Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
12312/14.1T8LSB.L1-4
Relator: DURO MATEUS CARDOSO
Descritores: DESPEDIMENTO
EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
COMISSÃO DE SERVIÇO
CESSAÇÃO DA COMISSÃO DE SERVIÇO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/15/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: I- O regime vigente de trabalho em Comissão de Serviço, visa também garantir a segurança no emprego e é sempre suspensiva do vínculo anterior.
II- Acordando o trabalhador e o empregador um regime de trabalho em comissão de serviço (interna) o trabalhador não perde o direito a ocupar o anterior posto de trabalho (ou outro compatível com categoria para a qual tenha sido eventualmente promovido) logo que a comissão seja cessada, por sua vontade ou do empregador.
III- O anterior posto de trabalho fica “congelado” ou “adormecido”, à espera do regresso do trabalhador, até que a comissão de serviço cesse, e só não terá de o reocupar se, finda a comissão, o trabalhador optar por resolver o contrato.
IV- A extinção do posto de trabalho que estava a ser ocupado em regime de comissão de serviço não tem a virtualidade de fazer extinguir automaticamente o outro posto de trabalho originário que se encontrava “adormecido”, não podendo aquela única extinção levar ao despedimento do trabalhador porque pela assinatura do acordo de comissão de serviço aquele passou a ser titular, no âmbito da relação laboral estabelecida, de dois postos de trabalho, um em efectividade de execução e outro em estado de “dormência” à espera do seu regresso.
V- É ilícito o despedimento de um trabalhador com unicamente com fundamento na extinção do posto de trabalho ocupado em regime de comissão de serviço, na medida em que o trabalhador mantém o direito a vir ocupar o posto de trabalho originário.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório:


I-AA, intentou na Secção de Trabalho de Lisboa a presente acção declarativa, com processo especial, de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, CONTRA,
BB, S.A,

II-A empregadora/ré foi citada e realizou-se Audiência de Partes em que teve lugar infrutífera tentativa de conciliação.

III-A ré, requerendo declaração da licitude do despedimento, motivou o mesmo, dizendo, em síntese, que:
-Devido à fusão da empresa CC com a empresa DD, que deu origem à ré BB, houve necessidade de reestruturação interna dos serviços de que resultou a extinção do posto de trabalho da autora, que não pode ser recolocada;
-Cumpriu todas as formalidades legais.
-Opõe-se à reintegração da autora.

IV-A autora CONTESTOU E APRESENTOU RECONVENÇÃO, alegando, em síntese, que:
-A cessação do seu contrato de trabalho foi ilícita, por não se verificarem os pressupostos para a extinção do seu posto de trabalho;
-Apesar de deter a categoria de consultora sempre exerceu as funções de Directora de BI e IT/Governance em comissão de serviço;
-A comissão de serviço não havia sido declarada cessada aquando da extinção do posto de trabalho pelo que deveria ter regressado à categoria original que era a de consultora;
-Na Ré existem outros postos de trabalho correspondentes a consultor que são ocupados por pessoas recrutadas em regime de Outsourcing.
-A ré deve ser condenada a reintegrar a autora, a pagar todas as retribuições que deixou de auferir acrescidas de juros, a pagar créditos vencidos e a pagar uma indemnização por danos não patrimoniais.

RESPONDEU a ré, mantendo, no essencial, a posição tomada anteriormente.
Houve AMPLIAÇÃO PEDIDO por parte da autora quanto a devolução de 1400 acções referentes a prémio de desempenho a que a ré respondeu pugnando pela sua improcedência.

V-Foi proferido despacho saneador, dispensada a elaboração de base instrutória e de matéria assente, bem como da realização de audiência preliminar.
O processo seguiu os seus termos, tendo sido proferida sentença em que se julgou pela forma seguinte:

VI. Decisão:
Nestes termos, tendo presente as considerações tecidas e as normas legais citadas, decide-se:
a)Julgar procedente a oposição da autora/trabalhadora, declarando o despedimento ilícito, e, em consequência, decide-se:
1.-Condenar a ré/empregadora pagar à autora/trabalhadora as retribuições, férias, subsídios de férias e de Natal, contabilizadas desde a data do despedimento, até ao trânsito em julgado da presente sentença, tendo por referência a retribuição mensal de €6.168, 82 descontadas as importâncias que a autora/trabalhadora tenha obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, bem como as já pagas pela Ré, devendo ainda a ré/empregadora entregar à Segurança Social o subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador, se for esse o caso; a tais quantias acrescem os juros de mora vencidos, à taxa legal, desde a data de vencimento de cada uma das prestações;
2.-Condenar a ré/empregadora a reintegrar a autora/trabalhadora na sua estrutura organizativa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
3.-Julgar improcedente o pedido de indemnização por danos não patrimoniais, deles se absolvendo também a ré/empregadora;
Custas a cargo da autora/trabalhadora e da ré/empregadora, na proporção do decaimento, que se entende fixar em 4/5 para a ré e 1/5 para a autora.“

Desta sentença recorreu a ré (fols. 303 a 394), apresentando as seguintes conclusões:
(…)

Nestes termos:
a)Deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por outra que absolva a Recorrente dos pedidos formulados,
b)Subsidiariamente, mantendo-se a decisão recorrida na parte respeitante à declaração de ilicitude do despedimento, deve a Recorrente ser  condenada a pagar à Apelada (i) as retribuições intercalares, desde a data do seu despedimento até trânsito em julgado, por referência ao valor retributivo devido à Recorrida enquanto consultora, bem como (ii) indemnização em substituição da sua reintegração.

A autora contra-alegou e também recorreu subordinadamente (fols. 403 a 459) apresentando as seguintes conclusões:
(…)
Sendo a Sentença a quo substituída por outra que declare a procedência daquele pedido assim se fazendo a acostumada Justiça.

A ré contra-alegou (fols. 479 a 514), sustentando a improcedência do recurso da autora/trabalhadora.

Correram os Vistos legais, tendo a Digna Procuradora Geral-Adjunta do Ministério Público emitido Parecer (fols. 584 a 585 no sentido da improcedência de ambas as apelações).

VI-A matéria de facto considerada provada em 1ª instância (com correcção da numeração a partir do facto nº 96, por ausência do número 97), é a seguinte:
1-A TRABALHADORA tem a sua antiguidade na Ré reconhecida a 1 de Novembro de 1994 (cfr. doc. n.º 1).
2-À data do início do procedimento de extinção do posto de trabalho que ocupava e que determinou o seu despedimento, a TRABALHADORA detinha a categoria profissional de Consultora.
3-E exercia, em regime de comissão de serviço, funções de Directora de Serviços da área de Business Intelligence & Information-Tecnhologies (IT) Governance integrante da Direcção de Sistemas de Informação da EMPREGADORA.
4-A TRABALHADORA auferia retribuição base mensal no valor ilíquido de € 3.350 (três mil trezentos e cinquenta euros) (cfr. doc. n.º 2).
5-Acrescida do montante mensal ilíquido de € 112,40 (cento e doze euros e quarenta cêntimos), a título de diuturnidades.
6-E de € 575,00 a título de ‘complemento de responsabilidade’ pelo exercício de funções de natureza directiva.
7-Por cada dia de trabalho efectivamente prestado, a TRABALHADORA auferia um subsídio de alimentação no valor ilíquido de € 8,86 (oito euros e oitenta e seis cêntimos).
8-Em Junho de 2014, o montante referido no artigo 4.º foi elevado para € 3.379 (três mil trezentos e setenta e nove euros) (cfr. doc. n.º 3),
9-De modo a compensar a redução do valor ilíquido do subsídio diário de alimentação, que passou a € 6,83 (seis euros e oitenta e três cêntimos).
10-Por lapso de processamento dos serviços administrativos, o cálculo da compensação devida à TRABALHADORA pelo despedimento tomou por referência o valor da retribuição base antes da actualização referida no artigo 8.º.
11-E foi-lhe pago, a este título, o montante de € 62.323,20 [(€ 3.350 + € 112,40) x 18 anos].
12-Quando lhe eram devidos mais € 522, ou seja, o total de € 62.845,20 [(€ 3.379 + € 112,40) x 18 anos].
13-Tendo de imediato pago o valor diferencial à TRABALHADORA (cfr. doc. n.º 4).
14-Em 27 de Agosto de 2013, foi concluída a fusão por incorporação da CC, S.A. (adiante designada por “CC”) na DD, S.A., (adiante designada por “DD”) (cfr. doc. n.º 5).
15-Pela qual se operou a transferência global do património da CC para a DD e a atribuição aos accionistas da primeira de acções representativas do capital social da segunda (idem).
16-Após fusão, a denominação social da empresa foi alterada para BB, S.A. (adiante designada por “BB”) (idem).
17-As sociedades objecto da fusão, a par de se dedicarem à gestão, também detinham participações em sociedades e, consequentemente, em negócios que integram o mercado de telecomunicações e multimédia em Portugal e, no caso da DD, também em Angola e Moçambique (adiante designados por “Grupo DD” e “Grupo CC”).
18-A DD detinha a totalidade do capital social da EE, S.A. (adiante designada por “EE”), que exercia a actividade de operador de comunicações de rede fixa e de prestador de serviços de comunicações móveis, detendo e explorando rede de nova geração com cobertura extensiva do território nacional.
19-E a CC detinha a totalidade do capital social da EMPREGADORA, operadora à data denominada FF, S.A. (adiante designada por “FF), que explorava rede de comunicações móveis de última geração GSM/UMTS/LTE, com ampla cobertura do território nacional, bem como rede de nova geração de comunicações fixas, que inclui uma componente de transmissão e backbone e uma outra de acesso local em fibra.
20-No novo grupo económico BB (adiante designado por “Grupo BB”) passaram a desenvolver-se, de forma integrada, as actividades anteriormente desenvolvidas, de modo individual, no âmbito dos grupos económicos DD e CC.
21-Em 16 de Maio de 2014 se operasse a fusão por incorporação da EE na EMPREGADORA, mediante a transferência global do património da primeira para a segunda (cfr. doc. n.º 6).
22-A EMPREGADORA alterou a respectiva denominação social para BB, S.A. (idem).
23-A EMPREGADORA tem por objecto a implementação, operação, exploração e oferta de redes e prestação serviços de comunicações electrónicas e serviços conexos, bem como o fornecimento e comercialização de produtos e equipamentos de comunicações electrónicas, bem como a distribuição de serviços de programas televisivos e radiofónicos (idem).
24-Antes da fusão, a Direcção de Sistemas de Informação da EE era composta por seis áreas, entre as quais a Business Intelligence & IT Governance, chefiada pela TRABALHADORA, ocupante do posto de trabalho de Directora de Serviços (cfr. doc. n.º 7).
25-Esta área estava, por sua vez, dividida em três subáreas: (i) Gestão de Contratos; (ii) Business Intelligence Competence Center e (iii) Indicadores e Cumprimento de Processos (idem).
26-À TRABALHADORA, enquanto Directora de Serviços da área de Business Intelligence & IT Governance competia, no essencial, gerir a relação contratual mantida com os parceiros de outsourcing, bem como com os demais fornecedores de serviços relativamente à renegociação e renovação de contratos existentes, em colaboração com a Direcção de Compras (idem).
27-Supervisionar a negociação com os prestadores de serviços (“service providers”), facilitando e monitorizando os contratos tendo em conta as condições acordadas (“service level agreement”) e outros indicadores, de forma a garantir que os serviços prestados pelos parceiros eram conformes aos termos e condições contratados (idem).
28-E coordenar os recursos humanos afectos à área sob sua responsabilidade, definindo, em colaboração com os responsáveis de recursos humanos, as necessidades previsionais e operacionais no âmbito das áreas de motivação e coaching, avaliação de desempenho, recrutamento e carreiras (idem).
29-Após a referida fusão, a referida Direcção de Sistemas de Informação deu lugar à Direcção de IT/IS, a qual passa a estar organizada em três departamentos: (i) Demand e Arquitectura; (ii) Delivery Management e (iii) Suporte e Qualidade (cfr. doc. n.º 8).
30-O departamento de Demand e Arquitectura, por sua vez, encontra-se dividido em quatro áreas: (i) Architecture & Solutions Management; (ii) Business Partnership Management, (iii) IT Governance & Transformation e (iv) Business Intelligence (idem).
31-A área de IT Governance & Transformation está subdividida nos seguintes segmentos: (i) Indicadores, Compliance e Gestão de Fornecedores; (ii) Program Management Officer, Processos e Transformação e (iii) Planeamento e Controlo de Gestão (idem).
32-No âmbito da nova estrutura organizativa da EMPREGADORA, as áreas de Business Intelligence e de IT Governance passam a ser autónomas, assumindo, cada uma delas, maior relevância para o negócio, complexidade e conteúdo funcional (idem).
33-Em virtude das fusões referidas nos artigos 15.º e 22.º, as redes e sistemas de informação de suporte aos clientes fixos, convergentes e móveis passam a ser alvo de gestão e planeamento integrados.
34-A integração deu-se em todos os aspectos relativos ao negócio que podem ser objecto de decisão ou oferta conjunta, designadamente negociação agregada de contratos e compras e harmonização das soluções, sistemas e programas instalados.          
35-A área de IT Governance & Transformation, integrada no departamento de Demand e Arquitectura, a par das funções de negociação com os service providers, assume ainda as responsabilidades de gestão orçamental.
36-Gestão e negociação com os fornecedores de software.
37-Controlo do licenciamento aplicacional em uso.
38-Programação de transformação, integração e uniformização dos sistemas de informação utilizados em ambos os negócios.
39-E, renegociação e harmonização das condições contratuais estabelecidas para os Sistemas de Informação de suporte aos clientes fixos e convergentes, por um lado, e aos clientes móveis, por outro, com os service providers e fornecedores de software.
40-Por seu turno, a integração dos negócios fixo e móvel determina a existência de área autónoma de Business Intelligence, incorporada igualmente no departamento de Demand e Arquitectura, em face do aumento do volume de trabalho associado.
41-Foi decidido, pela Ré, proceder à extinção do posto de Directora de Serviços da área de Business Intelligence & Information Technologies (IT) Governance, integrante da anterior Direcção de Sistemas de Informação da sociedade incorporada.
42-E à criação dos postos de trabalho de Responsável de IT Governance & Transformation e de Responsável de Business Intelligence no âmbito da nova Direcção de IT/IS.
43-Na organização da EMPREGADORA deixou de existir um posto de trabalho vago compatível com a categoria profissional de Consultor detida pela TRABALHADORA.
44-E à data do despedimento deixou de existir um outro posto de trabalho disponível para o exercício de direcção de Business Intelligence & IT Governance.
45-Bem como qualquer outro posto de trabalho disponível para o exercício de funções correspondentes à categoria profissional de Consultor que, cessada aquela comissão de serviço, a TRABALHADORA pudesse ocupar.
46-Aquando do procedimento de extinção do posto de trabalho ocupado pela TRABALHADORA, não existiam – nem actualmente existem – trabalhadores contratados a termo para o exercício de tarefas correspondentes às daquele mesmo posto.
47-A EMPREGADORA não instaurou, simultânea ou sucessivamente no período de três meses antecedentes à data do despedimento da TRABALHADORA, processos que operem, pelo menos, a cessação de cinco contratos de trabalho.
48-Na Direcção de Sistemas de Informação oriunda da EE existia apenas um posto de trabalho de Directora de Serviços da área de Business Intelligence & Information Technologies (IT) Governance, o qual era ocupado pela TRABALHADORA.
49-Na actual estrutura orgânica da Ré não existe outro posto de trabalho para o exercício de funções idênticas às desempenhadas pela TRABALHADORA.
50-As estruturas organizativas – e respectivos postos de trabalho – de Sistemas de Informação oriundos da EE e da FF foram alvo de extinção.
51-E deram lugar à actual Direcção de IT/IS da EMPREGADORA.
52-No âmbito da nova estrutura organizativa da EMPREGADORA, designadamente na referida Direcção de IT/IS, não foi criado nenhum posto de Director de Serviços da área de Business Intelligence & Information Technologies (IT) Governance que a TRABALHADORA pudesse ocupar.
53-E não existe na, nova Direcção, pluralidade de postos de conteúdo funcional idêntico àquele.
54-No âmbito desta Direcção, foram criados, entre outros, dois postos de trabalho: o de Responsável de IT Governance & Transformation e o de Responsável de Business Intelligence, integrados no departamento de Demand e Arquitectura.      
55-Estes dois postos de trabalho abrangem quer o negócio fixo, quer ao negócio móvel.
56-A TRABALHADORA é licenciada em matemática aplicada às ciências da computação, representava maior custo para a EMPREGADORA e possuía menor experiência na função, no noutro caso, quando comparada com os trabalhadores ocupantes dos novos postos de trabalho de Responsável de IT Governance & Transformation e de Responsável de Business Intelligence, respectivamente.
57-Não foi ponderado o critério avaliativo, por as avaliações de desempenho efectuadas à TRABALHADORA e àqueles trabalhadores terem sido realizadas por sociedades distintas, com parâmetros e níveis avaliativos de exigência diversos.
58-O novo posto de responsável de IT Governance & Transformation é ocupado por GG, que transitou do de responsável de Arquitectura e Planeamento, integrante da estrutura organizativa de Sistema de Informações da EMPREGADORA, então FF.
59-Este posto de trabalho implica a supervisão da gestão do programa de integração dos sistemas de informação da EE e da FF e carece de ser ocupado por trabalhador com formação e habilitações académicas especializadas.
60-GG possui licenciatura e a parte curricular do mestrado em Engenharia Electrotécnica e Computadores no Instituto Superior Técnico.
61-O posto de trabalho de responsável de Business Intelligence é ocupado por HH, que transitou do de Responsável de Equipa DW, integrante da anterior estrutura organizativa de Sistema de Informações da EMPREGADORA, então FF.
62-A TRABALHADORA e HH possuem ambos licenciatura universitária.
63-Este último representava para a EMPREGADORA menor custo e detinha mais de quinze anos de experiência e aptidão profissionais em Business Intelligence,            
64-Em 9 de Setembro de 2014, a TRABALHADORA foi notificada pessoalmente da intenção da EMPREGADORA extinguir o seu posto de trabalho (cfr. processo de extinção do posto de trabalho, que se junta como doc. n.º 9).
65-À referida notificação foi junto anexo, contendo explicitação dos motivos justificativos da necessidade de extinguir o posto de trabalho, com indicação da secção a que respeitava e da necessidade de despedir a TRABALHADORA, enquanto funcionária afecta ao posto de trabalho a extinguir e sua categoria profissional, a saber: “ (…) será objecto de cessação o contrato de trabalho firmado com a trabalhadora AA (…) com a categoria profissional de consultor.” “ (…) a extinção do posto de trabalho de Directora de Serviços da área de Business Intelligence & IT Governer, funda-se na reestruturação da organização produtiva da empresa, o que configura motivo estrutural para aquela extinção (…).”
66-Mais se fundamentando a inaplicabilidade de observar critérios de selecção na concretização do posto de trabalho então a extinguir dado “ (…) não existir naquela Direcção, pluralidade de postos de conteúdo funcional idêntico àquele.” Sic. Vide fls. 71 verso do p.d.
67-A TRABALHADORA apresentou resposta à referida comunicação inicial através do documento nº 23, datado de 19 de Setembro de 2014, que foi junto com a contestação e cujo teor se dá nesta sede por integralmente reproduzido.
68-Em 2 de Outubro de 2014, a TRABALHADORA foi notificada da decisão de extinção do posto de trabalho por si ocupado e consequente despedimento, com efeitos em 18 de Dezembro de 2014 (idem).
69-À referida decisão foi junto anexo, que continha descrição dos motivos da extinção do posto de trabalho, bem como confirmação da verificação dos requisitos legais da mesma e prova da inaplicabilidade, no caso concreto, dos critérios de determinação do posto de trabalho a extinguir (idem).
70-Na referida comunicação, a EMPREGADORA confirmou ainda que os motivos invocados para a extinção do posto de trabalho não eram devidos a conduta culposa da mesma ou da TRABALHADORA (idem), por inexistir na estrutura da EMPREGADORA, posto disponível e compatível com a categoria de Consultor detida pela TRABALHADORA (idem),
71-Não existiam, naquela mesma estrutura, contratos de trabalho a termo para tarefas correspondentes às do posto de trabalho a extinguir (idem),
72-À TRABALHADORA foi ainda comunicado o montante, forma, momento e lugar do pagamento da compensação e dos créditos vencidos e exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho que mantinha com a EMPREGADORA (idem).
73-No mesmo dia, em 2 de Outubro de 2014, foi remetida à Autoridade para as Condições do Trabalho cópia da comunicação de extinção do posto de trabalho ocupado pela TRABALHADORA e seu anexo (idem).
74-Em data anterior à cessação do seu contrato de trabalho, a EMPREGADORA pagou à TRABALHADORA compensação pecuniária no valor de € 62.323,20, bem como todos os créditos laborais vencidos e exigíveis em virtude daquela cessação (cfr. doc. n.º 10).
75-Em 30 de Outubro de 2014, a TRABALHADORA colocou à disposição da EMPREGADORA a totalidade daquele valor compensatório (cfr. doc. n.º 11).    76- A TRABALHADORA ocupava cargo de direcção na EMPREGADORA, sendo, à data do início do procedimento de extinção do posto de trabalho que ocupava, a responsável máxima da área de Business Intelligence & Information Technologies (IT) Governance.
77-O exercício daquele cargo pressupõe confiança e entendimento absolutos na pessoa que o ocupa.
78-Na qualidade de Directora de Serviços da área de Business Intelligence & Information Technologies (IT) Governance, a TRABALHADORA podia celebrar contratos em representação da EMPREGADORA.
79-Mantinha relações próximas com clientes e fornecedores.
80-Tomava conhecimento de informação respeitante à actividade da Direcção de Sistemas de Informação da EMPREGADORA e seus resultados, nomeadamente, formação de preços e orientações comerciais.
81-Competia-lhe a tomada de decisões estratégicas na condução do negócio, designadamente, na área de Business Intelligence & Information Technologies (IT) Governance.
82-Conhecia a política de recursos humanos da EMPREGADORA e exercia poderes de autoridade sobre outros trabalhadores.
83-A Autora exercia as funções de Directora de Serviços da área de Business Intelligence & Information Technologies em regime de Comissão de Serviço.
84-A Autora exercia essas funções, em regime de comissão de serviço, nos termos do Acordo para o Exercício de Funções em Regime de Comissão de Serviço, celebrado em 01.01.2008, à data celebrado com a II, SA, cfr. Doc. nº1 junto com a contestação da trabalhadora.
85-A Ré manteve a trabalhadora, nessa situação, até à data da cessação do contrato de trabalho.
86-A A exercia essas funções em regime de Isenção de Horário de Trabalho, pago 14 x por ano, nos termos do Acordo para o Exercício de Funções em Regime de Comissão de Serviço que constitui o Documento nº1 junto com a contestação,
87-Consta da alínea b) da cláusula 2ª do Acordo para o Exercício de Funções em Regime de Comissão de Serviço que constitui o Documento nº1 junto com a contestação, que a Autoria iria auferir um complemento de responsabilidade no valor de 575,00€/ mensais, valor esse que seria pago 14 x por ano;
88-O IHT incidia sobre 21% do vencimento base acrescido de diuturnidades e do Complemento de Responsabilidade, conforme consta da cláusula 2ª, al. a) do Acordo que constitui o doc. nº 1 junto com a contestação da trabalhadora.
89-Resulta do nº 3 da cláusula 2ª do Acordo para o Exercício de Funções em Regime de Comissão de Serviço que constitui o Documento nº1 junto com a contestação, a seguinte redacção: “3. As compensações e meios constantes das alíneas do número um, vigoram exclusivamente enquanto o Segundo Contraente desempenhar as funções em regime de comissão de serviço, cessando automaticamente, na data do termo desta.”
90-Resulta da alínea c) do nº1 da 2ª Cl. do Acordo para o Exercício de Funções em Regime de Comissão de Serviço, que constitui o Documento nº1 junto com a contestação, a seguinte redacção: “1. No exercício das funções exercidas em comissão de serviço, referidas na cláusula antecedente, a segunda contraente receberá (…): c) Viatura de Utilização Permanente; d) Plafond de combustível de 1.750,00€ / ano, utilizando actualmente, o cartão Galp Frota como meio de pagamento; e) Telemóvel com plafond anual em chamadas de 700,00€.”
91-À data da extinção do posto de trabalho a A utilizava uma viatura com a matrícula (…), que lhe fora atribuída em 11.05.2012, conforme resulta dos documentos nºs 3,4 e 5 juntos com a contestação da trabalhadora;
92-À data da extinção do posto de trabalho a Ré disponibilizava gratuitamente, à A, a utilização de serviço TV/HD, internet (Netwideband 120mb), telefone fixo, nos termos do Pacote IRIS 120 mb e Canais Sport Tv, com um valor mensal de 99, 84 €, vide doc. nº 7;
93-À data da extinção do posto de trabalho, a Ré pagava à Autora um seguro de saúde Multicare, Plano Active, conforme doc. nº 8 que se dá por integralmente reproduzido, para os devidos efeitos;
94-Anualmente, a Ré entregava à Autora um conjunto de 600 acções suas, no âmbito do Plano de Atribuição de Acções da Ré, vide docs. Nº 6 e 9;
95-À Autora era pago, anualmente, um Prémio de Desempenho no valor de 6.500,00€, vide doc. nº10, que se dá por reproduzido nesta sede;

96-Em 09.10.2014, a Ré comunicou à Autora por email que constitui o documento nº 10 verso (fls. 118), que, até 18 de dezembro, o final do contrato, e que lhe deveria entregar:
- computador portátil;
- telemóvel- cartão 93;
- cartão Kanguru;
- cartão de colaborador;
- cartão Portugália,
- Viatura, via verde, Cartão Galp Frota;

97-Nesse mesmo email, foi a A informada acerca do cancelamento do Seguro de Saúde, número de telefone corporativo e patronos.
98-Na área de ITS existem outros trabalhadores com a categoria profissional de consultores, vide doc. nº 17 junto com a contestação.
99-A Ré mantém contratos de outsourcing que empresas que fornecem recursos à área de IT/IS, que desempenham as funções de consultores, vide doc. 18 junto com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.
100-Como consequência do despedimento, a Autora sentiu tristeza ansiedade e um sentimento de isolamento no local de trabalho.
101-A Ré deixou de convidar a Autora para participar em eventos profissionais ao longo do ano de 2014.

VII-Nos termos dos arts. 635º-4, 637º-2, 639º-1-2, 608º-2 e 663º-2, todos do CPC/2013, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação; os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes, salvo se importar conhecê-las oficiosamente.

Tratando-se de recurso a interpor para a Relação, como este pode ter por fundamento só razões de facto ou só razões de direito, ou simultaneamente razões de facto e de direito, assim as conclusões incidirão apenas sobre a matéria de facto ou de direito ou sobre ambas (v. Fernando Amâncio Ferreira, "Manual dos Recursos em Processo Civil", 3ª ed., pag. 148).

Atento o teor das conclusões das alegações apresentada pela apelante, as questões que fundamentalmente se colocam nos presentes recursos são as seguintes:

Na Apelação da ré de fols. 303 a 394:
A 1ª, se a matéria de facto dada como provada pode ser alterada nos termos pretendidos pela ré.
A 2ª, se o despedimento não foi ilícito por terem sido respeitados os pressupostos do art. 368º do CT e se mostrarem verificados os fundamentos invocados.
A 3ª, se sendo o despedimento ilícito, a comissão de serviço existente cessou com a declaração de despedimento por extinção do posto de trabalho e não deve ser considerada a retribuição mensal auferida enquanto em comissão de serviço.
A 4ª, se a oposição à reintegração da autora pode proceder.

Na Apelação da autora de fols. 403 a 459:
A 1ª, se a matéria de facto dada como provada pode ser alterada nos termos pretendidos pela autora.
A 2ª, se o valor mensal da autora a ser considerado para cálculo das retribuições intercalares deve ser no montante de € 6.429,40.   
A 3ª, se deveria ter sido arbitrada à autora uma indemnização por danos não patrimoniais.
*

VIII-Decidindo.

Quanto às 1ªs questões das apelações da ré e da autora.
(…)
Na Apelação da ré de fols. de fols. 303 a 394:
Quanto à 1ª questão
(…)
Agora na Apelação da autora de fols. de fols. 403 a 459:
Quanto à 1ª questão.
(…)

***
Novamente na Apelação da ré de fols. 303 a 394:

Quanto à 2ª questão.
Entende a ré ter o despedimento sido lícito por terem sido respeitados os pressupostos do art. 368º do CT e se mostrarem verificados os fundamentos invocados.
Atentemos primeiro relativamente à possibilidade de aplicação do regime do despedimento por extinção do posto de trabalho quando o trabalhador se encontra em regime de comissão de serviço.
A sentença recorrida foi no sentido da impossibilidade da cessação do vínculo laboral decorrente da extinção do posto de trabalho. E decidiu muito bem, adianta-se desde já.

Vejamos porquê.

O Trabalho em Regime de Comissão de Serviço, actualmente previsto nos arts. 161º a 164º do CT/2009 começou por estar regulado no Dec.-Lei nº 404/91 de 16/10, o qual veio dar resposta a necessidades prementes da vida moderna das empresas (veja-se o preâmbulo do Dec.-Lei nº 404/91 de 16/10 e Bernardo da Gama Lobo Xavier, Curso de Direito do Trabalho, ed. 1992, pag. 344 e s.), bem como a dar suporte jurídico a situações de facto já abundantemente existentes (v. art. 7º do D.L. nº 404/91 de 16/10).

Como é uniformemente reconhecido, a figura da comissão de serviço teve a sua origem na função pública, embora já anteriormente tivesse expressão na regulamentação colectiva e na prática de certas empresas (v. António Monteiro Fernandes, "Direito do Trabalho", 10ª ed., pags. 202 e 203 e Bernardo da Gama Lobo Xavier, Curso de Direito do Trabalho, ed. 1992, pag. 345).

O Prof. Menezes Cordeiro, em Parecer publicado na RDES, Janeiro-Junho 1991, pags. 129 a 148 dá-nos conta da evolução histórica em função da sua origem administrativa, referindo a Lei de 14/6/1913 (art. 27º), o Decreto nº 26.341 de 7 de Fevereiro de 1936 (art. 2º), o DL nº 729/74 de 20/12 (art. 1º-2- Administradores por parte do Estado designados para o exercício de funções de gestão ou fiscalização em quaisquer empresas do sector público ou privado), o DL nº 146/75 de 21/3 (art. 1º-1), o DL nº 267/77 de 2/7, e o DL nº 191-F/79 de 26/6 (art. 4º). São também de considerar o DL nº 260/76 de 8/4 (art. 32º), o DL nº 427/89 de 27/12 (arts. 7º e 24º), a Lei nº 49/99 de 22/6 (arts. 5º a 7º) e o DL nº 558/99 de 17/12 (art. 17º- sector empresarial do Estado).

Já o Prof. Menezes Cordeiro, no citado Parecer, a pag. 147, referia que o DL nº 404/91 de 16/10 não é totalmente inovador, visando no essencial delimitar a tutela da categoria, ao mesmo tempo que garante a segurança no emprego.

Também Jorge Leite, "Comissão de Serviço", Questões Laborais, Ano VII, 2000, nº 16, a pag. 154 (nota 3), já referia que a comissão de serviço é sempre suspensiva do vínculo anterior.

Ou seja, o trabalhador, como é o caso da autora nestes autos (factos provados nºs 1, 2, 3, 84 e 85), que estando já a trabalhar na empresa, noutras funções e noutro posto de trabalho, acorda com a empregadora o desempenho de outras funções em regime de comissão de serviço (comissão de serviço interna), não perde o direito a ocupar o anterior posto de trabalho (ou outro compatível com categoria para a qual tenha sido promovida) logo que a comissão seja cessada, por sua vontade ou da empregadora.

O anterior posto de trabalho fica, por assim dizer, “congelado” ou “adormecido”, à espera do seu regresso, até que a comissão de serviço cesse. E só não terá de o reocupar se, finda a comissão, o trabalhador optar por resolver o contrato. 

Este é o regime que também agora resulta do art. 164º-1-a)-b) do CT/2009.

E o que fez a ré ?

Procedeu a uma reorganização interna no âmbito da qual extinguiu o posto de trabalho correspondente ao desempenhado pela autora em comissão de serviço e promoveu o seu despedimento com fundamento nessa extinção sem, contudo, ter feito cessar formalmente o regime de comissão de serviço que acordara com a autora.

Acontece que a extinção do posto de trabalho que estava a ser ocupado em regime de comissão de serviço não tem a virtualidade de fazer extinguir automaticamente o outro posto de trabalho originário que se encontrava “adormecido”, não podendo aquela única extinção levar ao despedimento da trabalhadora pela simples razão de que a mesma, pela assinatura do acordo de comissão de serviço passou a ser titular, no âmbito da relação laboral estabelecida, de dois postos de trabalho, um em efectividade de execução e outro em estado de “dormência” à espera do seu regresso.

E ainda que se pudesse admitir que a actuação da ré também configurasse uma cessação de facto do regime de comissão de serviço existente até então, à autora sempre assistia o direito a voltar ao seu posto de trabalho originário.

Sustentou ainda a ré que, após a extinção do posto de trabalho executado em comissão de serviço, não podia atribuir à autora qualquer outra ocupação compatível com a sua categoria de Consultora, por não ter na empresa nenhum lugar disponível ou vago, como aliás se provou nos factos nºs 43 e 45.

Diz mesmo nas suas alegações de recurso que “a necessidade de despedimento da Apelada adveio não apenas da inexistência de posto de trabalho alternativo, a nível directivo, que aquela pudesse ocupar, mas também da inexistência de posto de trabalho vago compatível com sua categoria profissional de consultora.”

Lavra a ré aqui em profunda confusão.

Tendo a autora de regressar ao primitivo posto de trabalho por aquele que suportava a comissão de serviço ter sido extinto é, desde logo, manifesto que o problema da ré não ter lugar vago ou disponível (ou seja, não é uma situação de ausência de posto de trabalho compatível com a categoria da autora, mas antes de postos de trabalho compatíveis mas ocupados por outros trabalhadores) é algo que não é imputável à autora mas antes à ré, sabendo esta, perfeitamente, que a autora poderia ter direito a regressar ao lugar de origem a qualquer momento, com aviso prévio de entre 30 a 60 dias, como resulta do disposto no art. 163º-1 do CT/2009 e ficou expressamente previsto nas Clªs 3ª e 4ª do Acordo de Comissão de Serviço celebrado entre autora e ré (fols. 111 e 111 v. – facto provado nº 85) e, portanto, era a ré que devia ter acautelado a vacatura ou disponibilidade do lugar originariamente ocupado pela autora, cujo regresso, diga-se e sublinhe-se, foi unicamente provocado pela ré.

E sendo esta dificuldade claramente imputada à actuação e omissão da ré, nunca poderia servir de suporte para a cessação do contrato laboral com a autora. Como é sabido, não é aceitável o benefício do infractor.

Mas acresce que a ré aqui mistura e confunde as coisas. É que o despedimento que promoveu por extinção do posto de trabalho tem a ver com o posto ocupado em regime de comissão de serviço e era em relação a esse que se teria de aferir da inexistência de possibilidade de ocupação posterior pela autora para cargo de Direcção.

Já quanto ao posto de trabalho originário da autora, como Consultora, que se manteve, o mesmo não foi objecto de qualquer extinção, mostrando-se antes ocupado por outros trabalhadores, pelo que tal também não pode fundar um despedimento da autora que, aliás, a ré também não o promoveu nos termos dos arts. 367º e s. do CT/2009.

Seguro, pois, que a extinção do posto de trabalho ocupado pela autora enquanto em regime de Comissão de Serviço, não levou à extinção do posto de trabalho originário que a mesma detinha e manteve e, consequentemente, aquela extinção não provocou a cessação da relação laboral existente entre autora e ré.

O despedimento da autora foi, assim, ilícito na medida em que a autora mantinha e mantém o direito ao posto de trabalho originário e quanto a este a ré não promoveu qualquer despedimento por extinção do posto de trabalho nos termos dos arts. 367º e s. do CT/2009.

Pese embora tal conclusão dispensasse já a análise das outras questões suscitadas pela ré relativamente à (i)licitude do despedimento, ainda assim faremos uma breve apreciação.

Quanto à impossibilidade de a ré ocupar a autora em posto de trabalho compatível com aquele que foi extinto, retira-se sem dificuldade da matéria de facto provada que as competências da Direcção da ré que a autora ocupava, fruto da reorganização interna, foram atribuídas e distribuídas por outras novas Direcções que por sua vez englobavam outras competências que não estavam atribuídas à antiga Direcção da ré, a exigir diferentes conhecimentos e determinando a inexistência de posto de trabalho de Direcção compatível para a autora. É o que resulta dos factos provados nºs 3, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 49, 50, 51, 52, 53 e 54.

Quanto à inexistência de contratos de trabalho a termo para as tarefas correspondentes às do posto de trabalho extinto, na sentença recorrida entendeu-se que o requisito previsto no art. 368º-1-c) do CT/2009 não se mostrava verificado, sendo a prova respectiva a cargo da ré.

No entanto, pode ver-se do facto provado nº 46 que esse requisito se mostra preenchido.

Quanto aos critérios de selecção do posto de trabalho a extinguir, a sentença recorrida considerou que a carta enviada à autora é omissa quanto a tal.

Discorda a ré.

Por força do art. 384º-c) do CT/2009, o despedimento é ilícito se não for observado o disposto no art. 369º do CT/2009 onde se inclui a comunicação ao trabalhador dos critérios de selecção nos termos do art. 368º-2 do CT/2009.
Da análise dos factos provados nºs 64, 65 e 66 (doc. de fols. 67 a 78 v.), designadamente a fols. 71 v. verifica-se que, de facto, a ré não comunicou à autora quaisquer critérios de selecção porque considerou haver inaplicabilidade dos critérios de selecção na concretização do posto de trabalho a extinguir porque não existir naquela Direcção, pluralidade de postos de conteúdo funcional idêntico ao da autora.
Portanto, só se tivesse ficado provado que existia na Direcção que foi extinta outros postos de trabalho como o da autora é que se poderia concluir que a ré não tinha respeitado o comando dos arts. 369º e 368º-2 do CT/2009, o que levaria à ilicitude do despedimento também por esta razão.
Não se tendo provado a referida circunstância, conclui-se não ter ocorrido a ilicitude prevista no art. 384º-c) do CT/2009.

Quanto à 3ª questão.
Defende a ré que da decisão de despedimento decorre inequivocamente a vontade de fazer cessar a comissão de serviço.
Não acompanhamos esta perspectiva.
Nos termos do art. 163º-1 do CT/2009 as partes só podem por termo à comissão de serviço por escrito sendo que aquilo que não obsta à cessação da comissão de serviço, nos termos do nº 2 do mesmo artigo, é o desrespeito pelo aviso prévio, não a falta de comunicação escrita, como já era o entendimento doutrinário no âmbito do art. 246º do CT/2003 (v. Júlio Manuel Vieira, Direito do Trabalho, Vol. I, ed. 2007, pag. 756 e Maria Irene Gomes, A comissão de Serviço, A Reforma do Código do Trabalho, Coimbra Editora, 2004, pag. 376 e 377).
Ora em lado algum dos documentos enviados pela ré à autora aquela manifesta a mínima vontade de fazer cessar a comissão de serviço. Aliás bem se compreende esta atitude da ré pois se lhe comunicasse tal vontade era obrigada a recolocar a autora no seu posto de trabalho originário e, então, lá se ia por água abaixo o despedimento tão laboriosamente urdido.
A ré, que não quis, manifestamente, fazer cessar a comissão de serviço para poder levar a bom porto os seus intentos de despedimento, não pode agora, depois de falhados flagrantemente aqueles, vir candidamente dizer que, afinal, estava a comunicar à autora que cessava a comissão de serviço.É um bocadinho demais !
Portanto, faltando a declaração escrita invocando a cessação da comissão de serviço não se pode concluir que a mesma terminou.
Assim, clarificando as dúvidas que a apelante/ré manifesta nas suas alegações de recurso, face à ilicitude do despedimento deverá reintegrar a autora com os direitos e deveres inerentes à Comissão de Serviço que com ela acordou até que uma das duas partes ponha termo à mesma, momento a partir do qual então passará a ser com as consequências inerentes do regresso da autora ao posto de trabalho originário vigente na altura da celebração de tal acordo de Comissão de Serviço.
E, naturalmente, as retribuições intercalares devidas entre o despedimento e a reintegração, terão de também ser por referência ao auferido pela autora em regime de Comissão de Serviço.
Claro que a ré, como extinguiu o posto de trabalho de Direcção onde a autora estava e não fez cessar a Comissão de Serviço, enquanto não fizer cessar esta, terá de atribuir à autora, sem prejuízo dos direitos emergentes do acordo de Comissão de Serviço, funções as mais aproximadas e compatíveis possíveis com aquelas que ela desempenhava antes do seu afastamento.

Quanto à 4ª questão.
A sentença recorrida concluiu que da matéria de facto provada não se evidenciam factos e circunstâncias que tornem o regresso do trabalhador gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa, como exigido pelo art. 392º-1 do CT/2009
Discorda a ré invocando os factos provados nºs 43, 44, 45, 48, 49, 52, 76, 77, 78, 79, 80, 81 e 82.
Como atrás se viu, os factos nºs 78, 81 e 82 foram entretanto eliminados do conjunto dos provados. Mas ainda que tais factos se mantivessem como provados, dos demais alegados e dos restantes constantes do elenco dos provados não se consegue encontrar um único que revele, ainda que superficialmente, qualquer facto ou circunstância que torne o regresso da autora gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa.
Note-se também que a autora apenas desempenhava um cargo de Direcção de Serviços da ré em regime precário de Comissão de Serviço, susceptível de terminar a qualquer momento por denúncia escrita da autora ou da ré.
Percebe-se que a ré não quer a autora de volta mas essa vontade é absolutamente insuficiente para preencher os requisitos estabelecidos no art. 392º-1 do CT/2009.
Nem vale a pena invocar agora que o presente litígio minou a confiança da ré na autora pois a única responsável por este litígio é a própria ré que, por meio enviesado, procurou contornar as limitações legais e constitucionais aos despedimentos sem justa causa, em vez de proceder com a lisura e simplicidade que a situação impunha, determinando a simples cessação da comissão de serviço face à reestruturação que queria levar a cabo nas suas Direcções de Serviços. Aliás, tendo este fundamento de oposição à reintegração sido culposamente criado pela ré, não pode por ela ser usado, como determina o art. 392º-2 do CT/2009
Ademais, as outras inconveniências com a reintegração da autora que a apelante/ré suscita nas suas alegações, são pura e simplesmente as que sempre adviriam de uma cessação normal da comissão de serviço e consequente retorno normal da autora ao seu posto de trabalho originário, sendo, também por isso, insusceptíveis de impedir a reintegração da mesma.
Inexiste, pois, fundamento bastante para oposição da reintegração da autora.

Voltando à Apelação da autora de fols. de fols. 403 a 459:

Quanto à 2ª questão.
Considera a autora que ao ter-se considerado na sentença o valor mensal retributivo de € 6.168,82 não se contabilizou, como devia, também o valor mensal de € 99,84 relativos à utilização de serviço TV/HD, internet (Netwideband 120mb), telefone fixo, nos termos do Pacote IRIS 120 mb e Canais Sport Tv; € 1.750,00 anuais de plafond de combustível; e € 700,00 anuais de plafond de chamadas de telemóvel.
Resulta da sentença recorrida que ali se atribuiu o valor mensal de € 6.168,82, exactamente como contabilizado pela autora na sua resposta ao articulado da ré, a fols. 101 v.. Porém a sentença acrescenta também que devido à sua natureza retributiva devem igualmente entrar no cômputo a utilização de viatura; o complemento de responsabilidade; o serviço TV/HD, internet (Netwideband 120mb), de telefone fixo nos termos do Pacote IRIS 120 mb e Canais Sport Tv; o plafond de combustível; e o plafond de chamadas de telemóvel.
Acontece que, incongruentemente, não só ali se remata que esta parte da acção deve improceder no tocante a esta parte do pedido como no decisório se mantém o valor mensal de € 6.168,82.
Atentando na referida contabilização feita pela autora na sua resposta ao articulado da ré, a fols. 101 v. vê-se que já ali estão integrados nos € 6.168,82, quer a utilização de viatura quer o complemento de responsabilidade. Ficaram, por isso, efectivamente de fora, somente os € 99,84 mensais relativos à utilização de serviço TV/HD, internet (Netwideband 120mb), telefone fixo, nos termos do Pacote IRIS 120 mb e Canais Sport Tv; os € 1.750,00 anuais de plafond de combustível; e os € 700,00 anuais de plafond de chamadas de telemóvel (factos provados nºs 90 e 92).
Obtendo o valor mensal total destas quantias, alcança-se € 304,00 que somados com os anteriores € 6.168,82 totalizam € 6.472,82, valor que se terá de ter em conta quanto ao valor da retribuição mensal da autora.

Quanto à 3ª questão.
Defende a autora a condenação da ré no pagamento de uma indemnização por danos morais com base na alteração da matéria de facto que nesta apelação suscitou.
A sentença recorrida decidiu no sentido da improcedência deste pedido porque não encontrou factos em que a mesma se pudesse sustentar, tendo e conta os critérios definidos no Código Civil.
São pressupostos exigidos pelo art. 483º do CC, para que exista obrigação de indemnizar, a violação de um direito ou interesse alheio, a ilicitude, o vínculo de imputação do facto ao agente, dano e nexo de causalidade entre o facto e o dano- v. Prof. A. Varela, Obrigações, I Vol., pag. 445.
Com relevância para esta questão provou-se apenas que a autora como consequência do despedimento, sentiu tristeza ansiedade e um sentimento de isolamento no local de trabalho e que partir de Novembro de 2013, deixou de ter ou chefiar equipas e de ser-lhe atribuído trabalho bem como de ser convocada para reuniões, o que a deixou afectada (factos provados nºs 100 e 102).
Ora nos termos do art. 496º-1 do CC deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Não sobressaindo factualidade de onde se possa extrair gravidade a merecer tal tutela, é de concluir que a sentença recorrida decidiu aqui com acerto.

IX-Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar a apelação da autor parcialmente procedente, a apelação da ré totalmente improcedente e, em consequência, decide-se alterar o decisório da sentença quanto ao montante da retribuição mensal a ter em conta, que passará a ser de € 6.472,82.
Custas em 1ª instância, como ali fixado.
Custas da apelação da autora, na proporção 8/10 para a autora e 2/10 para a ré.
Custas da apelação da ré, a cargo da ré.

Lisboa, 15 de Dezembro de 2016

Duro Mateus Cardoso
Albertina Pereira
Leopoldo Soares
Decisão Texto Integral: