Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | RUI DA PONTE GOMES | ||
Descritores: | CONTRATO DE MEDIAÇÃO COMISSÃO ÓNUS DA PROVA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/08/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I - O mediador só adquire direito à comissão quando a sua actividade tenha contribuído para a celebração do negócio, determinando a aproximação do comitente com terceiros, mesmo quando o contrato de mediação é celebrado em regime de exclusividade. II - A existência de um contrato de mediação em regime de exclusividade autoriza a presunção (de facto) de que a actividade da empresa mediadora contribuiu para a aproximação entre o comitente e terceiros, facilitando o negócio e revertendo o ónus de prova para os mediados. III - No regime de não exclusividade, essa prova tem de ser efectivamente efectuada pela mediadora. (AMPMR) | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I – Estado da Causa 1.1. – A sociedade B. propôs, no, a presente acção declarativa, sob a forma sumária, contra J pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de 10 890,00 €, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, devidos desde 4 de Maio de 2007, calculados à taxa legal de 10,58% até 30 de Junho de 2007, e de 11,07% desde 1 de Julho de 2007, até efectivo e integral pagamento, bem como a pagar-lhe a sanção pecuniária compulsória de 15,00 €, por cada dia de atraso, desde a data do trânsito em julgado da sentença. Invoca, para tanto, que celebrou com o R., J, no exercício da sua actividade comercial, um contrato, entendido como de mediação imobiliária, com a duração de 180 dias contados desde a data inicial e renovação automática por iguais períodos, tendo em vista encontrar um interessado para a compra do imóvel; nos termos de tal contrato comprometia-se a promover a venda do imóvel, recebendo a título de remuneração uma comissão de 5%, calculada sobre o preço efectivo de concretização do negócio; a 19 de Outubro de 2006, M dirigiu-se à sua loja, tendo-lhe sido mostrada a fracção acima identificada, ao que esta fez três propostas com vista à negociação do preço, tendo sido aceite a proposta no montante de 180 000,00 €; contudo, o contrato promessa não se realizou devido a M não ter logrado obter o empréstimo bancário a que se havia proposto, não obstante o R., J ter continuado a considerar aquela como eventual compradora; veio, então, apurar que o R. vendeu o imóvel a M, tendo simulado uma desistência do negócio, pelo que reclamou junto daquele o pagamento da respectiva comissão, o que não aconteceu. O R. contestou. Procedeu-se a julgamento e, depois, foi proferida a douta sentença de 2 de Junho de 2009 (fls.201/215) que julgou a acção totalmente improcedente e absolveu o demandado dos pedidos contra si deduzidos. 1.2. - È desta sentença de 2 de Junho de 2009 (fls.201/215) que apela sociedade B, Lda. ___ Concluindo: A factualidade provada constante na sentença impugnada obriga ao reconhecimento da existência de nexo causal entre a actividade de mediação da apelante e o contrato de compra e venda celebrado entre o R., J, e M, porquanto, sem a sua intervenção não teriam as partes se aproximado, conjugado vontades e celebrado o acordo contratual de compra e venda. II – Os Factos 2.1. – A 1ª instância deu como provados os factos constantes na douta sentença impugnada, a fls. 204/209, que aqui se dão por integralmente reproduzidos (art. 713º, nº6, do C. P. Civil). 2.2. – Aceitamos os factos fixados (art. 712º do C. P. Civil). III – O Direito Sobre a actividade de mediação imobiliária rege, na vertente situação, o Decreto-lei n.º211/2004, de 20-VII, que, no seu art. 1.º, n.º 1, estabelece: - “…O exercício das actividades de mediação imobiliária e de angariação imobiliária fica sujeito ao regime estabelecido no presente diploma. Por seu turno. O art. 2.º, n.º 1, estabelece o objecto dessa actividade: - “…A actividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização de negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posição em contratos cujo objecto seja um bem imóvel. Nos números 2 e 3 desse mesmo art. 2.º concretiza-se, por sua vez, em que se traduz tal actividade: - “…2 - A actividade de mediação imobiliária consubstancia-se no desenvolvimento de: a) Acções de prospecção e recolha de informação que vise encontrarem o bem imóvel pretendido pelo cliente; b) Acções de promoção dos bens imóveis sobre os quais o cliente pretenda realizar negócio jurídico, designadamente através da sua divulgação, publicitação ou da realização de leilões.3 - As empresas podem ainda prestar serviços de obtenção de documentação e de informação necessários à concretização dos negócios objecto do contrato de mediação imobiliária, que não estejam legalmente atribuídos, em exclusivo, a outras profissões…”. Trata-se pois de actividade tendente (nos casos de venda de imóveis como é aquele que aqui se discute) a encontrar comprador para determinado imóvel que se pretende vender, devendo a mediadora realizar diligências de difusão variada – que se podem consubstanciar, designadamente, na publicação de anúncios em jornais e revistas (próprias ou alheias), aposição de placas nos prédios em venda, estabelecimento de contactos com clientes em carteira ou que surjam com perfil para o negócio pretendido, anúncios em páginas da Internet – de forma a que possa surgir um ou mais potenciais compradores. Certo é que esta actividade tem particularidades várias, entre as quais se destaca o facto da respectiva remuneração só ser devida, salvo situações expressamente previstas, após a concretização do negócio. Com efeito, reza assim o n.º 1 do art. 18.º do apontado DL 211/2004: “…1 - A remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação…”. O n.º 2 do preceito consagra as duas situações em que esse princípio pode ser afastado: - “…2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior: a) Os casos em que o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação celebrado, em regime de exclusividade, com o proprietário do bem imóvel, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, tendo esta direito a remuneração; b) Os casos em que tenha sido celebrado contrato-promessa relativo ao negócio visado pelo contrato de mediação, nos quais as partes podem prever o pagamento da remuneração após a sua celebração...”. O Legislador vai mesmo mais longe ao não permitir___ nos casos em que o contrato de mediação é celebrado com o vendedor___ “…às empresas de mediação receber quaisquer quantias a título de remuneração ou de adiantamento por conta da mesma, previamente ao momento em que esta é devida nos termos dos n.os 1 e 2…” (n.º 3 do preceito). Toda esta regulamentação da remuneração da mediadora tem sentido e visa até a própria salvaguarda da actividade em causa, pois que só assim os seus potenciais clientes estarão com o à vontade necessário para recorrerem aos seus serviços. Seria de facto impensável que uma mediadora que conseguisse, por hipótese, reunir 10 ou 20 pretensos interessados na aquisição dum determinado imóvel, viesse a cobrar ao seu cliente (o vendedor) a percentagem estabelecida pelos serviços realizados (de angariação), sem que qualquer dessas 10 ou 20 pessoas concretizasse o negócio, comprando o imóvel em causa – seria ruinoso para o vendedor e a curto prazo sê-lo-ia também para as empresas de mediação que, assim, veriam por certo as suas carteiras de clientes drasticamente reduzidas. Doutra banda. Tem constituído jurisprudência constante do Supremo Tribunal de Justiça, nas anteriores legislações do contrato de mediação, e pensamos que aplicável à actual, que o mediador só adquire direito à comissão quando a sua actividade tenha contribuído para a celebração do negócio, determinando a aproximação do comitente com terceiros (Vide, entre outros, os Acórdãos de 31 de Maio de 2001, processo 1229/01 de 11 de Março de 1999, processo n°154/99, de 31 de Março de 1998, processo n°245/98, de 5 de Junho de 1996, processo n°88410 e de 3 de Novembro de 1993, processo n°83579). Esta jurisprudência é aplicável mesmo quando o contrato de mediação é celebrado em regime de exclusividade. Com efeito, já o Decreto-Lei 285/92, de 19 de Dezembro nenhuma referência tinha a este regime, e o Decreto-Lei 77/99, de 16 de Março, só a ele se refere para conferir à empresa mediadora direito à remuneração quando o contrato se não concretize por causa imputável ao cliente (art. 19°, n°2) e o direito exclusivo de promover o negócio objecto do contrato de mediação (art. 20°, nº 3). A existência de um contrato de mediação em regime de exclusividade autoriza a presunção (de facto) de que a actividade da empresa mediadora contribuiu para a aproximação entre o comitente e terceiros, facilitando o negócio. Ora___ Considerando que: - “…No dia 19 de Setembro de 2006…no exercício da sua actividade…a A. obrigou-se perante o R. a diligenciar no sentido de conseguir um comprador, pelo preço de 195 000,00 €, para o imóvel …” (Facto 2); “…Em Outubro de 2006, M entrou nas instalações da A. e comunicou-lhe estar interessada em adquirir uma casa com a tipologia, características e dentro do preço do imóvel…” noticiado nestes autos (Facto 20); “…A A. promoveu a visita de M à casa…” (Facto 21), tendo-se desenvolvido uma longa actividade burocrática no sentido da aquisição do imóvel (Factos 22, 23, 24, 25), nomeadamente a elaboração de propostas e celebração de contrato promessa; pouco tempo depois do e-mail enviado pelo R. J, a 19 de Dezembro de 2006, a dizer à apelante para devolver o cheque de reserva, M avisou aquele da desistência da compra da casa (Factos 9, 10, 11, e 12); e “…No dia 8 de Janeiro de 2007, M deslocou-se às instalações da A., e de forma muito nervosa, solicitou a entrega do cheque de reserva de imóvel, o qual lhe foi devolvido…” (Facto 13); contudo, pouco tempo depois, “…No dia 3 de Abril de 2007, deu entrada…um registo provisório para a aquisição do imóvel…a favor de M, por compra…” (Facto 14), que se veio a concretizar com a intervenção de outra mediadora (Facto 26). Resulta claramente que entre a actividade de mediação da apelante e o contrato de compra e venda celebrado entre o R., J, e M, sem a sua intervenção, estes não se teriam aproximado, conjugado vontades e celebrado o acordo contratual de compra e venda____ Inversamente, a mediadora que interveio na escritura de compra e venda nada contribuiu para a aproximação negocial das partes. Mas resulta mais. O culminar da compra e venda, que se consubstanciou na concretização do negócio, à exclusiva intervenção da apelante se deve. Portanto. Efectivação de diligências no sentido de conseguir um interessado___ por um lado___ e realização efectiva do negócio___ por outro lado___ somente à apelante se pode atribuir o mérito. Em verdade, quando a compra e venda foi celebrada, o trabalho de mediação já estava todo feito. Apesar de se indiciar fortemente uma actividade para não reconhecer isto, todos os pressupostos da mediação estavam cumpridos. E nem se pode invocar a não exclusividade na mediação (cláusula 4ª). Conforme é jurisprudência da nossa mais alta instância judicial, a existência de um contrato de mediação em regime de exclusividade autoriza a presunção (de facto) de que a actividade da empresa mediadora contribuiu para a aproximação entre o comitente e terceiros, facilitando o negócio e revertendo o ónus de prova para os mediados. Já no regime de não exclusividade, essa prova tem de ser efectivamente efectuada pela mediadora. E no presente caso foi-o. Atentos todos os circunstancialismos de facto, de Direito e de experiência comum, somos levados a aceitar a conclusão em apreciação. IV – Em Consequência – Decidimos: a) – Julgar procedente a apelação da sociedade B., revogar a douta sentença de 2 de Junho de 2009 (fls.201/ 215) e condenar J, no pagamento aquela da quantia de 10 890,00 €, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, devidos desde 4 de Maio de 2007, calculados à taxa legal de 10,58% até 30 de Junho de 2007, e de 11,07% desde 1 de Julho de 2007, até efectivo e integral pagamento, bem como a pagar-lhe a sanção pecuniária compulsória de 15,00 €, por cada dia de atraso, desde a data do trânsito em julgado da sentença. b) – Condenar, ainda, J nas custas do processo. Lisboa – 8 de Abril de 2010 Rui da PONTE GOMES – Juiz Relator LUIS Correia de MENDONÇA – 1º Juiz Adjunto CARLOS de Melo MARINHO – 2º Juiz Adjunto |