Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | MAGDA GERALDES | ||
Descritores: | CONTRATO DE ARRENDAMENTO NRAU EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA TÍTULO EXECUTIVO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 06/16/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | 1. A regra geral da forma de comunicação entre senhorios e arrendatários, que é o escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de receção, abrange as cartas que integrem título para pagamento de rendas, com vista a permitir que a comunicação se torne eficaz para a formação de título executivo, ao abrigo do disposto no art.º 14º-A, o que é reforçado pela previsão normativa contida nos nºs 3 e 4 do art.º 10º do NRAU. 2. A comunicação feita por carta registada simples não é suficiente para a formação de título executivo suficiente, nos termos do disposto no art.º 812º - E, nº1, al. a) do anterior CPC, aplicável aos presentes autos ex vi do disposto no art.º 6º, nº3 da Lei 41/2013, de 26.06. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa, 2ª Secção Cível Serafim ... ... e Maria ... Santos ... ..., identificados nos autos, interpuseram recurso de apelação do despacho de indeferimento liminar do requerimento executivo no processo de execução para pagamento de quantia certa que intentaram contra MARIA de Fátima ... ..., PAULO Jorge ... ... e Sílvia Maria ... ... ..., também identificados nos autos. Em sede de alegações de recurso formularam as seguintes conclusões: “1. Em 27 de Junho de 2013 os recorrentes instauraram a execução em apreço, visando com a mesma receber a quantia em dívida pelos executados arrendatários, Maria de Fátima ... ... e Paulo Jorge ... ..., pela qual a executada Sílvia Maria ... ... ... se constituiu fiadora e pessoal e solidariamente responsável. 2. Para o efeito, os exequentes juntaram como título executivo, nos termos do artigo 14.º-A da Lei n.º 6/2006, na redação da Lei n.º 31/2012, o contrato de arrendamento, acompanhado dos comprovativos das comunicações aos executados, efetuadas por carta registada. 3. Apreciando o referido requerimento, o Tribunal recorrido indeferiu-o liminarmente por insuficiência de título executivo, resultante de os recorrentes terem efetuado comunicação aos arrendatários por carta registada, e não por carta registada com aviso de receção. 4. Os recorrentes não se conformam com a decisão proferida, daí o presente recurso. 5. Analisando a decisão proferida, conclui-se que a mesma carece de fundamento bastante para tal indeferimento. 6. Pois, ao contrário do que afirma o Tribunal recorrido, o artigo 14.º-A do NRAU não exige que a comunicação ao arrendatário seja feita através de carta registada com aviso de receção. 7. Não lhe sendo aplicável, direta ou analogicamente, o artigo 9.º, n.ºs 1 a 7 do mesmo diploma, que consagram tal requisito. 8. Uma vez que esse preceito abrange apenas às comunicações relativas a cessação do contrato de arrendamento, atualização da renda e obras. 9. Não revestindo a comunicação do montante das rendas em falta tal natureza. 10. A comunicação prevista no artigo 14.º-A do NRAU não constitui uma interpelação aos arrendatários, dispensada nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 805º do CC. 11. A mesma visa apenas uma liquidação aritmética extrajudicial prévia dos montantes em dívida, de forma a conferir maior grau de certeza quanto ao montante peticionado. 12. Sendo um elemento meramente complementar do contrato de arrendamento. 13. Pelo que vigora o princípio da liberdade de forma nessa comunicação, nos termos do artigo 219 do Código Civil. 14. Aos exequentes era tão só exigível uma comprovação documental dessa comunicação. 15. O que foi cumprido através da junção das cartas registadas. 16. O contrato de arrendamento e as cartas registadas enviadas aos arrendatários através de mandatária juntos pelos exequentes constituem título executivo bastante ao abrigo do artigo 14.º-A do NRAU. 17. Pelo que o indeferimento liminar do requerimento executivo viola a liberdade de forma do senhorio na escolha do meio de efetuar a comunicação ao arrendatário. 18. Estando também o mesmo viciado de erro de direito por qualificação errada da comunicação enviada aos arrendatários e por aplicar incorretamente o artigo 9.º, n.º 1, do NRAU. Termos em que deve dar-se provimento ao presente recurso, anulando-se a decisão impugnada e substituindo-a por outra que admita o requerimento executivo, considerando verificado o pressuposto do título executivo. Assim se fazendo JUSTIÇA.” Não existem contra-alegações nos autos. Questão a apreciar: indeferimento liminar requerimento executivo por falta de título executivo. FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS Mostram os autos que: 1 - os exequentes apresentaram requerimento executivo para pagamento de quantia certa, nos termos do artº 14.º-A do NRAU, juntando como título executivo a cópia do contrato de arrendamento e o comprovativo da comunicação das rendas em dívida aos arrendatários realizada mediante carta registada simples; 2 - o despacho recorrido indeferiu liminarmente o requerimento executivo com o fundamento de o título dado à execução ser insuficiente, por a notificação efectuada aos executados arrendatários não respeitar os formalismos exigidos por lei. O DIREITO Os recorrentes instauraram a presente execução na data de 27.06.2013, pretendendo com a mesma receber a quantia em dívida pelos executados arrendatários, respeitante a rendas em dívida relativas ao arrendamento da fracção autónoma referida no contrato de arrendamento para habitação cuja cópia juntaram como título executivo. Instruíram o requerimento executivo com este contrato de arrendamento e apresentaram os comprovativos das comunicações aos executados, efectuadas por cartas registadas simples. Pela decisão ora recorrida foi o requerimento executivo indeferido liminarmente, com o fundamento de o título executivo se apresentar insuficiente, atento o facto de os recorrentes terem efectuado comunicação aos arrendatários por carta registada simples e não por carta registada com aviso de recepção. Alegam que o contrato de arrendamento e as cartas registadas enviadas aos arrendatários através de mandatária juntos pelos exequentes constituem título executivo bastante ao abrigo do disposto no artº 14.º-A do NRAU, imputando ao despacho recorrido vício de erro de direito por qualificação errada da comunicação enviada aos arrendatários e por aplicação incorrecta do disposto no artº 9º, nº 1, do NRAU. Vejamos. O artº 14º- A – Título para pagamento de rendas, encargos ou despesas – da Lei n.º 6/2006, de 27.02, que aprovou o NRAU, dispõe o seguinte: “O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário.” O artº 9º - Forma da comunicação – inserido no CAPÍTULO II, Disposições gerais - SECÇÃO I - Comunicações, do NRAU, estipula que: “1 - Salvo disposição da lei em contrário, as comunicações legalmente exigíveis entre as partes relativas a cessação do contrato de arrendamento, atualização da renda e obras são realizadas mediante escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de receção. 2 - As cartas dirigidas ao arrendatário, na falta de indicação por escrito deste em contrário, devem ser remetidas para o local arrendado. 3 - As cartas dirigidas ao senhorio devem ser remetidas para o endereço constante do contrato de arrendamento ou da sua comunicação imediatamente anterior. 4 - Não existindo contrato escrito nem comunicação anterior do senhorio, as cartas dirigidas a este devem ser remetidas para o seu domicílio ou sede. 5 - Qualquer comunicação deve conter o endereço completo da parte que a subscreve, devendo as partes comunicar mutuamente a alteração daquele. 6 - O escrito assinado pelo declarante pode, ainda, ser entregue em mão, devendo o destinatário apor em cópia a sua assinatura, com nota de receção. 7 - A comunicação pelo senhorio destinada à cessação do contrato por resolução, nos termos do n.º 2 do artigo 1084.º do Código Civil, é efetuada mediante: a) Notificação avulsa; b) Contacto pessoal de advogado, solicitador ou agente de execução, sendo feita na pessoa do notificando, com entrega de duplicado da comunicação e cópia dos documentos que a acompanhem, devendo o notificando assinar o original; c) Escrito assinado e remetido pelo senhorio nos termos do n.º 1, nos contratos celebrados por escrito em que tenha sido convencionado o domicílio, caso em que é inoponível ao senhorio qualquer alteração do local, salvo se este tiver autorizado a modificação.”
a) A carta seja devolvida por o destinatário se ter recusado a recebê-la ou não a ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais; b) O aviso de receção tenha sido assinado por pessoa diferente do destinatário. 2 - O disposto no número anterior não se aplica às cartas que: a) Constituam iniciativa do senhorio para a transição para o NRAU e atualização da renda, nos termos dos artigos 30.º e 50.º; b) Integrem título para pagamento de rendas, encargos ou despesas ou que possam servir de base ao procedimento especial de despejo, nos termos dos artigos 14.º-A e 15.º, respetivamente, salvo nos casos de domicílio convencionado nos termos da alínea c) do n.º 7 do artigo anterior. 3 - Nas situações previstas no número anterior, o senhorio deve remeter nova carta registada com aviso de receção decorridos que sejam 30 a 60 dias sobre a data do envio da primeira carta. 4 - Se a nova carta voltar a ser devolvida, nos termos da alínea a) do n.º 1, considera-se a comunicação recebida no 10.º dia posterior ao do seu envio. 5 - Nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 7 do artigo anterior, se: a) O destinatário da comunicação recusar a assinatura do original ou a receção do duplicado da comunicação e cópia dos documentos que a acompanhem, o advogado, solicitador ou agente de execução lavra nota do incidente e a comunicação considera-se efetuada no próprio dia face à certificação da ocorrência; b) Não for possível localizar o destinatário da comunicação, o senhorio remete carta registada com aviso de receção para o local arrendado, decorridos 30 a 60 dias sobre a data em que o destinatário não foi localizado, e considera-se a comunicação recebida no 10.º dia posterior ao do seu envio.” Como supra se referiu, no despacho recorrido entendeu-se que a comunicação aos arrendatários não foi realizada com as formalidades legais, entendimento que os recorrentes contestam. A matéria das modalidades e formalidades da comunicação entre as partes no contrato de arrendamento encontra-se regulada de modo exaustivo e cuidadoso nos artºs 9º e 10º do NRAU que se transcreveram. A regra geral da forma de comunicação entre senhorios e arrendatários é o escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de recepção – cfr. artº 9º do NRAU - Forma da comunicação – inserido no CAPÍTULO II, Disposições gerais - SECÇÃO I - Comunicações.
a) A carta seja devolvida por o destinatário se ter recusado a recebê-la ou não a ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais; b) O aviso de receção tenha sido assinado por pessoa diferente do destinatário.” Ou seja, as comunicações legalmente exigíveis entre as partes relativas a cessação do contrato de arrendamento, actualização da renda e obras que são realizadas mediante escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de recepção, consideram-se efectuadas ainda que ocorram as vicissitudes previstas no nº1, a) e b) do artº 10º do NRAU. Todavia, o nº2 – b) do citado artº 10º, diz que “ (…) 2 - O disposto no número anterior não se aplica às cartas que: (…) b) Integrem título para pagamento de rendas, encargos ou despesas ou que possam servir de base ao procedimento especial de despejo, nos termos dos artigos 14.º-A e 15.º, respetivamente, salvo nos casos de domicílio convencionado nos termos da alínea c) do n.º 7 do artigo anterior. Ou seja, nos termos do artº 10º, nº 2, al. b), nos casos em que a carta registada com aviso de recepção haja sido devolvida por ter sido recusada ou não ter sido levantada na estação de correios a comunicação não se considera feita quando as cartas integrem título para pagamento de rendas, ao abrigo do disposto no artº 14º-A do NRAU. Nessa situação, o nº 3 do artº 10º exige o envio de nova carta registada com aviso de recepção, decorridos 30 a 60 dias sobre a data do envio da primeira carta, e o n.º 4 prescreve que se esta segunda carta for devolvida por ter sido recusada ou não ter sido levantada na estação de correios a comunicação se considera feita no 10.º dia posterior ao envio da segunda carta. Assim sendo, a regra geral da forma de comunicação entre senhorios e arrendatários, que é o escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de recepção, haverá de abranger as cartas que integrem título para pagamento de rendas, ao abrigo do disposto no artº 14º-A, que é precisamente a finalidade da carta dos autos, o que é reforçado pela previsão normativa contida nos nºs 3 e 4 do artº 10º do NRAU, com vista a permitir que a comunicação se torne eficaz para a formação de título executivo, com artº 10º do NRAU. O que se entende, face às exigências de segurança e certeza jurídicas de que tal comunicação chegou ao conhecimento do destinatário para efeitos de formação de título executivo com vista à instauração do respectivo processo executivo. Ora, aplicando o regime legal previsto nos normativos citados ao caso dos autos e tendo presente os factos apurados impõe-se concluir que a comunicação aos arrendatários não se pode considerar efectuada regular e eficazmente, quando o foi por carta registada simples. Esta comunicação não é suficiente para a formação de título executivo, tal como a decisão recorrida considerou, não se estando no caso dos autos perante título executivo suficiente, nos termos do disposto no artº 812º - E, nº1, al. a) do anterior CPC, aplicável aos presentes autos ex vi do disposto no artº 6º, nº3 da Lei 41/2013, de 26.06. Pelo exposto, improcedem as conclusões das alegações de recurso, não tendo a decisão recorrida feito errada interpretação e aplicação das normas jurídicas invocadas pelos recorrentes, não merecendo censura e devendo ser confirmada. DECISÃO Acordam, pois, atentos os fundamentos invocados, os Juízes da 2ª Secção Cível do TRL, em: a) – negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida; b) – condenar os recorrentes nas custas. LISBOA, 16.06.2016 Magda Geraldes…………………………… Farinha Alves……………………………… Tibério Silva………………………………. |