Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
454/13.5YRLSB-4
Relator: MARIA JOÃO ROMBA
Descritores: GREVE
SERVIÇOS MÍNIMOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/19/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A DECISÃO
Sumário: I - Na medida em que o direito de greve pode colidir com outros direitos com igual dignidade constitucional, a tutela destes impõe que aquele sofra restrições que, todavia, terão de ser as mínimas para permitir a concordância prática dos direitos em colisão e por conseguinte, que não implique a aniquilação de um dos direitos em detrimento do outro.
II - Por isso a definição dos serviços mínimos deve respeitar os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.
III -Embora a especificidade da insularidade imponha que, em caso de greve nos transportes aéreos, as populações das ilhas não fiquem absolutamente isoladas, isso não justifica que se definam como serviços mínimos todos os voos programados de e para as Regiões Autónomas, nem o justificam o facto de a greve em causa ter a duração de três dias e/ou de ter lugar na semana anterior à Páscoa. A definição de serviços mínimos como a totalidade dos voos programados de e para as Regiões Autónomos equivaleria à negação aos trabalhadores das empresas transportadoras aéreas do direito de greve, violando os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.
IV - No que se refere aos voos internacionais para os principais destinos da comunidade emigrante portuguesa, não se vislumbram razões para concluir que os serviços mínimos, tal como definidos no acórdão arbitral, excedam os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.
V - Relativamente à operação a realizar nos dias de greve pela SATA Internacional – por existir litispendência relativamente ao processo que corre termos neste Tribunal sob o nº 491/13.0YRLSB, no qual esta e outras interpuseram recurso do acórdão arbitral nº 2/2013 do CRCE da RAA que definiu os serviços mínimos relativamente à mesma greve, prevalece a decisão ali proferida, por se tratar do processo primeiramente iniciado.(Elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

          O Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) e o Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC) recorreram do acórdão arbitral proferido em 15/3/2013 no processo de arbitragem obrigatória nº 15/2013-SM, do Conselho Económico e Social que, relativamente à greve decretada para o período de 21 a 23 de Março de 2013, não só pelos sindicatos ora recorrentes, mas ainda pelo Sindicato dos Técnicos de Manutenção de Aeronaves (SITEMA), Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos (SITAVA), Sindicato dos Técnicos de Handling de Aeroportos (STHA), Sindicato das Indústrias Metalúrgicas e Afins (SIMA), Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Aviação Civil (SINTAC), Sindicato dos Quadros da Aviação Comercial (SQAC), e pelo Sindicato Nacional dos Engenheiros, Engenheiros Técnicos e Arquitectos (SNEET), conforme pré-avisos de greve dirigidos à TAP – Air Portugal, S.A., Portugália – Companhia Portuguesa de Transportes Aéreos, S.A. (PGA) e SATA Internacional, S.A., decidiu, por unanimidade, definir os seguintes serviços mínimos para os períodos de greve:
1. Voos de realização obrigatória:
a)      Realização dos voos de regresso directamente para o território nacional para as bases de Lisboa e Porto;
b)      Todos os voos impostos por situações criticas relativas à segurança de pessoas e bens, incluindo os voos-ambulância e de emergência, movimentos de emergência entendidos como situações declaradas em voo, designadamente por razões de natureza técnica, meteorológica e outras que pela sua natureza tornem absolutamente inadiável a assistência ao voo ou à sua realização;
c)       Todos os voos militares;
d)      Todos os voos de Estado, nacional ou estrangeiro.
2.       Operação a realizar nos dias de greve para a TAP e PGA:
2.1.    Voos de e para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira:
Realização de todos os voos programados de e para a Região Autónoma dos Açores e de e para a Região Autónoma da Madeira;
2.2     Restante operação:
a) Ligação Portugal/Angola/Portugal – dois voos de ida e dois voos de volta durante todo este período de greve;
b) Ligação Portugal/Brasil/Portugal – dois voos de ida e dois voos de volta em cada um dos dias deste período de greve;
c) Ligação Portugal/França/Portugal – um voo de ida e um voo de volta em cada um dos dias deste período de greve;
d) Ligação Portugal/Guiné Bissau/Portugal – um voo de ida e um voo de volta em todo este período de greve;
e) Ligação Portugal/Luxemburgo/Portugal – um voo de ida e um voo de volta em cada um dos dias deste período de greve;
f) Ligação Portugal/Reino Unido/Portugal – um voo de ida e um voo de volta em cada um dos dias deste período de greve;
g) Ligação Portugal/Suíça/Portugal – dois voos de ida e dois voos de volta durante todo este período de greve;
3. Operação a realizar nos dias de greve pela SATA:
Entre o continente e as diversas ilhas do arquipélago dos Açores, uma ligação diária, existindo essas ligações na ausência da greve, designadamente:
3.2 No dia 21 de Março:
a) LIS/TER/LIS (TP 1821/1822);
b) LIS/HORT/LIS (TP 3919/3918);
c) LIS/SMA/PDL/LIS (S4 4012).
3.3 No dia 22 de Março:
a) LIS/HORT/LIS (TP 1843/1844);
b) LIS/TER/LIS (TP 1827/1828);
c) LIS/PDL/LIS (S4 129/128).
3.4 No dia 23 de Março:
d) LIS/HORT/LIS (TP TP 3919/3918);
e) LIS/PIX/TER/LIS (TP 1817);
f) LIS/PDL/LIS (S4 129/128).
4.       Quanto aos meios humanos para assegurar a prestação dos serviços mínimos, os representantes dos sindicatos deverão em conformidade com o art. 538.º, 7, do CT identificar os trabalhadores adstritos a tal obrigação, cabendo, nos termos da mesma disposição legal, a designação aos empregadores se a associação sindical não exercer essa faculdade até vinte e quatro horas antes do início do período da greve.” (cfr. fls. 238/244).
         
          O primeiro recorrente, formula a final as seguintes conclusões:
          (…)
      
       Por sua vez, o 2º recorrente, que também arguiu nulidade do acórdão, deduz as seguintes conclusões:
          (…)
          A recorrida TAP – Air Portugal, S.A. contra-alegou ambos os recursos, pugnando pela respectiva improcedência.
          Subidos os autos a este Tribunal, a digna PGA emitiu o parecer de fls.  470/474 favorável à parcial procedência do acórdão, o que mereceu resposta da recorrida TAP:

          O objecto dos recursos, como decorre das conclusões que antecedem, cinge-se à questão de saber se na definição dos serviços mínimos efectuada pelo tribunal arbitral foram respeitados os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade, para além de saber se o acórdão incorreu na nulidade de não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (art. 668º nº 1 al. b) CPC).
         
          Apreciação
          À laia de questão prévia, adiante-se que concordamos com ambos os recorrentes quando sustentam que resulta da interpretação conjugada do disposto nº 4 do art. 538º do CT, 27º (em especial do respectivo nº 3) e 22º do DL 259/2009, de 15/9, a utilidade do recurso, independentemente de a greve se ter consumado ou ter sido desconvocada, visto ser praticamente impossível que a decisão do recurso possa ter lugar antes do decurso da greve, dado os apertados prazos do procedimento de arbitragem e, não obstante isso, a lei prever que a decisão arbitral é sempre passível de apelação, sendo, por outro lado, legítimo que as recorrentes impugnem a definição dos serviços mínimos com vista a evitar, numa futura greve em idênticas circunstâncias, a aplicação do previsto no nº 3 do art. 27º do DL 259/2009[1].
Portanto, o facto de a greve ter sido desconvocada não obsta ao conhecimento dos recursos.

          Passando então à apreciação da invocada nulidade, adiante-se desde já que entendemos que a mesma não se verifica, porquanto, ainda que sinteticamente, o tribunal arbitral fundamentou a decisão, tanto em termos fácticos, como em termos jurídicos, como decorre do seguinte excerto, que contém precisamente a fundamentação da decisão:
“Posto o que se tratou de considerar, o contexto legal e factual, no qual se desenvolveu o presente processo.
A) O Direito aplicável
O que foi feito, tendo começado o Tribunal por ponderar aquilo que considera os fundamentos legais do que vai decidir-se.
Desde logo que a decisão de serviços mínimos a prestar por trabalhadores em greve se destina a permitir a satisfação das necessidades sociais impreteríveis das pessoas atingidas por essa mesma greve (art. 537º 1. do CT). O que não acontece com todas as greves mas apenas aquelas que tenham lugar em organizações de trabalho que tenham que ver com a satisfação de tais necessidades. A título exemplificativo, a lei [art. 537º h)- CT] indica os sectores em que tais empresas podem inserir-se, aí figurando os “transportes, incluindo aeroportos, relativos a passageiros, animais e géneros alimentares deterioráveis e a bens essenciais à economia nacional.”
Ora, é evidente que, com a definição de serviços mínimos, se não pretende eliminar, em qualquer dos sectores mencionados, a possibilidade de exercer o direito de greve que é definido na CRP como um direito fundamental dos trabalhadores (art. 57º da CRP).
Pretende-se, tão só, compatibilizá-lo com outros direitos fundamentais destinados a proteger, necessidades sociais impreteríveis, ou seja de satisfação inadiável, como será o caso do direito ao trabalho, do direito à saúde, do direito ao ensino, ao lado de muitos outros.
B) Os Factos
E foram, de igual modo, ponderados os factos e as circunstâncias que foram trazidos ao processo, com destaque para:
- a duração prolongada da greve (3 dias);
- a época do ano em que nos encontramos (Páscoa) e que implica grande crescimento da procura do transporte aéreo, cada vez mais com objectivos da reunião das famílias;
- o facto de a aglomeração de candidatos a passageiros, nos aeroportos, poder implicar com questões de segurança das pessoas e dos bens que transportam;
- o facto de ser necessário assegurar o regresso das aeronaves ao território nacional, em ordem a evitar que fiquem imobilizadas nos outros aeroportos sem as necessárias condições de assistência e segurança;
- o facto de, para os portugueses dos Açores e da Madeira, o transporte aéreo ser a única forma de quebrarem o isolamento em que são forçados a viver e, em ambos os casos, ser necessário assegurar o direito à deslocação no território nacional, consagrado no art. 44º da CRP;
- o facto de estarem já hoje deslocados em Angola, a trabalhar, centenas de milhar de portugueses e de na Guiné, existir uma comunidade de cooperantes, em relação aos quais, tanto os que estão em Angola como na Guiné, a diminuição das possibilidades de viajar para Portugal pode implicar problemas consideráveis, nos domínios da saúde e da segurança, designadamente os que resultam, no caso de segurança, do regime dos vistos;
- o facto de existirem igualmente no Brasil, França, Luxemburgo, Reino Unido e Suíça enormes comunidades de emigrantes que neste período de Páscoa, em que os voos estão cheios, terão dificuldades em arranjar alternativas de voo para se reunirem com os seus familiares.”
          Em conformidade com a opinião de autores como p. exº Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora[2], Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto[3] e vasto sector da jurisprudência, cremos que a nulidade prevista no art. 668º nº 1 al. b) do CPC apenas se verifica quando há omissão absoluta dos fundamentos, de facto ou de direito, que justificam a decisão, o que não ocorre no caso, como mostra a transcrição antecedente.
          Improcede pois a arguida nulidade.

          Debrucemo-nos então sobre a questão essencial, que é a de saber se os serviços mínimos, tal como foram definidos nos pontos 2 e 3 do dispositivo no acórdão arbitral recorrido, violam os princípios que, como disposto pelo nº 5 do art. 538º do CT, devem respeitar, quais sejam: os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.
          Com efeito, sendo o direito à greve um dos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, constitucionalmente previstos (art. 57º), não suscita (sobretudo após a revisão constitucional de 1997) quaisquer dúvidas que naqueles serviços que se destinem à satisfação de necessidade essenciais da comunidade tenham de ser estabelecidos limites[4] ao respectivo exercício. A própria Constituição, no nº 3 do art. 57º (introduzido pela revisão de 1997), o prevê, remetendo para a lei as condições de prestação, durante a greve, além dos serviços necessários à segurança e manutenção dos equipamentos e instalações, dos serviços mínimos indispensáveis para acorrer à satisfação de necessidade sociais impreteríveis, o que acentua o carácter não absoluto do direito de greve. Na medida em que o direito de greve pode colidir com outros direitos com igual dignidade constitucional, a tutela destes impõe que aquele sofra restrições que, todavia, terão de ser as mínimas para permitir a concordância prática dos direitos em colisão e por conseguinte, que não implique a aniquilação de um dos direitos em detrimento do outro. Por isso o nº 5 do art. 538º estabelece que a definição dos serviços mínimos deve respeitar os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.
          O sector dos transportes, mormente do transporte aéreo, que a greve dos autos visava, é um dos exemplificativamente enunciados no nº 2 do art. 537º [al. h)] como indiscutivelmente destinado à satisfação de necessidades sociais vitais. O tipo de serviços que prestam são essenciais à comunidade. Quando impreteríveis, os direitos e interesses fundamentais dos cidadãos utentes desses serviços determinam a imposição de limites ao exercício do direito de greve, ou seja a realização de serviços mínimos. Trata-se todavia de conceitos indeterminados, de difícil concretização, que só pode ser feita casuisticamente. A determinação do quantum dos serviços mínimos adequado a assegurar o justo equilíbrio, a harmonização prática, entre os direitos de idêntica tutela constitucional, conflituantes entre si pressupõe a delimitação, no caso concreto, da necessidade social como “impreterível”.
          Nas palavras da profª. Palma Ramalho[5] “devem entender-se como necessidades sociais impreteríveis apenas aquelas necessidades que sejam urgentes, ou seja, as necessidades cujo cumprimento seja inadiável ou irrepetível sem prejudicar ou pôr em risco os interesses por elas tutelados”.
          Expende Joana Costa Henriques na sua dissertação de mestrado[6]: “Falar em serviço ou actividade destinada a satisfazer necessidades sociais impreteríveis é precisamente o mesmo que falar em serviços essenciais, que assegurem prestações vitais e indispensáveis para a vida em comunidade e para a realização de direitos básicos dos seus membros, e cuja eventual interrupção determinaria, de imediato ou a muito curto prazo, que os referidos direitos ficassem irremediavelmente prejudicados.
          O critério distintivo assenta, por um lado, no tipo de interesses, bens, utilidades que a actividade em causa proporciona à comunidade e, por outro lado, no carácter inadiável da necessidade cuja satisfação é assegurada ou proporcionada. 
(…) o que caracteriza  estas necessidades é o facto de (muito embora na sua maioria corresponderem a interesses individuais) carecerem ‘de meios comuns ou socializados’ para a sua satisfação (que só a comunidade, no seu conjunto organizado pode proporcionar), a que acresce o facto de serem necessidades que pela sua natureza não podem ficar privadas de satisfação por um intervalo de tempo, carecendo de uma continuidade nos fornecimentos, abastecimentos ou funcionamento dos serviços, sob pena de irremediável prejuízo.
          Note-se que não é tanto pelas características da actividade em si mesma, mas antes pela natureza do resultado gerado ou proporcionado com essa actividade que saberemos identificar um serviço como essencial ou destinado a satisfazer necessidades impreteríveis para a comunidade
 (…) tem sido considerado pela doutrina e jurisprudência que os serviços essenciais são, no fundo, aqueles que, pela natureza das prestações que proporcionam, asseguram a satisfação e realização de direitos fundamentais da pessoa (tais como a vida, a segurança, a saúde, direitos relacionados com as mínimas condições de existência e de bem estar dos cidadãos), das liberdades públicas e dos bens constitucionalmente protegidos.”
            Tratando-se no caso de uma greve no sector do transporte aéreo afecta desde logo o direito de deslocação, seja no território nacional, - que ganha particular acuidade na circulação entre o continente e as ilhas e entre ilhas, devido justamente à especificidade resultante da insularidade –, seja para o exterior e o direito de regressar (previsto no art. 44º da Constituição), podendo reflexamente afectar igualmente outros direitos e liberdades constitucionalmente garantidos, como sejam os direitos à saúde, ao trabalho, ao ensino, etc..
          Não pode, porém, ser exigível que a greve não afecte esses outros direitos, se não perderia qualquer eficácia, mas apenas que assegure a satisfação das necessidades sociais impreteríveis, abaixo das quais os cidadãos seriam irremediavelmente lesados nos seus direitos fundamentais. Todavia, também há que evitar que a imposição de serviços mínimos redunde num sacrifício desproporcionado do direito de greve, que praticamente o aniquile.
          Ora, salvo o devido respeito, seria esse precisamente o resultado da forma como foram definidos pelo Tribunal Arbitral os serviços mínimos no ponto 2.1 do dispositivo do acórdão recorrido – “Operação a realizar nos dias de greve para a TAP e PGA – voos de e para a Região Autónoma dos Açores e para a Região Autónoma da Madeira”.
          Apesar da especificidade da insularidade, que só por si torna mais difícil e onerosa a liberdade de circulação no próprio território nacional, impondo-se que em caso de greve nos transportes aéreos as populações das ilhas não fiquem absolutamente isoladas, isso não justifica que se definam como serviços mínimos todos os voos programados de e para as Regiões Autónomas. Tampouco o justificam o facto de a greve em causa ter a duração de três dias e de ter lugar na semana anterior à Páscoa, que implica sempre aumento de passageiros. Sem dúvida que as necessidades de deslocação entre o Continente e as Ilhas são, em alguma medida, impreteríveis, mas não na sua totalidade, pois isso equivaleria à negação aos trabalhadores das empresas transportadoras aéreas do direito de greve.
          Ao definir os serviços mínimos nos termos constantes do citado ponto 2.1.[7] não se respeitaram minimamente os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade, como exige a lei, pelo que nesta parte se reconhece razão aos recorrentes, devendo, pois, o acórdão arbitral ser revogado.
          No que se refere ao ponto 2.2  - Restante Operação – no qual se estabeleceram os voos internacionais a realizar para os principais destinos da nossa comunidade emigrante, não vemos razões para concluir que os voos aí definidos excedam os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade, pelo que, nesta parte se mantém a decisão recorrida.
          Relativamente ao ponto 3 - Operação a realizar nos dias de greve pela SATA”  - tem este tribunal, por virtude das suas funções, conhecimento oficioso que a questão foi objecto do acórdão arbitral nº 2/2013 do Conselho Regional de Concertação Estratégica da Região Autónoma dos Açores, também de 15/3/2013, do qual foi interposto recurso de apelação pelas empresas SATA AIR AÇORES, Sociedade Açoriana de Transportes Aéreos, S.A., SATA INTERNACIONAL – Serviços e Transportes Aéreos, S.A. e SATA - Gestão de Aeroportos, S.A., em que foram recorridos, entre outros, os sindicatos ora recorrentes, recurso que foi decidido sumariamente pela relatora no passado dia 5/6/2013 no âmbito do processo 491/13.0YRLSB, conforme cópia que, nos termos do art. 514º nº 2 do CPC, se ordena seja junta.
          A SATA Internacional apresentara nestes autos a sua posição a fls. 219 e segs., não tendo contra-alegado os presentes recursos.
          No que à SATA Internacional diz respeito, porque entre os presentes autos e o referido processo 491/13-0YRLSB existe identidade de sujeitos (os ora recorrentes, por um lado e a SATA Internacional, pelo outro), de pedido e causa de pedir (a fixação dos serviços mínimos relativamente à greve decretada pelos SNPVAC e SPAC para os passados dias 21 a 23/3/2013), é manifesto que existe litispendência (art. 498º do CPC).
          Atenta a especificidade do processo de arbitragem sobre serviços mínimos, no qual não existe propriamente petição nem citação, entendemos que o processo se inicia com a comunicação a que se refere o nº 1 do art. 25º do DL 259/2009, de 25/9. No caso, verifica-se que essa comunicação foi efectuada no dia 8/3/2013 (cfr. fls. 1), ao passo que no processo nº 491/13.0YRLSB foi efectuada no dia 7/3/2013[8] (cfr. fls 1 do dito processo, da qual determinamos seja igualmente junta cópia a estes autos, tal como de fls. 2 e 3).
          Assim, verificando-se a excepção dilatória de litispendência, uma vez que os presentes autos foram iniciados em segundo lugar - não obstante o Tribunal Arbitral não se ter abstido de fixar os serviços mínimos relativamente à SATA Internacional, por a questão não ter sido suscitada e não possuir oficiosamente o conhecimento que ora possuímos - há que revogar, com esse fundamento, essa parte da decisão arbitral (ponto 3), prevalecendo no âmbito da Sata Internacional os serviços mínimos fixados no processo arbitral 2/2013 do CRCE da RAA (processo 491/13.0YRLSB deste tribunal).

          Decisão
          Pelo exposto se acorda em julgar parcialmente procedente o recurso, alterando o acórdão arbitral no sentido de revogar os pontos 2.1 e 3, confirmando-o no demais.
          Atenta a isenção de custas dos sindicatos (art. 4º nº 1 al. f) do RCP) as custas serão suportadas pela TAP, na proporção de 1/3.
          Lisboa, 19 de Junho de 2013

          Maria João Romba

          Filomena de Carvalho

          Duro Mateus Cardoso



[1] Após três decisões no mesmo sentido em casos em que as partes sejam as mesmas e cujos elementos relevantes para a decisão sobre os serviços mínimos a prestar e os meios necessários para os assegurar sejam idênticos, caso a última decisão tenha sido proferida  há menos de três anos, o tribunal pode, em iguais circunstâncias, decidir de imediato nesse sentido, após a audição das partes e dispensando outras diligências instrutórias.
[2] Manual de processo Civil, Coimbra Editora, 2ª ed., pag. 687/688
[3] CPC Anotado, Coimbra Editora, 2ª ed. pag. 703
[4] Que, por força do disposto no art. 18º nº 2, se sujeita à regra do mínimo, devendo pois restringir-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
[5] Tratado de Direito do Trabalho, Parte III – situações laborais Colectivas, Almedina, 2012, pag.487/488.
[6] “A fixação dos serviços mínimos: as arbitragens no âmbito do CES sobre o sector de transportes”, in Estudos de Direito do Trabalho, Coimbra editora, 2011, pag. 259 e segs.
[7] Aceitando integralmente a proposta da TAP constante de fls. 209/210, sem que se compreenda porque motivo foi reformulada relativamente à constante de fls. 41/42, na qual a TAP propusera a realização de 3 voos Lisboa-Funchal-Lisboa e um voo para cada uma das ilhas dos Açores.
[8]  Verifica-se ainda que na reunião de negociação realizada em 7/3/2013 foi alcançado acordo quanto “à realização de uma ligação aérea diária entre Funchal e Porto Santo, designadamente  nos dias 21 e 22 de Março p.f. os voos 16098 e 1699, e no dia 23 de Março, os voos 1690 e 1691” (cfr. fls. 2 e 3 do processo 491/13.0YRLSB.

Decisão Texto Integral: