Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | MARGARIDA VIEIRA DE ALMEIDA | ||
Descritores: | RECURSO PENAL MOTIVAÇÃO CONCLUSÕES PEDIDO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/17/2016 | ||
Votação: | DECISÃO INDIVIDUAL | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | REJEIÇÃO | ||
Sumário: | I - A motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. II - Há que distinguir o acto de demanda do conceito de pretensão processual. III - Afirmar e pedir são os dois actos essenciais…o pedido há-de ser a consequência logica das afirmações efectuadas. O pedido deve ser formulado com toda a precisão, de modo a que não haja dúvidas sobre o efeito jurídico que se pretende obter IV - Os recursos que não indicam o sentido em que o Tribunal “ad quem” deve decidir as questões suscitadas na motivação e resumidas nas conclusões, não formulando o pedido respectivo, terão de ser rejeitados por manifesta improcedência substantiva. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Decisão sumária: O MºPº junto do Tribunal da Concorrência de Santarém veio interpor recurso do despacho judicial que equiparou a penhora de depósitos bancários à ordem de sociedades comerciais à penhora de vencimentos e determinou a devolução imediata às executadas de 2/3 das quantias à ordem bloqueadas/penhoradas, e que aplicou o artº 73º, nº 8 da Lei nº 19/2012, de 8 de Maio, ao invés do artº 47º, nº 4 da Lei nº 18/2013, de 11 de Junho, por considerar que é a lei mais favorável às sociedades comerciais executadas, e que o artº 3º, nº 2 do RGCO deve ser interpretado extensivamente para, depois, concluir que as executadas “X” “Y” e “Z”, não tinham legitimidade, indeferindo liminarmente a acção executiva em relação às mesmas e determinando o levantamento imediato das penhoras respectivas. Termina dizendo, … “Nesta conformidade, deverão V. Exªs revogar a decisão recorrida.” (em 19 de Novembro 2015). Em 20 de Novembro de 2015, interpôs igualmente recurso da decisão que indeferiu liminarmente a acção executiva em relação a seis sociedades comerciais executadas por falta de título executivo. Termina, pedindo….” Nesta conformidade deverão V. Exªs revogar a douta decisão recorrida. As requeridas na execução vieram responder aos recursos interpostos, pugnando pela manutenção da decisão recorrida. Vejamos, então: Nos termos do disposto no artº 412º, nº1 do Código do Processo Penal, …1 a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.” Da simples leitura da frase com que o recorrente termina a motivação verifica-se que inexiste pedido, considerado este do ponto de vista técnico. Senão, vejamos: O pedido é o objecto da pretensão processual do recorrente, conforme ensina Prof Alberto dos Reis. Há que distinguir o acto de demanda do conceito de pretensão processual. Como ensina GUASP, citado por aquele insigne Professos, … a demanda no seu estado puro é um simples acto de iniciação processual, o acto mediante o qual o autor (aqui o recorrente) pede que se dê começo a um processo (aqui, o acto pelo qual o recorrente pede que se conheça das razões da sua discordância em relação à decisão recorrida); a pretensão processual é uma declaração de vontade por virtude da qual o declarante solicita determinada actuação do órgão jurisdicional….” CPC anotado, vol. II, pág 335. Estes dois objectos aparecem fundidos a maior parte das vezes; … mas simultaneidade temporal não significa identificação, não significa que os dois actos se confundam (Guasp, Comentários a la ley de enjuiciamento civil, tomo 2º, vol 1º, parte 1ª, págs. 232 a 235). E prossegue o Prof. Alberto dos Reis…” …Afirmar e pedir são os dois actos essenciais…o pedido há-de ser a consequência logica das afirmações efectuadas…” na motivação e que se encontram resumidas nas conclusões. Em boa técnica jurídica, uma coisa é a pretensão, outra o pedido..., o pedido dirige-se ao Tribunal…é um elemento da relação jurídica processual… traduz-se na providência que o autor solicita ao Tribunal… O pedido deve ser formulado com toda a precisão, de modo a que não haja dúvidas sobre o efeito jurídico que se pretende obter…” Há-de ser a consequência lógica dos fundamentos …” do recurso, que deverão estar resumidos nas conclusões. O pedido deve ser congruente com os fundamentos, deve ser o corolário lógico deles…” ibidem, Prof. Alberto dos Reis, vol. 2º do Comentário, 380 e ss. Pires Bento, citado pelo insigne Professor, ensinava, em O Advogado Aprendiz, pág 212…” a conclusão … ou elaboração do pedido é a tarefa mais delicada do Advogado…saber formular o pedido é o ponto capital.” No caso vertente, o pedido é apenas o de que se revogue a decisão recorrida. Falta a indicação do sentido em que o recorrente entende que o Tribunal “ad quem” deve decidir, como corolário das razões indicadas na motivação, e resumidas nas conclusões. Faltando essa pretensão, o recurso deve ser rejeitado por manifesta improcedência, uma vez que o Tribunal não tem de substituir-se aos intervenientes processuais na interpretação de qual terá sido a sua pretensão para concluir pela procedência de esta ou daquela pretensão, em detrimento de outra, a “olho” e a seu “bel-prazer” Mal se compreenderia que o legislador, tão exigente que foi na formulação dos mecanismos de interposição de recurso, e das exigências técnicas a respeita, não entendesse que era necessário formular o pedido, (ou pedidos), que decorrem, necessariamente, como corolários dessa pretensão. Logo, os recursos do MºPº, porque não indicam o sentido em que o Tribunal “ad quem” deve decidir as questões suscitadas na motivação e resumidas nas conclusões, não formulando o pedido respectivo, terão de ser rejeitados por manifesta improcedência substantiva, nos termos das decisões conjugadas dos artºs 420º, nº 1 a) e 417º, nº 6 b) do CPP. Cumpre, todavia, esclarecer ainda que mesmo que os recursos não devessem ser rejeitados por falta de pedido, a sua improcedência sempre seria manifesta do ponto de vista substantivo. Uma coisa é a lei prever que as associadas respondam solidariamente pela coima imposta à Associação, outra muito diferente é entender-se que essa responsabilidade pode ser executada sem previamente ser declarada. Dito de outro modo, a responsabilidade solidária tem de resultar de uma decisão que vincule as associadas, que previamente assegure o direito de defesa e que acolha o seu direito a um processo justo e equitativo. Daí que a formulação do artº 73º, nº 8 da Lei nº 19/2012 tenha vindo explicitar o pensamento do legislador nesse sentido, ao prever como excepção a essa responsabilidade solidária a existência de…”oposição escrita à decisão que constitui infracção ou da qual resultou a infracção”. Onde é que essa prova deve ser feita? Em sede de processo judicial, obviamente, entendido este o processo para aplicação da contra-ordenação pela referida infracção. Só depois de ser concedido às associadas o direito de defesa no exercício do qual podem provar a existência de oposição escrita à decisão que constitui infracção ou da qual resulta a infracção, e de tal defesa ter sido apreciada e julgada improcedente, por decisão que a não acolha, é que a decisão de impor a coima pode vincular as associadas. Logo, a decisão recorrida de considerar que não existe título executivo contra as associadas que o MºPº pretende executar não mereceria qualquer reparo deste Tribunal de recurso, e o recurso interposto, seria igualmente de rejeitar por manifesta improcedência substantiva. Mantendo-se a decisão recorrida, por via da improcedência manifesta do recurso do MºPº em relação à decisão que indeferiu o requerimento executivo por falta de título contra as seis associadas, prejudicado fica o conhecimento das restantes questões suscitadas pelo recorrente. Decisão sumária : Termos qme se decide rejeitar por manifesta improcedência o recurso interposto pelo MºPº junto do 1º Juízo do Tribunal da Concorrência de Santarém, ao abrigo das disposições conjugadas dos artºs 420º, nº1 a) e 417º, nº 6 b), todos do CPP. Margarida Vieira de Almeida |