data ora indicada, todas as restantes;
- este empréstimo reverteu em proveito comum do casal (composto por ambos os Réus).”.
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Vejamos.

II – 1 – Quanto ao contrato n.º ....
Coloca a Recorrente em crise – no concernente ao que assim designa de segundo contrato, embora seja cronologicamente o “primeiro”, e posto que celebrado em 08-01-2007 – e afinal, tão só o apuro do montante de capital incluído nas prestações 67ª a 115ª.
Que na sentença recorrida foi feito dividindo o total do capital mutuado pelo número total de prestações – 115 – e multiplicando o valor assim obtido pelo n.º de prestações antecipadamente vencidas, a saber, 48, alcançando o quantitativo global de € 8.681,76.
Para o que pressupôs a igualdade do montante de capital integrante de cada uma das prestações, e, designadamente, das antecipadamente vencidas.
Quando é certo que tal contrato foi objeto de renegociação, com alargamento do prazo de reembolso do empréstimo, de 84 para 115 prestações mensais, cujo montante passou dos anteriores €410,04, para € 278,73 a partir da 44ª prestação.
E, logo, com recálculo de capital, juros e outros encargos incluídos em cada uma dessas “restantes” prestações.

Tendo a Recorrente computado o montante do capital incluído nessas mesmas prestações – pretendendo reclamar apenas aquele e juros moratórios vencidos, “atento o teor do contrato referido e o decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão para a uniformização de jurisprudência proferido aos 25 de Março de 2009 no recurso 1992/08-6” – em € 9.957,26, com remissão para o “doc. n.º 8”, que junto se mostra a folhas 40-43, vd. art.º 32º da petição inicial.
Documento aquele onde se mostra discriminado o montante de capital mutuado incluído em cada uma das prestações, podendo constatar-se que, seja inicialmente, seja após o alargamento do prazo do empréstimo, o mesmo não se mantém constante, variando para cada uma delas.

Operando, na ausência de contestação, a cominação estabelecida no art.º 484º, n.º 1, ex vi do art.º 463º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil.

Assim, quando se entendesse não ser de aceitar o provado do montante de capital incluído em cada uma das prestações antecipadamente vencidas, por não ser de aplicar a cominação ao que resulta de documentos para que se remete na petição inicial, sempre teria que se considerar provado o montante global do capital incluído no conjunto daquelas mesmas prestações, que alegado vinha no referenciado lugar da petição inicial.
E que, diga-se, se contém no somatório dos montantes parcelares de capital, discriminados, por prestação, no sobredito documento.

Importando deste modo retificar o montante da correspondente condenação proferida em b) da parte decisória da sentença recorrida, que passará de € 8.681,76,00, para € 9.957,26.

Com procedência, nesta parte, das conclusões da Recorrente.

II – 2 – Quanto ao contrato n.º ...6.
Relativamente a ambos os contratos – que não sofre crise tratarem-se de contratos de mútuo oneroso, bancário, dito de crédito ao consumo, cfr. art.ºs 1142º e 1145º do Código Civil, 1º do Decreto-Lei nº 344/78, de 17 de Novembro, 2º do Decreto-Lei n.º 359/91 de 25/10, e 2º e 3º do Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de Junho – e “Seguindo, então, a orientação definida” no Acórdão Uniformizador do Supremo Tribunal de Justiça de 25-03-2009, considerou-se na sentença recorrida:
«Pelo que, desta forma, “No contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao art.º 781º do Código Civil não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporados".
Partindo desta premissa, temos, então, que apenas são devidos à Autora, a título de juros remuneratórios, os valores calculados até ao momento em que a mesma exigiu a devolução imediata e integral do capital mutuado (…) não sendo devidos juros com esta natureza (remuneratória) nas prestações restantes (…) 24ª a 60ª».

Contrapondo aqui a Recorrente que, por se tratar este, de contrato de mútuo – crédito ao consumo – datado de 22-07-2007, e, logo, “celebrado nos termos e de harmonia com o disposto no Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de Junho”, não se lhe aplica “a orientação que ressalta” do sobredito Acórdão Uniformizador.

O Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de Junho, procedeu “à transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva n.º 2008/48/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Abril, relativa a contratos de crédito aos consumidores, cfr. art.º 1º, n.º 1.
Revogando o decreto n.º 359/91, de 21 de Setembro, que transpõe para a orem jurídica interna as Diretivas do Conselho e das Comunidades Europeias n.ºs 87/102/CEE, de 22 de Dezembro de 1986 e 90/88/CEE, de 22 de Fevereiro, cfr. art.º 33º, n.º 1.
A sobredita Diretiva n.º 2008/48/CE, e como dos considerandos da mesma se alcança, exprime a urgência na realização de um mercado comunitário de produtos e serviços financeiros, reforçando os direitos dos consumidores, designadamente o direito à informação pré-contratual.
E o Decreto-Lei n.º 133/2009, como no preâmbulo do mesmo se dá conta, estabeleceu, “Na linha do disposto nos artigos 934º a 936º do Código Civil (…) novas regras aplicáveis ao incumprimento do consumidor no pagamento de prestações, impedindo-se que, de imediato, o credor possa invocar a perda do benefício do prazo ou a resolução do contrato.”.
Nessa linha dispondo o art.º 20º daquele Decreto-Lei, para as hipóteses de “Não cumprimento do contrato de crédito pelo consumidor”.
Anotando Gravato de Morais[1] que no n.º 1 “Estão em causa os requisitos de aplicabilidade de dois institutos, de alcance diverso, justamente a perda de benefício do prazo e a resolução do contrato, que in casu são similares. (…) O emprego de tais figuras deixa de estar sujeito ao regime geral do art. 781.° CC, na hipótese de perda do benefício do prazo, ou à cláusula resolutiva aposta invariavelmente nos contratos de crédito ao consumo, que determinava como causa da extinção a falta do pagamento de uma só prestação, verificando-se agora uma restrição assinalável no tocante ao seu exercício, para efeito de protecção do consumidor.”.
Passando assim a ser necessário, por um lado, que ocorra a falta de pagamento de duas prestações sucessivas. O não cumprimento de uma prestação ou de duas prestações não consecutivas (portanto, alternadas) não permite ao credor accionar qualquer dos mecanismos citados.
Por outro lado, exige-se que a falta de pagamento ultrapasse 10% do montante total do crédito, cfr. alínea a).
Impondo-se, ainda, e verificado o duplo condicionalismo referido, uma interpelação do consumidor para, no prazo suplementar mínimo de 15 dias, proceder ao pagamento das prestações em atraso, acrescidas da eventual indemnização devida, com expressa advertência dos efeitos da perda do benefício do prazo ou da resolução do contrato, vd. alínea b).

Tendo-se pois que o citado art.º 20º, cuja violação, pela sentença recorrida, vem sustentado pela Recorrente, nada dispõe quanto à determinação do montante das prestações assim antecipadamente vencidas.
Posto o que, como se julgou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-11-2012,[2] a questão de “saber se os juros remuneratórios devem ou não integrar as prestações vincendas, para efeitos da sua exigibilidade em caso de perda do benefício do prazo continua a colocar-se. Consequentemente, não se vê que o Acórdão Uniformizador em causa tenha perdido actualidade com a entrada em vigor do DL nº 133/2009, já que este não veio alterar, substancialmente, o regime normativo com base no qual aquele Acórdão foi proferido.”.
E “Aliás, o novo regime, como já se referiu, visou, até, reforçar os direitos dos consumidores, como resulta, designadamente, do disposto no citado art.20º e, também, do disposto no art.19º, nº1, onde, diferentemente do que acontecia no domínio do DL nº359/91 (art.º 9º, n.ºs 1 e 2), no que respeita ao reembolso antecipado, a amortização parcial não tem agora limitações quantitativas e o cumprimento antecipado provoca uma redução plena e absoluta do custo total do crédito, operando-se uma diminuição correspondente dos juros e dos encargos do período em falta, ao contrário do que sucedia anteriormente.”.

Porém:
Revertendo à hipótese dos autos, temos que no contrato celebrado em 08 de Janeiro de 2007, as partes estabeleceram na cláusula 7. b) das Condições Gerais que “Em caso de não pagamento de três ou mais prestações sucessivas, o Banco “A” (mutuante) poderá considerar vencidas todas as restantes prestações incluindo nelas o juros remuneratórios e demais encargos incorporados no montante de cada prestação mencionada nas Condições Especificas, como expressamente fica acordado, desde que por escrito em simples carta dirigida ao(s) Mutuário(s) para, a(s) morada(s) constante(s) do contrato lhes conceda um prazo suplementar de quinze dias de calendário para proceder(em) ao pagamento das prestações em atraso acrescidas da indemnização devida pela mora, com expressa advertência de que tal falta de pagamento neste novo prazo suplementar implica o dito vencimento por perda do beneficio do prazo.”.

Ora o referido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de Uniformização de Jurisprudência n.º 7/2009, de 25/3/09, decidiu que “No contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao art.º 781º do Código Civil não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporados.” (o sublinhado é nosso).
E, assim, depois de ter considerado, na sua fundamentação que:
«Consta, ainda, do nº 8, al. b) das ditas “Condições Gerais” que a falta de pagamento de uma prestação na data do respectivo vencimento, implica o imediato vencimento de todas as restantes.
Ora o art.º 781º do Código Civil estabelece que “se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de pagamento de uma delas, implica o imediato vencimento das demais.”
Não se trata esta de uma norma imperativa, pelo que existindo uma qualquer cláusula estipulada num contrato ainda que de adesão, atribuindo outras consequências à mora do devedor será esta a prevalecer, face ao princípio da liberdade contratual consagrado no art.º 405º do Código Civil, regra mínima de funcionamento do mercado
O que no caso, manifestamente não acontece.».

Articulando ainda, no seu ponto VII, as “seguintes premissas nucleares que suportam o entendimento amplamente maioritário senão mesmo uniforme deste Supremo Tribunal sobre a questão objecto do presente recurso de revista ampliada para uniformização de jurisprudência:
(…)
8 - O art.º 781º do Código Civil e logo a cláusula que para ele remeta ou o reproduza tem apenas que ver com a capital emprestado, não com os juros remuneratórios, ainda que incorporados estes nas sucessivas prestações;
9 – A razão de ser do mencionado preceito legal prende-se com a perda de confiança que se produz no mutuante/credor quanto ao cumprimento futuro da restituição do capital, face ao incumprimento da obrigação de pagamento das respectivas prestações;
10 – As partes no âmbito da sua liberdade contratual podem convencionar, contudo, regime diferente do que resulta da mera aplicação do princípio definido no art.º 781º do C. Civil(o negrito é nosso).

Verificando-se pois que o referido Acórdão foi proferido no confronto de cláusula geral de contrato de crédito ao consumo, com redação que nada acrescenta, ou dispõe em sentido diverso, relativamente ao art.º 781º do Código Civil.
E que a cláusula 7. b) do contrato ora em análise comina efetivamente outras consequências – relativamente às assim contempladas na norma do art.º 781º do Código Civil – para a mora do devedor.

Posto o que não aproveita a doutrina de tal acórdão, ao caso dos autos.

Sobrelevando o princípio da liberdade contratual e da eficácia dos contratos, cfr. art.ºs 405º e 406º, do Código Civil.

Sendo devida à A. a importância correspondente à totalidade das prestações assim antecipadamente vencidas, com inclusão dos juros remuneratórios e demais encargos naquelas incorporados.
Importando deduzir àquela, no entanto, a quantia entregue pelos RR. de € 161,99, e que a A. imputa correspondentemente.
*
Com procedência, também nesta parte, das conclusões da Recorrente.
*
Nada cumpre apreciar no tocante ao termo a quo da contagem de juros moratórios, concedido na sentença recorrida – e designadamente ponderando que o vencimento antecipado das prestações, por via da falta de pagamento de uma delas, apenas determina a sua exigibilidade em sentido fraco, não dispensando a interpelação para o seu pagamento – atenta a proibição da reformatio in pejus.
Sendo, pelo que ao montante dos vencidos à data da propositura da ação respeita, que não foi a liquidação dos mesmos objeto de impugnação.
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E também assim importando também reequacionar a questão da solidariedade das obrigações em causa, mais exatamente no tocante às emergentes do contrato n.º ...…

III – Nestes termos, acordam em julgar a apelação procedente, e revogam correspondentemente a sentença recorrida, julgando a ação totalmente procedente e condenando os RR., solidariamente, a pagar à A.:
a) No âmbito do contrato n.º ...6 - cinco mil duzentos e sessenta e quatro euros e vinte e sete cêntimos (€5.264,27)  acrescidos de juros à taxa anual de 18,516%, vencidos – no montante de novecentos e trinta e dois euros (€932,00) até 24 de Julho de 2012 – e vincendos, bem como trinta e sete euros e vinte e oito cêntimos (€37,28) de imposto de selo sobre os juros vencidos até àquela data, e o imposto de selo sobre os juros vencidos desde 25 de Julho de 2012 e vincendos, até efetivo e integral pagamento.
b) No âmbito do contrato n.º ... - doze mil setecentos e quarenta e quatro euros e cinquenta e seis cêntimos (€12.744,56) acrescidos de juros à taxa anual de 18,51%, vencidos – no montante de duzentos e oitenta e três euros e setenta e um cêntimos, até 24 de Julho de 2012 – e vincendos, bem como onze euros e trinta e cinco cêntimos (€11,35) de imposto de selo sobre os juros vencidos até àquela data, e o imposto de selo sobre os juros vencidos desde 25 de Julho de 2012 e vincendos, até efetivo e integral pagamento.

Custas, em ambas as instâncias, pelos RR.
***
Em observância do disposto no n.º 7 do art.º 713º, do Código de Processo Civil, passa a elaborar-se sumário, da responsabilidade do relator, como segue:
(…)
*
Lisboa, 2013-07-04

Ezagüy Martins
Maria José Mouro
Maria Teresa Albuquerque
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[1] In “Crédito aos Consumidores, anotação ao Decreto-Lei n.º 133/2009”, Almedina, 2009, págs. 99-100.
[2] Proc. n.º 1834/12.9TJLSB.L1-7, Relator: ROQUE NOGUEIRA, in www.dgsi.pt/jstj.nsf.