Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4828/16.1T8FNC-A.L1-6
Relator: ANABELA CALAFATE
Descritores: EXECUÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
EMBARGOS DE EXECUTADO
FIANÇA
OBJECTO INDETERMINAVEL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/23/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: Visto que os fiadores sabiam que estavam a obrigar-se relativamente a todas e quaisquer quantias que viessem a ser devidas pela sua afiançada no âmbito de um contrato de cartão de crédito em que está previsto que o limite máximo de 25.000 € podia ser alterado, a obrigação que assumiram no «Contrato de fiança» não é indeterminada nem indeterminável, não sendo nula nos termos do art. 280º do CC e do  Ac do STJ nº 4/2001.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I - Relatório
Por apenso à execução comum para pagamento de quantia certa instaurada por A [ Caixa Geral de Depósitos, SA]  contra B [ …. Automóveis - Unipessoal Lda] , C e D , vieram os dois últimos deduzir oposição à execução alegando, em síntese:
- devem ser absolvidos do pedido quanto à 1ª livrança
- há cumulação indevida de execuções;
- há preenchimento abusivo da 2ª livrança
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A exequente contestou, invocando, em resumo:
- a 1ª livrança tem subjacente um contrato de atribuição e utilização de cartão de crédito relativamente ao qual os opoentes prestaram garantia num contrato de fiança celebrado em 18/12/2008  e num contrato de garantias acessórias celebrado em 29/12/2010;
- quanto à 2ª livrança os opoentes não alegam factos de onde se possa extrair que há preenchimento abusivo e nem este se verifica
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No despacho saneador, proferido em 07/12/2018, foi julgada «inverificada a excepção de cumulação ilegal de execuções.».
*
Realizada a audiência final, foi proferida sentença que decretou:
«Em face de tudo quanto ficou exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os presentes embargos de executado e, por conseguinte, determina-se que a quantia exequenda, no que se reporta à livrança com data de vencimento “2016.06.14”, seja reduzida para o capital de €5.208,34, acrescido de juros de mora desde 01 de Março de 2012 até à data de vencimento da livrança, a taxa anual de 3,037% acrescida da sobretaxa de 3%, do imposto de selo sobre esses juros e pelo preenchimento da livrança legalmente devido, e dos juros de mora à taxa legal desde a data do vencimento da livrança.».
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Inconformados, apelaram os opoentes, terminando a alegação com as seguintes conclusões:
1 - O douto despacho proferido sob data de conclusão de 07/12/2018, concretamente sob o ponto V, que decidiu que não se verifica uma cumulação indevida de execuções, não integra a previsão da alínea b), do nº 1, do artigo 644º do CPC, pelo que recai no âmbito do nº 3, do mesmo normativo, daí o respectivo recurso neste momento.
2 - Ao contrário, salvo o devido respeito, do decidido pelo Tribunal a quo, verifica-se uma cumulação indevida de execuções, e, bem assim, uma coligação ilegal de executados.
3 - Efectivamente, os obrigados numa e noutra das duas livranças em causa não são os mesmos, e, concretamente, enquanto que ambas as livranças estão subscritas pela mesma sociedade, apenas a segunda se mostra avalizada pelos restantes executados;
4 - E ainda que, quanto àquela primeira livrança, a dedução de execução contra estes últimos resulte, no ver da Exequente e agora também do Tribunal a quo, da fiança que integra o documento n.º 2 junto ao requerimento executivo, aval e fiança são figuras jurídicas distintas, e que, in casu, não podem ser confundidos.
5 - Já quanto à sentença proferida pelo Tribunal a quo, sob data de conclusão de 16/01/2019, em termos de recurso quanto à matéria de facto, face ao teor da primeira livrança dada à execução, e, bem assim, considerando a defesa deduzida pelos Embargantes, deve o ponto 3 da matéria de facto ser aditado com a menção expressa de que nessa livrança não foi prestado qualquer aval.
6 - Já quanto ao facto provado sob o ponto 7, face ao teor do documento nº. 2 junto ao requerimento executivo, deve aquele ser aditado com as seguintes estipulações deste, com manifesta relevância para a defesa dos Embargantes:
(…)
CONSIDERANDO QUE:
a) A CAIXA, por contrato de atribuição e utilização do cartão de crédito designado como CAIXAWORKS com o nº. 10033432344, celebrado nesta data, por documento particular que aqui dá integralmente por reproduzido, concedeu aos seus CLIENTES acima identificados um limite de crédito no montante inicial de 25.000,00 € (vinte e cinco mil euros) e com as cláusulas e demais condições constantes das respectivas Condições Gerais de Utilização;
b) As partes declararam conhecer perfeita e integralmente os termos, cláusulas e condições do contrato identificado na alínea anterior, doravante designado por contrato;
É CELEBRADO O PRESENTE CONTRATO DE CONSTITUIÇÃO DE FIANÇA QUE FICARÁ ANEXO E COMO PARTE INTEGRANTE DO CONTRATO ATRÁS IDENTIFICADO, COM AS CLÁUSULAS SEGUINTES
Primeira: As pessoas identificadas para o efeito no início do contrato constituem-se FIADORES solidários e principais pagadores de todas e quaisquer quantias que sejam ou venham a ser devidas à CAIXA pelos CLIENTES no âmbito do contrato supra identificado, quer a título de capital, quer de juros, remuneratórios ou moratórios, comissões, despesas ou quaisquer outros encargos e dão antecipadamente o seu acordo a prorrogações do prazo e moratórias que forem convencionadas entre a CAIXA e os CLIENTES.
(…)
7 - Já quanto ao facto provado sob o ponto 9, face ao teor do “Contrato de Garantias Acessórias” a que se refere, deve o mesmo ser aditado com as seguintes estipulações deste, com manifesta relevância para a defesa dos Embargantes:
(…)
CONSIDERANDO QUE:
c) A CAIXA, por contrato de atribuição e utilização do cartão de crédito designado como CAIXAWORKS, com o n.º 10033432344, celebrado em 18/12/2008, por documento particular que aqui se dá integralmente por reproduzido, concedeu à sua CLIENTE acima identificada, um limite de crédito no montante inicial de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros) e com as cláusulas e demais condições constantes das respectivas Condições Gerais de Utilização.
d) Acordaram agora as partes na elevação do limite de crédito até 50.000,00 Euros (cinquenta mil Euros), e com possibilidade de requerer os pagamentos fraccionados até € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros)
(…)
É CELEBRADO O PRESENTE CONTRATO DE CONSTITUIÇÃO DA SEGUINTE GARANTIA, QUE FICARÁ ANEXO E COMO PARTE INTEGRANTE DO CONTRATO ATRÁS IDENTIFICADO, COM AS CLÁUSULAS SEGUINTES:
3- AVAL: Todas e quaisquer quantias que sejam ou venham a ser devidas à CAIXA pela CLIENTE no âmbito do contrato supra identificado, quer a título de capital, quer de juros, remuneratórios ou moratórios, comissões, despesas ou quaisquer outros encargos ficam garantidas pelo aval prestado na livrança prevista no nº. 2, caso a CAIXA decida proceder ao seu preenchimento, de acordo com o pacto de preenchimento ali convencionado
4- LIVRANÇA EM BRANCO:
2.1- Para titular e assegurar o pagamento de todas as responsabilidades decorrentes do contrato supra identificado, a CLIENTE e os AVALISTAS atrás identificados para o efeito entregam à CAIXA, neste acto, uma livrança com montante e vencimento em branco, devidamente datada, subscrita pela primeira e avalizada pelos segundos, e autorizam desde já a CAIXA a preencher a sobredita livrança, quando tal se mostre necessário, a juízo da própria CAIXA, tendo em conta, nomeadamente, o seguinte:
d) A data de vencimento será fixada pela CAIXA quando, em caso de incumprimento pela CLIENTE das obrigações assumidas, a CAIXA decida preencher a livrança;
e) A importância da livrança corresponderá ao total das responsabilidades decorrentes do presente empréstimo, nomeadamente em capital, juros remuneratórios e moratórios, comissões, despesas e encargos fiscais, incluindo os da própria livrança;
f) A CAIXA poderá inserir cláusula "sem protesto" e definir o local de pagamento.
2.4- A livrança não constitui novação do crédito, pelo que se mantêm as condições do empréstimo, incluindo as garantias.
2.5 - EM ANEXO: LIVRANÇA EM BRANCO.
8 - Em termos de direito, no ver dos Recorrentes, o valor expresso do crédito na origem da fiança a que alude o ponto 7 da matéria de facto, € 25.000,00, é critério necessário de identificação da respectiva origem e âmbito, sob pena de nulidade de tal fiança, por indeterminabilidade do respectivo objecto.
9 - Dos termos específicos da fiança em causa consta prevista a autorização para prorrogações de prazo e moratórias, mas não consta qualquer autorização para qualquer aumento de valor, nem está previsto qualquer aumento de valor.
10 - A estipulação ínsita à cláusula terceira da fiança, expressamente transcrita pelo Tribunal a quo no ponto 7 da matéria de facto, tem necessariamente de se conter no que resulte considerando o crédito concedido pelo montante de € 25.000,00.
11 - Na interpretação dada à fiança em causa, pelo Tribunal a quo, em face do feito constar sob o ponto 8 da matéria de facto assente, resulta não apenas que a fiança é indeterminada no momento contratação, mas ainda indeterminável, isto é, não estando contratualmente definidos/ balizados os elementos que permitem determinar o seu objecto.
12 - A fiança em causa, na interpretação dada pelo Tribunal a quo, é nula, face ao disposto no artigo 280º do C.Civ., o que expressamente se invoca.
13 - E, também ao invés do decidido pelo Tribunal a quo, não é em função do contrato a que alude o ponto 9 da matéria de facto que se pode concluir pela abrangência da fiança em causa em relação à livrança dada à execução, preenchida pelo montante de € 85.414,17, em resultado da ali prevista “elevação do limite de crédito até 50.000,00 Euros (cinquenta mil Euros), e com possibilidade de requerer os pagamentos fraccionados até € 25.000,00 (vinte e cinco mil Euros”.
14 - Com efeito, o que resulta de tal contrato é precisamente o contrário – pelo que a decisão proferida contende com o disposto no art. 406º do C.Civ., o que expressamente se invoca para todos os efeitos.
15 - Concretizando, verifica-se que a garantia do crédito reclamado pela Exequente e que motivou o preenchimento da primeira livrança dada à execução, pelo valor facial de € 85.414,17, reside, nos termos desse acordo a que se refere o ponto 9 da matéria de facto, numa livrança avalizada, não sendo esta a que foi como tal preenchida e dada à execução.
16 - Assim, nesse instrumento contratual não só se alude a outra livrança, que não à dada à execução – porque esta, ao contrário daquela, não se encontra avalizada –, como ainda se alude, como garantia constituída em função e para o aumento do crédito, não à fiança, mas ao aludido aval.
17 - Aliás, está apurado como facto assente, sob o ponto 10, que os Embargantes “assinaram tal documento na qualidade de avalistas”.
18 - Se assim é, resulta que não houve qualquer alteração contratual à fiança prestada.
19 - E mais resulta que a garantia do aumento do crédito ora em causa não reside na dita fiança, nem na livrança dada à execução (posto que não se encontra avalizada) mas numa livrança, que não foi dada à execução, essa sim avalizada.
20 - É certo que o Tribunal a quo veio a equiparar, para decidir como o decidiu, a fiança ao aval, mas seguramente, e mais uma vez sob pena de infracção ao disposto no art. 406º do C.Civ., não o pode fazer.
21 - Prestado o aval, sendo este a garantia do aumento de crédito contratada, o mesmo depende, para ser executado, em face das características próprias do negócio cambiário, desde logo a incorporação, da própria apresentação do título, o que no caso não acontece; e, por outro lado, não obstante as afinidades dos dois institutos jurídicos, é o respectivo regime legal que terá de ser considerado, e não o da fiança, designadamente no que tange ao respectivo prazo de prescrição, que, ao contrário desta, é de apenas três anos.
22 - Assim, a diversidade dos termos concretamente contratados, e, além disso, dos respectivos regimes legais, não permite seguramente afirmar, como o faz o Tribunal a quo, que “na prática, no caso concreto, os efeitos na perspectiva de obrigações decorrentes para os embargantes são as mesmas nas duas figuras” tal como, considerada a perspectiva inversa, também não são os mesmos os direitos dos ditos embargantes num e noutro caso, designadamente, como já referido, não podendo invocar para a fiança o prazo de prescrição do aval.
23 - Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso de modo a se fazer Justiça.
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Não há contra-alegação.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II - Questões a decidir
O objecto do recurso é delimitados pelas conclusões da alegação dos apelantes, sem prejuízo de questões de conhecimento oficioso, pelo que as questões a decidir são:
-  se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto
- se nos autos há título executivo para o alegado crédito de 85.414,17, € vencido em 22/02/2016
- se há cumulação indevida de execuções e coligação ilegal de executados
- se a fiança, na interpretação dada na sentença recorrida, é nula por ser indeterminada e indeterminável
- se a garantia do crédito invocado pela exequente e que motivou o preenchimento da primeira livrança dada à execução pelo valor de 85.414,70 €, reside, nos termos de denominado  «Acordo de Garantais Acessórias», numa livrança avalizada que não foi dada à execução
- se não houve alteração contratual à fiança prestada
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III - Fundamentação
A) Na sentença recorrida vem dado como provado:
1. A 20 de Julho de 2016, foi apresentado à execução ordinária n.º 4828/16.1T8FNC, em apenso, duas livranças, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
2. Numa consta, como local e data de emissão “Câmara de Lobos 08.12.15”, como data de vencimento “2016.02.22”, como importância em Euros “85.414,17”, como valor nada preenchido, e a seguinte menção “no seu vencimento pagarei(emos) por esta única via de livrança à Caixa Geral de Depósitos, S.A. ou à sua ordem a quantia de oitenta cinco mil, quatrocentos catorze euros dezassete cêntimos”.
3. Consta igualmente a identificação como subscritor a sociedade executada e assinatura em nome da mesma.
4. Noutra consta, como local e data de emissão “Câmara de Lobos 10.09.11”, como data de vencimento “2016.06.14”, como importância em Euros “12.663,55”, como valor nada preenchido, e a seguinte menção “no seu vencimento pagarei(emos) por esta única via de livrança à Caixa Geral de Depósitos, S.A. ou à sua ordem a quantia de doze mil, seiscentos sessenta três euros cinquenta cinco cêntimos
5. Consta igualmente a identificação como subscritor a sociedade executada e assinatura em nome da mesma.
6. E, no verso, precedida da expressão “Bom para aval ao subscritor”, as assinaturas dos ora embargantes.
7. Os ora embargantes assinaram o documento n.º 2 junto com o requerimento executivo, denominado de “Contrato de Fiança”, que aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual consta que os embargantes «constituem-se FIADORES solidários e principais pagadores de todas e quaisquer quantias que sejam ou venham a ser devidas à CAIXA pelos CLIENTES no âmbito do contrato supra identificado [“cartão de crédito designado como CAIXAWORKS, com o n.º 10033432344] (…) TERCEIRA: A presente garantia abrange as livranças, letras ou outros títulos cambiários emitidos, ou que o venham a ser, para titulação da operação de crédito garantida, nos termos do respectivo pacto de preenchimento».
8. Da proposta de adesão ao mencionado cartão de crédito CAIXAWORKS, que aqui se dá por integralmente reproduzido (fls. 15), consta na cláusula 26, parte final, «No entanto, o referido limite poderá ser alterado pela mesma CGD, a qualquer momento por sua livre iniciativa ou a pedido do titular».
9. Por acordo denominado de “Contrato de Garantias Acessórias” (fls. 16 verso e 17), que aqui se dá por integralmente reproduzido, com as mesmas partes a que se alude em 7), consta: «b) Acordaram agora as partes na elevação do limite de crédito até 50.000,00 Euros (cinquenta mil Euros), e com possibilidade de requerer os pagamentos fraccionados até €25.000,00 (vinte e cinco mil Euros)».
10. Os embargantes assinaram tal documento na qualidade de avalistas.
11. A livrança a que se alude em 4) tem subjacente o acordo de fls. 20 a 23, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
12 - Na sequência de a exequente ter considerado vencidas antecipadamente todas as mensalidades, accionou a garantia autónoma junto da LISGARANTE a que se alude na cláusula 22A do mencionado acordo (fls. 22 verso), reportada a 75% do valor do capital em dívida, tendo, consequentemente, recebido desta a quantia de €15.625,00.
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B) E vem exarado:
«Da discussão da causa não se logrou provar quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa, designadamente que, a fiança a que se alude em 7) não se reporta ao contrato de cartão de crédito CAIXAWORKS, com o n.º 10033432344».
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C) Da alegada impugnação da matéria de facto
a) Alegam os apelantes que recorrem da decisão proferida sobre a matéria de facto, dizendo que é relevante para a sua defesa a reprodução de mais partes dos documentos mencionados nos pontos 7 e 9.
Na sentença recorrida constam transcrições de excertos de cada um desses documentos antecedidas da expressão «que aqui se dá por integralmente reproduzido». Portanto, se bem que não seja processualmente a forma mais correcta de mencionar o teor dos documentos, todo o seu conteúdo foi julgado provado pela 1ª instância.
Assim, apenas porque é mais correcto e facilita a apreensão do conteúdo da sentença e deste acórdão, passaremos a transcrever os trechos que se mostram relevantes para a subsunção jurídica dos factos.
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b) Mais sustentam os apelantes que no ponto 3 deve constar que nessa livrança não foi prestado aval.
No ponto 1 são referidas as duas livranças «cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido». Portanto, é aplicável o que dissemos em a).
Assim, porque resulta dos autos e é relevante para a subsunção jurídica dos factos, deve constar essa menção.
*
Nesta conformidade, decide-se alterar a redacção dos pontos 3, 7 e 9, passando a ser:
«3. Consta igualmente a identificação como subscritor a sociedade executada e assinatura em nome da mesma, e não consta prestação de aval.».
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«7. Os ora embargantes assinaram sob o dizer «Fiadores» e o embargante C mais assinou sob o dizer «Clientes» o documento n.º 2 junto com o requerimento executivo, denominado de “Contrato de Fiança”, no qual consta:
«Contratantes
Primeiro:
B, sociedade por quotas (…) adiante designado por Devedor ou Cliente;
Segundos.
C, (…) e D  (…), ambos (…) residentes na Lombada Baixo, Entrada .., Porta .. (…) adiante designados como Fiadores;
Terceira
Caixa Geral de Depósitos, SA, (…) adiante também designada por Caixa ou CGD.
Considerando que:
a) A Caixa, por contrato de atribuição e utilização do cartão de crédito designado como CAIXAWORKS com o nº. 10033432344, celebrado nesta data, por documento particular que aqui dá integralmente por reproduzido, concedeu aos seus Clientes acima identificados um limite de crédito no montante inicial de 25.000,00 € (vinte e cinco mil euros) e com as cláusulas e demais condições constantes das respectivas Condições Gerais de Utilização;
b) As partes declararam conhecer perfeita e integralmente os termos, cláusulas e condições do contrato identificado na alínea anterior, doravante designado por contrato;
É celebrado o presente Contrato de Constituição de Fiança que ficará anexo e como parte integrante do contrato atrás identificado, com as cláusulas seguintes:
Primeira: As pessoas identificadas para o efeito no início do contrato constituem-se FIADORES solidários e principais pagadores de todas e quaisquer quantias que sejam ou venham a ser devidas à Caixa pelos Clientes no âmbito do contrato supra identificado, quer a título de capital, quer de juros, remuneratórios ou moratórios, comissões, despesas ou quaisquer outros encargos e dão antecipadamente o seu acordo a prorrogações do prazo e moratórias que forem convencionadas entre a Caixa e os Clientes.
Segunda: Os fiadores renunciam ao benefício do prazo estipulado no art. 782º do Código Civil e ao exercício das excepções previstas no art. 642º do mesmo Código.
Terceira: A presente garantia abrange as livranças, letras ou outros títulos cambiários emitidos, ou que o venham a ser, para titulação da operação de crédito garantida, nos termos do respectivo pacto de preenchimento.
Câmara de Lobos, 11 de Dezembro de 2008.».
*
«9. Os ora embargantes assinaram sob o dizer «Avalistas» e o embargante C assinou também  sob o dizer «Clientes» o documento denominado “Contrato de Garantias Acessórias” (fls. 16 verso e 17 destes autos), no qual consta, além do mais:
«Contratantes
Primeira: B , sociedade por quotas (…) adiante designado por Devedora ou Cliente;
Segundos: C , residente na Lombada Baixo, Entrada .., Porta .. (…);
D, residente no Edifício Monumental Palace, (…) adiante designados como Avalistas;
Terceira: Caixa Geral de Depósitos, SA, (…) adiante também designada por Caixa ou CGD.
Considerando que:
a) A Caixa, por contrato de atribuição e utilização do cartão de crédito designado como CAIXAWORKS com o nº. 10033432344, celebrado em 18/12/2008, por documento particular que aqui dá integralmente por reproduzido, concedeu à sua Cliente acima identificada um limite de crédito no montante inicial de € 25.000,00 € (vinte e cinco mil euros) e com as cláusulas e demais condições constantes das respectivas Condições Gerais de Utilização;
«b) Acordaram agora as partes na elevação do limite de crédito até 50.000,00 Euros (cinquenta mil Euros), e com possibilidade de requerer os pagamentos fraccionados até €25.000,00 (vinte e cinco mil Euros).
c) As partes declararam conhecer perfeita e integralmente os termos, cláusulas e condições do contrato identificado nas alíneas anteriores, doravante designado por contrato;
É CELEBRADO O PRESENTE CONTRATO DE CONSTITUIÇÃO DA SEGUINTE GARANTIA, QUE FICARÁ ANEXO E COMO PARTE INTEGRANTE DO CONTRATO ATRÁS IDENTIFICADO, COM AS CLÁUSULAS SEGUINTES:
1- AVAL: Todas e quaisquer quantias que sejam ou venham a ser devidas à CAIXA pela CLIENTE no âmbito do contrato supra identificado, quer a título de capital, quer de juros, remuneratórios ou moratórios, comissões, despesas ou quaisquer outros encargos ficam garantidas pelo aval prestado na livrança prevista no nº. 2, caso a CAIXA decida proceder ao seu preenchimento, de acordo com o pacto de preenchimento ali convencionado.
2- LIVRANÇA EM BRANCO:
2.1- Para titular e assegurar o pagamento de todas as responsabilidades decorrentes do contrato supra identificado, a Cliente e os Avalistas atrás identificados para o efeito entregam à CAIXA, neste acto, uma livrança com montante e vencimento em branco, devidamente datada, subscrita pela primeira e avalizada pelos segundos, e autorizam desde já a Caixa a preencher a sobredita livrança, quando tal se mostre necessário, a juízo da própria Caixa, tendo em conta, nomeadamente, o seguinte:
a) A data de vencimento será fixada pela CAIXA quando, em caso de incumprimento pela Cliente das obrigações assumidas, a Caixa decida preencher a livrança;
b) A importância da livrança corresponderá ao total das responsabilidades decorrentes do presente empréstimo, nomeadamente em capital, juros remuneratórios e moratórios, comissões, despesas e encargos fiscais, incluindo os da própria livrança;
c) A Caixa poderá inserir cláusula "sem protesto" e definir o local de pagamento.
2.2. - A livrança não constitui novação do crédito, pelo que se mantêm as condições do empréstimo, incluindo as garantias.
2.3- Em anexo: livrança em branco.
(…)».
*
D) É ainda de considerar que no requerimento executivo consta, além do mais:
«Valor da Execução: 99.580,19 € (Noventa e Nove Mil Quinhentos e Oitenta Euros e Dezanove Cêntimos)
(…)
Título Executivo: Livrança
Factos:
1. A Exequente é uma instituição financeira, como é do conhecimento do público em geral.
2. É a Exequente a legítima dona e portadora de uma livrança no valor de € 85.414,17, com vencimento na data de 22.02.2016 (cfr. doc. 1).
3. A livrança foi subscrita pela executada B, conforme se alcança da assinatura constante no presente título executivo.
4. Apresentada a pagamento a livrança não foi paga.
5. Cumpre referir que no dia 18.12.2008, a Exequente e a empresa executada celebraram um contrato de fiança - cfr. doc. 2 que se junta, através do qual C e D constituíram-se fiadores solidários e principais pagadores de todas e quaisquer quantias devidas à Caixa, nomeadamente a responsabilidade relativa a este título executivo (cfr. cláusula 1ª do doc. 2).
6. Daí serem demandados na presente execução.
7. A Exequente, é também, a legítima dona e portadora de uma outra livrança no valor de € 12.663,55, vencida em 14.06.2016 (cfr. doc. 3);
8. A livrança foi, também, subscrita pela executada B, e devidamente avalizada pelos executados C e D, conforme se alcança das assinaturas e declarações constantes no presente título executivo.
9. Apresentada a pagamento na data do seu vencimento, a livrança não foi paga.
LIQUIDAÇÃO DA OBRIGAÇÃO
Valor Líquido:       98.077,72 €
Valor dependente de simples cálculo aritmético:   1.502,47 €
Valor NÃO dependente de simples cálculo aritmético:  0,00 €
Total:           99.580,19 €
Relativamente à primeira livrança, além do capital de € 85.414,17, são devidos os juros de mora, contados à taxa legal de 4%, sobre o valor em dívida, desde a data de vencimento até hoje, no valor de € 1.394,64 e imposto de selo, no valor de € 55,79.
Relativamente à segunda livrança, além do capital de € 12.663,55, são devidos os juros de mora, contados à taxa legal de 4%, sobre o valor em dívida, desde a data de vencimento até hoje, no valor de € 50,04 e imposto de selo, no valor de € 2,00.
Serão ainda devidos os juros de mora vincendos até ao efectivo pagamento, contados à taxa legal, acrescidos dos respectivos impostos de selo.».
*
E) O Direito
1. No saneador foi julgada «inverificada a excepção de cumulação ilegal de execuções».
Na sentença recorrida foi novamente apreciada a questão, nestes termos:
«V — FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
V.1. Da cumulação indevida de execuções
Os embargantes, em sede de alegações orais proferidas no julgamento, consideraram que a questão decidida no ponto V do despacho saneador de fls. 39 (verso) a 40 não se encontrava completamente decidida por resultar dos autos que haveria dois “plafonds” para a mesma dívida, um previsto no contrato de fiança e outro, garantido por livrança em branco avalizada pelos embargantes que não foi dada em execução, pelo plafond aumentado pelo documento de fls. 16 verso) a 17.
Porém, a legalidade de cumulação de execuções afere-se pelo cotejo entre pedido e causa de pedir.
A exequente deduziu a execução contra os três executados assumindo que as obrigações subjacentes a cada uma das livranças era solidária.
Donde, independentemente de se concluir que não existe título executivo contra os embargantes pela totalidade da obrigação exequenda relativamente a uma das livranças, daí não resulta que estejamos perante uma cumulação ilegal, pois a exequente deduziu a execução como se tratando de uma situação de litisconsórcio e não como de coligação.
Isto é, a única consequência consiste em reduzir a obrigação dos embargantes para o montante em relação ao qual existe título executivo.»
Mas estabelece o art. 631º do CPC (Código de Processo Civil):
«1. Proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa.
2. É lícito, porém, ao juiz rectificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença, nos termos dos artigos seguintes.
3. O disposto nos números anteriores, bem como nos artigos subsequentes, aplica-se, com as necessárias adaptações aos despachos.».
Portanto, essa questão não podia ser reapreciada pela 1ª instância, o que tem como consequência não deverem ser levadas em conta as considerações tecidas na sentença recorrida a esse respeito.
*
2. No despacho saneador expôs-se, além do mais:
«A pluralidade de partes processuais na execução, pelo lado passivo, todavia, pode conviver com a pluralidade de títulos executivos, no caso de litisconsórcio de executados — é o que dispõe o artigo 709.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (corpo da norma).
No que concerne a coligação de executados — devem encontrar-se obrigados no mesmo título — artigo 56.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil.
Assim, a demanda em simultâneo, por um lado, da sociedade executada pelas duas livranças dadas em execução enquanto subscritora das mesmas, e dos embargantes, por outro lado, pela obrigação de aval assumida na 2.ª livrança e como fiadores, apenas poderia acontecer na eventualidade de nos encontrarmos perante um litisconsórcio passivo.
A pluralidade de partes executiva, nos presentes autos, entre a sociedade subscritora e os embargantes é de classificar como litisconsórcio ou como coligação?
(…)
Estamos no caso dos autos perante um pedido único?
Entendemos que a resposta é positiva em relação a cada livrança.
Em ambas as livranças a exequente trata a obrigação em causa como solidária, sendo da responsabilidade de todos os executados, sem que nenhum possa opor que somente cumpre se os restantes igualmente cumprirem.
O que se cumula são livranças e não qualquer outro título executivo.
Porém, para que os embargantes tenham legitimidade para figurar como devedores quanto à primeira livrança, na qual não assumiram a figura de avalistas, foi necessário que a exequente invocasse e juntasse contrato de fiança em que, alegadamente, os embargantes assumiram a responsabilidade pela obrigação cambiária.
A relação existente entre as partes passivas, na presente execução, é de natureza litisconsorcial, pelo que pode a execução ser fundada em títulos diversos — nesse sentido, cf. ac. da RG de 07.07.2004, processo n.º 1335/04-1, disponível in www.dgsi.pt.
Na primeira livrança todos os executados obrigaram-se, na alegação da exequente, solidariamente, titulando tal obrigação a livrança quanto à sociedade executada e o contrato de fiança quanto aos embargantes,
Na segunda livrança todos os executados obrigaram-se, a sociedade executada na qualidade de subscritora e os embargantes na qualidade de avalistas.
(…)».
Mas dizem os apelantes:
«Ora, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, com o devido respeito, não está em causa à luz do requerimento executivo, uma situação de litisconsórcio entre os obrigados numa e noutra das duas livranças em causa, que não são os mesmos, e, concretamente, enquanto que ambas as livranças estão subscritas pela mesma sociedade, apenas a segunda se mostra avalizada pelos restantes executados.
É certo que, quanto àquela primeira, a dedução de execução contra estes resulta, no ver da Exequente e agora também o Tribunal a quo, da fiança que integra o documento nº 2 junto com o requerimento executivo; mas não menos certo, é que, além do que abaixo se dirá quanto à fiança concretamente prestada, aval e fiança são, me si mesmos, figuras jurídicas distintas e com regimes distintos.
(…)
Ora, no caso concreto, tendo em conta os termos do referido doc. nº  2, precisamente se coloca uma de duas questões, nos termos abaixo melhor referidos:
- ou a ausência de relação da fiança prestada com o aumento do crédito que motivou o preenchimento da primeira livrança dada à execução, desde logo considerando o montante do contrato a que aquela expressamente respeitou;
- ou a nulidade da fiança em causa por indeterminabilidade do respectivo objecto, caso se considere que abrange o dito aumento do crédito tal como o veio a considerar o Tribunal a quo.
Daí se evidencia, salvo melhor entendimento, uma cumulação indevida de execuções, e, bem assim, uma coligação ilegal de executados.
(...)
Considerando a matéria de facto resultante do já apurado pelo Tribunal, e bem assim, o teor próprio dos documentos em causa, (…) resulta que a fiança foi prestada em relação a um crédito com o limite expresso de € 25.000,00.
(…) Mas não consta qualquer autorização para qualquer aumento de valor, nem está previsto qualquer aumento de valor.
A estipulação ínsita à cláusula terceira da fiança, expressamente transcrita pelo Tribunal a quo no ponto 7 da matéria de facto, ou seja, que integra no âmbito da garantia que aquela representa quaisquer títulos cambiários emitidos ou a emitir para titulação da operação de crédito em causa, tem, necessariamente de se conter no que resultes considerando o crédito concedido pelo montante de € 25.000,00.
Entender de outro modo conduz à consideração da nulidade da fiança, por Indeterminabilidade do respectivo objecto.»
Vejamos.
Prevê o CPC:
Art. 53º
«1. A execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor.
2. (…)».
Art. 56º
«1. Quando não se verifiquem as circunstâncias impeditivas previstas no nº 1 do artigo 709º, é permitido:
a) A vários credores coligados demandar o mesmo devedor ou vários devedores litisconsortes;
b) A um ou vários credores litisconsortes, ou a vários credores coligados, demandar vários devedores coligados, desde que obrigados no mesmo título;
c) A um ou vários credores litisconsortes ou a vários credores coligados demandar vários devedores coligados, titulares de quinhões no mesmo património autónomo ou de direitos relativos ao mesmo bem indiviso, sobre os quais se faça incidir a penhora.
2. Não obsta à cumulação a circunstância de ser ilíquida alguma das   quantias, desde que a liquidação dependa unicamente de operações aritméticas.
3. É aplicável á coligação o disposto nos nº 2 a 5 do artigo 709º para a cumulação de execuções.».
Art. 709º:
«1. É permitido ao credor, ou a vários credores litisconsortes, cumular execuções, ainda que fundadas em títulos diferentes, contra o mesmo devedor, ou contra vários devedores litisconsortes, salvo quando:
a) Ocorrer incompetência absoluta do tribunal para alguma das execuções;
b) As execuções tiverem fins diferentes;
c) A alguma das execuções corresponder processo especial diferente do processo que deva ser empregado quanto às outras, sem prejuízo do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 37;
d) A execução da decisão judicial corra nos próprios autos.
(…)».
Nas palavras de Antunes Varela, «No litisconsórcio, há pluralidade de partes, mas unicidade da relação material controvertida; na coligação, à pluralidade das partes corresponde a pluralidade das relações materiais litigadas, (…) (in Manual de Processo Civil, 2ª ed. pág. 161).
O requerimento executivo deve ser acompanhado do título executivo sob pena de indeferimento liminar no caso de ser manifesta a falta ou insuficiência deste (art. 724º nº 4 e 726º nº 2 al a) do CPC.
No caso concreto, vem indicado no requerimento executivo: «Título: Livrança».
Estão juntas duas livranças.
Na 2ª livrança, preenchida pela importância de 12.663,55 €, é subscritora a sociedade executada e são avalistas os apelantes.
Na 1ª livrança, preenchida pelo valor de 85.414,17 €, é subscritora a Sociedade executada e nela não constam como obrigados os apelantes, tendo a exequente justificado a sua demanda na fiança que prestaram no documento nº 2 junto com o requerimento executivo, embora posteriormente, na contestação à oposição, oferecida em 08/05/2017, invoque também o denominado «Contrato de garantias acessórias» nos termos do qual consta que ficou acordado entre a sociedade executada, os apelantes e a apelada, a elevação do limite do crédito no âmbito do contrato do cartão de crédito.
Portanto, os apelantes são executados na qualidade de garantes quanto às duas livranças.
Quanto à 1ª livrança, como fiadores por se terem vinculado como tal no denominado «Contrato de fiança».
Quanto à 2ª livrança, como avalistas, por nesta terem prestado aval.
E a sociedade executada é a subscritora das duas livranças.
O fiador garante a satisfação do direito de crédito, ficando pessoalmente obrigado perante o credor (art. 627º nº 1 do CC/Código Civil).
O dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada (art. 32º da LULL/Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças).
Assim:
- existe litisconsórcio entre todos os devedores/executados quanto à 1ª livrança;
- existe litisconsórcio entre todos os devedores/executados quanto à 2ª livrança.
Daí que não tenha aplicação o disposto no art. 56º do CPC.
O que temos é cumulação de execuções fundadas em dois títulos diferentes (duas livranças) contra três devedores litisconsortes em cada um desses títulos (sociedade e apelantes).
Nesta conformidade, a conclusão a extrair só pode ser a de que esta cumulação de execuções é permitida pelo art. 709º do CPC.
Questão diferente é a de saber se nesta execução pode ser exigida aos apelantes toda a importância indicada na 1ª livrança.
É o que será apreciado de seguida.
*
Na contestação à oposição à execução, vem alegado pela apelada, além do mais:
- «Ora, como bem sabem os Embargantes, o limite de crédito inicialmente contratado para utilização do referido cartão era, de facto, de € 25.000,00 mas, em 29.12.2010, por documento particular denominado “Contrato de Garantias Acessórias” celebrado com a sociedade B e com os aqui Embargantes, tal limite foi elevado para o montante de € 50.000 (…)»,«Fazendo ambos os contratos - o de fiança outorgado em 18.12.2018 e das garantias acessórias celebrado em 29.12.2010 - parte integrante do referido contrato de atribuição e utilização de cartão de crédito» (13º), «Assim, a livrança aqui dada à execução tem subjacente o contrato de atribuição e utilização do cartão de crédito nº 10033432344, foi preenchida nos termos contratualmente estipulados pelas partes pelo valor em dívida no âmbito do referido contrato e está garantida pela fiança prestada pelos Embargantes - cfr cláusulas 3ª do Doc. 2 junto com o requerimento executivo.» e «O valor inscrito na livrança corresponde a todas as responsabilidades decorrentes do contrato referente ao cartão de crédito nº 10033432344 ».
Não foi junta a dita livrança com aval prestado pelos apelantes mencionada no «Contrato de garantias acessórias» por estes assinado sob o vocábulo «Avalistas».
Por escrito de 29/05/2017, disseram os apelantes:
«O ora junto e denominado “contrato de garantias acessórias” faz, diversamente, alusão aos Executados C e D como avalistas, e não como fiadores;
Faz ainda menção a livrança em branco pelos mesmos avalizada;
O mesmo será dizer, por outras palavras, que nem a livrança dada à execução corresponde à livrança a que se reporta o aludido “contrato de garantias acessórias”, nem tal contrato respeita à concreta livrança dada à execução»;
Como bem sabido, sendo o título executivo concretamente invocado e apresentado condição e limite da execução, não pode para esta ser considerada uma livrança avalizada que não foi invocada nem apresentada;
Do mesmo modo, a discrepância entre o alegado crédito exequendo e a fiança invocada, devidamente invocada nos artigos 1º a 11º da oposição, redundando na expressa alegação de uma indevida cumulação de execuções, porquanto os Executados apenas prestaram fiança relativamente a crédito com o limite de capital de € 25.000,00, mais confirmada fica pelo documento junto, embora incompleto, sob a designação de “nota de débito” emitida pela Exequente e que se refere a um capital em dívida de € 66.555,49 - o que é inequivocamente alheio ao contrato de fiança em causa».
Do que vem alegado por ambas as partes não resulta claro que tenha sido subscrita e avalizada a livrança em branco que está referida no «Contrato de garantias acessórias».
Mas a existir tal livrança e a ter sido preenchida e exigido o seu pagamento, lógico teria sido a sua apresentação como título executivo.
Por outro lado, nem no articulado de oposição nem posteriormente alegaram os apelantes a extinção, por pagamento, do crédito da apelada de 85.414,17 € nascido no âmbito do contrato de utilização do cartão de crédito.
Só alegaram os apelantes que a fiança não garante esse valor porque, dizem, foi prestada só para garantia dum crédito com limite máximo de 25.000 €.
O art. 734º do CPC estabelece:
«1. O juiz pode conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo.
2. Rejeitada a execução ou não sendo o vício suprido ou a falta corrigida, a execução extingue-se, no todo ou em parte.».
Decorre do exposto, que no caso concreto não se trata de conhecer oficiosamente se a 1ª livrança não constitui título executivo quanto aos apelantes.
Trata-se sim, de decidir se deve ser reduzida a quantia exequenda em função do limite máximo de 25.000 € quanto aos fiadores/apelantes.
O art. 628º do CC estipula:
«1. A vontade de prestar fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal.
2. A fiança pode ser prestada sem conhecimento do devedor ou contra a vontade dele, e à sua prestação não obsta o facto de a obrigação ser futura ou condicional.».
O art. 280º nº 1 estatui que é nulo o negócio jurídico cujo objecto seja física ou legalmente impossível, contrário à lei ou indeterminável.
No acórdão nº 4/2001 do Supremo Tribunal de Justiça (in DR I, nº 57 de 08/03/2001) foi uniformizada a jurisprudência nos seguintes termos:
«É nula, por indeterminabilidade do seu objecto, a fiança de obrigações futuras, quando o fiador se constitua garante de todas as responsabilidades provenientes de qualquer operação em direito consentida, sem menção expressa da sua origem ou natureza e independentemente da qualidade em que o afiançado intervenha.».
No «Contrato de fiança» declararam os apelantes constituírem-se «fiadores solidários e principais pagadores de todas e quaisquer quantias que sejam ou venham a ser devidas à Caixa pelos Clientes no âmbito do contrato supra identificado, quer a título de capital, quer de juros, remuneratórios ou moratórios, comissões, despesas ou quaisquer outros encargos e dão antecipadamente o seu acordo a prorrogações do prazo e moratórias que forem convencionadas entre a Caixa e os Clientes.», mais constando que «A presente garantia abrange as livranças, letras ou outros títulos cambiários emitidos, ou que o venham a ser, para titulação da operação de crédito garantida, nos termos do respectivo pacto de preenchimento.».
As obrigações garantidas pela fiança são pois as resultantes do contrato nº 10033432419 /cartão de crédito Caixaworks em cuja cláusula 26, parte final, consta: «No entanto, o referido limite poderá ser alterado pela mesma CGD, a qualquer momento por sua livre iniciativa ou a pedido do titular».
Portanto, os fiadores sabiam que se estavam a obrigar relativamente a todas e quaisquer quantias que viessem a ser devidas à apelada no âmbito daquele contrato de cartão de crédito em que o limite máximo de 25.000 € podia ser alterado.
Assim, contrariamente ao que sustentam os apelantes, a obrigação que assumiram no «Contrato de fiança» não é indeterminada nem indeterminável, não sendo nula nos termos do art. 280º do CC e do  Ac do STJ nº 4/2001.
Em suma, não têm razão ao sustentarem que no contrato de fiança se obrigaram apenas quanto a um crédito com limite máximo de 25.000 €.
Como não está provado - nem sequer foi alegado - que a dívida em que se constituiu a subscritora no âmbito do contrato de cartão de crédito foi extinta por pagamento ou por qualquer outro meio de extinção - e repare-se que o apelante C é o legal representante da sociedade unipessoal com o seu nome -, a livrança podia ter sido preenchida nos termos em que o foi.
Por isso, o aval alegadamente prestado pelos apelantes noutra livrança será apenas mais uma garantia das responsabilidades daquela sociedade unipessoal emergentes do contrato de cartão de crédito, que acresce à garantia prestada pelos apelantes como fiadores.
Em consequência, nesta execução há um título executivo complexo quanto à quantia de 85.414,17 € relativamente aos apelantes, composto pela livrança e pelo «Contrato de fiança».
*
Por quanto se disse, impõe-se a improcedência da apelação.
*
IV - Decisão
Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelos apelantes.
Lisboa, 23 de Maio de 2019

Anabela Calafate
António Manuel Fernandes dos Santos
Ana de Azeredo Coelho (não assina por não estar presente mas tem voto de concordância)