Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
279/14.0PLSNT.L1-3
Relator: VASCO FREITAS
Descritores: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/16/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: 1. O legislador de 2007 previu expressamente que o tipo não exige a reiteração, alargou a tutela penal da norma de forma a abranger as relações familiares pretéritas e as relações parentais não familiares, e exemplificou algumas das condutas integradoras do conceito de “maus tratos físicos ou psíquicos” - castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais.
2. A norma incriminadora protege vários bens jurídicos (integridade física e psíquica, liberdade pessoal, liberdade e autodeterminação sexual, honra), que podem ser afectados por uma multiplicidade de comportamentos que, em si mesmas considerados, já constituem crime, mas que não devam ser punidas com pena mais grave por força de outra disposição legal ( cfr. parte final do nº 1 do art. 152º ).
3. O crime de violência doméstica pode unificar, através do elemento da reiteração – que não implica necessariamente habitualidade na conduta -, uma multiplicidade de condutas que, consideradas isoladamente, poderiam integrar vários tipos legais de crime, mas que, pela subsunção a uma única previsão legal, deixam de ter relevância jurídico-penal autónoma.
4. O crime também se preenche mesmo que não haja reiteração.
5. Desde as alterações introduzidas pela Lei nº 52/2007, de 4/09, que não é sustentável defender como regra geral que o crime de violência doméstica depende da conduta descrita no tipo revestir uma especial gravidade ou atingir uma certa intensidade ou assumir um “carácter violento”.
6. Tendo em atenção o bem jurídico protegido e o caso concreto, para a consumação do crime de violência doméstica não é necessário que a conduta do agente/arguido assuma um carácter violento, no sentido de exceder o crime de ameaça e de injúria.
7. É um crime de mera actividade, bastando o dolo de perigo de afectação da saúde, aqui o bem estar psíquico e a dignidade humana do sujeito passivo.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 3ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa

I RELATÓRIO

No Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste Instancia Local de Sintra - Secção Criminal - Juiz 1, em processo comum com intervenção do tribunal singular, foi submetido a julgamento o arguido A.T.S., devidamente identificados nos autos, tendo no final sido proferida sentença, na qual se decidiu condená-lo, pela prática, em autoria material, de um crime de violência doméstica, p. e p. nas alíneas b) e c) do n.º 1 e nos n.ºs 4 e 5 do artigo 152 do Código Penal, na pena principal de 550 dias de prisão, substituída por 480 horas de trabalho a favor da comunidade e na pena acessória de obrigação de frequência de programa especifico de prevenção da violência doméstica, a cumprir no prazo máximo de 9 meses.

Inconformado com a sentença, dela interpôs recurso o arguido, pugnando pela sua revogação e substituição por outra que o absolva do crimes por que foi condenado, para o que apresentou as seguintes conclusões:

A) O presente recurso tem como objecto a matéria de direito da sentença proferida nos presentes autos porquanto, atenta a factualidade dada como provada na sentença sob recurso, verifica-se que o Tribunal a quo errou na subsunção dos factos ao direito.

B) O bem jurídico protegido pela norma do art. ° 152. ° n. ° 1, do Código Penal, sob a epígrafe "Violência doméstica", é a saúde - bem jurídico complexo que abrange a saúde física, psíquica e mental, e bem jurídico este que pode ser atingido por uma multiplicidade de comportamentos.

C) Por esta incriminação são apenas puníveis as condutas violentas (de índole física, psicológica, verbal e/ou sexual) dirigidas a uma pessoa que, no domínio de uma determinada relação, surge subordinada à outra pessoa que, participante nessa relação, assume uma posição tal que exerce, de forma ilegítima, um poder/domínio sobre a vida, a integridade física, a liberdade, a honra, etc, do outro.

D) Atentos os elementos objectivos e subjectivos do crime de violência doméstica, perante comportamento ofensivo da honra, consideração e/ou integridade física, importará aferir se existe reiteração, ou se, tratando-se de um acto isolado, o mesmo o foi com uma intensidade tal e em circunstâncias tais que permitam concluir que, igualmente, foi afectada a integridade pessoal do outro, a sua dignidade enquanto pessoa humana ou o livre desenvolvimento da sua personalidade, e tal, terá de ser casuisticamente determinado.

E) Da factualidade dada como provada na sentença recorrida, resulta que a conduta do Arguido se circunscreveu num único dia, foi levada a cabo por telefone e não atinge uma gravidade tal que revele que o Arguido e ora Recorrente, enquanto elemento da relação, assumia para com S.P. Pereira, na data da prática dos factos, uma posição de poder/domínio sobre o outro que, em última instância, é "coisifícado".

 F) Não é por o Arguido ter escrito mensagens, contendo palavras e expressões ameaçadoras e injuriosas, dirigidas a S.P., mãe da sua filha, (transcritas em 3) dos Factos Provados), na data em que ambos partilhavam mesa, cama e habitação que, imediatamente, se mostra preenchida a previsão do crime de violência doméstica, do artigo 152. °, n. ° 1, do Código Penal.

G) O Tribunal a quo deu ao disposto no art. ° 152. °, n. ° 1, do Código Penal, uma interpretação redutora e que não respeita a ratio daquele preceito legal.

H) Atenta a interpretação e a aplicação que o Tribunal a quo deu, na sentença recorrida, ao disposto no art. ° 152. °, n. ° 1, do Código Penal, existindo entre o agressor e a vítima uma relação análoga à dos cônjuges e/ou filhos em comum, seriam sempre inaplicáveis as previsões dos crimes de injúria ou de ameaça, por exemplo; sendo imediata e necessariamente aplicável, ao caso, a previsão do crime de violência doméstica.

I) Ora, os factos dados como provados na sentença recorrida não revelam, nem sequer tenuemente, o exercício por parte do Arguido de uma dominação e prevalência sobre a pessoa de S.P. Pereira; nem uma correlativa vivência, por parte desta, de medo, de tensão e de subjugação, idónea a afectar-lhe a saúde, no caso concreto, o seu bem-estar psíquico e a sua dignidade humana, bens jurídicos tutelados pela norma incriminadora do art. ° 152. ° do Código Penal.

J) Assim, perante tal, e tendo presente o tipo legal de crime de violência domestica - art.° 152.° do Código Penal - resulta que a factualidade considerada provada pelo Tribunal a quo não preenche o tipo objectivo do ilícito criminal de violência doméstica, por cuja prática o Arguido foi condenado.

K) Quanto à possibilidade de integração do crime de injúria simples, p. e p. pelos arts. 181.°, n.° 1 e 182.°, ambos do Código Penal, há a assina/ar que o procedimento criminal está dependente de queixa e de acusação particular (arts. 188. °, n. ° 1, do Código Penal e 50. °, do Código de Processo Penal). Ora, a ofendida não se constituiu assistente nem formulou acusação particular - pelo que o Tribunal ad quem não pode conhecer de tais factos.

L) Já quanto à possibilidade de integração do crime de ameaça agravada, p. e p. pelos arts. 153.°, n.° 1 e 155.°, n.° 1, alínea a), ambos do Código Penal, verificamos que o teor das mensagens enviadas pelo Arguido a S.P. , transcritas em 3) dos Factos Provados, não integram a previsão da norma do art. ° 153. ° do Código Penal, uma vez que a ameaça tem como requisito que o mal ameaçado não possa ser iminente, mas tenha que ser um mal futuro e as expressões: "(...) to a cminho dai vo ti matar hj juro" (em 3) alínea b) dos Factos Provados) e "s n vo ti matar hj juro (...) s n ti aleijar hj q eu morra" (em 3) alíneas c) e d) dos Factos Provados), são expressões de absoluto presente e não admitem qualquer interpretação de ameaça para o futuro.

Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogada a sentença recorrida, absolvendo-se, em consequência, o Recorrente da prática de qualquer ilícito penal,

Como é de JUSTIÇA!


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O recurso foi admitido.

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Na sua resposta, o MºP defendeu a improcedência do recurso e a confirmação integral da sentença recorrida, concluindo nos seguintes termos:

1. O arguido, ora recorrente, alega erro na subsunção dos factos ao direito e subsidiariamente, a não subsunção dos factos ao crime de ameaça na forma agravada;

2. Não concordamos com a argumentação constante do recurso, entendendo que deve manter-se integralmente a sentença proferida porque se encontram verificados os requisitos do artigo 152.º, n.º 1, alíneas b) e c), n.º s 4 e 5 do Código Penal;

3. Uma vez que, em 18 de Fevereiro de 2014, o arguido e a ofendida, partilhavam cama, mesa e habitação, tendo dessa relação uma filha em comum, de nome M.;

4. Nos autos, foram provados factos passíveis de integrar o conceito de “maus tratos psíquicos”;

5. E não se avance que a conduta do ora recorrente, foi pontual, porque se atentarmos no conteúdo das mensagens enviadas resulta das mesmas expressões como: “(…) to a cminho dai vo ti matar hj juro” e “Vo prefiro morrer hoje a vos deixar com ela nem que vamos os dois pra d baixo do comboio”.

6. Expressões ameaçadoras dirigidas à ofendida, que à data ainda vivia com ele em condições análogas às dos cônjuges, referindo-se inclusive à filha de ambos, dizendo que prefere que acabem os dois debaixo do comboio, a deixar a menina com a mãe.

7. Assim, mesmo que nos autos não tenha ficado demostrada a reiteração da conduta, os factos assentes são já reveladores de um comportamento violento capaz de ofender a dignidade pessoal da ofendida.

8. Pelo que deverá manter-se a condenação pela prática do crime de violência doméstica;

9. Ou, caso assim não se entenda, condenar o arguido pela prática do crime de ameaça, na forma agravada, previsto e punido nos termos do disposto no artigo 153.º, n.º 1 e 155.º. n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal.

10. Uma vez que, as expressões constantes das mensagens de texto enviadas à ofendida verbalizam a intenção da prática futura, de um crime contra a vida ou a integridade física da ofendida, tendo provocado naquela medo e inquietação;

Termos em que negando provimento ao recurso e mantendo a douta sentença recorrida”


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Nesta Relação, a Exmª Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, subscrevendo os termos e fundamentos constantes na resposta do MºPº

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Foi cumprido o disposto no art. 417º nº 2 do C.P.P., sem que tivesse sido apresentada resposta.

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Colhidos os vistos, foram os autos submetidos à conferência.

Cumpre decidir.


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II FUNDAMENTAÇÃO

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

1) Na data abaixo referida, o arguido e S.P.  partilhavam cama, mesa e habitação.

2) Da relação entre ambos nasceu uma filha, de seu nome M..

3) Em 18.02.2014, o arguido, através dos telefones por si usados, com os n.ºs 96…….. e 92……., enviou para o telefone usado por S.P. as seguintes mensagens:

a) Recebida pelas 10H40M: «Sbis bem q ele ia lgar logo a minha mae ela cheia d problemas d coração e tensão aind vais lgar pq qres vadirar cm a lar so pds tar a brinkar cmg». «eu uo ti dar a dssculpa M. tu es um aporca d merda q dves tar a confundir cm outr pessoa d serteza».

b) Recebida pelas 11H46M: «N fls.t a puta q ti pario to a cminho dai vo ti matar hj juro».

c) Recebida pelas 11H24M: «s nvo ti matar hj juro por ela a minha avò e pla minha via s n ti aleijar hj q eu morra».

d) Recebida pelas 11H24M: «s nvo ti matar hj juro por ela a minha avò e pla minha via s n ti aleijar hj q eu morra».

e) Recebida pelas 11H22M: «Puta merda n lembras o q fzeste ao meu primo nem nda vo ti aleijar é muita coisa pra n ti fzr nada».

f) Recebida pelas 10H40M: «eu uo ti dar a dsculpa M. tu es uma porca d merda q dves tar a cnfundir cm outr pessoa d serteza».

g) Recebida pelas 10H44M:«mantalisate q vais morrer estis dias pds ter serteza».

h) Recebida pelas 10H52: «eu vo ti matar so isso sair dqi dsta merd é o q mais quero ent já sbis vem cm qem qzeres eu hj vo em cana ent mas n ris d mim n juro vo ti meter nu hospital cmo metest a minha mae juro puta d merda».

i) Recebida pelas 11H00:«ainda bem tu dstd ontem q n a vais ver ms juro bem pds ir a creche a ver s lhe encomtras vaca vo t matar juro pds vir aqi cm a policia è igual vo ti matar na msm».

j) Recebida pelas 11H06: «Ainda bem pq vo ti matar e cm ela tmb n fcas».

k) Recebida pelas 11H14: «n venhas ka nem hj nem nunca mas pp s ti ver na minha frente vo ter d ti mandar ao hospital pds apostar a vida da M. pq vo ti matar juro vaca d merda».

l) Recebida pelas 11H16: «ainda bem tu e a merda da tua família n a veiem tbm já ta bom a minha mae n cnhece pq q tua tem d ficar cm ela».

m) Recebida pelas 11H17: «juro vo preferir da pra adoção».

n) Recebida pelas 11H19: «cm merda cmo vocês n fica juro e tns tanta serteza n ti vo fzr nada vem aqi ent ver».

o) Recebida pelas 11H22: «puta merda n lembras o que fzste ao primo nem nda vo ti alejar é muita coisa junta pra n ti fzr nda!».

p) Recebida pelas 11H24: «s n vo ti matar hj juro por ela a minha avó e pla minha vida s n ti alejar hj q eu morra».

q) Recebida pelas 11H46: «Nflas.t a puta q ti pario to a caminho dai vo ti matar hj juro».

r) Recebida pelas 12H20: «sbis bem q ele ia lgar logo a minha mae ela cheia d problemas d coraçao e tensão ainda vai lgar pq qres ir vadiar cm a lar aso pds tar a brinkar cmg».

s) Recebida pelas 14H34: «mands msg agora n atends».

t) Recebida pelas 14H48: «Entao tas a mandar msg a dzr muita coisa agora não atends pq vocês tdos também tao fdidos pq tdos sabiao q aias casar por dinheiro e nao disseram nada Eu que fiquei com ela achas q agora vo vos dar ela de mao beijada nada disso juro ent voa me matar hoje pq ela não vao tirar n».

u) Recebida pelas 14H50: «Vo prefiro morrer hoje a vos deixar com ela nem que vamos os dois pra d baixo do comboio».

4) O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

5) Do teor do certificado de registo criminal do arguido consta:

a) Por acórdão proferido em 13.04.2005, transitado em julgado em 28.04.2005, o arguido foi condenado pela prática, em 29.09.2003, de dois crimes de roubo na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período temporal.

b) Por acórdão proferido em 02.02.2009, transitado em julgado em 04.03.2009, o arguido foi condenado pela prática, em 28.02.2006, de um crime de tráfico de estupefacientes na pena de 4 anos e 7 meses de prisão.

c) Por sentença proferida em 12.09.2012, transitada em julgado em 02.10.2012, o arguido foi condenado pela prática, em 14.01.2012, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de 6,00 Euros.

d) Por sentença proferida em 27.09.2012, transitada em julgado em 20.10.2012, o arguido foi condenado pela prática, em 26.09.2012, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal na pena de 75 dias de multa, à taxa diária de 10,00 Euros.

e) Por sentença proferida em 11.04.2013, transitada em julgado em 13.05.2013, o arguido foi condenado pela prática, em 09.10.2011, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de 6,00 Euros.

6) O arguido é pintor de automóveis, encontrando-se desempregado.

7) Faz pequenos trabalhos na construção civil que lhe rendem (mensalmente) entre 500,00 a 600,00 Euros.

8) Os pais enviam-lhe de Angola, mensalmente, cerca de 250,00 a 300,00 Euros.

9) Vive sozinho em casa arrendada, pagando (mensalmente) 300,00 Euros de renda.

10) Paga(mensalmente)deágua,luzegásaquantiade50,00Euros.

11) Está habilitado com o 5.º ano de escolaridade.

12) Tem uma filha, com 2 anos de idade.”

Consignaram-se como não provados os seguintes factos:

13) S.P. e A.T.S., em data não concretamente apurada, mas no ano de 2011, iniciaram um relacionamento amoroso, fruto do qual nasceu M. em 21 de Maio de 2012.

14) No decurso da gravidez da filha comum do casal, S.P. e A.T.S. passaram a viver em condições análogas à dos cônjuges, ou seja, partilhando mesa, leito e habitação, residindo, num primeiro momento na casa sita na Avenida ………………. Queluz, e desde data não concretamente apurada, na casa sita na Rua ………………… em Belas, área desta Comarca.

15) Desde o inicio do período de convivência do casal, o arguido, por diversas vezes, em datas não concretamente apuradas, sem motivo aparente, apresentou um temperamento violento e implicativo para com S.P., sendo que, a frequência e intensidade de tais condutas acentuaram-se nos últimos meses do ano de 2013 e primeiros meses do ano de 2014. 16) Designadamente, durante todo este tempo, e com frequência não concretamente apurada, o arguido dirigia-se a S.P. e em tom sério e alto dizia-lhe “puta”, “porca”, “vaca”, “cabra”, “és uma vadia”, entre outras, em desrespeito pelo sentido de consideração e pudor inato a qualquer ser humano, não se coibindo o arguido de dirigir-lhe tais expressões, procurando, sem motivo vexá-la e humilhá-la, mesmo na presença da filha menor de ambos.

17) Igualmente durante esse período, em datas concretamente apuradas, o arguido desferiu, em número não determinado, em S.P. Pereira chapadas, murros, pontapés, puxões de cabelo, apertões de pescoço, o que lhe causou dores e incómodos, e por vezes, marcas nas zonas atingidas, designadamente, junto aos olhos.

18) Sendo que, quando S.P., por força das dores que sentia na sequencia dessas agressões, gritava por auxílio ou porque não conseguia parar de chorar face às dores, A.T.S. em tom sério e alto, e repetidamente, dizia-lhe “cala-te, é melhor estar calada, eu desfiguro-te, mato-te” (sic), sendo que por vezes, quando assim atuava, munia-se de facas de cozinha, as quais apontava na direção daquela.

19)Igualmente nesse período de convivência conjugal, em datas não concretamente apuradas, o arguido arremessava objetos contra o corpo de S.P., não a atingindo por razões alheias à sua vontade, como e ainda, em datas igualmente não concretamente determinadas, agarrava aquela e munido de uma faca, a colocava nas pernas desta, junto à pele.

20) Bem como, por diversas vezes, em datas não apuradas e de modo não concretamente determinado, não permitia que S.P. saísse da residência do casal, como e ainda lhe dizia que a matava.

21) Sendo que o arguido não se coibiu de adotar tais condutas mesmo durante o período em que S.P. estava grávida da filha comum do casal.

22) Tal sucedeu, designadamente, no dia 12 de Dezembro de 2012, pelas 01H53M, no interior da residência do casal à data sita na Avenida ………… Queluz, área desta Comarca, quando S.P. disse ao arguido que pretendia visitar uns familiares à localidade da Serra das Minas, perante o que o mesmo de imediato iniciou uma discussão com aquela, dizendo-lhe entre o mais que o que a mesma queria era ir visitar os amigos e não os familiares, e de imediato, e sem que nada o fizesse antever, desferiu-lhe duas chapadas, atingindo-a na cara e cabeça, causando-lhe dores e incómodos.

23) Face a tal, S.P., pegou na filha menor de ambos e dirigiu-se para a rua, sendo de imediato seguida pelo arguido, que a logrou alcançar e, em ato continuo, lhe retirou a filha menor do colo, ao mesmo tempo que, em tom sério e audível, lhe disse que “lhe dava com a cabeça nos vidros da porta” (sic), e seguidamente, desferiu- lhe outra chapada na cara e agarrou-a pelos cabelos puxando-os, procurando trazê-la para a casa, o que, contudo, não logrou conseguir por aquela ter-se soltado.

24) Seguidamente A.T.S. remeteu para o telemóvel da sua companheira uma mensagem na qual dizia “para a mesma voltar para casa, e que não o obrigasse a sair de casa se não nem sabia o que lhe ia acontecer” (sic), perante o que, S.P.  temendo pela sua integridade física, refugiou-se no meio dos prédios e pediu ajuda a uma amiga, cuja identidade não se logrou apurar.

25) No dia 18 de Fevereiro de 2014, pelas 10H00M, S.P. encontrava-se no interior da residência do casal, a arranjar a filha menor para ambas saírem ao encontro da mãe daquela, N.R., quando o arguido entrou na residência e iniciou uma discussão com aquela, dizendo-lhe que “ela ia sair e deixar a residência por limpar” (sic), ao que a mesma ainda lhe respondeu que só ia tomar um café com a sua mãe, mas aquele, por forma não concretamente apurada, não a deixou sair de casa.

26) Tendo S.P. insistido que queria sair para ir ter com a sua mãe, o arguido muniu-se de uma faca e de um martelo, ao mesmo tempo que, dirigindo-se aquela lhe disse, em tom sério, que lhe batia com os mesmos,

27) Face a tal, S.P. ligou para a sua mãe, dizendo-lhe que não podia ir ao seu encontro por estar retida em casa.

28) Perante o telefonema da sua filha, N.R. deslocou-se à residência do casal, e no momento em que entrou no interior da mesma, S.P. fugiu para o exterior, tendo o arguido ido ao seu encalce, logrando alcançá-la no vão de escadas do prédio, agarrou-a e puxou-lhe os cabelos, contudo, a mesma logrou libertar-se e continuou a correr, indo refugiar- se na casa da sua mãe sita na Avenida …………….. Rio de Mouro.

29) Seguidamente, N.R. acompanhou o arguido ao infantário da filha menor do casal, e durante esse percurso, o arguido, em tom sério, disse “vou lá e bato-lhe e mato-a” (sic).

30) Nesse mesmo dia, em hora não apurada mas durante a noite, o arguido dirigiu-se à casa de N.R. e exigiu a S.P. que lhe entregasse a menor, ao que a mesma, com receio do que aquele lhe poderia fazer, acabou por ceder entregando a menor ao pai.

31) Sendo que, após tal situação, e por temerem pela própria integridade da menor, S.P. e sua mãe, acompanhadas de elementos policiais, deslocaram-se ao infantário frequentado pela filha menor do casal a fim de a irem buscar,

32) Momentos após tal acontecer, o arguido telefonou para S.P.  dizendo-lhe “vais andar sempre com escolta atrás de ti, se pensas que ganhastes a batalha estás enganada, não vou ficar sem a minha filha, nunca!” (sic).

33) Perante as condutas assumidas por o arguido e melhor descritas em 13 a 20 do presente, S.P., saiu da sua casa só́ com a roupa que tinha no corpo, refugiando-se no interior da casa da sua mãe.

34) No dia 17 de Junho de 2014, pelas 09H45M, o arguido deslocou-se à residência de S.P. e ali entrou e permaneceu, sendo que em certo momento, e sem autorização da ofendida, o mesmo pegou no telemóvel pessoal pertença desta e começou a ver as mensagens que a mesma tinha recebido,

35) Ao visualizar uma mensagem que tinha a expressão “querida” (sic), de imediato iniciou uma discussão com S.P., em voz alta e séria, disse-lhe “tu não prestas” (sic).

36) Durante a discussão assim mantida, N.R., mãe da ofendida, recebeu uma chamada telefónica através do número de telemóvel de A.T.S., tendo reconhecido a voz da sua filha, em tom elevado, e de forma repetida, a dizer “pára Sony” (sic), após o que, desligaram a chamada.

37) Perante isto, de imediato N.R. ligou para o numero de telemóvel pertença da sua filha, tendo a chamada sido atendida, contudo, e durante cerca de 5 minutos, aquela só ouvia o arguido e a sua filha a falar em tom elevado, em que aquele dizia “tu não prestas” (sic), e a filha respondia “para Sony, chega Sony” (sic), ouvindo ainda sons semelhantes a sons de pancadas.

38) Já́ em data anterior, não concretamente apurada, mas entre o mês de Fevereiro e Março de 2014, por o arguido ter pedido a S.P. para se encontrar consigo dizendo-lhe que queria ver a filha de ambos, esta última acedeu, mas pediu à sua mãe para a acompanhar, o que sucedeu, tendo esta última as levado na sua viatura.

39) Ali chegadas, e encontrando-se S.P. e a menor no interior do veículo de N.R., o arguido abeirou-se deste veículo e abriu a porta do mesmo, colocando o seu corpo no seu interior, tendo S.P. de imediato e em tom aflitivo dito “não comeces Sony” (sic),

40) Perante tal N.R., procurando evitar que o arguido alcançasse S.P., aproximou-se e colocou a sua mão entre o arguido e o corpo da sua filha, e de imediato e sem que nada o fizesse prever, o arguido aproximou-se mais de S.P., e desferiu uma dentada, vindo, contudo, a atingir a mãe desta, mais precisamente o seu dedo polegar direito.

O Direito

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar[1], sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no art. 410º nº 2 do C.P.P.[2].

No caso dos autos, face às conclusões da motivação do recurso, as questões essenciais que importa decidir são as seguintes:

-erro na subsunção dos factos ao direito e

- não subsunção dos factos provados ao crime de ameaça na forma agravada.

No caso em apreço, o recorrente invoca erro de interpretação na subsunção dos factos ao direito uma vez que, na sua perspectiva, os factos dados como provados não integram o crime de violência doméstica pelo qual foi condenado, e nem eventualmente o do crime de ameaça p. e p. pelo artº 153º do C.P. sendo que relativamente ao crime de injúria, p. e p. pelo artº 181º do C.P., pelo mesmo não poderá ser condenado uma vez reveste de natureza particular sendo certo que que não existe acusação particular  deduzida nos autos e que a tal não permitiria o princípio “ne bis in idem”

Porém, não lhe assiste razão.

Perante os factos que foram dados como provados, não merece censura a qualificação jurídica feita pelo tribunal da 1ª instância e a conclusão da condenação do recorrente pelo crime de violência doméstica p. e p. nas alíneas b) e c) do n.º 1 e nos n.ºs 4 e 5 do artigo 152.º do Código Penal,

Pratica o crime de violência doméstica previsto no art. 152º, nº 1, al. a), do CP, “Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais:

a)...

b)A pessoa de outro ou do mesmo sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido uma relação de namoro ou uma relação análoga à dos cônjuges, ainda quer sem coabitação

c) A progenitor de comum em 1º grau;..”

A necessidade de criminalização das condutas genericamente denominadas de maus tratos adveio da progressiva consciencialização acerca da gravidade de um fenómeno social de proporções tanto mais alarmantes quanto encapotadas e altamente lesivo, com repercussões quer a nível da formação individual, quer a nível da integridade do próprio tecido social. Fenómeno esse do qual são vítimas pessoas particularmente vulneráveis e indefesas em razão dos vínculos, nomeadamente de natureza familiar ou análoga, que as ligam às pessoas dos seus agressores e em resultado dos quais se estabelecem entre estes e aquelas relações de subordinação ou de domínio de facto, que as colocam em situação de dependência económica e/ou emocional. Pretendeu-se, pois, contrariar um sentimento de impunidade - encorajado pelo facto de tais condutas serem habitualmente praticadas em círculos privados ou muito restritos, longe dos olhares alheios, nem sempre denunciadas e ainda mais raramente reclamada a sua punição até às últimas consequências, seja por medo de represálias, vergonha de expor publicamente a situação ou falta de capacidade para o fazer ( circunstâncias, aliás, propiciadoras da sua proliferação ) -, bem como travar a espiral de violência em que se traduzem e os demais efeitos nocivos que desencadeiam, reprimindo a sua prática.

O crime de violência doméstica é uma das duas formas especiais do crime geral de maus tratos cuja previsão, antes das alterações introduzidas pela Lei nº 59/2007 de 4/9, se encontrava concentrada na anterior redacção do art. 152º do C. Penal. Na vigência desta norma discutia-se se a previsão legal exigia a reiteração criminosa ou se se podia considerar preenchida com uma conduta isolada, aceitando a corrente maioritária na jurisprudência[3] que bastava um só acto nos casos excepcionais em que ele se revestisse de gravidade suficiente para afectar de forma marcante a saúde física ou psíquica da vítima. O legislador de 2007 veio resolver essa querela ao prever expressamente que o tipo não exige a reiteração, para além de ter alargado a tutela penal da norma de forma a abranger as relações familiares pretéritas e as relações parentais não familiares, e de ter exemplificado algumas das condutas integradoras do conceito de “maus tratos físicos ou psíquicos” - castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais.

A norma incriminadora protege vários bens jurídicos ( integridade física e psíquica, liberdade pessoal, liberdade e autodeterminação sexual, honra ), que podem ser afectados por uma multiplicidade de comportamentos que, em si mesmas considerados, já constituem crime[4], mas que não devam ser punidas com pena mais grave por força de outra disposição legal ( cfr. parte final do nº 1 do art. 152º ). O crime de violência doméstica pode, pois, unificar, através do elemento da reiteração – que não implica necessariamente habitualidade na conduta -, uma multiplicidade de condutas que, consideradas isoladamente, poderiam integrar vários tipos legais de crime, mas que, pela subsunção a uma única previsão legal, deixam de ter relevância jurídico-penal autónoma[5].

Este crime “persiste enquanto durarem os actos lesivos da saúde física (que podem ser simples ofensas corpo­rais) e psíquica e mental da vítima (humilhando‑a, por exemplo) e a relação de convivência que faz dele um crime de vinculação pessoal persistente (…).”[6].

Trata-se de um crime específico por pressupor uma determinada relação entre os sujeitos activo e passivo.

No entanto, o crime em apreço também se preenche mesmo que não haja reiteração quando são infligidos maus-tratos físicos ou psíquicos. De realçar que desde as alterações introduzidas pela Lei nº 52/2007, de 4/09, que não é sustentável defender como regra geral que o crime de violência doméstica depende da conduta descrita no tipo revestir uma especial gravidade ou atingir uma certa intensidade ou assumir um “carácter violento”.

Com efeito, e como salientam Victor de Sá Pereira e Alexandre Lafayette, Código Penal anotado e comentado, Quid Juris, Lisboa, 2008, p.404, o elemento redutor constante da Proposta de Lei nº 98/X, de 7.9.2006 (onde se exigia que “os maus tratos ocorressem «de modo intenso e reiterado»), que por certo iria dar causa a alguma arbitrariedade, não passou para a Lei.

No que aqui interessa o tipo objectivo de ilícito preenche-se com a acção de infligir “Maus-tratos físicos” (que se traduzem em ofensas à integridade física, incluindo simples) ou “Maus-tratos psíquicos” (que podem consistir em “humilhações, provocações, molestações, ameaças, mesmo que não configuradoras em si do crime de ameaça”) ao ex-cônjuge do agente.( Taipa de Carvalho in Comentário Conimbricense do Código Penal, Volume I, Coimbra Editora, 1999, pág. 332.

Portanto, tendo em atenção o bem jurídico protegido (que orienta a interpretação do tipo legal aqui em causa) e o caso concreto para a consumação do crime de violência doméstica não é necessário que a conduta do agente/arguido assuma um carácter violento, no sentido de exceder o crime de ameaça e de injúria.

Neste caso concreto não estão em causa “maus-tratos físicos” (uma vez que o arguido não atingiu a integridade física da ofendida), mas antes o infligir “maus-tratos psíquicos” na pessoa da companheira com a qual mantinha uma relação análoga à dos cônjuges e de que tinha uma filha

No que respeita ao elemento subjectivo, trata-se de um crime doloso[7], podendo o dolo revestir qualquer das modalidades previstas no art. 14º do C. Penal, resultando claro - afastada que foi a exigência de que o agente agisse por “malvadez ou egoísmo” que constava da redacção do art. 153º do C. Penal anterior às alterações introduzidas pelo DL nº 48/95 - que basta o dolo genérico.

É um crime de mera actividade (está em causa o infligir de “maus-tratos psíquicos”), bastando o dolo de perigo de afectação da saúde, aqui o bem estar psíquico e a dignidade humana do sujeito passivo.

Ora perante os factos concretos apurados, dívidas não existem que  o arguido ao enviar repetidamente à ofendida à ofendida dizendo-lhe és uma puta, uma porca de merda, ameaçando-a que a ia matar, aleijá-la, e que preferia que ambos morressem debaixo de um comboio a que ficassem com a filha, não há dúvidas que todo esse sucessivo e repetido comportamento do arguido (portanto considerado não só individual como globalmente) integra o conceito de “maus-tratos psíquicos”, tendo em atenção o bem jurídico protegido no crime de violência doméstica.

Todos esses episódios e actos, praticados dolosamente pelo arguido contra a sua companheira, para além do seu conteúdo, foram-no de um modo intenso continuado como fez, realizando no espaço de 5 horas  21 telefonemas, e sem terem como origem qualquer episódio conflituoso que os possam de algum modo justificar, são a nosso ver idóneos a afectar o bem estar psicológico daquela, pois além de representarem total desrespeito para com a mesma, são aptos pela sua intensidade, a cauS.P.m medo e ansiedade, e ofendendo a dignidade de qualquer pessoa..

A descrita conduta do arguido (que até assumiu um modo especialmente desvalioso) é penalmente censurável tendo em atenção o tipo legal em questão (crime de violência doméstica) e o bem jurídico protegido.

Não há, por isso, quaisquer dúvidas que toda a descrita conduta do arguido integra os pressupostos objectivos e subjectivos do crime pelo qual foi condenado.

Em conclusão: não há qualquer erro de interpretação na subsunção dos factos ao direito, razão pela qual não merece censura a sentença impugnada.

Improcede, pois, a argumentação do recorrente


*

III DECISÃO

Por todo o exposto, julgam o recurso improcedente, confirmando integralmente a sentença recorrida.

Vai o recorrente condenado em 4 UC de taxa de justiça.


(processado por computador e revisto pelo1º signatário- artº 64º nº 2 do Cod. Proc. Penal)

   Lisboa, 16 de Setembro de 2015

(Vasco Freitas)               

     (Rui Gonçalves)

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[1] ( cfr. Prof. Germano Marques da Silva, "Curso de Processo Penal" III, 2ª ed., pág. 335  e jurisprudência uniforme do STJ (cfr. Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196 e jurisprudência ali citada).
[2]  Ac. STJ para fixação de jurisprudência nº 7/95, de 19/10/95, publicado no DR, série I-A de 28/12/95.

[3] cfr., entre outros, os Acs. STJ 14/11/97, C.J. STJ, ano V, t. 3, pág. 235, 5/4/06, proc. nº 06P468, e 6/4/06, proc. nº 06P1167, e RE 29/11/05, proc. nº 1653/05-1.
[4] Abarcando na sua previsão condutas que também se encontram previstas autonomamente noutros tipos legais, estabelecem-se entre estes e aquele relações de concurso.

[5] “A unidade de acção típica não é excluída pela realização repetida de actos parciais, quer estes actos integrem, ou não, em si mesmos, outros tipos de crime.

O tipo legal inclui na descrição da acção uma pluralidade indeterminada de actos parciais. Trata-se do que, na doutrina, é designado por realização repetida do tipo (…)

Há crimes que se consumam por actos sucessivos ou reiterados, como se expressa no artigo 19.º, n.º 2, do CPP, mas que são um só crime; não há pluralidade de crimes, mas pluralidade no modo de execução do crime.

A execução é reiterada quando cada acto de execução sucessivo realiza parcialmente o evento do crime; a cada parcela de execução segue-se um evento parcial. Porém, os eventos parcelares devem ser considerados como evento unitário. A soma dos eventos parcelares é que constitui o evento do crime único.” cfr. Ac. RP 5/11/03, proc. nº  0342343.

[6] cfr. Ac RG 31/5/04, proc. nº 719/04-1.
[7] “Todavia, uma vez que este crime tanto pode ser um crime de resultado (…) como de mera conduta (…), como, ainda noutra perspectiva, tanto pode ser um crime de dano (…) como crime de perigo (…), o conteúdo do dolo é variável em função da espécie de comportamento do agente.”